Artigo do poeta Ferreira Gullar, na edição de hoje da Folha, sobre os malefícios de Lula:
Lula é
uma vocação política incontestável, como demonstra sua carreira
vitoriosa, que o fez sair da condição de operário e chegar à Presidência
da República. É verdade que alguns fatores políticos contribuíram para
isso, mas não tivesse ele o tino e a sagacidade que tem, jamais chegaria
onde chegou.
Há,
porém, um traço de sua personalidade que igualmente contribuiu para essa
carreira vitoriosa: a facilidade com que ignora toda e qualquer norma,
seja ética, política, jurídica ou administrativa. Para ele, tudo é
permitido, desde que favoreça a seus propósitos. Não digo que ele seja o
único, dentre nossos políticos, com essas características, mas, nesse
particular, indiscutivelmente, ele supera qualquer um.
E tem
mais, quando se trata de seu interesse político pessoal, não distingue
entre companheiros e adversários. Os exemplos são muitos e o mais
notável dentre eles foi o próprio mensalão. José Dirceu, Genoino,
Delúbio, todos pagaram pelos delitos cometidos, menos ele, que era o
chefe da trupe.
Lembro-me
bem da expressão de pânico estampada em seu rosto, quando o escândalo
eclodiu. Dava para perceber que se sentia sem saída. Não duvido que, em
seguida, tenha mostrado àqueles três que se ele, Lula, fosse
incriminado, todos eles e o próprio PT estariam perdidos. Foi então que
Delúbio assumiu toda a culpa e o Lula se safou.
Alguém
acredita que Lula desconhecia o uso do dinheiro público para a compra de
deputados que apoiavam o seu governo? Quer dizer que o chefe da Casa
Civil, que despachava com ele todos os dias, armou tudo sem nada lhe
contar; o Genoino, presidente do PT, também nada, e Delúbio, que estava
todos os domingos fazendo churrasco na Granja do Torto, também guardou
segredo.
Isso,
embora o mensalão tivesse como beneficiário o seu governo. Pois bem, na
hora em que o escândalo estourou, o que disse Lula? "Fui traído!"
Passado o susto, porém, afirmou que não houve o mensalão, era tudo uma
invenção de seus inimigos e da imprensa. É muita cara de pau, não acha?
Sucede
que o Supremo Tribunal Federal julgou o mensalão e condenou os
dirigentes do PT por crime de peculato, corrupção e lavagem de dinheiro,
num julgamento que durou meses e que foi transmitido pela televisão.
Tudo foi dito, exibido, discutido e votado às vistas de todo o país.
Acusados foram condenados e estão cumprindo pena. Mesmo assim,
recentemente, Lula afirmou numa emissora de rádio em Portugal que aquele
julgamento foi 80% político e só 20% jurídico. Ele diz isso baseado em
quê, se a maioria dos ministros do STF foi nomeada por ele e pela Dilma?
Claro, sabia muito bem estar mentindo, que o que afirmava não tinha
qualquer fundamento, mas afirmou.
Mas o que
esperar de Lula, diante de uma pergunta como aquela: o que pensa da
condenação de dirigentes do PT pelo STF? A resposta honesta seria, no
mínimo, "é, pisamos na bola". Só que admitir que ele e sua trupe
erraram, jamais admitirá. Por essa razão, sem o menor constrangimento,
garantiu que o julgamento foi político e que o futuro revelará a
verdade. Sim, o futuro há de revelar que ele, Lula, foi o verdadeiro
chefe do golpe do mensalão.
Hoje Lula
diz que o julgamento foi político, mas quem, de fato, tentou
politizá-lo foi ele, que, como revelou o ministro Gilmar Mendes, do STF,
armou um encontro para convencê-lo a votar contra a condenação dos
mensaleiros. Como o ministro não topou, tentou dobrá-lo, ameaçando
revelar um deslize que ele teria cometido, e que não houve. Isso é
chantagem, não?
Convenhamos
que não pega bem um ex-presidente da República fazer certas coisas
como, por exemplo, tentar desmoralizar o Judiciário, um dos três poderes
do Estado democrático brasileiro. Mas o que fazer? Outro dia, eu o vi,
num vídeo antigo, afirmar para seus companheiros ter a vida lhe ensinado
que o político não deve dizer o que pensa e, sim, o que o eleitor quer
ouvir. Ou seja, o político deve enganar o eleitor. Creio não ser preciso
dizer mais nada.
Esclareço
que nada tenho, de pessoal, contra Lula. Preocupam-me as consequências
de sua atuação no Brasil de hoje e no de amanhã.
DO ORLANDOTAMBOSI