domingo, 21 de maio de 2017

Autor de laudo citado por Temer usou equipamento amador para encontrar supostas edições

Profissional é bacharel em Direito e corretor de imóveis.

O Jornal Nacional reproduziu neste sábado (20) matéria sobre a perícia pedida pelo jornal ‘Folha de S.Paulo’ na gravação da conversa do presidente Michel Temer com o dono da JBS Joesley Batista. O presidente Michel Temer citou em pronunciamento, também no sábado, essa perícia que apontou que a conversa foi editada. Neste domingo (21), o jornal ‘O Globo’ publicou na internet uma reportagem sobre o autor da perícia da Folha.
A reportagem relata que o perito judicial Ricardo Caires dos Santos afirma ser profissional em transcrever áudios. É bacharel em Direito pela Unifig, de Guarulhos, e diz ter especialização em Direito Penal.
Ele se tornou figura frequente em programas sensacionalistas e de celebridades na TV. Antes de se dedicar à transcrição da conversa de Temer com Joesley, coube a ele determinar se havia ou não um fantasma numa foto da internet divulgada pela atriz americana Jéssica Alba no ano passado.
O Globo informa que Ricardo costuma se apresentar como perito do Tribunal de Justiça de São Paulo, mas é apenas um prestador de serviços eventual da Justiça, sem nenhum vínculo com o tribunal.
Procurado por 'O Globo', ele afirmou que seu trabalho é apenas inicial e que qualquer conclusão depende de uma outra perícia. Ele negou que o áudio da conversa tenha 50 pontos de edição, como apontado pela Folha. Segundo ele, são 14 pontos de edição, entre 15 e 20 pontos de corte e diversos trechos de ruído. Mas disse que ele não tem condições de apontar onde estão os pontos de edição.
O perito disse que o objetivo de seu trabalho era apenas que outro profissional fizesse a perícia. Para elaborar o laudo, ele afirma ter usado um tocador de mídia, o programa Audacity, uma ferramenta gratuita para edições de áudio caseiras, e o software Vegas Pro 10, ferramenta profissional para edição de vídeo - embora a fita tenha apenas áudio e não imagens.
Especialistas ouvidos pelo 'Globo' afirmam que as ferramentas adotadas por Caires para fazer a perícia são insuficientes para dizer se houve ou não edição. O jornal destaca no laudo da perícia uma série de erros na transcrição da conversa: a presidente do BNDES Maria Sílvia Bastos foi confundida com Marina Silva. A CVM, Comissão de Valores Mobiliários, foi transcrita como CDN.
Na conclusão, o perito cometeu erros de português. Escreve: "para melhor identificação está marcados os pontos em vermelho e amarelo", quando deveria dizer “estão” marcados. Diz ainda e "o objeto "áudio" está eivados de vícios". No lugar de “está eivado”, o que demostra que o perito não tem o domínio da língua portuguesa.
O perito defendeu ainda que os trechos editados teriam reduzido o tempo total de conversa de 50 minutos para 38 minutos. A reportagem do Globo alerta que ele não considerou a gravação feita enquanto Joesley estava no carro, antes e depois de entrar no Palácio do Jaburu.
No site que mantém na internet, Caires se diz especializado em espionagem. Apesar da carreira de perito, o site também mostra que ele atua no ramo imobiliário e tem registro de corretor de imóveis.
O perito Ricardo Caires dos Santos foi o mesmo contratado pela familia do menino Bernardo Boldrini para tentar provar que a carta de suicídio da mãe dele, a enfermeira Odilaine Uglione, era falsa. Na ocasião, o perito também foi entrevistado pelo Fantástico para explicar seu lado.

Nota da 'Folha de S.Paulo'

A 'Folha de S.Paulo' informou que contratou o perito e posteriormente o entrevistou para a produção de reportagem. Tanto no laudo produzido como na entrevista, Santos afirma textualmente que a gravação sofreu 53 edições. "Em nome da transparência, marca de seu jornalismo, a Folha voltará ao profissional para que ele esclareça o teor das declarações dada a 'O Globo', a quem Santos ofereceu outra conclusão. Santos é perito judicial e já fez análises para diversos órgãos de imprensa."DO G1

‘O Brasil está mais para The Walking Dead do que para House of Cards’, diz procurador da Lava Jato

Carlos Fernando dos Santos Lima, do Ministério Público Federal em Curitiba, postou em seu perfil no Facebook como 'cidadão' uma longa análise da crise no País e aponta para 'hordas de mortos-vivos, apodrecidos de alma e corpo, que passam entre nós'


O procurador regional da República Carlos Fernando dos Santos Lima, que integra a força-tarefa da Operação Lava Jato, escreveu em seu perfil no Facebook que ‘não há como comparar a crise brasileira com a série House of Cards’.
Para Carlos Lima, ‘o que vivemos hoje está mais para The Walking Dead, onde hordas de mortos-vivos, apodrecidos de alma e corpo, passam entre nós, contaminando tudo que poderia ser bom com o vírus da imoralidade e da corrupção’.
O procurador subscreve o post como ‘Carlos Fernando dos Santos Lima, cidadão’.
Chama-se ‘o cadáver insepulto’ o título que o procurador deu à longa análise que fez do cenário do País mergulhado em um ambiente de incertezas. Ele postou suas impressões neste sábado, 20.
“Falo isso hoje como cidadão, e não como procurador da República e membro da força-tarefa da Lava Jato”, ressaltou. “Essa história de horror tem que acabar. Não é possível admitir mais que esse cadáver do sistema político-partidário continue a apodrecer tudo o que toca.”
“Nenhum motivo existe para que o Brasil conviva com isso como se estivéssemos sempre fadados a essa podridão e mau cheiro”, segue o procurador. “Nem me venham dizer que devemos tapar o nariz para isso, na esperança de uma volta à normalidade do sistema econômico.”
Adiante, o procurador fala do episódio mais explosivo da Lava Jato, a Operação Patmos, que mira o presidente Temer, o senador Aécio Neves (PSDB/MG) e o deputado Rocha Loures (PMDB/PR) – o executivo Joesley Batista, da JBS, gravou conversa com Temer na noite de 7 de março no Palácio do Jaburu.
“Nem também me digam que as gravações de Michel Temer não são estarrecedoras. Nenhum relativismo moral justificaria uma conversação onde são explicitadas as bases de tudo o que de errado, podre e vil a Operação Lava Jato tem tentado mostrar”, diz o procurador.
“Os que desejam fechar os olhos hoje, em uma cegueira ética intencional, são os mesmos que aplaudiam as investigações que revelaram a podridão dos governos do PT. Igualaram-se abjetamente aos que acusavam a Lava Jato de parcialidade contra o governo Dilma e Lula.”
Carlos Lima sustenta que ‘as motivações econômicas não podem justificar que esses cadáveres insepultos continuem entre nós’.
“Suas vísceras expostas enojam, seus costumes obscenos desvirtuam, a sua sujeira contamina. Devemos lutar contra TODOS eles, enterrando-os definitivamente para que, sepultados pela democracia, tenhamos realmente oportunidade de um futuro são”, prega.
O procurador faz um alerta. “Se não fizermos isso, corremos todos nós o risco de que sejamos um país de zumbis morais, que nem coragem de olhar um espelho teremos, com medo de ver que nos tornamos apenas um reflexo decaído de alguém que um dia se pensou ético.”
“Basta. Basta. Basta. Cumpramos a Constituição e nos livremos do mal. Amém.”
Ele ainda registrou um Pos Scriptum. “Aqueles que não gostarem do que escrevi e constarem de minha lista no facebook, por favor desfaçam a ‘amizade’. Para mim ficaria difícil fazer isso um por um. Obrigado.”DO ESTADÃO

É hora de tirar o código de barras da democracia

Josias de Souza

Antigamente, o Brasil era um país de corruptos sem corruptores. Hoje, com o advento da delação premiada, virou uma nação de corruptores sem corruptos. Roçando as grades de Curitiba, Lula não sabia de nada. Recém-chegada ao pântano, Dilma continua estalando de pureza moral. Com a reputação reduzida à soma de palavrões que inspira nos botecos, Aécio é a virtude que terceirizou o xadrez à irmã. Ao jurar que não fez nada, Temer tornou-se um revolucionário do léxico, provando que nada é uma palavra que ultrapassa tudo.
Tanta inocência eliminou até o benefício da dúvida. Aos olhos da opinião pública, os políticos agora são culpados até prova em contrário. Se perdem o mandato e o foro privilegiado, como Eduardo Cunha, vão em cana como prova em contrário. Desde março de 2014, quando a Operação Lava Jato começou, a banda dinheirista da política cultiva a ilusão de que a sangria será estancada. Para o bem da nação, deu-se o oposto. A política virou uma atividade hemorrágica.
A má notícia é que o sistema político morreu. O comportamento de risco e a tendência à autodesmoralização levaram o modelo ao suicídio. A boa notícia é que a morte pode ser um enorme despertar. Num instante em que a faxina invade os salões do Palácio do Jaburu, fica claro que o país necessita de um movimento que acabe com o suborno, o acobertamento, o compadrio, o patrimonialismo… Em suma, precisa-se de uma articulação qualquer que acabe com os valores mais tradicionais da política brasileira.
O primeiro passo é eliminar dos costumes nacionais a praga do quase. A higienização quase foi alcançada quando as ruas escorraçaram Collor do poder. A assepsia quase foi obtida quando cassaram-se os mandatos de meia dúzia de anões do Orçamento. A purificação quase chegou quando o Supremo Tribunal Federal mandou para a cadeia a turma do mensalão. Temer é uma evidência de que o impeachment de Dilma não eliminou a síndrome do quase. Chegou a hora de levar a faxina às últimas consequências.
Neste sábado, Temer discursou por 12 minutos para informar ao país que Joesley Batista, seu ex-amigo do Grupo JBS, não vale nada. Depois de limpar os cofres do BNDES nos governos Lula e Dilma, armou uma delação fraudulenta para produzir turbulência econômica capaz de lhe propiciar lucros extraordinários comprando dólares na baixa e vendendo ações na alta. Quer dizer: para Temer, Joesley é um patife. E não será a plateia que irá discutir com um especialista. Melhor passar a Presidência de Temer no detergente e seguir em frente.
A honestidade é como a gravidez. Nenhuma mulher pode estar um pouquinho grávida, como não pode haver governo um pouco honesto, com oito ministros investigados e um presidente que confraterniza com corruptos no palácio residencial. A esse ponto chegamos: o Brasil terá de cair para que Temer se mantenha no cargo de presidente. Só a desmoralização nacional salva Temer.
A velha sacada do Churchill ensina que a democracia é o pior regime possível com exceção de todos os outros. Mas no Brasil os políticos parecem eternamente engajados num esforço para implementar as alternativas piores. De erro em erro, chegou-se à cleptocracia atual. É chegada a hora de arrancar o código de barras da democracia brasileira. A entrada do processo é a saída de Temer. O limite é a Constituição. O desafio é encontrar um nome capaz de gerir um programa mínimo e zelar pelo calendário eleitoral de 2018.