quarta-feira, 28 de junho de 2017

Com Raquel Dodge, Temer injetou na Procuradoria um contraponto a Janot

Josias de Souza

Com a rapidez de um raio, Michel Temer indicou a sucessora do procurador-geral da República Rodrigo Janot horas depois de receber a lista tríplice com os nomes mais votados pela corporação. Refugou o primeiro nome da lista, Nicolao Dino. Conforme previsto aqui, indicou sua preferida: Raquel Dodge, a segunda colocada. Deve-se a pressa de Temer ao desejo de injetar desde logo no cenário político a perspectiva de um contraponto à atuação de Janot, que deixará o cargo em 17 de setembro.
Subprocuradora-geral, Raquel Dodge é uma clara antagonista de Janot. Além da simpatia de Temer, contava com o apoio de caciques do PMDB, entre eles José Sarney e Renan Calheiros. Esses apoios lhe serão úteis na segunda fase do processo: a aprovação do seu nome no Senado Federal. A escolhida planeja visitar senadores. Deseja, segundo diz, expor seu plano de trabalho. Pesou também a favor da nova procuradora-geral da República o apoio do ministro Gilmar Mendes, do STF, amigo de Temer e desafeto de Janot.
Ao optar por Raquel Dodge, Temer rompeu uma tradição de 14 anos. Desde 2003, sob Lula, prevalecia na sucessão da Procuradoria-Geral da República o nome do primeiro colocado na eleição interna da corporação. Temer recusou-se a indicar Nicolao Dino porque ele representa o oposto do que o presidente desejava. Frequentou a disputa como candidato apoiado por Rodrigo Janot, a quem Temer declarou guerra aberta.
Nicolao Dino foi o autor do parecer no qual o Ministério Público recomendou a cassação da chapa Dilma-Temer, posição derrotada por 4 a 3 no recente julgamento do Tribunal Superior Eleitoral. De resto, o primeiro colocado da lista dos procuradores era o último nome que José Sarney, amigo e conselheiro de Temer, queria ver no comando da Procuradoria-Geral. O irmão dele, Flavio Dino, governador do Maranhão pelo PCdoB, é um ferrenho adversário do clã Sarney.
Içada à chefia do Ministério Público Federal por um presidente denunciado, Raquel Dodge talvez tenha de lidar com parte do espólio de denúncias que Janot fará contra Temer. O presidente e seu grupo político estão aliviados com a perspectiva de se livrar de Janot. O alívio nestes casos pode ser, porém, ilusório. Nos seus dois mandatos, Lula indicou meia dúzia de ministros para o STF. Um deles, Joaquim Barbosa, revelou-se um insuspeitado algoz do petismo como relator do processo do mensalão.
Na entrevista que concedeu ao blog no último final de semana, Raquel Dodge prometeu tratar das investigações que envolvem Temer com “destemor”. E incluiu na sua oratória uma palavra que agrada aos investigados sem ofender necessariamente os investigadores: “temperança” (assista abaixo). A partir de setembro, a escolhida de Temer poderá escolher de que forma planeja entrar para a história.

Renan mostra que o torniquete virou hemorragia

Josias de Souza
Empurrado para fora da liderança do PMDB no Senado, Renan Calheiros saiu batendo a porta. Chamou Michel Temer de “covarde” e disse que Eduardo Cunha manda no governo a partir da cadeia. Como se fosse pouco, insinuou que é verdadeira a acusação do delator Joesley Batista de que Temer avalizou a compra do silêncio de Cunha.
Do alto da tribuna do Senado, Renan fez pose de benfeitor dos trabalhadores, atacando Temer por levar a ferro e fogo a reforma trabalhista. Em verdade, o senador se fantasia de militante da CUT porque sua reeleição ao Senado, em 2018, corre riscos. Ao se reposicionar em cena, Renan comporta-se como criança que brinca no barro depois do banho.
Réu no Supremo, Renan revela sua vocação para piada ao sugerir a saída de Temer. Há seis meses, pegou em lanças contra despacho judicial do ministro Marco Aurélio Mello, do STF, ordenando que deixasse a poltrona de presidente do Senado. Investigado em 11 inquéritos, Renan corre o risco provocar uma epidemia de risadas com suas críticas a Cunha.
A consolidação do rompimento de Renan com Temer desce à crônica da deterioração política do país como uma evidência de que a operação torniquete desandou. A turma que tramava “estacar a sangria”, na célebre definição de Romero Jucá, chega ao São João de 2017 como uma quadrilha hemorrágica.

“Chegou a hora da fogueira” e outras notas de Carlos Brickmann

O juiz Sérgio Moro pode, a qualquer momento, emitir a sentença de Lula. Gleisi Hoffmann diz que só é aceitável a sentença que o absolva integralmente

Ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff conversam durante cerimônia de abertura do congresso nacional do Partido dos Trabalhadores, em Brasília
Publicado na Coluna de Carlos Brickmann
Como no futebol, há juízes para decidir cada lance. Como no futebol, a derrota pode derrubar o time. Como no futebol, há quem se rebele contra o juiz. Como no futebol, muita gente levou uma bolada. Mas não se trata de futebol: trata-se de um país e de seu futuro. Futuro? Como no futebol, cada um pensa no próprio futuro, e os outros que, digamos, se danem.O presidente Temer e o ex-presidente Lula buscam desmoralizar seus acusadores. Ataca-se o procurador-geral Janot, que denunciou Temer, e o Ministério Público, que, segundo Temer, não investigou procuradores cujo comportamento considera duvidoso. Ataca-se o juiz Moro, que Lula acusa de parcialidade, e procuradores da Lava Jato, porque fazem palestras pagas. Tanto Temer quanto Lula suspeitam que os acusadores tenham forçado delações “a la carte”, dando substanciais reduções de pena a quem atingisse determinado acusado. O embate nos tribunais mais parece uma guerra.
O juiz Sérgio Moro pode, a qualquer momento, emitir a sentença de Lula. A presidente nacional do PT, senadora Gleisi Hoffmann, diz que só é aceitável a sentença que o absolva integralmente. O presidente do PT do Rio, Washington Quaquá, defende “o confronto popular aberto nas ruas” se Lula for condenado. Temer acena com o êxito da política econômica (a inflação ficou abaixo da meta, as exportações cresceram) que, indica, só será mantida caso fique no cargo. E o Brasil? O Brasil é apenas um detalhe.
Dois lados, uma defesa
Temer e Lula são hoje adversários ferozes, mas sua defesa é a mesma: há uma conspiração dos inimigos contra eles, e não há provas de nada. Mas cada um tem um antídoto diferente para a peçonha dos adversários. Lula, a ameaça de convulsão social, com apoio do PT, de partidos como PSOL e PSTU, de centrais sindicais como a CUT; Temer, a blindagem parlamentar, já que é preciso que 342 deputados (em 513) autorizem o processo contra ele. Só que Lula já ameaçou colocar nas ruas “o exército de Stedile” (o MST) e não deu certo. E Temer, em seu duro discurso de ontem, apareceu na TV ao lado de políticos de menor expressão. Os caciques se pouparam.
É o que temos
Outra arma de Temer é a falta de um bom nome para sucedê-lo, caso seja afastado. Mesmo que surja alguém, será eleito por um Congresso em que o presidente do Senado, Eunício Oliveira, e o da Câmara, Rodrigo Maia, são investigados por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
Caso Temer seja afastado, Rodrigo Maia é o favorito para sucedê-lo
O Temer…
Um fato está intrigando os meios políticos: este Temer não é o Temer a que todos se acostumaram. Temer sempre foi discreto, afável, racional, cauteloso, frio e duro – foi quem assumiu com êxito a Secretaria de Segurança de São Paulo logo depois do massacre do Carandiru. O Temer presidente não tem como ser discreto. Mas anda ríspido, irritado, reagindo emocionalmente à pressão que sofre. O político cauteloso, que antes de falar “boa noite” pensava muito para não ser mal interpretado, referiu-se duas vezes aos russos como “soviéticos” – o que não são há 27 anos; e, em visita oficial à Noruega, confundiu o rei da Noruega com o da Suécia.
…que não é o Temer
O duro Temer levou um pito da primeira-ministra norueguesa sobre desmatamento na Amazônia e calou a boca. O sempre bem-informado Temer nem lembrou, ou nem sabia, que uma empresa controlada pelo Governo da Noruega está desmatando quase cinco mil hectares da floresta amazônica para extrair bauxita, o minério básico do alumínio; e que um país tão interessado no meio-ambiente talvez devesse repensar a poluente extração de petróleo no Mar do Norte e a autorização para a caça às baleias.
O cauteloso Temer ainda recebe Joesley Batista nos porões do Jaburu.
O dia da caça
Os procuradores da República elegem hoje três candidatos à Procuradoria-Geral, na sucessão de Janot. Mas o presidente Temer nomeia quem quiser, esteja ou não na lista tríplice. Uma escolha acertada pode fazer com que Janot se enfraqueça até deixar o cargo, em 17 de setembro. Temer acredita que, saindo Janot, se reduzam as pressões contra ele. Mas nem sempre é assim: o novo procurador-geral pode querer provar que não está lá para acochambrar, e que é tão duro quanto o antecessor.
Gravando lá e cá
O ex-ministro da Fazenda, Guido Mantega, reuniu a família para dizer que ninguém deve se preocupar com delações premiadas em que é citado. Informou que, durante todo seu período como ministro, gravou todas as conversas que manteve em seu gabinete. São oito anos de gravações. DO A.NUNES

José Nêumanne: Um vice para Temer

Foi menos difícil depor Collor e Dilma, que tinham vices, do que tirar Temer do poder

Presidente Michel Temer
Publicado no Estadão
Há semelhanças e dessemelhanças relevantes entre os processos de impeachment que depuseram os ex-presidentes Fernando Collor de Mello, em 1992, e Dilma Rousseff, em 2016, e a situação do desgoverno de Michel Temer. Este, mesmo parecendo moribundo ou zumbi, não inspira profecias de igual desfecho, ao menos por enquanto. Sem conhecê-las, entendê-las e enfrentá-las, por mais absurda que pareça a hipótese, resta esperar pela improvável demonstração de espírito público do chefe do Executivo, a renúncia, imitando, não Getúlio Vargas no suicídio, mas Jânio Quadros no abandono voluntário do melhor emprego da República.
Diferença fundamental nos dois exemplos anteriores é que tanto para Collor quanto para Dilma havia um substituto automático, um vice, a possibilidade de se agrupar em torno de um nome. Esta talvez seja, na atual conjuntura, a principal diferença do caso de agora em relação a ambos os anteriores. Com Temer já no exercício do poder presidencial, o Supremo Tribunal Federal (STF) chegou a decidir a dúvida específica de o então presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), poder, ou não, participar de uma fictícia “linha sucessória” do presidente pelo fato de responder a processos judiciais. A decisão final foi esdrúxula, como muitas outras adotadas recentemente pelo órgão supremo do Poder Judiciário: Renan foi autorizado a permanecer no comando da chamada Câmara Alta, que não tem dado demonstrações de muita altitude ultimamente. Mas foi retirado da chamada, mas inexistente, linha de sucessão na chefia do Executivo.
De fato, no presidencialismo mitigado, dito semiparlamentarista ou “de coalizão”, vigente conforme as normas da Constituição de 1988, só há um sucessor autorizado a assumir automaticamente a Presidência em estado de vacância: o vice-presidente. Já o era na democracia de 1946, quando Café Filho substituiu Vargas após o suicídio e João Goulart assumiu, depois de longa negociação, o posto abandonado por Jânio.
Com exceção do Partido dos Trabalhadores (PT), que então era, ou pretendia ser, infenso a pactos de governabilidade, houve, de fato, substituição consensual de Collor – deposto por impeachment de indiscutível legitimidade – pelo vice, Itamar Franco. O próprio PT, sob a batuta de Luiz Inácio Lula da Silva, que antes havia rejeitado votar em Tancredo Neves, do PMDB, para substituir o último general da ditadura, João Batista Figueiredo, apoiou a deposição no Congresso. Mas desautorizou sua militante Luiza Erundina de Souza, ex-prefeita de São Paulo, a assumir um ministério, a Secretaria de Administração, no mandato-tampão do ex-governador de Minas, forçando-a a sair do partido.
Não se pode dizer o mesmo do impeachment de Dilma, até hoje contestado como se tivesse resultado de uma intervenção fora dos parâmetros constitucionais para extinção do mandato. Onde lhe é autorizado protestar, como agora na visita de Michel Temer à Rússia e à Noruega e em shows de artistas populares de esquerda, este é xingado de “golpista” e ouve berros de “fora Temer”.
Esse comportamento inconsolável da militância esquerdista, expelida com Dilma das boquinhas do poder, chama a atenção para outra dessemelhança dos casos de Itamar e Temer. O mineiro nascido em mar baiano sempre se manteve longe do carcará sanguinolento, sendo, na prática, um desafeto do titular da chapa pela qual se elegeu e mercê da qual chegou ao poder maior depois do impeachment. Após assumir a chefia do Executivo, o ex-vice comportou-se de forma exemplar, nunca tendo herdado nenhuma suspeita de participação no esquema de corrupção operado pelo notório PC Farias. Afinal, ele fora, seja na campanha, seja na administração, um corpo completamente estranho à famigerada “república de Alagoas”, de tristíssima memória, marca registrada do desmantelo Collor.
Com essa autoridade moral, que reforçou ao afastar seu homem de confiança, Henrique Hargreaves, da chefia da Casa Civil, à qual este só voltaria após provar inocência, Itamar montou o time que fez o Plano Real, acabou com a inflação e apostou no futuro, criando a alternativa Fernando Henrique. Desta o PSDB se aproveitou para vencer Lula e o PT em duas eleições consecutivas e sem precisar de segundo turno.
Ao ler o relato acima, o leitor de posse das faculdades mentais, imparcial, impoluto e munido do mínimo de lógica perceberá que Temer é inteiramente diferente. Primeiramente, ele antes pertencia à quadrilha que assaltou os cofres republicanos nos 13 anos, 4 meses e 12 dias de desmazelo sob Lula e Dilma, chegando até a funcionar provisoriamente como coordenador político da cabeça da chapa que se reelegeu. Por causa disso lhe coube o desgaste do processo contra a chapa vitoriosa em 2014 no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que, aliás, o favoreceu num julgamento que só desmoralizou a já desmoralizada Justiça Eleitoral de antanho.
Portanto, o oxigênio que mantém o governo Temer respirando por aparelhos é não haver vice disponível para evitar a necessidade da solução constitucional da eleição indireta no Congresso, que é quase tão impopular quanto o ex-vice beneficiado. E aterroriza o tal do mercado, que acredita que se ele sair do governo, apesar de todas as evidências de seus passeios pelo Código Penal, será substituído por alguém capaz de jogar as conquistas econômicas no lixo, num ambiente infecto em que todos os Poderes da República padecem de absoluta falta de crédito.
Até agora Temer tem mantido seus parceiros de rapina no Executivo e seus sócios no Legislativo asseguram o terço de votos necessário para mantê-lo no poder, ao arrepio da lei criminal. Conta ainda com parte do Judiciário que se dispõe a interpretar a lei de acordo com as conveniências dos amigos, comprovando que cabeça de juiz pode surpreender tanto quanto bumbum de bebê. DO A.NUNES

Temer “rouba” o discurso de Lula?


Edição do Alerta Total – www.alertatotal.net
Por Jorge Serrão - serrao@alertatotal.net
Custa nada ficar esperto... A revisão, em segunda instância, de ua condenação imposta pelo juiz Sérgio Moro ao ex-tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, por crime de lavagem de dinheiro, já chama atenção para a hipótese de que uma eventual (quase certa) condenação a Luiz Inácio Lula da Silva também pode ser revista pelas turmas do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Um “perdão”, em tempo hábil, no TRF-4 pode permitir que Lula tenha condições legais de disputar a Presidência da República em 2018.
O advogado Luiz Flávio D’Urso foi conseguiu emplacar uma tese que, nas instâncias judiciais superiores, pode aliviar a barra de muito condenado graças às transações penais na Lava Jato. A lei 12.850 deixa claro que ninguém pode ser condenado com base apenas em declarações de agentes colaboradores. Ou seja, a 8ª turma do TRF-4 entendeu que a regra vigora, e que não valem as palavras de delatores premiados, por mais ilustres e poderosos que sejam. Assim, sem que haja provas objetivas para confirmar as afirmações, a condenação pode e deve ser revista. Na prática, a tal teoria do domínio do fato foi derrubada.
Enquanto a Lava Jato fica ameaçada no horizonte dos infindáveis recursos judiciais brasileiros, o Brasil assiste a um Presidente da República que já era, e começa a esfarelar em alta velocidade, embora prometa reagir e seguir em frente, alegando que as denúncias do Procurador-Geral da República são ficcionais. Michel Temer ainda aposta que conseguirá reunir maioria no plenário da Câmara dos Deputados para rejeitar as denúncias de Rodrigo Janot por corrupção passiva. Em agosto, a PGR promete apresentar nova denúncia contra o Presidente por crime de tentativa de obstrução judicial.
O risco temerário é que, na Comissão de Constituição e Justiça, apenas uns quatro dos 66 parlamentares se arriscam a defender Temer em público. Assim, Temer fica ainda mais na mão do chamado “baixo clero”. Os deputados menos famosos jogam na base governista até o ponto em que funciona o esquema nada franciscano do “é dando que se recebe”. Todos sabem que eventuais negociatas são monitoradas pela Polícia Federal e Cia limitada... Além disso, como já pensam na eleição de 2018, muitos podem “jogar para a galera” e mandar o marido da bela Marcela às favas.
Michel Temer tem um pepino gigante nas mãos: quem vai escolher para suceder o agora inimigo público Rodrigo Janot? Ontem, o atual Subrocurador-Geral Nicolau Dino foi o primeiro colocado (621 votos) na eleição promovida pela Associação Nacional dos Procuradores da República. A entidade é quem indica a lista tríplice que, desde 2003, baliza a escolha do chefe da PGR. Temer não deseja emplacar Dino – considerado “inimigo”. A cúpula do PMDB adoraria emplacar a segunda colocada na consulta: Raquel Dodge, que obteve 587 indicações. Mário Bonsaglia ficou em terceiro, com 564.
Quando sentou na cadeira tirada da Dilma, no ano passado, Temer só faltou jurar que indicaria o primeiro colocado na lista formada pelos Procuradores. Naquela época, Rodrigo Janot ainda não era considerado “inimigo real”. Agora, o jogo é outro. O mandato de Janot termina dia 17 de setembro. Temer tem até lá para indicar o escolhido, que ainda passará por uma sabatina no Senado, até a nomeação efetiva. A indefinição apenas vai agravar a agonia do Presidente que esfarela...
Mais apertadinho que Temer? Só Lula – que espera pela mão pesada de Sérgio Moro... 
Faz de conta
Malvados Favoritos

"Temer entra na História pela porta dos fundos", editorial de O Globo


Não que o advogado Michel Temer, vice de Dilma Rousseff - chapa nascida da aliança entre PMDB e PT, negociada em bases nada republicanas -, fosse de absoluta confiança. Mas, político rodado, presidente da Câmara dos Deputados três vezes e do próprio partido, Michel Temer assumiu no impeachment de Dilma com o trunfo de, com base em toda esta expertise de transitar com facilidade pelo Congresso, poder aprovar, em pouco menos de dois anos, as principais reformas de que o Brasil necessita para voltar a crescer. Conquistaria lugar de destaque na República.
Temer conseguiria, de fato, lugar na História, mas como o primeiro presidente em exercício a ser denunciado por corrupção. O passado e as práticas do PMDB - em especial, do grupo do presidente na Câmara, em conexão com o encarcerado Eduardo Cunha - foram mais fortes que possíveis intenções de Temer de abrilhantar a biografia. Por isso, manteve os esquemas do fisiologismo do toma lá dá cá, e, como se vê, não obstruiu o fluxo de dinheiro de propina pelos subterrâneos do partido. Ao contrário, transferiu o propinoduto para o porão do Palácio do Jaburu, já na condição de presidente da República.
Encaminhada na segunda à noite ao Supremo Tribunal pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, a denúncia de corrupção passiva se baseia em depoimento e gravação de conversa com o presidente feitos pelo empresário Joesley Batista, do grupo JBS. Mas não só. Joesley, segundo acordo de delação premiada assinado com a PGR, colaborou, ainda, em uma "operação controlada", nos termos da legislação, em que, além de gravações, foi feito vídeo da entrega de mala com R$ 500 mil ao deputado Rodrigo Loures (PMDB-PR), indicado por Temer ao empresário para tratar de "tudo", de qualquer assunto de interesse de Joesley.
Somadas, as provas sustentam uma denúncia sólida contra Temer: gravação do presidente indicando Loures para Joesley abordar temas subterrâneos, na falta do ex-ministro Geddel Vieira, sob investigação; Loures, também em gravação, dispondo-se a defender interesses de Joesley no Cade e na CVM; e o acerto de uma generosa mesada a Loures, em troca da ajuda na solução de uma pendência com a Petrobras sobre o preço do gás cobrado a uma termelétrica da JBS.
O quadro se fecha com um depoimento do executivo do JBS Ricardo Saud comprovando ser correta a evidência de que Loures recebia o dinheiro em nome de Temer. Os dois, como disse o executivo, teriam bela "aposentadoria" . Pois, paga ao longo de 25 a 30 anos, a propina chegaria a centenas de milhões.
O presidente decidiu rebater a acusação da PGR em pronunciamento, ontem à tarde, no Planalto, diante de uma plateia de aliados, com os quais espera contar na votação da denúncia, a ser enviada à Câmara pelo Supremo. Mas, em vez de responder a questões objetivas da acusação, partiu para o ataque a Janot. Para Temer, a PGR "reinventou o Código Penal", ao instituir a "denúncia por ilação". Mais: a delação de Joesley Batista foi negociada por um ex-procurador que trabalhara com o procurador-geral e, por este trabalho, teria ganhado muito dinheiro. Aproveitou para insinuar que Janot teria recebido parte do pagamento, mas disse que não faria a denúncia, porque, assim, repetiria a acusação da PGR contra ele.
É muito difícil que a aplicação do velho chavão - a melhor defesa é o ataque - funcione diante de tantos indícios e provas em sentido contrário. Para descredenciar a gravação feita por Joesley da conversa noturna no porão do Jaburu, Temer insistiu com o laudo feito por perito contratado por sua defesa, quando a Polícia Federal acabara de atestar como verdadeiro o áudio. As 294 paralisações da gravação, segundo a PF, não são intervenções fraudulentas, mas característica do gravador, que para quando ninguém está falando.
Ainda há mais acusações a caminho contra Temer. A de obstrução da Justiça foi reforçada com a elucidação, pela PF, de trechos que eram inaudíveis. A criação de obstáculos para a ação do Estado na repressão ao crime ficou configurada quando Joesley e Temer trataram da ajuda financeira a Eduardo Cunha e a Lúcio Funaro, operador financeiro de Cunha e de outros do PMDB.
Joesley fazia pagamentos periódicos a Cunha e Funaro, em troca do silêncio dos dois. Houve grande controvérsia em torno de algumas palavras, mas o trabalho feito nos laboratórios da PF reforça a acusação do procurador-geral de que Temer, naquela noite, estimulou o empresário a continuar com os pagamentos aos dois. Esta é uma passagem tóxica para Michel Temer.
Na segunda-feira, o presidente aproveitou solenidade no Planalto para dar um grito de guerra: "Nada nos destruirá, nem a mim, nem aos ministros" . Resta saber como. À noite, depois de formalizada a acusação, Temer se reuniu em Palácio com o ministro Moreira Franco, da Secretaria-Geral da Presidência; a advogada-geral da União, Grace Mendonça, e advogados que o defendem no STF. As tropas de Temer, porém, são mais numerosas.
Elas já devem estar fazendo intenso trabalho junto aos membros da Comissão de Constituição e Justiça, para onde a presidente do Supremo, Cármen Lúcia, enviará a denúncia. Conseguir que a CCJ rejeite o pedido - mesmo que ele siga de qualquer forma ao plenário - é importante para Temer. Deverá ser feito "o diabo", nos termos usados por Dilma Rousseff, na obtenção de votos na comissão. Caberá vigilância estreita sobre as transações que inevitavelmente transcorrerão na Câmara.
São conhecidas as manobras para trocas de deputados com assento na CCJ, para se garantirem resultados nas votações. Nesta hora, pesam os vínculos e compadrios construídos por Temer e seu grupo durante muito tempo de convívio no Congresso. A não ser que conte a impopularidade recorde do presidente. Mas ele jogará tudo para fazer morrer na Câmara a acusação, evitando que chegue aos 11 ministros do Supremo, Corte muito diferente do TSE.
O resto é zelar pelos trâmites constitucionais, sem manobras protelatórias, para se desatar o nó político-institucional, pelas regras legais. A economia ainda emite sinais positivos decorrentes do que pôde ser feito até o porão do Jaburu ser iluminado pela delação de Joesley. Mas seria um milagre o PIB se desconectar de uma crise que tem nome: Michel Miguel Elias Temer Lulia. Porém, importa agora é que as instituições decidam, essencial para manter a segurança jurídica, independentemente de qual será o desfecho.DO J.TOMAZ

Temer fala como se presidisse um país de bobos

Josias de Souza
No seu primeiro pronunciamento como presidente denunciado por corrupção, Michel Temer perdeu o último trunfo que lhe restava: a serenidade. Fora de si, deixou antever o que tem por dentro: raiva excessiva e razão escassa. Movido pelo excesso, atirou em Rodrigo Janot e acertou o próprio pé. Premido pela escassez, exagerou na meia verdade, privilegiando exatamente a metade que é mentirosa.
Temer estava irreconhecível. Perdeu a fita métrica que costumava trazer no lugar da língua. Expressando-se de forma desmedida, chamou a denúncia de “ficção”, uma “trama de novela”. Disse que Janot fez um “trabalho trôpego”. Temer deixou de mencionar que é ele quem fornecesse a matéria-prima que torna a realidade inacreditável e transforma o noticiário num novelão policial.
As explicações de Temer foram endereçadas aos deputados que compõem a milícia parlamentar que enterrará a denúncia. É gente que despreza o desejo da opinião pública de ver o presidente julgado no Supremo. Discursando para os seus apoiadores na Câmara, o presidente mandou às favas a lógica e a inteligência alheia.
“Os senhores sabem que eu fui denunciado por corrupção passiva”, declarou. “Notem, vou repetir a expressão: corrupção passiva. A esta altura da vida! Sem jamais ter recebido valores, nunca vi o dinheiro e não participei de acertos para cometer ilícitos. Onde estão as provas concretas de recebimento desses valores? Inexistem.” Falso.
Corta para o dia 7 de março, no porão do Jaburu. Ali, entre 22h31 e 23h16, Temer manteve com Joesley Batista uma conversa vadia. Grampeado pelo dono da JBS, entregou-se a um diálogo que a Polícia Federal recuperou.
Joesley: “Pra mim falar contigo qual é a melhor maneira… Porque eu vinha falando através do Geddel, através… Eu não vou lhe incomodar, evidente, se não for algo assim…”.
Temer: “As pessoas ficam… Sabe como é que é…”.
Joesley: “Eu sei disso, por isso é que…”.
Após um trecho ininteligível, Temer declara: “Um pouco”.
Joesley: “É o Rodrigo?”.
Temer: “O Rodrigo”.
Joesley: “Ah, então ótimo”.
Temer: “Pode passar por meio dele, viu? Da minha mais estrita confiança”,
O presidente referia-se ao ex-assessor Rodrigo Rocha Loures —aquele que, no mês seguinte, seria filmado recebendo de um executivo do grupo empresarial de Joesley a mala com R$ 500 mil em propinas.
Toda a negociação deflagrada no escurinho do Jaburu foi monitorada pela Polícia Federal. A investigação demonstrou que Loures participou das tratativas em nome de Temer. Preso, o preposto do presidente devolveu a mala antes que o dinheiro chegasse ao destinatário.
Temer voltou a fazer pose de perseguido: ''Exatamente neste momento em que nós estamos colocando o país nos trilhos é que somos somos vítima dessa infâmia de natureza política.”
Foi como se Temer declarasse: ''Eu aqui, fazendo o favor de presidir o país, e vem a Procuradoria, com sua vocação para estraga-festas, atrapalhar as minhas reformas jogando no ventilador algo tão irrelevante quanto uma denúncia por corrupção.'' Num de seus momentos mais temerários, Temer insinuou que foi Janot quem recebeu dinheiro de má origem, não ele (veja abaixo).
Ao atirar em Janot, acusando-o de inventar a “denúncia por ilação”, Temer acertou na Polícia Federal. O presidente sustentou que o áudio periciado com esmero é “prova ilícita”, totalmente “inválida para a Justiça.” Por quê? “Na pesquisa feita seriamente pela Polícia Federal, pelo seu instituto de criminalística, está dito que há cerca de 120 interrupções, não é? O que torna a prova inteiramente ilícita''. Lorota.
Os peritos da PF farejaram na gravação 294 “descontinuidades”. Nada a ver com fraude ou edição. São interrupções de 1,30 segundos, em média, provocadas pelo tipo de gravador usado por Joesley. O microfone do equipamento é acionado automaticamente pela voz. E pára de funcionar nos intervalos de silêncio.
O brasileiro desconfiado perde muito ao não acreditar na fábula que o presidente construiu para lhe servir de refúgio. A plateia tem sempre a sensação de estar perdendo alguma coisa com o seu ceticismo. A metafísica envolvida na narrativa presidencial é mais rica e divertida do que este materialismo chato em que corrupção é sempre, inapelavelmente, corrupção.
A teoria conspiratória de Temer é sempre mais criativa, cheia de intriga e perfídia. Tem todos os ingredientes de uma boa ficção. O único inconveniente é o convívio com um presidente que fala como se presidisse uma nação de bobos.

Segunda denúncia contra Temer virá em agosto

Josias de Souza
A Procuradoria-Geral da República sinalizou ao Supremo Tribunal Federal que a segunda denúncia contra Michel Temer só deve ser protocolada em agosto. Nela, o presidente será acusado do crime de obstrução de Justiça. O procurador-geral Rodrigo Janot sustentará que Temer avalizou a compra do silêncio de Eduardo Cunha pelo empresário Joesley Batista, da JBS.
Nesta terça-feira, ao se pronunciar sobre a primeira denúncia, em que é acusado de corrupção passiva, Temer falou sobre a suspeita que o vincula à operação para evitar a delação de Cunha. Contestou o trecho da gravação que servirá de matéria-prima para acusação. (assista abaixo).
Rodrigo Janot deixará a chefia do Ministério Público Federal em 17 de setembro. Portanto, a segunda denúncia contra Temer ainda trará a sua assinatura. O procurador-geral sustenta que suas convicções foram reforçadas pela perícia feita pela Polícia Federal na gravação do diálogo que Temer travou o delator Joesley Batista, da JBS, em 7 de março, no Palácio do Jaburu.
Vai abaixo a reprodução do trecho do audio que fundamentará a segunda denúncia:
Joesley: “Fiz o máximo que deu ali, zerei tudo, o … O que tinha de alguma pendência daqui para ali. Zerou, tal…”.
Temer: “Tudo”.
Joesley: Liquidou tudo e ele foi firme em cima, lá, veio, cobrou, tal, tal, tal. Eu pronto. Acelerei o passo e tirei da frente”.
A conversa prossegue. E o interlocutor noturno de Temer menciona novamente o nome de Cunha, hoje preso em Curitiba.
Joesley: “Estou de bem com Eduardo”.
Temer: “Muito bem”.
Joesley: “E…”.
Temer: “Tem que manter isso, viu?”.
Joesley: “Todo mês”.
Temer: “O Eduardo também, né?”.
Joesley: “Também”.
Temer: “É…”.
Joesley: “Eu estou segurando as pontas, estou indo”.
Temer: “É”.
Em meio às críticas que endereçou a Janot, Temer fez referência à tática do “fatiamento”. ''Ainda se fatiam as denúncias para provocar fatos semanais contra o governo”, disse o presidente. “Querem parar o país, parar o Congresso, num ato político com denúncias frágeis e precárias. Atingem a presidência da República.''
Em verdade, a Procuradoria alveja o presidente, não a Presidência. De resto, Temer fala em paralisia do Congresso porque sabe que sua reforma previdenciária subiu no telhado. Com nova denúncia em agosto, aí mesmo é que a proposta irá para as calendas gregas.
Hoje, o presidente molha a camisa para atrair os 172 deputados de que precisa para rejeitar as denúncias no plenário da Câmara. Já não desperdiça energias perseguindo os 308 votos que seriam necessários para aprovar a reforma da Previdência. Confirmando-se a segiunda denúncia e agosto, aí mesmo é que a reforma previdenciária subirá no telhado.

Estratégia de Temer é igual a dos Alcoólatras Anônimos

A esperança é ficar mais 24 horas no cargo, mais 24 horas com o apoio do PSDB, mais 24 horas sem uma denúncia...

Presidente Michel Temer
Sob intenso bombardeio, o presidente Michel Temer precisou adotar uma estratégia “Alcoólatras Anônimos”. Ou seja: um dia de cada vez. Na instituição, os dependentes tem como objetivo ficar 24 horas sem álcool e depois renovar esse compromisso a cada 24 horas. No caso do presidente, a ideia é ficar mais 24 horas no cargo, 24 horas sem uma denúncia grave, 24 horas sem perder uma votação no Congresso, 24 horas sem a ameaça do PSDB sair do governo e assim por diante…
Mesmo os mais fiéis assessores do presidente sabem que as estratégias de médio prazo estão sujeitas às reviravoltas diárias da frágil condição do presidente. Algumas batalhas importantes acontecerão em breve, a exemplo da votação da reforma trabalhista e da anuência ou não do Congresso à denúncia de Rodrigo Janot. Por enquanto, Temer vem superando os obstáculos que apareceram no caminho. O problema é que ninguém consegue enxergar o fim deles.DO RADAR

Denúncia contra Temer reforça divisão no PSDB

Grupo de parlamentares favorável ao desembarque do governo deve votar a favor de denúncia de Rodrigo Janot contra o presidente Michel Temer

REUNIÃO DA EXECUTIVA NACIONAL DO PSDB
A denúncia apresentada pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, contra o presidente Michel Temer (PMDB) ao Supremo Tribunal Federal (STF), na segunda-feira, reforçou o movimento de parte da bancada do PSDB na Câmara dos Deputados pelo desembarque do partido do governo. No último dia 12, a Executiva Nacional da legenda definiu a permanência na base de Temer, mas abriu a possibilidade de mudança com possíveis “fatos novos”.
Apesar do esforço do Palácio do Planalto para manter os tucanos, que comandam quatro ministérios, ao seu lado, o presidente não deverá ter o apoio em bloco da legenda na votação da admissibilidade de denúncia no plenário da Câmara. Para ser aprovada, a solicitação para a instauração do processo precisa do apoio de 342 dos 513 deputados da Casa. Se ficar admitida a acusação, após a aprovação do parecer, será autorizada a instauração do processo no Supremo.
Foram ouvidos 31 dos 46 integrantes da bancada do PSDB. Destes, quinze afirmaram que votarão pela admissibilidade da denúncia, sete contra e nove se disseram indecisos ou não quiseram opinar. Parte desse grupo prefere manter o posicionamento em sigilo por ora, mas muitos já falam abertamente.
“Vou votar favoravelmente. Não cabe à Câmara dos Deputados impedir a admissibilidade (da denúncia). O PSDB precisa de uma atitude independente em relação ao governo Temer”, afirmou o deputado Eduardo Barbosa (MG). Dos sete tucanos que integram a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), onde será realizada a primeira etapa do processo, pelo menos cinco tendem a votar contra o governo.

Maioria

O líder do PSDB na Câmara, deputado Ricardo Trípoli (SP), disse ter avisado a cúpula do partido de que vai consultar a bancada e votará com a maioria. A interlocutores, porém, ele sinalizou que não pretende articular nenhum movimento em defesa do Planalto.
Aliado do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, o deputado Silvio Torres (SP), secretário-geral da legenda, reconheceu que o ambiente mudou desde a reunião ampliada da Executiva que decidiu pela permanência no governo.

‘Questão de Tempo’

Em caráter reservado, até mesmo os mais conhecidos defensores de Temer na bancada declararam que o desembarque do partido da base do governo é uma “questão de tempo”. A mudança de discurso do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que passou a defender a renúncia de Temer, enfraqueceu o discurso dos tucanos mais alinhados com o Planalto. DA VEJA.COM