SÃO PAULO - Milhares de manifestantes de centenas de cidades do País
saíram às ruas neste domingo, 4, em protesto contra membros do Congresso
Nacional e a favor da Operação Lava Jato. O principal alvo da
mobilização é o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), que
tornou-se réu pelo Supremo Tribunal Federal por crime de peculato na
semana passada. Os manifestantes também pedem a saída do presidente da
Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), em cidades como Rio de Janeiro, Belo
Horizonte e Porto Alegre.
O protesto foi convocado por grupos pró-impeachment da presidente
cassada Dilma Rousseff, como o Vem Pra Rua e Movimento Brasil Livre.
Segundo seus organizadores, a mobilização foi organizada depois que a
Câmara aprovou, na madrugada da quinta-feira passada, mudanças no pacote
de medidas de combate à corrupção. A primeira delas foi a inclusão da
previsão de punir por crime de abuso de autoridade magistrados,
procuradores e promotores. Tanto a magistratura como membros do
Ministério Público interpretaram a iniciativa como tentativa de
intimidar a força-tarefa da Lava Jato. Após reação negativa de grande
parte do Judiciário, inclusive da presidente do Supremo Tribunal Federal
(STF), Cármen Lúcia, Maia saiu em defesa da soberania da Câmara.
Em São Paulo, os manifestantes se concentram na Avenida
Paulista desde as 13h. A Polícia Militar não divulgou o número de
participantes. Havia bonecos infláveis de Renan e do ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva ao lado de carros de som comandados pelo MBL e VPR.
A atriz Regina Duarte foi aplaudida após discursar contra a corrupção
no local. Apesar dos gritos contra políticos, o senador Ronaldo Caiado
(DEM-GO) foi tietado na Paulista. Sobre o movimento "Fora, Renan", ele
afirmou que não se pode "finalizar" a discussão e que "o Senado é maior
do que isso". Em discurso no carro de som do MBL, Fernando Holliday, que
se elegeu vereador pelo DEM este ano, disse ter vergonha de ser do
mesmo partido de Maia.
Em Brasília, a manifestação começou por volta das 10h e se
encerrou ao meio-dia, com o início da chuva. A Polícia Militar do
Distrito Federal estimou que, no auge do protesto, estiveram presentes 5
mil pessoas na Esplanada dos Ministérios. A manifestação foi tranquila e
não houve registros de ocorrências.
A maior parte dos cartazes e palavras de ordem foram direcionadas
a Renan. Os manifestantes pediam a saída imediata do presidente do
Congresso, rechaçavam a votação do projeto que muda a Lei de Abuso de
Autoridade, agendada para a próxima terça-feira, 6, e pediam agilidade
do STF nas ações contra o peemedebista. Renan é investigado em nove
inquéritos ligados à Lava Jato, fora a ação penal por peculato acolhida
na última semana. Em contrapartida, não houve registros de manifestações
direcionadas a Michel Temer.
No Rio, manifestantes carregavam cartazes e faixas de apoio à
Operação Lava Jato, ao juiz Sérgio Moro, ao Ministério Público e à
Polícia Federal. "Todo o poder emana do povo. O povo brasileiro está
reunido para dizer não aos corruptos, a esses incompetentes que enfiaram
o Brasil nesse buraco sem fundo", bradou o humorista Marcelo Madureira,
do alto do caminhão de som do movimento Vem Pra Rua-RJ. Organizadores
estimaram em 600 mil o número de presentes, enquanto agentes de
segurança que acompanham o protesto calcularam extraoficialmente a
adesão de até 400 mil.
Entre os gritos de guerra dos manifestantes estavam "Fora Renan" e
"Lula na cadeia". Em meio à multidão, ambulantes vendiam bonecos
infláveis de Moro vestido de super-herói e de Lula e da presidente
cassada Dilma Rousseff trajando uniformes de presidiários. "A imundície
chegou a um ponto insuportável. Não adianta deixar o Temer, porque ele é
vice da Dilma", disse Hélio Marcus, militar reformado da Força Aérea
Brasileira, que defende uma intervenção militar no País.
Em Curitiba, cerca de 8 mil pessoas - segundo a PM - e 50 mil,
conforme a organização - se reúnem em frente à Justiça Federal. Com
palavras de ordem contra o governo Temer, assim como de apoio a Moro, os
manifestantes usavam camisas amarelas e se mostravam irritados com a
política."Nossos políticos querem derrubar a Lava Jato e não deixaremos
acontecer isso", disse o comerciante Pedro da Cunha.
'Varal da vergonha'. Em Belo Horizonte, cerca de
8 mil pessoas participaram do protesto na Praça da Liberdade, em Belo
Horizonte, contra as mudanças no projeto de lei das dez medidas contra a
corrupção e a favor da Lava Jato. A estimativa do número de
participantes é da organização do protesto, que tem à frente os
movimentos Vem pra Rua e Patriotas. A Polícia Militar não divulgou
cálculo do total de pessoas na praça. As críticas dos manifestantes se
concentram em Renan e em Maia.
Na capital mineira, porém, ao mesmo tempo em que protestavam
contra as mudanças no projeto de lei, os organizadores do ato criticaram
ainda o governador do Estado, Fernando Pimentel (PT), investigado por
corrupção no âmbito da Operação Acrônimo, da Polícia Federal. Uma foto
do governador foi atacada com lama. O mesmo ocorreu com a de Renan
Calheiros, que estava ao lado. Pimentel não se pronunciou sobre a
manifestação.
Em um varal, chamado "da vergonha", foram colocadas fotos de
deputados estaduais que, segundo os organizadores do ato, ainda não
revelaram como deverão votar o pedido de autorização para abertura de
ação penal contra Pimentel no Superior Tribunal de Justiça (STJ), por
conta da Acrônimo. Decisão da própria Corte determinou que a Casa se
posicionasse sobre o pedido. Nessa semana, no entanto, o Supremo
Tribunal Federal (STF), deverá julgar se a autorização da Assembleia é
ou não necessária.
Presença de magistrados. Em Recife, integrantes
do Ministério Público e do Judiciário estiveram presentes à mobilização.
Um deles foi o procurador federal, André Teixeira. "A gente tem um
quarto do Congresso Nacional que ou é acusado em ações ou é réu em
processos. Nas ruas nós não temos um quarto da população como réu em
processo penal. Isso mostra que tem alguma coisa muito errada", analisou
o procurador, que também fez críticas ao foro privilegiado, chegando a
citar como exemplo o caso do presidente do Senado, Renan Calheiros.
Em Fortaleza, os juízes do Ceará participaram da manifestação a
favor da Lava Jato e contra a desconfiguração das medidas anticorrupção
feita pela Câmara dos Deputados. Juiz da 2ª Vara Cível do Ceará, Augusto
César é um dos participantes do ato em Fortaleza, na Praça Portugal.
Para ele, o Congresso Nacional está querendo acabar com a Lava Jato.
"Investigar toda a magistratura é uma forma clara de retaliação à Lava
Jato."
O Palácio do Planalto, a presidência da Câmara e do Senado,
principais alvos dos protestos, publicaram notas em que apoiam o caráter
democrático das manifestações. O Planalto destacou que as manifestações
deste domingo são pacíficas e ordeiras. "A força e a vitalidade de
nossa democracia foram demonstradas mais uma vez, neste domingo, nas
manifestações ocorridas em diversas cidades do país", consta na nota,
divulgada pela Secretaria Especial de Comunicação do Palácio do
Planalto.
/ISABELA BONFIM, ADRIANA FERNANDES, RICARDO GALHARDO,
JULIANA GRANJEIA, DANIELA AMORIM, LEONARDO AUGUSTO, MONICA BERNARDES,
JULIO CESAR LIMA E CARMEN POMPEU