PAZ AMOR E VIDA NA TERRA
" De tanto ver triunfar as nulidades,
De tanto ver crescer as injustiças,
De tanto ver agigantarem-se os poderes
nas mãos dos maus, o homem chega
a desanimar-se da virtude,
a rir-se da honra,
a ter vergonha de ser honesto".
[Ruy Barbosa]
A morte da ex-primeira dama Marisa Letícia foi uma fatalidade que acomete dezenas de brasileiros anônimos todos os dias. Como a mulher de Lula era praticamente proibida pelo marido de falar em público e não possuía praticamente nenhuma empatia com a população, Marisa morreu praticamente como uma anônima. Para piorar, outra parte significativa da sociedade nutria certa antipatia por Marisa devido a um episódio em que a ex-primeira dama foi flagrada em uma conversa telefônica com o filho ofendendo manifestantes contrários ao governo Dilma que protestavam através dos famosos "panelaços". O fato é que Marisa era ignorada por alguns e detestada por outros. Para piorar a situação, a ex-primeira dama passou os oito anos do mandato de Lula sem desempenhar nenhum papel social. Para uma esposa de sindicalista que se dizia defensor dos interesses dos mais pobres, a passagem de Marisa pelo Palácio da Alvorada foi uma decepção. A ex-primeira dama dedicou todo o seu tempo a sessões de botox e a encomendar vestidos de estilistas famosos. Mas o histórico negativo de Dona Marisa não parou por aí. Investigada na Operação Lava Jato, a mulher de Lula se tornou ré em duas ações penais e se negou a prestar um depoimento sobre sua participação no esquema do triplex no Guarujá. Marisa também foi apontada como mandante e cúmplice nas reformas do sítio em Atibaia e no acobertamento de uma cobertura usada pelo casal em São Bernardo do Campo. O imóvel, sequestrado por determinação do juiz Sérgio Moro, foi adquirido com propinas da Odebrecht e era usado pela família desde 2010. Além de não desempenhar nenhum papel social durante o período em que foi a primeira dama, além de ofender cerca de 80% da população contrária à corrupção e incompetência da ex-presidente Dilma, Marisa ainda se envolveu nos crimes de lavagem de dinheiro do marido. Convenhamos, com um histórico como este, é perfeitamente compreensível que Marisa não fosse lá tão querida pelo povo brasileiro. Ao tentar explorar politicamente morte da esposa, o ex-presidente Lula e o PT acabaram piorando a situação. Ao tentar imputar a culpa pela morte de Marisa ao juiz Sérgio Moro e os membros do Ministério Público, os petistas deram um tiro no pé. Marisa havia sido diagnosticada com um aneurisma cerebral há dez anos, era diabética, fumante, bebia e era sedentária. Tentar atacar a Lava Jato, a maior reserva moral do país, e tentar se capitalizar com a morte de uma nulidade política, Lula e o PT deram com os burros na água. Aos olhos do povo, o oportunismo de Lula e do PT se traduziu numa manobra rasteira e imoral. Segundo o jornalista Reinaldo Azevedo, Lula fez do velório de Marisa um comício e de seu corpo, um palanque. FONTE: imprensaviva - Publicado 05.02.2017 às 12:02 hrs
‘Se desenvolveu no País o hipergarantismo, que só olha os direitos do réu, e não os da sociedade’,
afirma coordenador da força-tarefa da Lava Jato
Certa vez, numa viagem ao interior do Paraná, Deltan
Dallagnol, o procurador da República que coordena a força-tarefa da
Operação Lava Jato, ouviu, de um filho aflito, que o pai lhe contara ter
sido diagnosticado com um tumor na próstata. Passado um ano, o pai
voltou ao médico, que confirmou o tumor, já maior. Mais um ano, e
crescera mais. “O cara não tomava providência”, contou ao Estado
em entrevista na PGR de Curitiba. “Até que o médico, preocupado,
quebrou o protocolo e foi falar com o filho: ‘Olha, diagnóstico não vai
resolver o problema do seu pai. Tem de tirar o tumor’.”
A história ilustrou uma preocupação
crescente de Dallagnol: a visão da Lava Jato como a solução do problema
da corrupção. “Acham que vai ter um antes e depois da Lava Jato sem
reformas estruturais – e não vai”, disse. O procurador ainda defendeu a
linha teórica que chama de “garantismo integral”, “que garanta os
direitos dos réus, mas também os da sociedade”.
Quem ganha e quem perde, e o quê, se ficar
derrubada a proposta das dez medidas contra a corrupção, defendida pelo
Ministério Público Federal– atualmente sob impasse na votação da Câmara?
Se elas não passarem, nós precisamos continuar lutando
por reformas para que o sistema de justiça funcione, para todos. Eu vejo
isso como um processo de fortalecimento da sociedade civil. O que
acontece, no Brasil, é que a sociedade civil ainda não é suficientemente
organizada. Mas ela vem melhorando, vem desenvolvendo músculos.
Enquanto isso, o sr. e seus colegas procuradores
ficam dando uma força... Não é uma visão de salvador da pátria – como
ultimamente o sr. tem sido carimbado?
Não. Ninguém é salvador da pátria. Se quisesse passar a
idéia de salvador de pátria, diria que a Lava Jato vai transformar o
país, vai salvar o país. Mas não é isso que a gente fala.
O que é que os srs. falam?
O que a gente fala é que a sociedade vai perceber que a
Lava Jato não é a solução para os nossos males. Ela faz diagnóstico – e
diagnóstico não vai resolver o problema.
Explique melhor...
Existe a ilusão de que pessoas indo pra cadeia resolve o problema. O que a gente busca fazer é desconstruir essa ilusão.
De que forma?
Mostrando que o que pode contribuir para a redução dos
índices de corrupção são a reforma na justiça criminal, a reforma
política e a atuação sobre outras condições que favorecem a corrupção.
E a Lava Jato?
O que eu vejo, nas palestras que dou, é que a maior
parte das pessoas acha que vai ter um antes e um depois da Lava Jato.
Ela pode até contribuir, de algum modo, mas só a Lava Jato não resolve. É
um passo, mas a gente precisa de muitos passos. Se não for seguida por
modificações estruturais, tudo vai ficar como era antes. Com o passar do
tempo, é muito provável que nós voltemos à condição original.
Daí a necessidade de reformas...
Se nada for feito de reformas positivas, é possível, ou
até provável, que sejam feitas reformas negativas, seguindo os passos do
que aconteceu na Itália, em que os políticos se autoprotegeram,
concedendo autoanistias. Essa autoanistia não precisa assumir a forma de
uma anistia proclamada, como a que foi tentada [na Câmara] no final do
ano passado. Ela pode ser feita por pequenas mudanças na legislação
criminal, ao longo de dez anos.
O sr., e outros operadores centrais da Lava Jato
– como os procuradores da república Douglas Fischer, Eduardo Pellela e
Bruno Calabrich, além do juiz Sérgio Moro – defendem, em livros,
artigos, e palestras, uma corrente teórica que se contrapõe ao que
chamam de hipergarantismo, ou garantismo hiperbólico monocular,
definindo-o como uma exacerbação do direito de defesa dos acusados. E
propõem, em contraponto, o que chamam de garantismo integral, que
definem como uma solução mais equilibrada. Pode explicar melhor?
Acaba preponderando, no cenário brasileiro, uma corrente
que é chamada de garantista, onde se defende que os direitos dos réus
devem ser integralmente respeitados. Até aí todos nós concordamos: o
processo criminal deve ser garantista. Não serve só para punir, mas para
limitar a punição, proteger a pessoa contra abusos, contra
irracionalidades, contra atropelos.
Onde é que está a divergência?
O que se desenvolveu no Brasil foi aquilo que alguns
chamam de hipergarantismo. É um garantismo hiperbólico, porque
exacerbado, e monocular, porque só olha os direitos do réu, e não olha o
direito da sociedade.
O que o srs. defendem, então?
O que nós buscamos é um garantismo equilibrado,
integral, que garanta os direitos dos réus, mas também o das vítimas e
os da sociedade. Do modo como funciona em tribunais garantistas
internacionais.
Por exemplo...
O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, a Corte
Interamericana de Direitos Humanos, tribunais de países que são
considerados desenvolvidos, e que são berço da proteção de direitos
humanos, como a Espanha, como o próprio Estados Unidos, um grande pai
das garantias fundamentais.
Há fortes argumentos contrários a esse conceito
do “hipergarantismo”. Um deles é que o garantismo está lastreado na
constituição de 1988, que consolidou os princípios “in dúbio pro reu” e
da presunção da inocência.
O hipergarantismo é uma interpretação do que está na Constituição.
Permitida e amparada pelo que lá está.
A outra interpretação também é permitida. A grande
questão é: como é que funciona hoje o direito e o processo penal em
relação a réus do colarinho branco, a corruptos e corruptores?
Como é que funciona?
Uma pesquisa de dois autores publicada pela Fundação Getúlio Vargas [Carlos
Higino Ribeiro de Alencar e Ivo Gico Junior, em “Corrupção e
Judiciário: a (in)eficácia do sistema judicial no combate à corrupção”, disponível na internet],
mostra que o percentual de punição dos corruptos identificados é de
pouquinho mais de 3%. Uma probabilidade de punição de 3% não vai ser um
fator que desestimule a corrupção, porque a probabilidade de ser punido é
muito pequena. O sistema hoje está concatenado com uma grande
engrenagem, de tal forma que o resultado produzido é impunidade a réus
do colarinho branco, corruptos e corruptores.
Não é a Constituição que tem que mudar essa
equação – e não o dr. Deltan, que de resto poderia ter se candidato a
deputado ou senador, e ir defender as dez medidas lá no Congresso, em
vez de ficar correndo atrás de assinaturas?
Ótimo! Eu gosto de ouvir a divergência, porque ela é
saudável e ajuda a construir um debate que enriquece o resultado. O que
está colocado, com esse argumento, é medo de quem já passou por uma
ditadura, o medo de que o Estado se exceda. A minha geração é uma
geração que cresceu sem ditadura, vendo abusos de governantes praticando
mandos e desmandos sem qualquer punição. O que a gente prega é
altamente compatível, existe e funciona nas democracias do mundo.
O sr. defende, no seu livro sobre as provas, que
o princípio da boa fé deve ser valorizado – para permitir, por exemplo,
o recebimento de provas ilícitas. Acontece que esse princípio não está
constitucionalizado, enquanto o da presunção de inocência está, e deve,
portanto, prevalecer. Ou não?
A boa fé é algo inerente ao sistema de provas ilícitas,
que o Brasil importou dos Estados Unidos. Só que quando a gente importou
esse sistema, só importamos a metade que protege o réu. A outra metade,
que protege a sociedade, a gente abandona. Isso não faz sentido, na
minha perspectiva.
Mas foi assim que o Legislativo resolveu – como do jogo democrático.
É do jogo, posso entender, mas deve mudar.
A questão, na prática, voltando à operação Lava
Jato, é que a sua posição, assim como a juiz Sérgio Moro, relativiza o
constitucional in dúbio pro reu – o que é muito perigoso em um sistema democrático. Não?
Deltan - Eu aprendi nos Estados Unidos um argumento que se chama slippery slope .
É o argumento da ladeira escorregadia: “se você encosta em mim, daqui a
pouco me dá um tapa e daqui a pouco um tiro na cabeça”. É um argumento
tem por base o medo, que é uma emoção altamente poderosa. Mas a grande
questão é: esse slippery slope procede? Será que não há
barreiras entre esse tocar na pele e o tiro na cabeça? Nesse caso não
existe. Estamos propondo medidas que já existem nas democracias
civilizadas...
Esses princípios – in dubio pro reu, etc – estão na constituição...
Mas nenhuma posição que eu fedendo é incompatível com a Constituição. Me diga uma.
O sr. defende, claramente, a relativização do princípio da presunção da inocência.
Não. Digamos que você me dê essa caneta de presente. Eu vou dizer que você relativizou o direito à propriedade no Brasil?
Desculpe, mas não é uma boa comparação...
Direito à propriedade é um direito fundamental, que são
irrenunciáveis e inalienáveis. O que você foi fez foi compatibilizar um
direito inalienável e irrenunciável, com outro direito inalienável e
irrenunciável, que é o direito à liberdade. Aí é que está a chave para
entender o que a gente defende. Ninguém é contra a Constituição.
Na tabela que o sr. publica ao final de seu
livro – com decisões de tribunais superiores que já seguem essa corrente
do garantisno integral - não há nenhum exemplo de tribunal no Brasil. É
uma corrente que ainda não chegou por aqui, pelo menos nas instâncias
superiores.
Porque diz respeito à interpretação. Veja, por exemplo, a
doutrina constitucionalista do Direito Civil. O direito à propriedade
estava no cerne do Direito Civil. Eles fizeram um giro hermenêutico para
dizer que a propriedade é assegurada, mas está em função da dignidade
da pessoa humana. O que eles quiseram fazer foi humanizar o Direito
Civil. Essa linha é uma linha que eu endosso. O mesmo tipo de
argumentação que eles fizeram, no Direito Civil, é algo que a gente faz
buscando uma efetividade da justiça criminal. É usar a argumentação, e a
interpretação, dentro da constituição, para que a justiça penal seja
efetiva, sem desproteger o direito dos réus.
E daí voltamos às dez medidas...
Quando oferecemos alternativas como as dez medidas
contra a corrupção, estamos trazendo o debate para a mesa. O que a gente
quer é um sistema de justiça que funcione. Oferecemos um tipo de
solução, mas aceitamos qualquer outra solução que venha e resolva o
problema. DO ESTADÃO