quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

Marco Aurélio Mello determina soltura de todos os presos com condenação após 2ª instânci


Ministro do STF deferiu pedido apresentado pelo PCdoB; decisão se estende ao ex-presidente Lula. Efeito não é imediato e advogados terão de pedir a juízes soltura dos condenados.

Por Mariana Oliveira, TV Globo — Brasília
 O ministro Marco Aurélio Mello em julgamento no plenário do STF — Foto: Carlos Moura, STF
O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal, determinou nesta quarta-feira (19) a soltura de todos os presos que estão detidos em razão de condenações após a segunda instância da Justiça. A decisão foi tomada no último dia de trabalho do tribunal, já que a partir desta quinta (20), inicia-se o recesso do Judiciário.
O ministro determinou a soltura, mas a liberação dos presos não é imediata. Cabe a cada advogado pedir que o juiz responsável pela pena efetive a soltura e cumpra a decisão do ministro (leia mais sobre a decisão ao final desta reportagem).
A decisão liminar (provisória) de Marco Aurélio Mello atinge o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que tem recursos pendentes nos tribunais superiores. Lula foi condenado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, e tem recursos pendentes de análise nos tribunais superiores (Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal).
Logo após a decisão de Marco Aurélio, a defesa de Lula pediu à Justiça que o ex-presidente seja solto. O pedido foi apresentado 48 minutos depois da liminar ser concedida.
A decisão do ministro do STF afirma que deve ser mantido o artigo 283 do Código de Processo Penal, que estabelece que as prisões só podem ocorrer após o trânsito em julgado, ou seja, quando não couber mais recursos no processo.
Na decisão, Marco Aurélio ressalva prisões preventivas previstas no artigo 312 do Código de Processo Penal, ou seja, aquelas de presos perigosos ou quando é preciso manter a detenção para assegurar a ordem pública ou as investigações.
"Defiro a liminar para, reconhecendo a harmonia, com a Constituição Federal, do artigo 283 do Código de Processo Penal, determinar a suspensão de execução de pena cuja decisão a encerrá-la ainda não haja transitado em julgado, bem assim a libertação daqueles que tenham sido presos, ante exame de apelação, reservando-se o recolhimento aos casos verdadeiramente enquadráveis no artigo 312 do mencionado diploma processual", diz o ministro na decisão.

Em nota, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, disse que foi informada da decisão e afirmou que estuda medidas judiciais cabíveis.
"A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, recebeu há pouco a notícia da decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio, que determinou a soltura de todos os presos detidos em razão de condenações confirmadas em segunda instância. Embora ainda não tenha sido intimada da decisão, a procuradora-geral já analisa, juntamente com a equipe, as medidas judiciais cabíveis. A procuradora-geral destaca que o início do cumprimento da pena após decisões de cortes recursais é compatível com a Constituição Federal, além de garantir efetividade ao Direito Penal e contribuir para o fim da impunidade e para assegurar a credibilidade das instituições, conforme já sustentou no STF", diz a nota.

Julgamento no STF

O ministro concedeu a liminar dois dias depois de o presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, marcar para o dia 10 de abril do ano que vem o julgamento sobre o tema. Nessa data, está marcada a análise de três ações que pedem que as prisões após condenação em segunda instância sejam proibidas em razão do princípio da presunção da inocência.
O principal argumento dessas ações é que o artigo 5º da Constituição define que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória".
Desde 2016, o Supremo entende que a prisão após condenação em segunda instância é possível, mas as ações no tribunal visam mudar o entendimento.
O Supremo já julgou o tema "prisão após segunda instância" em pelo menos três ocasiões:
- 17 de fevereiro de 2016: O plenário definiu em um caso específico que a pena poderia ser executada após a condenação na segunda instância e que o réu poderia recorrer, mas preso. A decisão inverteu o entendimento que vinha aplicando pelo STF desde 2009, segundo o qual era possível aguardar o julgamento de todos os recursos antes da prisão.
- 5 de outubro de 2016: O STF julgou medidas cautelares apresentadas pelo PEN e pela OAB e decidiu confirmar a possibilidade de prisão após segunda instância.
- 11 de novembro de 2016: O Supremo voltou a julgar o tema, no plenário virtual, e manteve a possibilidade de prisão após condenação em segunda instância.

A decisão

Na decisão de 18 páginas, o ministro Marco Aurélio Mello disse que liberou a ação para julgamento em abril de 2018, mas o tema só foi marcado para julgamento em abril de 2019.
Ele viu "quadro a exigir pronta atuação" por conta do não cumprimento do artigo 283 do Código de Processo Penal.
O ministro citou que o plenário do Supremo já negou liminares em outras ações.
Afirmou que, como ministro, deve cumprir a Constituição e que o Supremo é a última trincheira da cidadania. Disse que não pode se curvar a decisões que não são vinculantes.
"Ao tomar posse neste Tribunal, há 28 anos, jurei cumprir a Constituição Federal, observar as leis do País, e não a me curvar a pronunciamento que, diga-se, não tem efeito vinculante. De qualquer forma, está-se no Supremo, última trincheira da Cidadania, se é que continua sendo", disse o ministro.
Marco Aurélio afirmou que o plenário já tomou decisões diferentes sobre o tema e que não existe nenhum entendimento vinculantes.
"Fixadas tais balizas, tem-se a necessidade de nova análise do tema em processo objetivo, com efeitos vinculantes e eficácia geral, preenchendo o vazio jurisdicional produzido pela demora em levar-se a julgamento definitivo as ações declaratórias de constitucionalidade, há muito devidamente aparelhadas e liberadas para inclusão na pauta dirigida do Pleno", disse o ministro.
O ministro disse que, quando ainda cabe recurso em tribunal superior, não se pode antecipar a culpa.
"Não se pode antecipar a culpa para além dos limites expressos na Lei Maior, quando o próprio processo criminal é afastado do controle do Supremo", afirmou Marco Aurélio.
Ele disse ainda que o direito de aguardar julgamento de recursos deve valer para todos os presos e não somente aos condenados por corrupção.
"Sob a óptica do perigo da demora, há de ter-se presente a prisão ou efetivo recolhimento, antes da preclusão maior da sentença condenatória, não apenas dos condenados em segunda instância por corrupção – pelo denominado crime do colarinho branco –, mas de milhares de cidadãos acusados de haver cometido outros delitos. Se essa temática não for urgente, desconheço outra que o seja", completou.

PGR aponta suspeita de propina de R$ 30 milhões a Kassab e repasses de R$ 28 milhões ao PSD

Em documento enviado ao STF, Raquel Dodge diz que delatores narraram repasses que teriam como objetivo obter influência do ministro em demandas da JBS; Kassab nega irregularidades.

Por Lucas Salomão, G1 — Brasília
O ministro da Ciência e Tecnologia, Gilberto Kassab  — Foto: Marcelo Brandt/G1
Em documento enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF), a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, disse que há suspeitas de que executivos do frigorífico JBS repassaram R$ 58 milhões ao ministro da Ciência e Tecnologia, Gilberto Kassab, e ao PSD, partido fundado por ele.
As suspeitas embasaram os mandados de busca e apreensão cumpridos pela Polícia Federal nesta quarta-feira (19), autorizados pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal – secretário de Transportes durante a gestão de Kassab na Prefeitura de São Paulo
Ao G1, Kassab disse que "não há nada que macule" sua imagem. "Ao longo de todos esses anos de vida pública não há nada que me comprometa no campo da imoralidade. Estou tranquilo porque sempre respeitei os princípios da ética. Estou à disposição do Ministério Público e do Poder Judiciário", disse por telefone.
Kassab foi nomeado secretário da Casa Civil do governador eleito de São Paulo, João Doria (PSDB). Considerado um homem forte do governo devido às suas habilidades de negociação, ele será o articulador político do Palácio dos Bandeirantes com os deputados na Assembleia Legislativa.
De acordo com a colunista do G1 Julia Dualibi, na operação desta quarta a PF apreendeu R$ 300 mil em dinheiro no apartamento de Kassab.

Repasses a Kassab

O ministro passou à condição de investigado após os executivos da JBS Wesley Batista e Ricardo Saud narrarem, em delação premiada, narrarem pagamentos a ele em troca de apoio político enquanto ele era prefeito de São Paulo e, depois, como ministro de Estado, além de apoio ao PT na disputa presidencial de 2014.
Segundo o documento enviado pela PGR ao Supremo, Kassab teria recebido uma mesada de R$ 350 mil entre 2010 e 2016.
Ao todo, o valor recebido pelo ministro teria chegado a R$ 30 milhões, afirma a PGR.
De acordo com os delatores, os repasses mensais tinham como objetivo "eventual influência política futura em demandas de interesse da JBS".
Para viabilizar os repasses, os delatores narraram que foram firmados contratos fictícios de prestação de serviço entre a JBS e uma empresa da qual Kassab foi sócio até 2014. Os pagamentos, segundo a delação, foram feitos, inclusive, no período em que o ministro já estava na chefia da pasta da Ciência e Tecnologia.
"Parte dos pagamentos relatados coincidem com o exercício atual do cargo de ministro de Estado da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, por parte de Gilberto Kassab, cuja nomeação ao referido cargo ocorreu em 12/05/2016", diz a PGR no inquérito.
Por outro lado, Raquel Dodge também destaca que os delatores narraram em depoimentos que Kassab teria vendido apoio político do PSD à campanha da ex-presidente Dilma Rousseff à reeleição em 2014.
Segundo o documento, a tratativa teria rendido R$ 28 milhões ao PSD.
Os delatores afirmaram que o valor foi repassado ao diretório nacional do partido, e tinha como destino as campanhas políticas do governador do Rio Grande do Norte, Robinson Faria, e de seu filho, o deputado federal Fábio Faria.
"Em razão do referido negócio, a JBS, com autorização do PT, teria realizado pagamentos na ordem de R$ 28.000.000,00 ao Diretório Nacional do PSD para as campanhas políticas do deputado federal Fábio Faria e do seu pai, o governador do estado do Rio Grande do Norte, Robinson Faria, bem como diretamente para Gilberto Kassab", narra a PGR no documento.
Nesta quarta, além dos mandados de busca e apreensão no apartamento de Kassab e em endereços ligados às empresas investigadas, a Polícia Federal também cumpre mandados em Natal (RN).
A PGR afirma que o repasse ao diretório do PSD foi operacionalizado por meio de doações oficiais de campanha, além da quitação de notas fiscais falsas de prestação de serviços e da entrega de dinheiro em espécie aos envolvidos no esquema.
O G1 buscava contato com Robinson Faria, Fábio Faria e PT até a última atualização desta reportagem.