É com tristeza que escrevo esse texto,
pois tenho – ou tinha – grande admiração pelo economista Paulo Rabello
de Castro, com quem já participei de palestras em conjunto. Considerado
um dos herdeiros intelectuais de Roberto Campos, liberal que vinha
condenando a estatização da poupança no Brasil com veemência, autor do
livro O mito do governo grátis, eis que Paulo, agora no comando do BNDES, parece ter esquecido de tudo que defendeu no passado recente.
Liberais são céticos com o governo e,
como Lord Acton, acham sempre que o poder corrompe. No encontro entre um
liberal e o poder, a chance de vitória do poder é enorme. Não é fácil
resistir às suas tentações e pressões, o que demandaria quase um rigor
ético de santo. Por isso mesmo os liberais defendem a redução do poder, a adoção de um mecanismo de incentivos mais adequado, para evitar riscos desse tipo.
No caso do BNDES, por exemplo, a única solução realista para um liberal seria acabar com
o banco, não ter o instrumento. Uma vez que ele esteja lá, será muito
difícil impedir seu uso para o “capitalismo de compadres”, para
beneficiar os “amigos do rei” com seus subsídios que transferem riqueza
dos trabalhadores para os poucos grupos ricos. E, como prova disso,
temos o atual presidente do BNDES dando uma de JK e falando em fazer seis anos em seis meses, ou negando que subsídio seja… subsídio!
Haja malabarismo semântico! E isso vindo
de um liberal, de um doutor em Economia pela Universidade de Chicago,
casa de Milton Friedman, é simplesmente imperdoável. “Subsídio, na
realidade, liquidamente não é subsídio. Porque o banco reverte o
resultado de sua boa administração em prol da administração”, afirmou
Paulo, mas poderia ter sido Guido Mantega também. Será que o doutor
nunca ouviu falar em CUSTO DE OPORTUNIDADE?
Que tal voltar aos autores clássicos
como Bastiat? Aquilo que se vê (resultado positivo) e aquilo que não se
vê (qual teria sido o uso alternativo desses recursos escassos pela
iniciativa privada?). Ao defender os subsídios do BNDES, a famosa
“bolsa-empresário”, Paulo está simplesmente ignorando o outro lado da
equação, o que não é admissível para um liberal. Alexandre Schwartsman,
em sua coluna desta quarta na Folha, atacou as recentes declarações do presidente do BNDES:
Boa parte
do empresariado nacional, em particular os encastelados na pirâmide da
Paulista, se especializou em ganhar dinheiro à custa de transferência de
recursos do resto da população.
São vários
os mecanismos, da proteção contra a concorrência (não só internacional
mas também doméstica) ao uso intensivo de subsídios. Uma das formas mais
insidiosas e menos transparentes, porém, se dá por meio do BNDES.
Empresas
com acesso privilegiado ao banco tomam lá recursos balizados pela TJLP
(Taxa de Juros de Longo Prazo), que tipicamente se situa muito abaixo do
custo a que o Tesouro Nacional se financia (numa primeira aproximação, a
taxa Selic), quando não da própria inflação.
[…]
Para
começar, trata-se de um subsídio gigantesco que não passa pelo Orçamento
federal: dá-se, portanto, a um ramo do Executivo o poder de promover
transferências de renda sem nenhuma transparência, sem nenhuma discussão
com a sociedade, seja de cunho técnico ou democrático.
E,
exatamente por ser pouco transparente, é também um incentivo
considerável para os que apreciam participar do jogo da corrupção.
[…]
A própria
lógica de uma economia de mercado se inverte quando a principal
atividade empresarial deixa de ser a inovação para se concentrar na
obtenção de facilidades de modo a canalizar renda do resto da sociedade
para si.
Quando um instrumento como o BNDES está à
disposição, ainda mais com um presidente afirmando que subsídio não é
subsídio e que pretende fazer seis anos em seis meses, ou seja, a senha
para a abertura da torneira, então os grandes empresários vão “investir”
apenas em lobby para cair nas graças do banco, em vez de investir em
produtividade.
E há, ainda, o efeito “crowding out”, ou seja, o banco estatal drena recursos escassos e pressiona a taxa de juros para o restante da
economia para cima. Não existe, afinal, almoço grátis, como dizia
Milton Friedman, tampouco governo grátis, como parecia saber o próprio
presidente do BNDES.
Mas parece que a chegada ao governo tem o
mesmo efeito daquele aparelhinho do “Men in Black”, que apaga a memória
do sujeito num segundo. E Paulo, doutor por Chicago, economista
liberal, agora parece convencido de que existe o “moto perpétuo do
crescimento”, bastando o banco estatal emprestar recursos produzidos do
além ou extraídos da economia com taxas subsidiadas, para que os
“campeões nacionais” possam pagar bons dividendos depois, e o BNDES
arrecadar impostos.
Não é incrivelmente simples? Luciano Coutinho, JBS, Eike Batista, Mantega e Odebrecht precisam só explicar o que deu errado…
Rodrigo Constantino, para o Instituto Liberal
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