O
PSDB sempre foi uma agremiação de amigos 100% feita de inimigos. Mas o
ninho já não é o mesmo. Virou um serpentário. Antes, eram tucanos
trocando bicadas. Agora, são víboras que se envenenam entre si. Por mais
que divergissem, os tucanos acabavam deslocando sua massa na correnteza
e esperneando da mesma maneira. Na atual fase viperina, porém, a
viscosidade da secreção venenosa indica que a coisa pode acabar num
sinistro afogamento coletivo.
Parceiros de escândalo, Aécio Neves e
Michel Temer viraram a sombra um do outro. Só na semana passada,
encontraram-se três vezes. Em nota divulgada neste domingo, o diretório
do PSDB paulistano escreveu que Aécio, afastado da presidência do
partido, provoca “desconforto e embaraços”, pois apenas Tasso Jereissati
está autorizado a falar pela legenda como seu presidente interino.
Signatário
da nota, o vereador Mario Covas Neto, que preside o PSDB na cidade de
São Paulo, caprichou na peçonha: ''Prove sua inocência, senador, e aí
sim retorne ao partido'', escreveu, jogando no ventilador o autogrampo
de Joesley Batista, no qual a voz de Aécio soa pedindo R$ 2 milhões
—repassados posteriormente pela JBS em malas e mochilas.
As
víboras paulistanas suspeitam que Aécio tricota com Temer para armar uma
emboscada contra Tasso. Temer plugou-se no Twitter para desmentir.
Disse ter conversado com Aécio sobre usinas hidrelétricas da Cemig, que a
União cogita levar ao martelo. “Senadores tratam dos assuntos de
interesse de seu Estado. Nada mais normal”, escreveu Temer. “Teorias da
conspiração são assunto de quem não tem o que fazer.''
Em outra
nota, Aécio ecoou a versão de Temer sobre a Cemig. Expressou-se como se
ainda estivesse no volante, não no banco do carona de uma legenda
pilotada por Tasso: ''O PSDB tem responsabilidade para com a
estabilidade política e a recuperação econômica do país, o que torna
natural que lideranças do partido tenham conversas com o presidente e
membros do governo. Estranho seria se isso não ocorresse.''
Quando
tudo já parecia bem confuso, o presidente PSDB no Estado de São Paulo,
Pedro Tobias, atravessou no noticiário uma nota em que diverge
parcialmente de Covas Neto, o mandachuva do tucanato na capital
paulista. Embora também não enxergue em Aécio autoridade para falar pelo
PSDB, Tobias sustenta que “como senador eleito por Minas Gerais”, ele
“tem o dever de exercer na plenitude o seu mandato.”
Com tanta
nota voando, o deputado Domingos Sávio, que preside o PSDB de Minas
Gerais, também deu asas a um texto. Nele, chamou de “lamentável
oportunismo” o ataque de Covas Neto. Em vez de defender Aécio, usou o
veneno do agressor como antídoto. Sávio tachou o neto de Mario Covas de
figura “pouco expressiva”. Realçou que ele já foi alvejado por
“acusações extremamente graves.” Pendurou um ponto de interrogação no
pescoço do seu alvo sem esmiuçar as “acusações.”
A gincana de notas torna mais densa a crise inaugurada na semana passada, com a veiculação da
propaganda
partidária na qual o PSDB fez uma “autocrítica” mal recebida pela banda
governista do serpentário. Em 2014, quando Aécio Neves bateu na trave
na vitória apertada de Dilma Rousseff, o tucanato julgava-se fadado a
retornar à Presidênica da República. Os tucanos não imaginavam naquela
época que seriam governo antes de 2018, com Temer no comando e a Lava
Jato nos calcanhares de vidro de Aécio, Geraldo Alckmin e José Serra.
Em
apuros, o serpentário revela-se capaz de quase tudo, menos de articular
meia dúzia de propostas para retirar o país do buraco em que se
encontra. Dividido em duas grandes alas —uma ávida por redescobrir o
gosto pelo fisiologismo e outra receosa de perder a castidade
presumida—, o PSDB parece condenado à separação. Um grupo deve ficar com
o PMDB de Temer e com a má fama do Aécio. O outro, com a certidão de
nascimento social-democrata e com o FHC. Que as víboras governistas só
poderão visitar uma vez por mês. DO J.DESOUZA