quinta-feira, 6 de outubro de 2016

Teori divide em quatro o principal inquérito da Lava-Jato com Lula entre os investigados

Inquéritos vão apurar crimes supostamente cometidos por pessoas ligadas ao PP, ao PT e ao PMDB 

Por Carolina Brígido
O Globo

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva  Pedro Kirilos / Agência O Globo 15/09/2016 

BRASÍLIA — O ministro Teori Zavascki, relator da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), determinou nesta quinta-feira o fatiamento em quatro do principal inquérito da Lava-Jato, que investiga a existência de uma quadrilha para fraudar a Petrobras. Serão investigadas 66 pessoas – entre elas, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O ex-presidente será investigado pela primeira vez por suspeita de participação de organização criminosa. Os quatro inquéritos vão apurar crimes supostamente cometidos por pessoas ligadas ao PP (30), ao PT (12), ao PMDB na Câmara (15) e ao PMDB no Senado (9). A decisão foi tomada a pedido do procurador-geral da República, Rodrigo Janot. 

Teori também determinou que os quatro inquéritos retornem à Procuradoria-Geral da República, para que Janot informe quais serão as principais providências a serem tomadas nas investigações - o que pode incluir a quebra de informações sigilosas ou a tomada de depoimentos. 
No ofício em que pediu o fatiamento do inquérito ao STF, Janot afirmou que integrantes dos três partidos “se organizaram internamente, utilizando-se de seus partidos e em uma estrutura hierarquizada, para perpetração de práticas espúrias”.
Segundo ele, os partidos formaram “uma mesma organização criminosa, com alinhamento, de forma horizontal, de núcleos políticos diversa” para cometer crimes contra a administração pública investigados na Operação Lava-Jato. 

“Com efeito, os elementos de informação que compõem o presente inquérito modularam um desenho de um grupo criminoso organizado único, amplo e complexo, com uma miríade de atores que se interligam em uma estrutura com vínculos horizontais, em modelo cooperativista, em que os integrantes agem em comunhão de esforços e objetivos, e outra em uma estrutura mais verticalizada e hierarquizada, com centros estratégicos, de comando, controle e de tomadas de decisões mais relevantes”, escreveu Janot. 
PT e PP terão um inquérito cada. O PMDB da Câmara terá um inquérito e o PMDB do Senado terá outro. Ao todo, o procurador-geral pediu a investigação contra 66 pessoas, sendo 30 pessoas ligadas ao PP; 12 ligadas ao PT; nove ao PMDB no Senado e 15, ao PMDB da Câmara. 
Ainda segundo o procurador-geral, o PT usou os crimes apurados na Lava-Jato para continuar no poder“No âmbito do PT, os novos elementos de informação passaram a indicar uma atuação criminosa voltada à arrecadação de valores espúrios, com um alcance mais amplo se comparado àquele que se visualizava no início, objetivando, em especial, a sedimentação de um projeto de manutenção no poder”, escreveu no ofício. 
Janot também explicou que integrantes do PMDB da Câmara “atuavam diretamente na indicação política de pessoas para postos importantes da Petrobras e da Caixa Econômica Federal. Além disso, eram responsáveis pela ‘venda’ de requerimentos e emendas parlamentares para beneficiar, ao menos, empreiteiras e banqueiros”. 
O procurador-geral também afirmou que integrantes dos três partidos, “utilizando indevidamente de sua sigla partidária”, dividiram entre si a indicação de diretorias de Abastecimento, Serviços e Internacional da Petrobras. “Como visto, a indicação de determinadas pessoas para importantes postos chaves do ente público, por membros dos partidos, era essencial para implementação e manutenção do projeto criminoso”. 
O procurador-geral esclareceu que o fatiamento do principal inquérito é necessário para a “otimização do esforço investigativo”. Ele esclareceu que os fatos investigados são conexos entre os partidos. “Embora, até o momento, tenha sido desvelada uma teia criminosa única, mister, para melhor otimização do esforço investigativo, a cisão do presente inquérito tendo como alicerce os agentes ligados aos núcleos políticos que compõem a estrutura do grupo criminoso organizado”. 
Janot também afirmou que não seria proveitoso para as apurações que pessoas sem direito ao foro especial fossem investigadas em um inquérito separado, na primeira instância. “Caso exista desmembramento, poderá gerar prejuízo relevante à compreensão da extensão material e à futura prestação jurisdicional, ponderou”. 
LISTA DOS INVESTIGADOS
INQUÉRITO PP
Aguinaldo Velloso Borges Ribeiro 
Aline Lemos 
Arthur Lira 
Benedito Lira 
Carlos Magno Ramos 
Ciro Nogueira 
Dilceu Sperafico 
Eduardo da Fonte 
Gladson Cameli 
Jerônimo Pizzolotto 
João Pizzolatti 
João Felipe Leão 
José Linhares Ponte 
José Otávio Germano 
Lázaro Botelho Martins 
Luis Carlos Heize 
Luiz Fernando Ramos Faria 
Nelson Meurer 
Renato Delmar Molling 
Roberto Balestra 
Roberto Pereira de Britto 
Roberto Sérgio Ribeiro 
Simão Sessim 
Vilson Luiz Covatti 
Waldir Maranhão 
João Luiz Argolo (filiado a SDD) 
Pedro Correa 
Pedro Henry 
Mario Negromonte 
José Olímpio Silveira Moraes (filiado ao DEM) 

INQUÉRITO PT
João Vaccari Neto 
Edson Antonio Edinho da Silva 
Ricardo Berzoini 
Jaques Wagner 
Delcídio do Amaral 
Luiz Inácio Lula da Silva 
Giles de Azevedo 
Antonio Palocci 
Erenice Guerra 
José Carlos Bumlai 
Paulo Okamoto 
José Sérgio Gabrielli de Azevedo 

INQUÉRITO PMDB NO SENADO
Edison Lobão 
Renan Calheiros 
Romero Jucá 
Valdir Raupp 
Jader Barbalho 
Silas Robdeau 
Milton Lyra 
Jorge Luz 
Sérgio Machado 

INQUÉRITO PMDB NA CÂMARA
Anibal Gomes 
Eduardo Cunha 
Henrique Eduardo Lyra Alves 
Alexandre Santos 
Altineu Côrtes 
João Magalhães 
Manoel Junior 
Nelson Bounier 
Solange Almeida 
André Esteves 
Fernando Antonio Falcão Soares 
André Moura (filiado ao PSC) 
Arnaldo Faria de Sá (filiado PTB); 
Carlos Willian (filiado ao PTC); 
Lucia Bolonha Funaro 

06/10/2016 - DO R.DEMOCRATICA

Palocci, de médico modesto a milionário preso - O homem de R$ 200 milhões


OPERAÇÕES NADA REPUBLICANAS LEVARAM O EX-MINISTRO ANTONIO PALOCCI, UM MÉDICO SANITARISTA QUE TINHA R$ 2 MIL DE SALDO EM CONTA CORRENTE, A VIRAR O PRINCIPAL CONSULTOR DAS MAIORES EMPRESAS DO PAÍS COM UMA MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA DE MAIS DE R$ 200 MILHÕES. NA SEMANA PASSADA, DEVIDO AOS CAMINHOS TORTUOSOS QUE ESCOLHEU PARA ENRIQUECER E ACUMULAR UM PATRIMÔNIO COLOSSAL, O PETISTA FOI PRESO PELA LAVA JATO

IstoE 


Preso na última segunda-feira 26, Antonio Palocci atravessou a recepção da Superintendência da Polícia Federal do Paraná meio sorumbático. Cabisbaixo, mal conseguiu reparar no quadro que adorna a entrada da carceragem em Curitiba com a imagem de uma onça agressiva – “a fera”, como costumam dizer os agentes penitenciários. Seu semblante abatido em nada lembrava o impávido ex-ministro da Fazenda de Lula e da Casa Civil de Dilma, protagonista do Petrolão, responsável por gerenciar negociatas que renderam cifras extraordinárias ao PT. Tampouco fazia jus ao physique du rôle do consultor milionário investigado pelo Ministério Público Federal. Pela primeira vez, em muitos anos, Palocci estava mais para Antonio, o médico sanitarista boa praça de Ribeirão Preto que debutou para a política em 1981 vendendo estrelinha do PT. De lá para cá, realmente, muita coisa mudou em sua vida. Preso pela Lava Jato, o petista é o retrato mais bem acabado do político que enriqueceu no poder – e graças ao poder. No início dos anos 2000, antes de se eleger deputado, Palocci tinha um patrimônio que somava R$ 295 mil. Sua conta-corrente no Banco do Brasil apresentava um saldo de R$ 2.300. No Banespa, seus depósitos somavam R$ 148. A ascensão patrimonial foi colossal. Na última semana, o juiz Sérgio Moro bloqueou das contas pessoais – físicas e jurídicas – do petista um total de R$ 30,8 milhões. Entre os bens adquiridos por Palocci nos últimos anos figuram um apartamento nos Jardins, área nobre de São Paulo, avaliado em R$ 13 milhões e um escritório na mesma região, que hoje vale pelo menos R$ 2 milhões. A movimentação bancária do ex-ministro entre 2010 e 2015, a qual ISTOÉ teve acesso, revela números ainda mais exuberantes. Neste período, R$ 216,2 milhões passaram pelas contas de Palocci e de sua empresa de consultoria, a Projeto. Os serviços contratados, acreditam os procuradores, iam além dos conselhos. Muitas vezes, os serviços de consultoria propriamente ditos nem eram prestados. Traduziam-se em lobby. Em português claro: tráfico de influência em favor de grandes empresas junto aos governos petistas.

Os bens do petista consultor

O enriquecimento e os valores movimentados pela firma de consultoria de Palocci acenderam o sinal de alerta entre os investigadores. Fundada em 2006, a Projeto recebeu R$ 52,8 milhões entre junho de 2011 e abril de 2015. Só em 2010, quando Palocci coordenava a campanha de Dilma, o ex-ministro teve ganhos de R$ 12 milhões. É um faturamento infinitamente maior do que o de prestigiadas assessorias de negócios do País. Conforme ISTOÉ adiantou com exclusividade em seu site, na última semana, duas novas investigações a respeito da evolução patrimonial foram abertas pala Procuradoria da República do Distrito Federal. As autoridades possuem fortes indícios de que os serviços oficialmente contratados pela Caoa e pelo Grupo Pão de Açúcar não foram prestados.
A primeira das apurações mira em valores recebidos do Grupo Pão de Açúcar. Ao todo, a firma de Palocci amealhou R$ 5,5 milhões do conglomerado varejista. O dinheiro era repassado pelo ex-ministro da Justiça falecido Márcio Thomaz Bastos. Chama a atenção o fato de os depósitos terem começado logo após Palocci ser anunciado ministro da Casa Civil da ex-presidente Dilma. O que por si só configuraria um conflito de interesses. As irregularidades se acumulam. Sequer há um contrato formal entre as partes. O próprio Grupo Pão de Açúcar reconheceu, depois de uma auditoria interna sob nova administração, não ter identificado qualquer serviço prestado pela Projeto. Na prática, acreditam os procuradores, a verdadeira razão dos pagamentos não podia ser registrada em papel: propina para Palocci defender os interesses da empresa.
A segunda apuração do MPF contra Palocci esquadrinha as suas relações com o grupo Caoa. A empresa automobilística aparece como a segunda principal cliente da Projeto. Pagou R$ 10 milhões à firma do petista. Uma parte dos depósitos ocorreu durante a primeira campanha de Dilma. Seria, de acordo com o contrato selado, para Palocci identificar e auxiliar em negócios na China. Não é o que acreditam os investigadores. “Aventou-se que o presente contrato destinar-se-ia, em verdade, a acobertar a prática do crime de tráfico de influência, ocorrido no processo de edição de medidas provisórias que, ao concederem benefícios fiscais à indústria automobilística, favoreceram sobremaneira a Hyundai-Caoa”, afirmou o procurador Frederico Paiva em despacho. A medida provisória, de fato, atendeu aos interesses da Caoa ao prorrogar as vantagens tributárias para montadoras instaladas nas regiões Centro-Oeste, Norte e Nordeste. O grupo comanda uma fábrica da Hyundai em Anápolis (GO). Por contratar “consultorias” similares, a Caoa se tornou alvo das operações Zelotes e Acrônimo. Em uma delas, há suspeitas de que teria pago R$ 10 milhões a Fernando Pimentel, então ministro da Indústria e Comércio de Dilma. Em troca, teria recebido benefícios fiscais.
Aos poucos, os investigadores vão conseguindo mapear a origem e o destino dos recursos amealhados por Palocci. Um relatório produzido pela CPI do BNDES mostra que o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) identificou nove operações bancárias suspeitas ligadas ao ex-ministro. Há outros alertas ainda de entradas atípicas de dinheiro no caixa de sua consultoria, como somas acima de R$ 1 milhão pagas por treze empresas. Só a Amil e seu ex-controlador Edson Bueno depositaram R$ 24,9 milhões nas contas da Projeto.
Foram, inclusive, as revelações pela imprensa a respeito dos ganhos milionários de Palocci com consultorias que levaram à segunda queda do petista. Em 2011, Palocci tinha conseguido voltar ao poder como ministro da Casa Civil de Dilma, depois de deixar a Fazenda, em março de 2006, em meio ao escândalo da quebra do sigilo bancário do caseiro Francenildo. O episódio rendeu um inquérito contra o petista no Supremo Tribunal Federal. Entrou na conta dos 19 arquivados desde 2005. A passagem do petista pela Casa Civil durou cinco meses. Foi abatido em pleno vôo ante às denúncias de multiplicação por 20 de seus bens – hoje, sabe-se, que a progressão patrimonial foi e é muito maior.
“Palocci entrou no radar da Lava Jato por causa
de uma consultoria feita à empresa WTorre”
Palocci entrou no radar da Lava Jato também por uma consultoria que ajudou a engordar o seu patrimônio. Entre 2007 e 2010, sua empresa recebeu recursos da construtora WTorre. Neste período, a empreiteira comprou e, logo, arrendou o Estaleiro Rio Grande para a Petrobras construir plataformas. Coincidentemente, a consultoria de Palocci se encerrou junto com a venda do estaleiro para a Engevix. O serviço de lobby, desconfiam investigadores, não era mais necessário. Depoimentos de delatores, como Paulo Roberto Costa, Alberto Youssef e Fernando Baiano mostram o envolvimento do ex-ministro com o Petrolão. Ao juiz Sergio Moro, eles narraram que Palocci pediu R$ 2 milhões desviados da Petrobras para a campanha presidencial de 2010.
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Na manhã da segunda-feira 26, a Lava Jato fechou o cerco contra Palocci. O petista, conhecido como “italiano” nas listas de propina, foi preso em seu apartamento na capital paulista. Não restam dúvidas, para os procuradores, de que o ex-ministro tinha papel central nas negociatas entre os governos do PT e a Odebrecht. Era o elo entre os desejos financeiros do partido e os da empreiteira. “Existe um pagamento (da Odebrecht) que é feito constantemente e que forma um caixa mesmo, uma poupança, digamos assim, de onde são depois, posteriormente, pelo gestor da conta – no caso, o senhor Antonio Palocci – destinados os pagamentos no interesse do partido”, afirmou a procuradora Laura Tessler. E-mails e planilhas mostram que o ex-ministro gerenciou R$ 128 milhões em propina paga pela construtora entre 2008 e o final de 2013. Cerca de R$ 30 milhões foram pagos em espécie a Palocci entre julho e outubro de 2010 num total de 26 pagamentos. Cada entrega era feita mediante uma senha com nome de um prato italiano, como espaguete, lasanha e canelone. Em contrapartida, Palocci agia dentro do governo, com anuência de lideranças petistas, para garantir que a construtora ganhasse contratos, obtivesse empréstimos de bancos estatais e pautasse projetos de seu interesse.
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A Lava Jato prendeu, além de Palocci, seus dois homens de confiança: Branislav Kontic e Juscelino Dourado. Chefe de gabinete do petista durante o governo Dilma, Kontic participava ativamente das operações ilegais do ex-ministro. Era ele quem fazia a comunicação do petista com executivos da empreiteira. Foi o responsável por encaminhar mensagens relacionadas à compra de um terreno na capital paulista pela Odebrecht onde pretendiam erguer a sede do Instituto Lula. A área, que custou R$ 12 milhões, seria repassada pela empreiteira e seu valor descontado das propinas. A participação de Juscelino Dourado, assessor de Palocci desde os tempos em que ele comandava a prefeitura de Ribeirão Preto, não fica para trás. Ele é acusado de receber U$S 48 milhões em negócios ilícitos. Há suspeitas que seja, na verdade, responsável por receber e lavar recursos para Palocci. Na mira dos investigadores está uma fazenda referência na criação e no leilão de gados Nelore. A PF deflagrou busca e apreensão na propriedade, localizada em Mato Grosso. Há suspeitas de que Dourado seja laranja do ex-ministro no empreendimento. “Nós, da Receita Federal, estamos acompanhando vertentes relacionadas à interposição de pessoas na aquisição de dois imóveis, principalmente uma fazenda no Mato Grosso”, afirmou o auditor Roberto Leone. “Possivelmente, no caso da fazenda, há indícios de que houve um subfaturamento na declaração ou na escrituração”, complementou.
“O ex-ministro atuava no governo para que a Odebrecht
ganhasse contratos, segundo os procuradores”
O hoje milionário Palocci construiu uma carreira política tão ascendente como cercada de suspeitas. Elegeu-se vereador, deputado estadual, federal e prefeito de Ribeirão Preto. Sua gestão à frente do município paulista foi marcada por suspeições. A primeira acusação foi de direcionar uma licitação exigindo que os molhos de tomates viessem com ervilha. Tirou da frente, assim, uma grande quantidade de concorrentes. Um expediente que teria sido repetido na máfia do lixo. Segundo a denúncia, Palocci recebia uma mesada para favorecer o Grupo Leão Leão em contratos de coleta. Em 2002, ele deixou o comando do município. Assumiu a coordenação da vitoriosa campanha de Lula à presidência. Com a chegada do PT ao poder, foi alçado ao cargo de ministro da Fazenda e recebeu do ex-presidente a missão de fazer a interlocução com os empresários. A partir daí, tornou-se o poderoso petista conectado com o mercado. O resto já é história. Treze anos depois, sabe-se que Palocci usou as conexões para se tornar o homem de mais de R$ 200 milhões – agora, preso.DO J.TOMAZ
Fotos: Pedro Kirilos/Ag. O Globo; Giuliano Gomes

Secretária de sobrinho de Lula relata saques em espécie

Em depoimento à Polícia Federal, Flávia de Oliveira Barbosa afirma que Taiguara Rodrigues dos Santos bancou até viagem do filho do ex-presidente para Cuba 

Por Thiago Bronzatto 
Veja.com

Taiguara Rodrigues, sobrinho de Lula, foi indiciado pela Polícia Federal pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro(VEJA.com/Reprodução)
O empresário Taiguara Rodrigues:
para funcionários do governo e executivos de empreiteiras, ele é ‘o sobrinho do Lula’


Dono da empresa Exergia Brasil, Taiguara recebeu 3,5 milhões de reais da Odebrecht
Em depoimento à Polícia Federal no dia 17 de agosto, Flávia de Oliveira Barbosa, secretária de Taiguara Rodrigues dos Santos, sobrinho do ex-presidente Lula, declarou que foi instruída a realizar saques em dinheiro vivo. “Taiguara pedia com frequência para a declarante sacar dinheiro no caixa”, disse Oliveira Barbosa. “Quase todo dia a declarante ia na boca do caixa para sacar de R$ 1.000 a R$ 1.500. Que além disso, ia uma vez por semana sacar por volta de R$ 5.000,00. Que quando sacava valores mais altos, a pedido de Taiguara, ia acompanhada de José Emmanuel. Que sabe que sacava eventualmente valores altos para TAIGUARA, mas não se recorda de valores específicos”, afirmou. 
A secretária trabalhou com Taiguara por cerca de quatro anos. Durante esse período, ela acompanhou de perto os negócios suspeitos e o enriquecimento extraordinário do sobrinho do ex-presidente. Segundo Oliveira Barbosa, Taiguara costumava comprar carrões em nome da sua empresa, que recebia dinheiro da Odebrecht. “Taiguara tinha um veículo Land Rover, cujas prestações eram pagas pela Exergia Brasil. Que Taiguara comprou para José Emmanuel (seu sócio) um veículo PT Cruiser, cujas prestações também eram quitadas pela Exergia Brasil. Que além disso Taiguara comprou para si uma BMW e uma GLK, veículo importado. Que Taiguara ainda comprou um Jeep Compass para sua ex-mulher. Que as prestações de todos esses veículos eram pagas com dinheiro da Exergia Brasil. Que Taiguara também comprou um Fiat Uno para o irmão”, disse a secretária. 
Taiguara, que mantinha fotos de Lula fixadas na parede de sua empresa e enviava presentes de aniversário para o ex-presidente, também era generoso com o filho mais velho do petista. Em meados de 2014, Taiguara bancou as passagens aéreas de uma viagem para Cuba, feita junto com Fábio Luis, conhecido como Lulinha, e seu sócio Fernando Bittar, proprietário no papel do sítio em Atibaia, interior de São Paulo, frequentado por Lula e investigado na Operação Lava-Jato. Durante essa expedição, o sobrinho do ex-presidente também alugou uma Mercedes-Benz para Lulinha e Bittar andarem para cima e para baixo na ilha. Segundo o sócio de Taiguara, José Emmanuel, a excursão tinha como intuito prospectar novos negócios em Cuba
A vida de luxo de Taiguara chamava a atenção da sua secretária. Segundo Oliveira Barbosa, o sobrinho de Lula, que costumava comprar com “frequência relógios de marca”, fez “reformas de luxo” tanto em seu escritório como em sua cobertura com “piscina e jardim”. O jovem empresário também costumava viajar com frequência, hospedando-se em resort com diárias de mais de 1 000 reais em Porto de Galinhas, em Pernambuco. “Se recorda de um episódio no qual Taiguara comprou um quadro de São Jorge no valor aproximado de R$ 5.000,00”, disse a secretária à PF. “Todo o dinheiro que financiava esses gastos eram provenientes de remessas que vinham de Angola”, afirmou ela, referindo-se aos contratos assinados entre Taiguara e a Odebrecht que renderam 3,5 milhões de reais para o sobrinho de Lula. “Vinha a remessa de valores de Angola, em dólares, e após cerca de dois dias a quantia era disponibilizada na conta da Exergia Brasil”. 
O fluxo de dinheiro da Odebrecht que enchia os bolsos de Taiguara foi interrompido após VEJA revelar em fevereiro de 2015 que o sobrinho de Lula teve um enriquecimento meteórico no mesmo ano em que a Odebrecht recebeu um empréstimo do BNDES para construir a hidrelétrica de Cambambe, em Angola. “Taiguara disse que a reportagem da revista VEJA inviabilizou os negócios da Exergia Brasil”, afirmou a secretária. “No final, não havia dinheiro sequer para pagar funcionários”, disse Oliveira Barbosa, que move uma ação trabalhista contra Taiguara.


5 out 2016 - DO R.DEMOCRATICA

Contra impunidade, STF mantém prisão na 2ª instância

Decisão tem impacto direto nas delações da Operação Lava-Jato
Delatores como Marcelo Odebrecht poderiam interromper colaboração com a justiça 

Por Laryssa Borges
Veja.com

Executivo Marcelo Odebrecht está preso desde 19 de junho deste ano, por suspeita de corrupção e lavagem de dinheiro na Petrobras
(Vagner Rosário/VEJA.com) 
Na carceragem de Curitiba e de Pinhais, onde estão detidos empreiteiros e empresários enrolados na Operação Lava-Jato, e nas principais bancas de criminalistas do país, todas as atenções se voltavam nesta quarta-feira para o Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília. A corte se preparava para julgar dois processos que poderiam acabar de vez com a sensação de que corruptos poderosos e endinheirados possuem verdadeiros passaportes para a impunidade. Com dinheiro suficiente para pagar bons advogados, eles criavam na prática “quatro instâncias” para recorrer em liberdade – juízo de primeiro grau, Tribunais de Justiça ou Tribunais Regionais Federais, Superior Tribunal de Justiça e o próprio STF. Na prática, raramente cumpriam pena. 
Os detentos do petrolão tinham especial interesse no veredicto de hoje. Se a indústria dos recursos eternos fosse mantida, poderiam ser interrompidos os acordos de delação premiada que revelariam ainda mais detalhes do esquema de corrupção instalado na Petrobras. Com a perspectiva de só terem de enfrentar realmente os riscos de cadeia dentro de anos, empreiteiros como Marcelo Odebrecht e Léo Pinheiro se calariam. Manteriam a tradicional omertà. 
Nesta quarta-feira, porém, o desejo dos poderosos do petrolão não se confirmou. O Supremo confirmou, por apertados seis votos a cinco, que a execução das penalidades pode ser feita já na segunda instância, sem depender do chamado trânsito em julgado. No julgamento no STF, o ministro Luiz Fux resumiu: “Estamos discutindo isso porque no Brasil as condenações são postergadas com recursos aventureiros, por força de recursos impeditivos do trânsito em julgado”. 
Entre os magistrados, um exemplo recorrente de impunidade: o jornalista Antonio Marcos Pimenta Neves, condenado pelo assassinato da ex-namorada Sandra Gomide, no ano 2000, passou 11 anos solto. Pimenta era réu confesso, mas só foi preso em 2011. Neste ano passou para o regime aberto. 
Do plenário, os ministros mandaram um recado claro contra a impunidade dos poderosos, que contam com o conceito elástico de presunção de inocência para nunca expiar culpa atrás das grades. “O sistema brasileiro hoje frustra na maior medida possível o senso de justiça de qualquer pessoa. Um sistema de justiça desacreditado pela sociedade aumenta a criminalidade, não serve para o Judiciário, não serve para a sociedade, não serve para ninguém”, disse o ministro Luis Roberto Barroso ao falar sobre a dificuldade de levar criminosos poderosos efetivamente para atrás das grades. “Por ser um princípio e não uma regra, a presunção de inocência é ponderada e ponderável com a efetividade do sistema penal, que é um valor que protege a vida das pessoas para não serem assassinadas, protege a integridade física, protege a integridade patrimonial”, continuou. “[Sem a prisão em segunda instância] O sistema brasileiro não era garantista. Era grosseiramente injusto”. 
Entre os ministros que consideraram que a prisão já em segunda instância é possível, prevaleceu o entendimento que o trecho da Constituição que trata de prisão é o inciso 61 do artigo 5º: “Ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei”. 
“Depois da segunda instância, sobe o interesse do sistema de fazer aplicar a norma penal. Depois do segundo grau, o peso da presunção da inocência fica mais leve e menos relevante em contraste com o interesse estatal”, afirmou Barroso. Em fevereiro, por sete votos a quatro, o STF havia entendido que a segunda instância é a última que analisa provas de materialidade e autoria e, por isso, a pena já poderia ser executada. 
Desde a retomada do tema à discussão, advogados articularam uma proposta alternativa: a de que a execução da pena possa ocorrer após o julgamento do recurso especial pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). A iniciativa significaria que um tribunal superior teria confirmado a condenação do réu, mas apenas os ministros Marco Aurélio Mello e Dias Toffoli – que mudou o entendimento pessoal desde fevereiro – consideraram a hipótese. Também votaram contra a execução da pena em segundo grau os ministros Ricardo Lewandowski, Rosa Weber e Celso de Mello. Hoje, o decano criticou o que chamou de “pragmatismo de ordem penal” e disse que o STF deve assegurar o direito fundamental de um acusado ser presumido inocente até que se sobreponha sentença condenatória transitada em julgado. “A majestade da Constituição Federal não pode ser violada pela potestade do Estado”, afirmou. 
Ao longo de toda a discussão, foram repisados por advogados argumentos que suspeitos podres seriam os principais prejudicados e ampliariam ainda mais a situação de caos do sistema penitenciário brasileiro. Teori Zavascki rechaçou de pronto a tese. Segundo ele, é improvável que condenados menos abastados entupam a justiça de recursos, além de ser necessário considerar que todos os recursos deles fossem aceitos e, ao fim, eles fossem declarados inocentes. “É absolutamente desprovido de base real que a improcedência da ADC [ação declaratória de constitucionalidade julgada hoje] iria acarretar injusto encarceramento de dezenas de milhares de condenados, notadamente pessoas humildes defendidas pela Defensoria Pública. Isso parte da premissa que tem recursos e que recursos serão acolhidos e que todos eles são inocentes”, disse.5 out 2016 - DO R.DEMOCRATICA