O
Supremo Tribunal Federal, pelas vozes da quase totalidade de seus
ministros, tirou da rede de crimes cometidos pelos petistas o seu
apelido meio apalhaçado: “mensalão”. Ninguém menos do que o presidente
de nossa suprema corte, Ayres Britto, pronunciou o nome da coisa:
“golpe”. Como tenho insistido desde 2005 — e os leitores do blog o sabem
desde junho de 2006, quando esta página veio à luz —, aquele esquema
criminoso foi montado para tornar irrelevantes a democracia, as
instituições e o estado de direito. É, afirmei num dos programas da
VEJA.com, o chavismo da boca do caixa, exercido por outros meios.
O Brasil
exibe uma das faces, a mais suave, que tomou o Foro de São Paulo, um
projeto de poder continental — não, não é centralizado — que tem, entre
seus inimigos, a livre iniciativa, a imprensa independente, a liberdade
de expressão e o direito à propriedade. Cada país sob o comando de
lideranças ligadas direta ou indiretamente ao Foro — Brasil, Argentina,
Equador, Bolívia, Venezuela, Peru, El Salvador, entre outros —, tem suas
próprias características, e a degeneração institucional avança com mais
rapidez ou com menos. Os respectivos governos desses países
estabeleceram a garantia da mútua assistência.
Se as
ditaduras latino-americanas tinham a “Operação Condor” para caçar
militantes de esquerda, os esquerdistas e populistas do Foro têm a
Operação Carcará, para socorrer candidatos a tiranos em dificuldades e
caçar democratas. Vejam o que aconteceu com Honduras. Um presidente com
sinais evidentes de demência tentou dar um golpe bolivariano e foi
deposto pela Constituição democrática. O Brasil tentou comandar a reação
ao que chamou golpe ajudando a instalar o real golpista na sua
embaixada. No Paraguai, Fernando Lugo também foi apeado do poder segundo
os rigores da Constituição. Dilma ajudou a suspender o país do Mercosul
e, de modo escandalosamente ilegal, aprovou a entrada da Venezuela de
Chávez no bloco. Faço essas observações para que fique claro que o bicho
tem muitas cabeças. Mas volto ao ponto.
Parte da
estratégia golpista no Brasil foi denunciada, e sua engenharia foi ao
menos avariada. Alguns de seus promotores acabam de ser condenados por
uma das instâncias do estado de direito, por um dos Poderes da
República, seguindo todos os rigores da lei. Mentiras em penca foram e
são cotidianamente contadas pelo petismo, a que dá curso, numa frente, a
subimprensa venal, financiada com dinheiro público, e, na outra,
setores da grande imprensa ou contaminados pela ideologia ou embalados
pela pior de todas as sabotagens: a ignorância.
As coisas estúpidas que foram ditas
Quantas vezes vocês já leram aqui — ou ouviram nos 27 debates
que já fizemos na VEJA.com (28º hoje) — que os ministros do STF seguem,
nos seus votos, a tradição da corte, a jurisprudência firmada, os
fundamentos que o orientam, em muitos casos, há mais de 70 anos? Não
obstante, espalhou-se a falácia de que o tribunal teria passado a usar,
neste julgamento, de um rigor inédito, que só estaria valendo para
petistas. Trata-se de uma mentira, de uma fraude, de uma canalhice.
Atenção! O
Artigo 317 do Código Penal, que define já no seu caput que a corrupção
passiva dispensa, por exemplo, a assinatura de um documento é de… 1940
(decreto-lei 2848). Assim, quando os ministros da corte afirmaram que
nem mesmo se precisa comprovar que o parlamentar votou assim ou assado
para que fique caracterizada a corrupção passiva, estavam pondo em
prática uma lei que tem 72 anos. O Artigo 333 do mesmo código, que trata
da corrupção ativa, está igualmente naquele decreto de 1940. O efetivo
cumprimento ou descumprimento de um ato de ofício em razão do cargo
sempre foi um agravante de pena. De que novidade se esta a falar?
Tentou-se
fazer escândalo também com o uso das chamadas provas indiciárias, de que
trata o capítulo 239 do Código de Processo Penal, que transcrevo
abaixo:
“Art. 239. Considera-se indício a
circunstância conhecida e provada, que, tendo relação com o fato,
autorize, por indução, concluir-se a existência de outra ou outras
circunstâncias.”
Aqui e
ali, tratou-se a prova indiciária como se fosse alguma grande novidade a
que estivessem recorrendo ministros para condenar petistas sem provas. É
mesmo? Estamos falando da Lei 3.689, de, ATENÇÃO!, 3 de outubro de
1941!!! Quando o ministro Luiz Fux afirmou que cabe, sim, à defesa
provar o álibi, os idiotas e os de má-fé se levantaram em coro: “Olhem,
ele está dizendo que as pessoas agora têm de provar que são inocentes”.
Não! Ele estava apenas evocando ao Artigo 156 do Código de Processo
Penal: “A prova da alegação incumbirá a quem a fizer”. Sim, leitor amigo, também esse é um fundamento antigo, que está na lei desde 1941!
Teoria do domínio do fato
Nesta quarta, Celso de Mello deu uma aula sobre a teoria do
domínio do fato, que, o ministro Ricardo Lewandowski maltratou sem rigor
nem cuidado teóricos. Tanto Mello como Britto demonstraram ser esta uma
doutrina já incorporada ao direito brasileiro, com vasta jurisprudência
nos tribunais e naquela mesma corte, o STF, onde tem assento
Lewandowski. Só se pode, por óbvio, chegar à conclusão de que uma
determinada pessoa tem o domínio do fato criminoso em face de provas —
INCLUINDO AS INDICIÁRIAS, SIM, QUE PROVAS SÃO. Tal teoria, não exime o
Ministério Público de demonstrar a materialidade e a autoria do fato
delituoso. Como ficou fartamente demonstrado nos casos de José Dirceu,
José Genoino e Delúbio Soares.
Em sua
coluna da Folha de hoje, Janio de Freitas, com a ignorância arrogante de
sempre, incapaz de consultar a lei, que está ao alcance do teclado,
escreve o seguinte:
“Se há ou não há jurisprudência do
Supremo para dar a indícios, na falta de poder mudar-lhes o nome, o
valor de provas, não se altera esta realidade: indícios são sugestões,
não são evidências, contrariamente ao que disse o ministro Celso de
Mello.”
Quanta
ignorância satisfeita a deste senhor! Ele não leu, como resta evidente, o
artigo da lei, não sabe o que fala. Este é o jornalista que se fez,
durante alguns anos, como crítico dos poderosos e da impunidade. O que
Janio entende como “prova” jamais condenaria o chefe de uma organização
criminosa, qualquer que fosse ela, porque é próprio dos “crimes de
poder”, como chamou a ministra Rosa Weber, não deixar o que ele chama
“prova”.
Entendo.
Janio é sábio demais para ter ao menos o cuidado de fazer uma pesquisa.
É vergonhoso! Não trato aqui de divergência de opinião, não! Estou
falando é de ignorância mesmo! Vá se instruir, Janio de Freitas!
A loucura petista
Fiz esse breve apanhado de algumas das leis que foram aplicadas
pelos ministros para condenar os mensaleiros para deixar evidente quão
falaciosa é a tese dos petistas, segundo a qual seus capas-pretas foram
condenados por leis de exceção. Trata-se, como se vê, de uma mentira
estúpida. José Dirceu, José Genoino e a CUT emitiram notas em que saem
atirando contra o Supremo e a imprensa. Também a Executiva do PT expeliu
um texto, em que volta a sua fúria contra a oposição — como se esta
tivesse assento lá no tribunal. A imprensa apanhou de novo.
Pois é…
Estes são eles. O que essa gente não aceita, de verdade, é o estado de
direito. O que essa gente não aceita de verdade é a democracia. O que
essa gente não aceita de verdade é que os petistas estejam submetidos às
leis que valem para o conjunto dos brasileiros. O Supremo Tribunal
Federal, como escrevi aqui, já foi tocado pelo mal — e isso está mais do
que evidente. Mas ainda conserva uma maioria esmagadora de homens e
mulheres com vergonha na cara, que conhecem o peso da toga.
Desde a
redemocratização do país — a rigor, isso vale também para alguns tantos
anos do regime militar —, não se vê um ataque tão feroz e organizado ao
Poder Judiciário. Os que agridem de maneira frontal um Poder da
República, que seguiu todos os rigores da Constituição e dos códigos
legais, têm uma agenda — e não é uma agenda democrática.
Com
efeito, o Brasil tem a corte mais livre e independente de todos os
países que estão hoje sob governos orientados pelo Foro de São Paulo. E o
PT, está claro, quer mudar isso. Nessas horas, alguns bobinhos sempre
exclamam: “Como esse Reinaldo exagera!” Será mesmo? Leiam este trecho da
resolução que Executiva Nacional do PT divulgou ontem:
“O desempenho do PT no primeiro
turno das eleições municipais brasileiras, assim como a vitória do
Grande Polo Patriótico nas eleições presidenciais venezuelanas
igualmente realizadas no dia 7 de outubro, confirmam a força da esquerda
democrática, popular e socialista latinoamericana e caribenha”.
Viram? A
referência do petismo é a democracia chavista. A referência do petismo é
o “socialismo caribenho” — leia-se: cubano. Lula e Fidel Castro são os
fundadores do foro. Toda essa fúria contra o Supremo se dá às vésperas
de a presidente Dilma Rousseff fazer mais uma indicação para o tribunal,
com a saída de Britto, em novembro. Fiquemos atentos! Para que o
projeto de poder petista — o projeto golpista! — possa se realizar,
ainda falta meter alguns chicaneiros no Supremo Tribunal Federal.