(Esclarece que Segovia disse que até o momento não há indício de crime
no caso, indicando, em vez de afirmando, que a tendência é que a PF
arquive o caso)
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Por Lisandra Paraguassu e Ricardo Brito
BRASÍLIA (Reuters) - O
diretor-geral da Polícia Federal, Fernando Segovia, afirmou na
sexta-feira, em entrevista exclusiva à Reuters, que não há indício de
crime na investigação contra o presidente Michel Temer no chamado
inquérito dos portos, indicando tendência de que a corporação recomende o
arquivamento.
Segundo o chefe da PF, até o momento as
investigações não comprovaram que houve pagamento de propina por parte
de representantes da empresa Rodrimar, que opera áreas do porto de
Santos (SP), para a edição do decreto que prorrogava contratos de
concessão e arrendamento portuários, assinado por Temer em maio do ano
passado.
Essa é a única apuração formal contra o presidente ainda
em curso perante o Supremo Tribunal Federal (STF), requerida ainda pelo
então procurador-geral da República, Rodrigo Janot.
Segovia
disse à Reuters nesta sexta-feira que, nas apurações feitas, não há
quaisquer indícios de que o decreto editado pelo presidente beneficiou a
Rodrimar. Ele destacou que a empresa não era atingida pelo decreto, que
mudou regras de concessão posteriores a 1993, o que não seria o caso
dela.
“O que a gente vê é que o próprio decreto em tese não
ajudou a empresa. Em tese se houve corrupção ou ato de corrupção não se
tem notícia do benefício. O benefício não existiu. Não se fala e não se
tem notícia ainda de dinheiro de corrupção, qual foi a ordem monetária,
se é que houve, até agora não apareceu absolutamente nada que desse base
de ter uma corrupção”, disse Segovia.
O diretor-geral da PF
também afirmou que a “principal prova obtida no inquérito”, a
interceptação de uma conversa entre o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures,
ex-assessor especial de Temer, e o subchefe de Assuntos Jurídicos da
Casa Civil, Gustavo Rocha, não mostra concordância de Temer com o
suposto benefício.
Segundo ele, o próprio Gustavo Rocha fala no
diálogo que não há como fazer ou mudar a questão do decreto e que o
próprio presidente não aceitou a mudança que poderia beneficiar a
empresa.
“Então, assim, os indícios são muito frágeis, na
realidade, de que haja ou que houve algum tipo de influência realmente,
porque em tese o decreto não foi feito para beneficiar aquela empresa”,
disse Segovia.
A suspeita era que o presidente teria recebido
propina, por intermédio de Rocha Loures, para favorecer a Rodrimar.
Tanto o ex-assessor especial quanto Temer já prestaram depoimento no
inquérito e negaram irregularidades. O presidente se manifestou por
escrito.
Rocha Loures chegou a ser preso depois que foi filmado
pela PF saindo de um restaurante com uma mala de dinheiro pago por um
executivo da processadora de carnes JBS JBSS3.SA> no âmbito de uma
outra investigação. Foi posteriormente solto e agora é monitorado com
uso de tornozeleira eletrônica. Ele é réu acusado de corrupção no caso
envolvendo a mala de dinheiro.
Para Segovia, que assumiu o posto
em novembro do ano passado, durante o governo Temer, a empresa não se
beneficiou diretamente porque o decreto não atingiu o contrato da
Rodrimar, ou seja, o “objeto em tese da corrupção não foi atingido”.
“Então ficou muito difícil de ter uma linha de investigação numa
corrupção que em tese não ocorreu”, reforçou.
O chefe da PF
afirmou que outros depoimentos colhidos na instrução do inquérito também
não conseguiram comprovar o cometimento de crime pelos investigados.
“No
final a gente pode até concluir que não houve crime. Porque ali, em
tese, o que a gente tem visto, nos depoimentos as pessoas têm
reiteradamente confirmado que não houve nenhum tipo de corrupção, não há
indícios de realmente de qualquer tipo de recurso ou dinheiro
envolvidos. Há muitas conversas e poucas afirmações que levem realmente a
que haja um crime”, disse.
Segundo ele, ainda há algumas
diligências a serem feitas, mas ele avalia que em no máximo três meses a
apuração será concluída.
O diretor-geral disse que, durante a
instrução do inquérito, também foram requisitadas informações de outra
investigação arquivada contra o presidente sobre suposto crime cometido
por Temer em um suposto esquema de cobrança de propina de empresas
detentoras de contratos no porto de Santos, em São Paulo. A intenção
seria saber se haveria ligação da apuração antiga com a atual, uma vez
que Temer era líder da bancada do MDB e poderia ter atuado na indicação
de uma das pessoas envolvidas em delitos.
Segovia, entretanto,
disse que o envolvimento de Temer se deu a partir de uma citação em uma
audiência de uma pensão alimentícia da esposa de um ex-diretor da Cia
Docas, e isso “caiu por terra” duas vezes, arquivada pelo Supremo,
destacando ainda que a indicação da pessoa teria sido feita por “várias
lideranças políticas”, não apenas por Temer.
“Então o inquérito
(arquivado) na verdade não se demonstra aproveitável para qualquer tipo
de questionamento. Até porque o que está sendo apurado e que o Supremo
está investigando e tem autorização é justamente a questão da corrupção
na construção desse decreto”, argumentou.
Em respostas a
perguntas formuladas pela PF no inquérito, Temer disse em janeiro que
“depositava confiança” em Rocha Loures quando ele exercia o cargo de
assessor especial da Presidência, mas destacou que nunca pediu-lhe para
receber recursos ilícitos em seu nome.
Afirmou ainda que a
Rodrimar não foi beneficiada com a edição dos decretos e que o assunto
foi tratado no âmbito de uma comissão do Ministério dos Transportes.
“MUITO ABERTO”
Segovia
criticou a forma de investigação instaurada por Janot contra Temer.
Formalmente, a apuração é por corrupção passiva e tráfico de influência.
O diretor-geral afirma que o ex-chefe do Ministério Público Federal
“deixou o troço muito aberto porque tem um espectro muito maior para ver
se pega alguma coisa”.
“É para ver se cata alguma coisa,
corrupção, tráfico de influência... vai que cai em alguma coisa?”,
questionou. “Aí você enquadra depois”, completou.
Questionado se o
inquérito está próximo de ser concluído, o chefe da PF afirmou que o
delegado responsável pelo caso, Cleyber Malta Lopes, está voltando de um
curso no exterior e devem conversar.
“Mas eu acredito que não
dure muito mais tempo, não tem muitas diligências mais a serem feitas.
Acredito que em um curto espaço de tempo deve ter a conclusão dessas
investigações”, disse.
Para o chefe da PF, há a necessidade de
tirar o caso a limpo, por isso é preciso se aprofundar na investigação,
buscar provas em todos os lugares porque “quando a gente concluir a
investigação e não houver realmente o fato a gente possa afirmar, ‘olha
não houve crime, não houve o fato’”.
Perguntado se a apuração
exaustiva tem por objetivo evitar questionamentos da imprensa, ele
concordou. “Estamos fazendo nosso trabalho, que é a investigação
criminal. Então tudo que for indício que possa reportar uma
possibilidade que ache uma prova que sustente esse tipo de acusação a
gente vai ter que checar. É muito mais uma checagem de tudo que a gente
tem para que no final não dê um veredicto ‘olha checamos tudo e não tem
nada’. ‘Ah, mas vocês checaram tudo mesmo?'. Sim, foi tudo verificado”,
concluiu.
Caberá à atual procuradora-geral da República, Raquel
Dodge, decidir se eventualmente aceita a recomendação da PF e, se não
houver alguma reviravolta, pedir ao Supremo o arquivamento da apuração,
requerer novas diligências ou ainda, apesar da instrução feita pela PF,
oferecer denúncia contra o presidente.
Raquel Dodge -que é a
responsável por conduzir as apurações contra autoridades com foro
privilegiado no STF- não é obrigada a seguir a sugestão feita pela PF.