Josias de Souza
A
realidade brasileira está cada vez mais inacreditável. Há duas semanas,
fui às férias convencido de que nada de relevante aconteceria na
política durante a Copa do Mundo. No Brasil, porém, nada tornou-se uma
palavra que ultrapassa tudo. A ausência foi de apenas 15 dias. Mas volto
ao trabalho com uma nova visão sobre o Brasil, o mais antigo país do
futuro em todo o mundo.
Imaginei que conseguiria descansar do noticiário. Planejara passar os olhos e os ouvidos a limpo. Nada de internet, TV ou jornal. Não deu. O repouso foi contaminado por uma espantosa sequência de fatos extraordinários protagonizados por pessoas ordinárias —em todos os sentidos. O país não merecia destino tão medíocre. Mas instalou-se uma espécie de monarquia tropical. Reina a esculhambação.
Numa manhã de domingo, retido na cama do hotel pela preguiça e pelo frio, fui despertado por uma novidade que chegou via celular. Minha mulher leu em voz alta a mensagem enviada por uma amiga: TRF-4 manda soltar Lula. Minha reação foi instantânea: Esqueça, é notícia falsa. E ela: Será? A contragosto, fui à manchete do UOL. E descobri que, no Brasil, o pesadelo é, hoje, melhor do que o despetar.
O inusitado não era obra do TRF-4, mas de um desembargador do tribunal. Não um desembargador qualquer. Tratava-se de um desembargador de porta de cadeia. Do tipo que aproveita a condição de plantonista para produzir um habeas corpus partidário, revendo decisão tomada em colegiado por seus colegas. Coisa mantida pelo STJ e STF, as Cortes supostamente superiores de Brasília.
É como se a história do Brasil contemporâneo tivesse pretensões literárias. Ela parece buscar paralelos na dramaturgia grega. Exagera nos detalhes. Transforma o plantão de um magistrado companheiro em oportunidade a ser aproveitada por petistas aloprados. Esforça-se para demonstrar que o exato é o exagero, que a verdade é a esperteza.
Passado o espanto e a correção do despautério, sobrou a evidência de que os libertadores do Supremo fizeram escola. O Judiciário pulou dentro do mesmo micro-ondas que carbonizou a legitimidade do Legislativo e a autoridade do Executivo. Consolidou-se durante a Copa a sensação de que todos os países são difíceis de consertar. Só o Brasil é impossível.
As histórias de horror que ouvimos nos últimos anos —de partidos antropofágicos em guerra permanente, de cofres estuprados, de desemprego selvagem, de impunidade sádica, de bombas orçamentárias —são meras camadas de um abismo que continua sendo cavado com persistência e método. Volto do descanso cansado. O jornalista às vezes tira férias. A realidade nunca. Nem em tempo de Copa.
Imaginei que conseguiria descansar do noticiário. Planejara passar os olhos e os ouvidos a limpo. Nada de internet, TV ou jornal. Não deu. O repouso foi contaminado por uma espantosa sequência de fatos extraordinários protagonizados por pessoas ordinárias —em todos os sentidos. O país não merecia destino tão medíocre. Mas instalou-se uma espécie de monarquia tropical. Reina a esculhambação.
Numa manhã de domingo, retido na cama do hotel pela preguiça e pelo frio, fui despertado por uma novidade que chegou via celular. Minha mulher leu em voz alta a mensagem enviada por uma amiga: TRF-4 manda soltar Lula. Minha reação foi instantânea: Esqueça, é notícia falsa. E ela: Será? A contragosto, fui à manchete do UOL. E descobri que, no Brasil, o pesadelo é, hoje, melhor do que o despetar.
O inusitado não era obra do TRF-4, mas de um desembargador do tribunal. Não um desembargador qualquer. Tratava-se de um desembargador de porta de cadeia. Do tipo que aproveita a condição de plantonista para produzir um habeas corpus partidário, revendo decisão tomada em colegiado por seus colegas. Coisa mantida pelo STJ e STF, as Cortes supostamente superiores de Brasília.
É como se a história do Brasil contemporâneo tivesse pretensões literárias. Ela parece buscar paralelos na dramaturgia grega. Exagera nos detalhes. Transforma o plantão de um magistrado companheiro em oportunidade a ser aproveitada por petistas aloprados. Esforça-se para demonstrar que o exato é o exagero, que a verdade é a esperteza.
Passado o espanto e a correção do despautério, sobrou a evidência de que os libertadores do Supremo fizeram escola. O Judiciário pulou dentro do mesmo micro-ondas que carbonizou a legitimidade do Legislativo e a autoridade do Executivo. Consolidou-se durante a Copa a sensação de que todos os países são difíceis de consertar. Só o Brasil é impossível.
As histórias de horror que ouvimos nos últimos anos —de partidos antropofágicos em guerra permanente, de cofres estuprados, de desemprego selvagem, de impunidade sádica, de bombas orçamentárias —são meras camadas de um abismo que continua sendo cavado com persistência e método. Volto do descanso cansado. O jornalista às vezes tira férias. A realidade nunca. Nem em tempo de Copa.
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