sexta-feira, 23 de março de 2018

STF, uma visão do inferno.

sexta-feira, 23 de março de 2018

"Esse STF fala por si e haverá de passar! Os corruptos não nos convencem nem nos vencem. Trouxeram-nos às portas do Inferno. Exibiram-nos o portal de Dante. Que entrem sozinhos. Perseveraremos". Post de Percival Puggina:
Não, três vezes não! Eles não farão um Brasil à sua hedionda imagem e semelhança.
Nesta noite de 22 de março, enquanto escrevo, sinto o coração apertado. Sei que, neste momento, os ratos se regozijam nos porões do submundo e os grandes abutres festejam nas iluminadas coberturas do poder. Aos olhos escandalizados da nação, o STF testemunhou contra si mesmo. Falou aos trancos com o “humanitário” Gilmar Mendes. Soprou vaidade e ironia matreira com Marco Aurélio Mello. Tartamudeou e olhou assustado com Rosa Weber. Perdeu resquícios de pudor militante e se fantasiou de amor ao próximo com Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli. Deu razão a Saulo Ramos com os floreios monocórdios de Celso de Mello.
Enquanto confessavam suas culpas e exaltavam a impunidade, viralizava o crime, a corrupção e o pandemônio moral. Suas palavras nos aprisionavam ainda mais, corroendo esperanças que juízes de verdade haviam plantado em nossas almas. Acabamos o dia numa cidadania vã, sugados feito bagaço, desprovidos de qualquer poder e capturados pelo mecanismo que nos tomou como servos submissos, pagadores das contas que não cessam de nos impor. Ironicamente, queriam convencer-nos de que era tudo para o nosso bem! Ora, isso é tão ridículo que não prosperará!
Reconheço. Assim como, em Cuba, tive medo do Estado, esta tarde tive medo aqui. Medo de também nos tomarem a esperança. Senti a dormência de sua perda e me lembrei das palavras lidas por Dante no sinistro portal do Inferno: “Por mim se vai a cidade dolente; por mim se vai a eterna dor; por mim se vai a perdida gente...”. E, ao fim do verso, a sentença terrível que, há sete séculos, ecoa com letras escuras nas horas sombrias: “Lasciate ogni speranza voi ch’entrate” (Deixai toda esperança, vós que entrais).
Não exagero, leitor amigo. Ali estava, mesmo, o portal do Averno, do Inframundo. Cinco dos sete pecados capitais eram encenados por uma tribo de togas. Os dardos da ira cruzavam o salão como tiroteio na favela. A soberba se refestelava na própria voz. Ah, o poder sem freios! A inveja se esbaforia entre duas malquerenças: a do brilho e a da altivez. A preguiça, sim ela, fez parar a sessão às 18 horas da tarde; ela mesma admitiu as férias pascais. A avareza fremia de cupidez, olhos postos nos bilhões em honorários que se derramarão para a imediata soltura de milhares de criminosos endinheirados, já cumprindo pena de prisão por condenação em segunda instância. São sentenciados cujas condenações extinguiram completamente a presunção de inocência, mas em relação às quais não se completou – e talvez não se complete jamais – o rito do trânsito em julgado. Ao menos enquanto houver talão de cheques com fundos suficientes para puxar os cordéis da impunidade.
Todavia, não! Este é o país de Bonifácio, de Pedro II, de Nabuco, de Caxias! Esse STF fala por si e haverá de passar! Os corruptos não nos convencem nem nos vencem. Trouxeram-nos às portas do Inferno. Exibiram-nos o portal de Dante. Que entrem sozinhos. Perseveraremos.

A caravana das vaias


Crédito: Itamar Aguiar
PIXULECO NA GAIOLA Ruralistas de Bagé se uniram para protestar contra a presença de Lula (Crédito: Itamar Aguiar)
O ex-presidente Lula constatou in loco que o seu capital político se esvaiu pelo ralo. Apesar de ter demonstrado êxito nas armações de bastidor no STF, ao realizar na semana passada uma fantasiosa caravana de pré-campanha à Presidência por dez cidades do Rio Grande do Sul, o petista se deparou com mais opositores do que com correligionários e praticamente foi escorraçado das cidades por onde passou, como Bagé, onde deu início ao fracassado projeto. Por todas as cidades do périplo pelo Sul, Lula foi recebido com vaias e até pedradas contra os três ônibus que compunham sua comitiva.
“Não vamos pagar pelo que essa gente fez ao Brasil” Divaldo Lara (PTB), prefeito de Bagé
Os protestos inflamados contra Lula começaram já na chegada ao campus da Universidade Federal do Pampa (Unipampa), na segunda-feira 19, o primeiro ato da caravana. A comitiva petista se deparou com outdoors espalhados pela cidade proclamando “Bagé não, Lula Ladrão” e um pixuleco – boneco com a imagem de Lula vestido de presidiário – em uma gaiola no alto de uma grua, instalada nas imediações da universidade onde o ex-presidente falaria. Cerca de dois mil opositores aguardavam a comitiva dos ônibus petistas. Eles foram vaiados e rechaçados. Alguns militantes do MST se dirigiram ao local para apoiar o petista, mas foram alvejados com pedras pelos militantes contrários ao ex-presidente, sobretudo por ruralistas da região. O buzinaço que promoveram abafou o discurso de Lula na porta da universidade. Acostumado a pronunciamentos longos e espalhafatosos, Lula dessa vez falou por meros oito minutos. Coube à ex-presidente Dilma tentar rebater os ruralistas: “Nós fomos o governo mais deu recursos aos produtores rurais”, disse ela, sem mencionar obviamente os crimes cometidos por seu mentor político. Em meio ao tumulto, a visita à universidade foi abreviada. Entre os mais exaltados estava o prefeito de Bagé, Divaldo Lara (PTB), que fez discurso inflamado: “Não vamos pagar pelo que essa gente fez ao Brasil”. Sem conseguir circular por Bagé livre de apupos, Lula reclamou. “Saio triste daqui”.
CONFRONTO Em Bagé, a polícia teve de separar apoiadores de Lula de manifestantes contrários (Crédito:Divulgação)
A história se repetiu em Santana do Livramento. Nem a companhia do ex-presidente do Uruguai José Pepe Mujica ajudou na segunda parada da viagem. Na verdade, nem Mujica aliviou. Recomendou que a esquerda “cuidasse enormemente” do modo de agir de seus líderes e que os partidos não devem se organizar em torno de uma “figura única”. Os protestos prosseguiram na terça 20, em Santa Maria, onde houve uma tentativa de bloqueio na entrada da cidade, o que obrigou a comitiva a ser escoltada pela polícia.
No caixão de Getúlio
Em São Borja, onde estão enterrados os presidentes Getúlio Vargas e João Goulart, a caravana lulista teve que fazer um desvio por uma estrada de terra que cruza dois assentamentos do MST para evitar um bloqueio na rodovia feito por ruralistas. No local, Lula fez um discurso de 20 minutos na praça ao lado do Mausoléu de Getúlio, de novo debaixo de vaias de manifestantes. Em função das hostilidades, petistas chegaram a sugerir que Lula interrompesse sua charanga desafinada, mas ele decidiu prosseguir até o fim. Como se nota, o petista, acometido por uma cegueira moral, se recusa a enxergar o próprio infortúnio político. DO J.TOMAZ

STF protege Lula contra jurisprudência do STF

O Supremo Trribunal Federal esteve mais surrealista do que o habitual nesta quinta-feira. Reunido para julgar um habeas corpus de Lula, decidiu adiar a decisão para 4 de abril. Mas havia o risco de Lula ser preso a partir de segunda-feira. Então, por 6 votos a 5, o Supremo proibiu o TRF-4 de aplicar contra Lula a resolução do próprio Supremo que autoriza o encarceramento de condenados na segunda instância. Atingiu-se a suprema esculhambação: o Supremo ofereceu a Lula, pelo período de pelo menos 13 dias, um escudo contra sua própria jurisprudência. Coisa costurada no cafezinho, durante um intervalo da sessão.
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STF julga recurso de Lula para não ser preso após 2ª instância21 fotos

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22.mar.2018 - Vista geral do plenário da Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília, durante sessão para o julgamento do habeas corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que tenta evitar a prisão após o julgamento final dos recursos pelo TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) VEJA MAIS > Imagem: Dida Sampaio/Estadão Conteúdo
A concessão do salva-conduto que livra Lula de uma ordem de prisão de Sergio Moro, liberando-o para passar a Páscoa com os netos, foi precedida de um exaustivo debate hamletino: tomar conhecimento ou desconhecer o habeas corpus?, eis a questão. Por um placar de 7 a 4, a maioria decidiu que o pedido de Lula deveria, sim, ser julgado. Mas a discussão se arrastou por mais de quatro horas. E já era noite. Marco Aurélio precisava tomar um avião. Ricardo Lewandowski tinha compromisso. Exausto, o Supremo optou por não resolver nada —exceto servir refresco a Lula.
Relator do habeas corpus, Edson Fachin já havia negado aos advogados de Lula duas liminares. Antes, o habeas corpus fora indeferido um par de vezes pelo Superior Tribunal de Justiça —primeiro em decisão individual, depois por um colegiado de cinco ministros —decisão unânime. Fachin recordou aos colegas que, em 2016, o plenário do Supremo autorizou a prisão em segunda instância em um, dois, três julgamentos. Embora um pedaço da Corte sonhe com a reversão da jurisprudência, ela continua vigorando.
“Ressalto que, até o momento, não há neste plenário colegiado orientação majoritária que tenha alterado esses três julgamentos”, disse Fachin. “E não havendo modificação daquela orientação expressa na apreciação das medidas cautelares e também a repercussão geral, das quais resultei vencedor, em homenagem à colegialidade, deferir a liminar neste momento seria subverter esses três julgamentos do colegiado”.
Alexandre de Moraes ecoou Fachin: “Entendo que conceder essa medida liminar pleiteada agora, em verdade, é conceder uma liminar contra a própria jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.”
Luís Roberto Barroso foi na mesma toada: “Eu não considero irrelevante que é ex-presidente da República. Republicanamente, deve ser tratado como qualquer brasileiro. E não tenho conforto de abrir exceção nesse caso de uma jurisprudência em vigor. Eu sinceramente não vejo razão da concessão de medida liminar.”
E Luis Fux: “Tendo em vista que a nossa jurisprudência ainda autoriza a execução [da prisão em segunda instância], eu não fico confortável em ter uma posição de mérito já manifestada e conceder essa medida.”.
Cármen Lúcia, a presidente da Corte, seguiria a posição dos quatro colegas. Mas Rosa Weber, Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello e Celso de Mello optaram por colocar os interesses de um condenado em duas instâncias acima da jurisprudência da Suprema Corte. Alegaram que há precedentes que autorizam a extravagância. Mas não se dignaram a mencionar um mísero caso.
“Tem precedente, só que não me lembro agora o número do processo”, disse Rosa Weber. Ela realçou que não se pode prejudicar o autor do pedido de habeas corpus por conta da incapacidade do Supremo de deliberar. Como se Lula estivesse prestes a se tornar vítima de grave injustiça. “Já concedemos liminar, infelizmente não lembro o número do processo”, insistiu Rosa. Gilmar Mendes e Celso de Mello também mencionaram os tais precedentes, sem especificá-los.
Embora se declarasse “absolutamente confortável” em fornecer a Lula proteção contra uma jurisprudência que ajudou a criar no Supremo, Gilmar invovou em sua defesa um argumento inusitado: “Estou absolutamente confortável, porque é difícil me imputar simpatia pelo PT.” Resta saber se o magistrado cogita declarar-se suspeito quando lhe chegarem às mãos processos do interesse de amigos como Michel Temer, Aécio Neves ou José Serra.
Chega um momento na vida em que as pessoas precisam tomar uma decisão definitiva. Não se trata de uma escolha qualquer. Não é como escolher uma gravata ou um vestido entre muitos. É bem mais do que isso. É como escolher uma personalidade entre muitas. Os ministros do Supremo vivem um desses momentos.
Se mantiverem a regra da prisão em segunda instância, permitindo que a lei alcance os poderosos da República, estarão fazendo a coisa sensata. Impedirão que a Lava Jato seja afundada por uma sequência de casuísmos. Se restabelecerem a sistemática que permite a corruptos endinheirados recorrerem em liberdade até a prescrição dos crimes, a única coisa que os ministros do Supremo têm a fazer é mandar abrir as portas das cadeias, soltando os mais de 220 mil brasileiros que mofam atrás das grades sem nenhum julgamento.
Nos últimos tempos, sempre que é convocado a optar entre o interesse público e a conveniência política, o Supremo decepciona. Dobrou-se para Renan Calheiros. Ajoelhou-se diante de Aécio Neves… Os magistrados tinham uma nova chance para demonstrar sua supremacia. Impor a lei a Lula seria um ótimo começo.
Entretanto, um ministro precisou viajar. Outro tinha compromisso inadiável. Trabalhar na sexta-feira estava fora de cogitação. Suspender o feriadão hipertrofiado da Páscoa, nem pensar. Melhor congelar o habeas corpus de Lula e livrar o condenado de Sergio Moro até que a regra da prisão em segundo grau seja revogada. A maioria do Supremo já decidiu o que deseja ser. E não é boa coisa.
Josias de Souza