O
ex-deputado deixou na manhã deste sábado (1º) a superintendência da
Polícia Federal em Brasília. Procurador-geral da República discursou em
congresso de jornalismo em São Paulo.
Por Will Soares, G1 SP, São Paulo
"A mala diz tudo", disse, referindo-se ao vídeo feito pela PF que
mostra o ex-parlamentar deixando uma pizzaria em São Paulo com uma mala
com dinheiro. "Houve a decretação da prisão cautelar de uma autoridade
que estava no curso de cometimento de crime", disse Janot sobre a
detenção de Loures.
A frase foi dita durante a palestra “Desafios no combate à corrupção: a
Operação Lava Jato” no 12° Congresso Internacional de Jornalismo
Investigativo da Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo
Investigativo). A Operação Lava Jato foi tema central do evento.
A jornalista Renata Lo Prete, da GloboNews, mediadora da palestra,
brincou logo no início do painel com Janot e seu cargo dizendo que ele
era o "entrevistado mais procurado da República". O procurador-geral
rebateu, de imediato, com bom humor: "Mas sem tornozeleira".
Nesta sexta (30), o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz
Edson Fachin mandou soltar Rocha Loures, mediante o uso de tornozeleira
eletrônica. Mas a PF informou que não tinha o equipamento e que somente
podia liberar o ex-deputado após receber a tornozeleira, cedida pelo
estado de Goiás.
"A leitura que eu faço de ontem é que ambos os ministros entenderam que
as cautelares deferidas já tinham surtido seus efeitos no sentido de
impedir a continuidade delitiva e, portanto, houve a revogação", afirmou
Janot.
"Faz parte do processo, tanto o deferimento quanto a revogação. Cada um
de nós tem seu entendimento jurídico sobre as questões. O que eu posso
dizer é que o MP tem a mão mais pesada que os outros atores de Justiça",
acrescentou. Janot disse que vê a soltura de Loures "com tranquilidade,
sem nenhum problema".
Durante a participação no evento, ele preferiu exaltar a decisão do
Supremo desta quinta (29), que validou a delação da JBS e não permitiu
que se alargasse a influência do Judiciário nos acordos acertados entre o
MP e os delatores. "Aquela decisão é fantástica. Ela salvou o instituto
da delação premiada."
"Aquela decisão é fantástica. Ela salvou o instituto da delação premiada." (sobre decisão tomada pelo STF)
Questionado sobre quando devem sair novas denúncias, Janot disse:
“Temos duas linhas de investigação. Essas investigações têm vida
própria. Essas investigações têm prazos diferentes de acordo com a
possibilidade. Uma está mais avançada, outra vai exigir um pouco mais de
trabalho.”
Temer
Janot também falou sobre a denúncia contra Temer. Segundo ele,
denunciar o chefe do Executivo do país não é algo que lhe dá prazer.
"Queria passar ao largo disso, mas tenho que cumprir minha missão."
Ele relembrou uma frase antiga dentro da Procuradoria para defender que
as provas contra o presidente são mais do que suficientes
para se apresentar uma denúncia. "Não é possível que, para eu pegar um
picareta, eu precise tirar uma fotografia dele pegando a carteira do
bolso de outro. Ninguém vai passar recibo. Esse tipo de prova é
satânica, é quase impossível. Tem que se olhar a narrativa."
"Não
é possível que, para eu pegar um picareta, eu precise tirar uma
fotografia dele pegando a carteira do bolso de outro. Ninguém vai passar
recibo. Esse tipo de prova é satânica, é quase impossível. Tem que se
olhar a narrativa" (sobre denúncia contra Temer)
Janot também comentou sobre a imunidade concedida a Joesley e Wesley
Batista, irmãos sócios da J&F, dona da JBS. De acordo com o
procurador, os irmãos garantiram entregar altas autoridades da
República, provaram que tinham indícios para tanto, mas não abriram mão
do benefício da não denúncia no acordo. "Se eu não tivesse dado
imunidade, não tinha acordo. Se não tivesse acordo, não tinha
investigação. E se não tivesse investigação, não cessava o crime”,
afirmou. "Se me perguntassem se faria de novo, hoje eu afirmo
tranquilamente que faria de novo".
Segundo Janot, apesar de os Batista não estarem presos, não deixam de
ser criminosos. "Continua sendo bandido. É réu colaborador." Para o
procurador, a delação proporcionou um "ganho para sociedade". "Estancar
eu acho que é impossível, mas vamos diminuir esse nível de corrupção",
explicou.
Ele admitiu, no entanto, que passou por uma "escolha de Sofia". "A
escolha de Sofia a fazer era fingir que não ouvi isso e deixar que isso
continue porque a premiação ao delator é alta. Ele não deixou de ser
bandido porque colaborou, mas a sociedade brasileira ganhou mais. Estou
com a consciência tranquila", disse.
"A
escolha de Sofia a fazer era fingir que não ouvi isso e deixar que isso
continue porque a premiação ao delator é alta. Ele não deixou de ser
bandido porque colaborou, mas a sociedade brasileira ganhou mais. Estou
com a consciência tranquila" (sobre delação dos irmãos da JBS)
“A nossa lista é uma lista que não é obrigatória. Estamos querendo
criar um fato para depois postular”, disse. “O importante é que o nome
escolhido seja da lista. A lista é tríplice, não é eleição direta. E
dentro da lista você escolhe um dos três. A escolha foi legítima.”
Mas ressaltou que "enquanto tiver bambu, lá vai flecha". "Até o dia 17
de setembro a caneta está na minha mão e vou continuar nesse ritmo que
estou”, afirmou, sobre o dia em que ele deixa a PGR.
“Enquanto
tiver bambu, lá vai flecha. Até o dia 17 de setembro a caneta está na
minha mão e vou continuar nesse ritmo que estou” (sobre a saída da PGR)
O procurador afirmou ainda que tem pensamento "diverso" de sua
sucessora, Raquel Dodge, em relação ao poder de barganha do Ministério
Público para negociar reduções de pena e imunidades a criminosos que
colaboram com a Justiça. Para Dodge, cabe apenas ao Judiciário a
concessão desse tipo de benefícios. "Eu tenho que ter flexibilidade para
fazer acordo. Se não, como vou fazer?"
"Não adianta eu chegar no colaborador e dizer: 'Amigo Joesley, venha
aqui. Senta aqui. Vou te propor um acordo de colaboração, beleza? Você
espontaneamente está dizendo que quer, né? Então vou lhe dar uma caixa
de bombom'", ironizou, sob risos da plateia.
Gilmar Mendes
Em outra provocação durante o debate, Renata Lo Prete disse: "Chegou um
momento complicado. Precisamos falar de Gilmar Mendes". Ele riu e
disse: "Sem o menor problema. Eu não tenho nada contra ele."
Ela, então, perguntou: "O Brasil inteiro já entendeu que os senhores
não se gostam. Para dizer o mínimo. Mas, para além desse acervo já longo
de atritos públicos, de desavenças, de discordâncias, eu queria que o
senhor dissesse qual é a essência do conflito entre vocês?"
"Afirmo que não tenho nenhum conflito com ele. Zero. Se vocês repararem
e acompanharem toda essa trajetória do que ocorreu, todas as vezes que
eu tive que me dirigir a ele de uma maneira um pouco mais dura foi
reagindo a uma agressão. Então é legítima defesa", afirmou Janot. "O
Gilmar, nós entramos na Procuradoria juntos, tomamos posse no dia 1º de
outubro de 1984, somos do mesmo concurso. Em 87, eu fui pra Itália
estudar, ele foi pra Alemanha (...) Lá a gente se frequentava. Saímos
lá, tomávamos sorvete... Sorvete, não, cerveja", emendou, arrancando
novamente risos dos presentes.
"Afirmo
que não tenho nenhum conflito com ele. Zero. Se vocês repararem e
acompanharem toda essa trajetória do que ocorreu, todas as vezes que eu
tive que me dirigir a ele de uma maneira um pouco mais dura foi reagindo
a uma agressão. Então é legítima defesa" (sobre relação com Gilmar
Mendes)
Questionado se teme por sua segurança, afirmou: “Para morrer basta
estar vivo”. “Eu ando com segurança, não vamos ser ingênuos. Já recebi
ameaças, não vamos ser ingênuos também. Se acontece alguma coisa comigo,
a confusão é muito maior do que se me deixar vivo, é óbvio. A gente
brinca que eles têm que estar rezando para eu não escorregar no banheiro
e bater a cabeça. Temer eu não temo, mas eu trato profissionalmente.”
Depois, voltou ao assunto. “Se isso tudo tivesse acontecido no começo do meu mandato, acho que eu não teria sobrevivido.”
Soltura de Loures
Mais cedo, neste sábado, a PF divulgou nota na qual informou que
realizaria a instalação da tornozeleira para, então, "garantir o
cumprimento da medida de prisão domiciliar". Além disso, a polícia
declarou que não forneceria detalhes sobre a operação para "garantir a
segurança".
Após Rocha Loures deixar a Polícia Federal, o advogado dele, Cezar
Bitencourt, avaliou à TV Globo que "foi feita justiça" porque, na visão
da defesa, não havia necessidade da prisão.
Pela decisão do ministro Edson Fachin, Rocha Loures:
- Deverá
permanecer em casa à noite (das 20h às 6h), nos finais de semana e em
feriados, fiscalizado por monitoramento eletrônico (tornozeleira);
- Não poderá ter contato com qualquer investigado, réu ou testemunha relacionados aos atos pelos quais responde;
- Está proibido de deixar o país e deverá entregar o passaporte;
- Terá
de comparecer em juízo sempre que requisitado para informar e
justificar suas atividades, mantendo informado o endereço no qual poderá
ser encontrado.
Ex-assessor especial do presidente Michel Temer, Rodrigo Rocha Loures foi preso em 3 de junho pela Polícia Federal.
Ele foi flagrado pela PF recebendo uma mala, em São Paulo, com R$ 500
mil que, segundo delatores da JBS, eram dinheiro de propina.
Segundo a PGR, o dinheiro destinava-se ao presidente Michel Temer e era
parte de propina paga pela JBS para que a empresa fosse favorecida, por
influência do governo, no Conselho Administrativo de Defesa Econômica
(Cade).
Temer e Rocha Loures foram denunciados pelo Minsitério Público pelo crime de corrupção passiva.
Na decisão que mandou soltar Rocha Loures, o ministro Fachin considerou
que não há risco de "reiteração delitiva" por parte do ex-deputado "em
face do transcurso de lapso temporal e das alterações no panorama
processual".
Fachin também levou em conta decisão da Primeira Turma do STF que
substituiu a prisão preventiva de familiares do senador Aécio Neves
(PSDB-MG) por medidas alternativas.
"Não sucumbindo por completo os fatos que deram ensejo à decretação da
medida extrema [prisão], torna-se imperiosa a sua substituição por
medidas cautelares alternativas, nos termos do art. 282, § 6º, do Código
de Processo Penal, as quais, neste momento, mostram-se suficientes à
garantia da ordem pública", escreveu o ministro.
O que dizem os denunciados
Antes mesmo de Rocha Loures ser preso, o advogado dele enviou uma
manifestação ao Supremo na qual disse que o pedido de prisão,
apresentado pela Procuradoria Geral da República, tinha como objetivo
"forçar a delação" do cliente.
Após ser denunciado, nesta semana, o presidente Michel Temer fez um
pronunciamento no qual se disse "vítima de infâmia de natureza
política"; cobrou provas "robustas"; e declarou que a denúncia do MPF é
uma "peça de ficção".