domingo, 31 de março de 2019
Os simpáticos conspiradores estão por aí, quase todos soltos, com muito
dinheiro e influência para continuar derramando suas lágrimas de
crocodilo sobre 64 enquanto lutam pelo único valor cívico que lhes
interessa de fato: poder. Quer se ligar no golpe, Brasil? Então olha pra
frente. Coluna de Guilherme Fiuza, via Gazeta do Povo:
O Brasil passou boa parte da última corrida presidencial discutindo
um regime instaurado mais de meio século atrás. Sinal impressionante de
frescor intelectual e acuidade cívica: um país em dia com seus conflitos
artificiais e seu viveiro de fantasmas. Mesmo assim chegou ao
aniversário de 55 anos da ditadura de 64 se perguntando o que, afinal,
se passou na ocasião.
Como você está cansado de saber o que se passou – assim como todo
mundo – não vamos cair aqui também na armadilha desse disco arranhado.
Temos mais o que fazer. Tratar, por exemplo, dos golpes depois do golpe.
Foram vários. E talvez o pior deles seja um que está ainda em curso,
neste exato momento, perpetrado por uma legião de picaretas espalhados
pelo vasto território nacional. É um golpe tipo aquele do falso
telefonema do presídio, pedindo resgate por um sequestro de mentira. No
caso, o truque é pedir voto, prestígio e grana ao país para combater uma
assombração do século passado.
Esse aí engana muito mais gente que o golpe do presidiário (o do trote, não o do PT – que enganou o mundo inteiro).
Em 2019, o maior desrespeito às vítimas da ditadura militar, a maior
afronta aos valores democráticos atropelados pelos tanques, enfim, a
maior traição à verdadeira luta pela liberdade vem das falsas vítimas do
golpe de 64. São personagens que se dizem de esquerda e fazem o jogo
daqueles que assaltaram o país por 13 anos, fingindo combater a direita.
Se fazer de vítima da ditadura para ter poder e parasitar o Estado
também é atropelar a democracia – além de ser um vexame.
Não são poucos os que vivem desse golpe no Brasil. E não são só os
que tomaram o poder central e viraram pobres milionários perseguidos por
roubar honestamente. Nas artes, na imprensa, no mercado em geral vale
uma fortuna você fingir que está lutando contra a censura – como aquelas
almas penadas da MPB que tentaram surfar no verão denunciando a
proibição do carnaval. Meu reino por uma fantasia de oprimido.
Como disse o gigante Carlos Vereza, de cima do palco, ao final de seu espetáculo sobre Judas Iscariotes: “Que censura, porra?!”
O país vive a mais plena liberdade que já conheceu em 500 anos de
história, apesar das tentativas do PT de amordaçar a imprensa –
disfarçando seus planos de censura prévia até em pacotes de direitos
humanos. Lembra-se disso? Esqueceu? Não soube? Procure saber. E esses
profissionais da lamúria contra a censura imaginária não deram um pio –
ao contrário, tentaram instituir a censura prévia de biografias
não-autorizadas. Obscurantistas são os outros.
Depois do impeachment de Dilma Rousseff – testa de ferro do escândalo
sem precedentes desmascarado pela Lava Jato – esse Brasil que se finge
até hoje de vítima do golpe de 64 tentou virar a mesa. Uma cena
antológica: as viúvas do golpe tentando dar o golpe.
Mas o golpe deles era perfumado, bem penteado como a franja prateada
de Rodrigo Janot – o ex-procurador-geral encarregado do serviço sujo.
Foi praticamente uma ópera: essas sofridas e podres de ricas vítimas
vitalícias de uma assombração morta e enterrada conspirando com o
açougueiro biônico do PT (vitaminado com os bilhões revolucionários do
BNDES, isto é, seus), com a ajuda de um supremo juiz petista empoderado,
por sua vez, pelo açougueiro. Coisa fina, carne de primeira.
A armação para tomar o palácio na mão grande (sem perder a ternura,
claro) contou com a parceria valiosa da imprensa FreeBoy – setor da
grande mídia assim apelidado por seu esforço cívico para transformar o
criminoso Joesley Batista em herói do combate à corrupção, no papel de
empresário arrependido. Uma fofura. Com Janot ditando manchetes
alopradas a partir de uma delação vagabunda e ilegal (hoje suspensa),
tentaram todos juntos garantir um exílio de ouro ao bandido em Nova York
– usando suas mentiras para derrubar o governo. Contando ninguém
acredita.
O golpe de 2017 não deu certo por um único e singelo motivo: era
ridículo. Foi montado e operado por uma galeria de trapalhões, covardes e
fanfarrões, iludidos pela crença de que para cometer um crime basta ser
desonesto. Ao fundo, essas mesmas e patéticas vítimas vitalícias de 64
aproveitavam a série de TV “Os dias eram assim” para pedir diretas já em
passeatas melancólicas.
Esse golpe de estado fracassado não chegou à virada de mesa, mas
parou o país – que vinha se recuperando da ruína petista com a saída da
maior recessão da história em tempo recorde. Essa equipe econômica tinha
o melhor presidente de Banco Central do mundo (ranking “Financial
Times”) e foi sabotada pela tentativa de golpe. Coincidências: na
ocasião, a reforma da Previdência foi jogada no lixo e um dos nomes
citados para assumir a Presidência da República em caso de derrubada do
governo era o de Rodrigo Maia.
Os simpáticos conspiradores estão por aí, quase todos soltos, com
muito dinheiro e influência para continuar derramando suas lágrimas de
crocodilo sobre 64 enquanto lutam pelo único valor cívico que lhes
interessa de fato: poder. Quer se ligar no golpe, Brasil? Então olha pra
frente. DO O.TAMBOSI