Torna-se
cada vez mais séria aquela brincadeira do “é bom Jair se acostumando”. Antes
encarada como uma “aventura” que não se sustentaria, a candidatura presidencial
do deputado federal Jair Bolsonaro vai ganhando viabilidade e visibilidade. Ontem,
o mercado ficou excitado com a informação de que Bolsonaro teria o economista
Paulo Guedes como seu timoneiro da área econômica. A bolsa monopolista teria
subido em função disto.
Alguns
fatos são concretos e inegáveis. A maioria esmagadora dos brasileiros está de
saco cheio e exige mudanças (até radicais). O descontentamento é cada vez maior
com o regime do Estado-Ladrão. A guinada conservadora é a tendência. O discurso
esquerdista e sua variante social-democrata não convencem mais. Culpa da
petelândia e de seus parceiros no crime. Eles simplesmente “desmoralizaram a
honradez” (para usar uma velha expressão do humorista Millôr Fernandes).
O fenômeno
Bolsonaro é simples de entender. O mercado e o eleitorado estão carentes de alguém
que seja ou demonstre ser honrado. Até agora, é Bolsonaro quem mais bem
incorpora tal vontade. O discurso dele combina indignação com combate ao crime –
e ataque ao “esquerdismo canalha”, cujos representantes são alvos diretos do
indomável Ministério Público e de alguns magistrados que se consagram como
“Pontos-fora-da-curva” em um Judiciário que parecia sinônimo de impunidade.
O nome do
Bolsonaro fica mais forte a cada erro cometido pelos companheiros de Michel
Temer – e a cada palhaçada encenada pela canhota acuada. Quanto mais batem
nele, mais o Jair cresce, principalmente junto ao eleitorado jovem do
Sul-Sudeste, muito impactado pela crise que atinge, duramente, a classe média
baixa e os trabalhadores de baixa renda. Eles são os indignados com a roubalheira
– já identificada como a geradora do caos. A maioria culpa diretamente a classe
política. Porém, uma minoria já identifica que a culpa é do modelo estatal
brasileiro: um capimunismo rentista e corrupto.
Bolsonaro é
quem, até agora, melhor representa o discurso contra a insegurança
generalizada, no campo político, econômico, judicial e “policial”. A retórica
de “pau em bandido” – não importa se ele é da classe alta, média ou baixa – é
facilmente assimilável pelo eleitorado. A curiosa novidade é que o papo também
agrada aos “deuses” do mercado – justamente os maiores beneficiários dos
favores estatais e do rentismo quase nunca produtivo. Até onde vai esta ironia
brasileira? Talvez o fla-flu eleitoral de 2018 nos mostre claramente.
É uma
jogada de mestre a escalação de Paulo Guedes no time de Bolsonaro – ou o
contrário, o patrocínio do time de Paulo Guedes ao Jair até então sem
“consistência junto ao poder econômico”. O Bolsonaro sempre pintado como
defensor de um Estado forte, nacionalista e interventor agora será colocado na
vitrine de uma possibilidade de prática liberal na gestão da Presidência da
República. O mercado, que acredita no que deseja, agora aposta suas fichas no
Bolsonaro.
A
candidatura dele cresce de modo consistente por dois motivos que se
complementam. O primeiro é que a equipe de Bolsonaro vem fazendo, há muito
tempo, um trabalho muito consistente nas redes sociais, principalmente focando
nos jovens (os agentes que desejam e incorporam, mais facilmente, o desejo por
mudanças). O segundo motivo é que os adversários se mostram cada vez mais
incompetentes, despreparados e, sobretudo, desmoralizados para enfrentar um
candidato contra o qual não pesam denúncias de corrupção.
É inegável
que Bolsonaro reflete diretamente e surfa na onda da indignação e revolta. O
mero discurso messiânico de esquerda não tem capacidade de derrotar Bolsonaro.
O desmoralizado Lula é um presidiável – e não um presidenciável viável. O
impopular Michel Temer – colocado no poder pela articulação bandida do PMDB para
trair o parceiro PT – agora estaria tentando liderar uma articulação de
“centro-direita” para enfrentar Bolsonaro. Tudo indica que tal plano vai dar
com os corruptos n’água. A parceria de Bolsonaro com o mercado tende a ser mais
consistente e forte.
A questão
mais importante é: não baste o jogo de faz de conta eleitoreiro. O momento
brasileiro exige a formulação de um Projeto Estratégico de Nação – missão até
hoje não cumprida pelos agentes políticos e econômicos no Brasil Capimunista
que precisa ser passado a limpo urgentemente. A articulação de Bolsonaro com
Guedes ao menos indica que haverá um debate liberal no fla-flu de 2018.
Amplia-se o espaço, também, para uma discussão séria sobre a Intervenção
Institucional sem golpismos.
Falta muito
tempo para outubro de 2018. Muita água – e lama – vai passar embaixo da ponte
da temerária sucessão ao Palácio do Planalto. Ainda serão firmados, como de mau
hábito, muitos acordos espúrios para viabilizar uma candidatura presidencial.
Bolsonaro, se quiser vencer e não terminar derrubado mais adiante, precisa se
articular de modo consistente, e não meramente para efeitos de marketing. Até
porque não basta ganhar a eleição. É preciso criar e garantir as condições para
realizar as mudanças prometidas.
O jogo será
muito bruto. Os donos do poder não querem mudanças estruturais. Farão o diabo
para sabotar Bolsonaro ou qualquer grupo que lidere propostas de transformação
real.
“Carta do
Rio de Janeiro”
Os
procuradores da Força Tarefa da Lava Jato lançaram ontem, no Rio de Janeiro, um
documento de compromisso no combate à corrupção:
Os
procuradores da República das Forças Tarefas da Lava Jato de Curitiba, São
Paulo e Rio de Janeiro, reunidos na cidade do Rio de Janeiro, no dia 27 de
novembro de 2017, para coordenar esforços no combate à corrupção, por meio da
discussão de casos conexos, de técnicas e instrumentos de investigação e dos
fatores que estimulam a corrupção no país, vêm a público expressar que:
1. Desde 2014, a Lava Jato vem revelando que a corrupção no
Brasil está bastante disseminada no modo de funcionamento do sistema político
nas esferas federal, estadual e municipal. Cargos públicos de chefia são
loteados por políticos e partidos para a arrecadação de propinas. O dinheiro
enriquece criminosos e financia campanhas, o que deturpa a democracia, gera
ineficiência econômica, acirra a desigualdade e empobrece a prestação de
serviços públicos.
2. Dentre os resultados desse esforço coletivo de diversas
Instituições, 416 pessoas foram acusadas por crimes como corrupção, lavagem de
dinheiro e organização criminosa; 144 réus foram condenados a mais de 2.130
anos; 64 fases foram deflagradas, cumprindo-se 1.100 mandados de busca e
apreensão; pelo menos 92 ações penais tramitam na Justiça; 340 pedidos de
cooperação internacional foram enviados ou recebidos em conexão com mais de 40
países; e mais de 11 bilhões de reais estão sendo recuperados por meio de
acordos de colaboração com pessoas físicas e jurídicas.
3. Contudo, mesmo depois de tantos escândalos, tanto o
Congresso como os partidos não afastaram os políticos envolvidos nos crimes.
Pelo contrário, a perspectiva de responsabilização de políticos influentes uniu
grande parte da classe política contra as investigações e os investigadores, o
que se reflete na atuação de Comissões Parlamentares de Inquérito e em diversos
projetos de lei que ameaçam as investigações.
4. Exemplos disso são a forma de atuação da CPI da Petrobras
de 2015 (a qual absolveu criminosos e condenou investigadores) e da CPMI do
caso JBS em 2017 e a propositura de uma série de projetos de lei prejudiciais à
punição dos grandes corruptos, como os de anistia (perdoando a corrupção sob o
disfarce de perdão a caixa dois), de abuso de autoridade (criando punições a
condutas legítimas com único intuito de intimidar as autoridades), da reforma
do Código de Processo Penal (impedindo prisão preventiva em casos de
corrupção), da delação premiada (vedando-a, por exemplo, em casos de réus
presos) e da prisão apenas após percorridas todas as instâncias (propiciando
ambiente altamente favorável à prescrição e à impunidade).
5. As tentativas de garantir a impunidade de políticos
poderosos certamente se intensificarão, como aconteceu na libertação dos
líderes políticos fluminenses pela ALERJ no dia 17/11/2017.
6. Da mesma forma, é essencial que a sociedade acompanhe o
desenrolar das grandes questões jurídicas que hoje são travadas na mais alta
Corte do País, como o foro privilegiado, a colaboração premiada, a execução de
condenação confirmada em segundo grau e a prisão preventiva, manifestando democraticamente
o seu interesse de que não haja retrocessos. Para o desenvolvimento adequado
das investigações, é essencial que se fomente um ambiente favorável para a
celebração de acordos de colaboração premiada e que tenham sua homologação
apreciada rapidamente.
7. O Ministério Público Federal continuará a defender a
sociedade e a democracia brasileiras da corrupção endêmica de nosso sistema
político. Esse é o compromisso dos procuradores da Lava Jato, que não se
acanharão com os ataques que vêm sofrendo de interesses atingidos pelas
investigações. Contudo, o futuro da Lava Jato e a esperança no fim da
impunidade histórica de poderosos no Brasil dependem do Congresso Nacional.
Somente os parlamentares federais podem aprovar as leis necessárias para satisfazer
os anseios da população por Justiça. Infelizmente, há quase um ano, em plena
madrugada do dia 29/11/2016, enquanto o país chorava a tragédia do avião da
Chapecoense, a Câmara dos Deputados desprezou o desejo legítimo de mais de 2
milhões e 300 mil pessoas ao desfigurar as 10 Medidas Contra a Corrupção,
encerrando precocemente um debate necessário.
8. Se a luta contra a Corrupção depende essencialmente do
Congresso, é preciso que a sociedade continue atenta aos movimentos dos atuais
parlamentares, manifestando-se contra qualquer tentativa de dificultar ou
impedir as investigações criminais de pessoas poderosas. Por fim, é crucial que
em 2018 cada eleitor escolha cuidadosamente, dentre os diversos setores de
nossa sociedade, apenas deputados e senadores com passado limpo, comprometidos
com os valores democráticos e republicanos e que apoiem efetivamente a agenda
anticorrupção. Olhando o passado, não podemos descuidar do futuro."
Assinam: Procuradores das Forças Tarefas da Lava Jato em Curitiba, Rio de
Janeiro e São Paulo.