O Carnaval ofereceu a Michel Temer uma valiosa oportunidade para a
reflexão. A quarta-feira reserva ao presidente muitas cinzas. Temer terá
de decidir se vai eliminar ou acentuar o contraste que se estabeleceu
entre as áreas econômica e política do seu governo. Na economia, Temer
celebra os números que apontam, timidamente, os resultados de uma gestão
que tenta tirar o país do buraco. Na política, o presidente tolera e
até participa de uma movimentação que aprofunda o abismo moral em que o
Brasil está metido. O primeiro dilema que Temer precisa encarar envolve o
ministro Eliseu Padilha. Demitir ou não demitir o chefe da Casa Civil?,
eis a questão.
Nos últimos dias, Temer e o ministro Henrique
Meirelles, da Fazenda, se esforçam muito para convencer os aliados do
governo no Congresso e toda a plateia de que a página da recessão foi
virada. Os números mais recentes do IBGE sobre o desemprego recomendam
calma. Há mais de 12 milhões de desempregados no país. Um em cada cinco
desses trabalhadores está sem contracheque há mais de dois anos. Uma
situação como essa não se reverte do dia para a noite. Leva tempo.
Temer
precisa resolver o drama hamletiano do seu governo, momentaneamente
personificado em Eliseu Padilha. Sob pena de permitir que a podridão
política contamine a economia. O presidente não pode mais assistir à
carnavalização política do seu governo com o distanciamento de um
observador neutro, como se nada fosse com ele. Depois que seu amigo José
Yunes acusou seu outro amigo Eliseu Padilha de lhe enviar um pacote
tóxico por meio do doleiro Lúcio Funaro, tudo passou a ser com Michel
Temer. De volta do descanso do Carnaval, o presidente terá de informar
se tem condições de se afastar do bloco de sujos.DO J.DESOUZA
Em
texto
veiculado nesta segunda-feira (27), o presidente do PT, Rui Falcão,
classificou de “memorável” o depacho do ministro Marco Aurélio Mello, do
Supremo Tribunal Federal, que colocou em liberdade o ex-goleiro Bruno,
acusado de participar da morte da ex-amante Eliza Samúdio. Falcão cobrou
tratamento isonômico para José Dirceu, Antonio Palocci e João Vaccari,
os presos petistas da Lava Jato.
Para o dirigente petista, a
soltura do ex-goleiro do Flamengo “deveria levar a uma revisão geral nas
decisões recentes da Suprema Corte nos requerimentos de habeas corpus
sistematicamente denegados.” Falcão reproduziu, entre aspas, um trecho
da decisão de Marco Aurélio: “A esta altura, sem culpa formada”, anotara
o ministro em seu desapcho, “o paciente [Bruno] está preso há 6 anos e 7
meses. Nada, absolutamente nada, justifica tal fato. A complexidade do
processo pode conduzir ao atraso na apreciação da apelação, mas jamais à
projeção, no tempo, de custódia que se tem com a natureza de
provisória.”
Os argumentos de Marco Aurélio deveriam ser
estendidos pelo Supremo aos processos da Lava Jato, defendeu Rui Falcão.
“Afinal, por que manter presos João Vaccari, José Dirceu e Antônio
Palocci – e há outros em situação semelhante — contra os quais só
existem delações e nenhum prova consistente?”, indagou o grão-petista.
“É hora de cessar a parcialidade nos julgamentos, dar um fim à
perseguição política promovida por certos juízes e procuradores e
libertar Vaccari, Dirceu e Palocci.”
Em março de 2015, nas pegadas
do Carnaval daquele ano, sob a presidência do mesmo Rui Falcão, o PT
federal divulgara um manifesto de conteúdo humorístico. Redigido sob a
supervisão de Lula, o texto dizia a certa altura: “Como já reiteramos em
outras ocasiões, somos a favor de investigar os fatos com o maior rigor
e de punir corruptos e corruptores. […] E, caso qualquer filiado do PT
seja condenado em virtude de eventuais falcatruas, será excluído de
nossas fileiras.”
Era como se o partido desejasse dar um banho de
gargalhada no país. A última vez que o PT havia se declarado a favor de
apurações rigorosas fora antes do julgamento do mensalão. Sentenciada,
sua cúpula passara uma temporada enjaulada na Papuda. E nada de
expulsão. Ao contrário. Os condenados sempre foram cultuados nos
encontros partidários como “guerreiros do povo brasileiro”.
Agora,
em plena folia de 2017, Rui Falcão rasga em definitivo a fantasia. José
Dirceu, que já carregava sobre os ombros a condenação de 7 anos e 11
meses de cana amealhada no julgamento do mensalão, adicionou ao seu
protuário uma sentença de 23 anos e 3 meses de prisão por envolvimento
na roubalheira do petrolão. João Vaccari já coleciona duas condenações
de sérgio Moro. Juntas, somam 24 anos e 4 meses de prisão. Palocci está
na fila.
Ao defender a libertação da banda presidiária do petismo,
Rui Falcão carnavaliza de vez o PT, condenando o partido a uma
Quarta-Feira de Cinzas perpétua. DO J.DESOUZA