domingo, 29 de julho de 2012

Mensalão marca rompimento de modelo de corrupção conhecido do Brasil

Analistas apontam que o esquema teve peso fundamental para a política brasileira
Wilson Tosta, O Estado de S.Paulo
Um escândalo político generalizado, obra coletiva de dirigentes de um partido que se declarava arauto da moralidade, e gerador de uma forte reação das instituições, como a Procuradoria-Geral da República e o Supremo Tribunal Federal (STF), que o Poder Executivo não pode brecar.
Para pesquisadores entrevistados pelo Estado, o mensalão significou um rompimento com o tipo de corrupção que tradicionalmente marcou a política brasileira. A ação individual dos corruptos, para fins pessoais, foi sobrepujada pelo uso político-partidário do dinheiro sujo, avaliam.
"Acho que não tem nada parecido na história do Brasil", diz a cientista política e historiadora Maria Celina d’Araújo, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ). "Há (tradicionalmente) casos individuais de corrupção. Agora, com um partido que está no governo foi um fato único. Não estou dizendo que outros partidos não tenham seus esquemas. Mas o caso do mensalão tem como característica que as denúncias envolvem um partido. Foi feito de forma sistemática."
Leia a íntegra em Mensalão marca rompimento de modelo de corrupção conhecido do Brasil
DO B. DO NOBLAT

A invenção do caixa dois

Mensalão do PT
O mês de agosto será marcado por uma guerra de versões entre os 38 réus durante o julgamento do mensalão
Folha de São Paulo
Essas divergências se acentuaram ao longo dos anos, mas, quando o escândalo eclodiu, em 2005, muitos dos envolvidos formularam uma tese unificada sobre o dinheiro do esquema.
Tudo virou "caixa dois".
É o jargão usado para o uso de dinheiro não declarado pelas campanhas.

A história é longa. Remonta ao início de 2003, primeiro ano de Lula na Presidência.
Na época, o empresário Marcos Valério Fernandes de Souza frequentava as sedes do PT. Loquaz, dizia aos dirigentes da sigla: "O PT me deve uns R$ 120 milhões".
Em meados de 2004 o então ministro da Casa Civil, José Dirceu, foi procurado por Silvio Pereira, secretário-geral do PT, que relatou o que ouvira.
Dirceu retrucou: "Mas não eram só R$ 40 milhões?". Dirceu nega a existência do diálogo. Já Silvinho, como é conhecido, relatou a conversa a mais de uma pessoa.
Vistos em retrospecto, os indícios do início do governo Lula iam todos na direção de um esquema em formação.

O escândalo do mensalão se materializou em 6 de junho de 2005.
Nessa data a Folha publicou uma entrevista com o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) afirmando que congressistas aliados recebiam o que ele chamava de "mensalão" de R$ 30 mil do PT.
Os petistas ficaram aturdidos. Não sabiam como reagir. Aí ocorreu algo inusitado. O discurso de defesa foi arquitetado pela mesma pessoa que forneceu recursos para o esquema: Marcos Valério.

Tudo seria apenas caixa dois.
Dívidas de campanha que precisavam ser pagas. Algo que todos os políticos acabam praticando. Um achado. O mensalão passou a ser a versão oficial da defesa.

Após a entrevista de Jefferson, a pressão aumentava a cada dia sobre o Planalto. Valério estava prestes a dar depoimento à Procuradoria. O empresário mineiro deixou vazar numa sexta-feira (dia 8 de julho) que teria marcado sua ida à Procuradoria para a semana seguinte.
Vários políticos entraram em contato com ele. Delúbio Soares foi um deles. O tesoureiro do PT e das campanhas de Lula falou com Valério no sábado. Conversa tensa, com ameaças diversas.

Valério se dizia abandonado. Queria proteção. Falou em negócios de seu interesse que o governo não poderia deixar de tocar, como a liquidação do Banco Econômico.
Delúbio comprometeu-se a tratar desses pleitos com a cúpula do PT e do governo. Mas a comunicação era difícil naqueles dias.

Na segunda-feira, 11 de julho, Delúbio foi a Belo Horizonte conversar com Valério. Poucos na direção do PT foram avisados. Era uma operação de alto risco, mas imprescindível para montar uma versão aceitável.
Enquanto Delúbio se mexia, o governo enviava bombeiros para conversas reservadas.
Foi importantes nesse processo o governador do Acre, Jorge Viana, que conhecia o meio publicitário de Minas (a agência que fazia a propaganda de seu governo era a mineira ASA).
Sua missão era acalmar o setor e evitar que mais pessoas começassem a dar entrevistas.

Ao mesmo tempo, o prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel (hoje ministro), procurou políticos locais para colocar água na fervura.
Em Brasília, Lula se aconselhava com um antigo tesoureiro do PT, Paulo Okamotto. O ministro Antonio Palocci (Fazenda) acalmou os credores dos bancos Rural e BMG, usados no valerioduto.
Preocupados com a eventual quebra das instituições, os credores ameaçavam acioná-las na Justiça.
Ouviram de Palocci que deveriam aguardar, pois o governo não deixaria a situação sair do controle.

Em 12 de julho, dia seguinte à visita de Delúbio a Valério, fez-se uma reunião secreta em São Paulo em um escritório do advogado Arnaldo Malheiros Filho, responsável pelos casos de Delúbio e Silvio Pereira.
Além de Delúbio, Silvio e dos advogados, estava no local José Genoino, presidente do PT quando o escândalo surgira. A reunião começou por volta de 9h.

No meio do encontro Delúbio disse: "Vocês não se espantem não, mas o Marcos Valério está chegando".
Um jatinho com o publicitário e o advogado Marcelo Leonardo aterrissara por volta das 10h no Campo de Marte.
Por volta das 10h30, Valério e Marcelo Leonardo entraram e se isolaram por alguns minutos em uma das salas do escritório.

Quando entraram na sala maior, onde estavam os outros, o empresário pediu a palavra. "Temos três hipóteses. A primeira é derrubar a República. Vamos falar tudo de todos. PT, PSDB, PFL, todos. Não sobra ninguém.
A segunda hipótese é a tática PC Farias: ficar calado. Só que ele ficou calado e morreu.
A terceira hipótese é um acordo negociado, de caixa dois."

Todos ficam calados.
Segundo um presente, "era como se estivéssemos todos congelados".

Várias conversas paralelas começaram, até que cada um apresentou seu ponto de vista.
Genoino defendeu o governo Lula e a escolha da hipótese número 3.
Essa foi a saída consensual.

Antes de a decisão ser aceita por todos, Delúbio, Valério e Genoino se reuniram separadamente numa sala. Depois da conversa reservada, o encontro maior não se instalou mais. Não houve anúncio formal, mas ficou subentendido que a saída era vender a versão do caixa dois ao público.

Já passava das 13h. A fome dos presentes foi saciada com sanduíches da padaria Barcelona, na praça Vilaboim, reduto tucano em São Paulo.
O primeiro a sair foi Valério.
Ficaram no local os demais.
Decidiu-se que no dia seguinte eles iriam a Brasília consultar o governo e as cúpulas dos partidos aliados. Malheiros providenciou o aluguel de um jatinho. Embarcaram cedo na quarta. Genoino preferiu não ir.

Ao chegar à capital federal, Malheiros e Delúbio se dividiram. O advogado foi ao encontro do então ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, hoje advogado de um ex-diretor do Banco Rural, que é réu.
O petista se deslocou para a casa de um amigo.
Na conversa entre Thomaz Bastos e Malheiros, o governo teve pela primeira vez detalhes da versão do caixa dois.

Bastos ouviu e falou da necessidade de todos afinarem o discurso. Aprovou a estratégia, mas antes precisava submeter o acordo a Lula.
Nessa mesma quarta, Thomaz Bastos chamou Antonio Palocci e ambos foram até o presidente.
Lula concordou com a versão.
O ministro deu sinal verde a Malheiros.

O endereço em que Delúbio se instalou em Brasília foi transformado em central da versão do caixa dois. Foram chamados ao local todos os políticos que precisavam ter o discurso ajustado.
Em romaria, eles chegavam, tomavam conhecimento e concordavam com a estratégia.
Estiveram ali, pelo menos, Arlindo Chinaglia, José Janene, José Borba, Valdemar Costa Neto, Aloizio Mercadante, Ricardo Berzoini, Paulo Okamotto e Renato Rabelo.
Entre os que foram consultados estão Dirceu e um representante do PTB.

No dia seguinte, quinta-feira (14 de julho), já com tudo acertado, Delúbio passou por Belo Horizonte para finalizar os detalhes do depoimento de Valério à Procuradoria, que acabou sendo feito nessa mesma data.
Antes de prestar seu depoimento, o ex-tesoureiro tomou conhecimento do teor do que fora dito por Valério. O depoimento de Delúbio à Procuradoria ocorreu na sexta-feira, dia 15.

Na véspera desse depoimento, com o discurso afinado, os protagonistas da montagem da versão do caixa dois voltaram a São Paulo.
Havia um clima mais relaxado.
No dia 14, à noite, houve ainda duas reuniões para preparar o depoimento de Delúbio.
A primeira teve como protagonistas Genoino, Delúbio, Silvio Pereira, Ricardo Berzoini e José Dirceu.

O advogado Arnaldo Malheiros chegou na metade do encontro.

Nessa reunião o objetivo era checar de maneira pontual os detalhes que Delúbio abordaria.

Um exemplo de que o clima estava melhor foi o prazer a que se deu Delúbio, torcedor do São Paulo: ele assistiu ao final da partida em que seu time disputava a finalíssima da Libertadores -e foi campeão pela terceira vez. Após a partida, todos saíram para um segundo encontro, já na madrugada de sexta.
Coube a Malheiros ligar para o procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, para acertar o depoimento de Delúbio. Estava montada a versão do caixa dois.

Ato contínuo, em viagem a Paris, o presidente Lula deu entrevista na qual falou sobre a operação.
O "Fantástico", da TV Globo, transmitiu o vídeo em 17 de julho: "O que o PT fez do ponto de vista eleitoral é o que é feito no Brasil sistematicamente".
E mais: "Não é por causa do erro de um dirigente ou de outro que você pode dizer que o PT está envolvido em corrupção".
O escândalo começava a ficar domado. No discurso oficial, circunscrevia-se o mensalão a mero uso de dinheiro não contabilizado em campanha. Lula não virou réu.
Agora, sete anos depois, o STF julgará se é verossímil a versão do caixa dois, tão bem arquitetada naquele conturbado julho de 2005.


DO R.DEMOCRATICA

DELCIDIO AMARAL DESMENTE CARTA CAPITAL


O senador Delcídio do Amaral (PT-MS) desmente em nota matéria, deste fim de semana, da revista Carta Capital "O Valerioduto abasteceu Gilmar", em que é citado de forma leviana. A reportagem divulga suposta lista de beneficiários do publicitário Marcos Valério afirmando que "o petista Delcídio Amaral (MS), ex-presidente da CPI dos Correios, teria embolsado 50 mil reais."
Delcídio ressalta que na época citada na matéria, em 1998, não exercia qualquer atividade política, e afirma que, se a lista fosse verdadeira, teria sido alvo de investigação da CPI dos Correios, a qual o senador presidiu. Delcídio lembra ainda que a matéria já foi desmentida inclusive pelo próprio Marcos Valério.
"É estranho – ou talvez não - que a reportagem seja publicada justamente às vésperas do julgamento do “mensalão” pelo Supremo Tribunal Federal, o que, para mim, demonstra o inequívoco propósito diversionista de suas intenções, subestimando a inteligência do povo brasileiro", diz o senador.
Leia íntegra da nota de Delcício do Amaral:
Ao jornalista Mino Carta
Editor da Carta Capital
Senhor editor,
Em relação a matéria publicada na edição 708 da revista Carta Capital, onde meu nome é levianamente citado como suposto beneficiário de pagamentos efetuados há 14 anos, em Minas Gerais, esclareço, indignado, o seguinte:
1 – A reportagem se baseia em “documento” de um suposto esquema de caixa 2 que teria ocorrido na campanha eleitoral de 1998, época em que eu não desenvolvia nenhuma atividade político partidária, nem em Minas Gerais nem em qualquer outro lugar do país. Disputei o primeiro cargo público em 2002, quando, com muito orgulho, me tornei o primeiro senador eleito pelo Partido dos Trabalhadores em Mato Grosso do Sul.
2 – Se essa “suposta” lista fosse verdadeira, seguramente teria sido utilizada durante a CPMI dos Correios, até para desqualificar os seus integrantes. O próprio advogado do acusado a quem a revista atribui a elaboração do abominável documento nega, com veemência, que seu cliente seja o responsável pelo mesmo, atribuindo sua autoria a um conhecido psicopata e estelionatário recorrente em fraudes diversas em Minas Gerais, que já foi preso e continua respondendo criminalmente por esses mesmos motivos. (Links dos desmentidos publicados ontem: http://bit.ly/QoeFTE e http://bit.ly/O5LNN4 )
3 – Orgulha-me, e não poderia ser diferente, a imparcialidade, a isenção, o equilíbrio e a serenidade que Deus me concedeu para presidir a CPMI dos Correios, fato que incomodou e, ao que parece, ainda incomoda, muita gente em diferentes pontos do país.
4 – É estranho – ou talvez não - que a reportagem seja publicada justamente às vésperas do julgamento do “mensalão” pelo Supremo Tribunal Federal, o que, para mim, demonstra o inequívoco propósito diversionista de suas intenções, subestimando a inteligência do povo brasileiro.
5 – Aos patrocinadores desse malfadado “documento”, que lembram a famigerada “Lista de Furnas”, outra desastrada trama engendrada por quem tenta confundir a opinião pública em benefício próprio, deixo um conselho: se os fatos apurados pela CPMI dos Correios lhes açoitam, tomem banho de sal grosso!
6 – Estou tomando as providências jurídicas que o caso requer, não só em relação aos autores dos “documentos” e também à revista, mas, eventualmente, às suas indevidas repercussões.
Campo Grande (MS) , 28 de julho de 2012
Delcídio do Amaral Senador (PT/MS)

Convite para a vigilia do mensalão em Brasilia

Convite para os que acreditam ser possivel derrotar a impunidade. Concentração em frente ao STF em Brasilia, dia 2 de agosto a partir das 17 horas. Os organizadores sugerem o uso de camiseta branca e pretendem acender velas às 18 horas. O julgamento do mensalão é oportunidade histórica. Participe dessa convocação  à responsabilidade. O Supremo é a esperança agora dos que acreditam na vitória da  justiça contra a corrupção.
DO B. DO ALVARO DIAS

Todas as investigações sobre o escândalo – na Polícia Federal, em CPIs, na imprensa – produziram provas

  Tudo sobre o mensalão
Em cima delas, os juízes decidirão o destino dos réus
DIEGO ESCOSTEGUY (TEXTO)
E ORLANDO BRITO (FOTOS)
COM MARCELO ROCHA E MURILO RAMOS

ÉPOCA
A verdade é verdade
Sem apelação"
William Shakespeare,
Medida por medida
Sete anos, um mês e 22 dias depois, o passado está vivo. Ainda não é nem passado, como escreveu o romancista americano William Faulkner.
Parece que foi ontem, parece que nunca aconteceu: o dia em que o deputado Roberto Jefferson revelou que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva botara o Congresso no bolso. Era 6 de junho de 2005, nascia o mais grave escândalo de corrupção da história recente do Brasil.
Dias depois, Jefferson afirmou diante das câmeras de televisão:
“É voz corrente em cada canto desta Casa, em cada fundo de plenário, em cada banheiro, que o senhor Delúbio, tendo como pombo-correio o senhor Marcos Valério, um carequinha que é publicitário lá em Minas Gerais, repassa dinheiro a partidos que compõem a base de sustentação do governo, num negócio chamado mensalão”.
Jefferson acusou o deputado José Dirceu, então primeiro-ministro informal do governo, de comandar o esquema. Contou que advertira o presidente Lula sobre a mesada – e ele, no mínimo, nada fizera.
A política brasileira, ainda se recuperando do impeachment do primeiro presidente eleito desde a ditadura militar, deparava com a possibilidade de um segundo.

O impeachment não aconteceu.
Seguiram-se investigações sobre o caso em CPIs no Congresso, na Polícia Federal, na imprensa e na Procuradoria-Geral da República.
Todas – todas – produziram provas e constataram que Jefferson contara, na essência, a verdade: o PT, sob a liderança de Dirceu, montara um esquema de pagamento maciço de dinheiro em troca de apoio político no Congresso.
Altos representantes do Poder Legislativo se venderam a altos representantes do Poder Executivo.
Não há caso que se compare em gravidade e dimensão institucional.
É por isso que, a partir das 14 horas desta quinta-feira, os 11 ministros do Supremo Tribunal Federal, os mais altos representantes do Poder Judiciário, darão início ao julgamento mais importante na história da corte.
Um julgamento que mostrará a maturidade da democracia brasileira – e que, sejam os réus absolvidos ou condenados, porá fim ao passado.

COMENTÁRIO
Desde o fatídico dia em que a bandidagem petista se apoderou do governo, o Brasil vive afundado numa lama fétida, que não tem prazo para esgotar-se.
A verdade é a verdade, sem apelação.

Walquiria Faria
28/07/2012
DO R.DEMOCRATICA