Hitler
recrutou crianças e adolescentes alemães para doutriná-los. Um livro
analisa os crimes de guerra que eles cometeram e como foram precursores
das crianças-soldado
A juventude sob Hitler não podia ser boa. De 1933 a 1945, os jovens alemães foram incorporados em massa à trituradora ideológica e militar do nazismo e muitos se tornaram autores dos crimes do regime. A cumplicidade genérica da juventude da Alemanha com seu Führer é indiscutível, mas também é verdade que esses meninos e meninas que ofereceram sua alma ao perverso ditador, seduzidos ou forçados, foram de alguma forma, e em maior ou menor grau, dependendo do caso, vítimas. Doutrinados até o indizível, coagidos, intimidados, despojados de sua infância e adolescência, arrancados de suas casas e escolas, muitas vezes entregues pelos próprios pais ao ogro da suástica, os jovens alemães foram usados pelos nazistas, que os tornaram sujeitos de um experimento social atroz, reservatório de suas ideias abomináveis e, em última instância, bucha de canhão para sua guerra com o mundo.
A juventude sob Hitler não podia ser boa. De 1933 a 1945, os jovens alemães foram incorporados em massa à trituradora ideológica e militar do nazismo e muitos se tornaram autores dos crimes do regime. A cumplicidade genérica da juventude da Alemanha com seu Führer é indiscutível, mas também é verdade que esses meninos e meninas que ofereceram sua alma ao perverso ditador, seduzidos ou forçados, foram de alguma forma, e em maior ou menor grau, dependendo do caso, vítimas. Doutrinados até o indizível, coagidos, intimidados, despojados de sua infância e adolescência, arrancados de suas casas e escolas, muitas vezes entregues pelos próprios pais ao ogro da suástica, os jovens alemães foram usados pelos nazistas, que os tornaram sujeitos de um experimento social atroz, reservatório de suas ideias abomináveis e, em última instância, bucha de canhão para sua guerra com o mundo.
A principal ferramenta usada pelos nazistas para se
apropriar dos jovens alemães e unificá-los em seu credo foi a Juventude
Hitlerista (JH), que recebeu o nome em 1926 a partir de formações
anteriores, inicialmente ligada às SA (unidades de choque do partido
nazista). Na JH serviram 9 de cada 10 jovens alemães. De tipo
paramilitar (com belos uniformes – de cor negra e mostarda – e insígnias
próprias), era destinada a meninos com idades entre 14 e 18 anos. Para
os menores, de 10 a 14 anos, havia um ramo infantil, o Deutsches
Jungvolk (DJ), que desembocava naturalmente na JH e cujos membros eram
chamados de pimpfe. Quanto às meninas, existia a seção feminina
da JH, a Liga das Meninas Alemãs, com seu próprio ramo para as meninas.
Todas usavam saia azul-marinho e uma camisa branca, muito à la mode, de acordo com o gosto nazista, e usavam tranças ou coques.
Uma das meninas mais famosas egressas da JH foi Irma Grese, a Bela Besta, a terrível guardiã de campos como Ravensbrück, Auschwitz
e Bergen-Belsen. A JH tornou-se a única organização juvenil da Alemanha
a partir de 1936, quando foram proibidas todas as outras. A filiação
passou a ser obrigatória por lei em 1939 para todos os adolescentes com
idade entre 10 e 18 anos. Da JH, que passou de 100.000 membros quando Hitler chegou ao poder
(1933) para dois milhões no fim de 1933 e 5,4 milhões em dezembro de
1936, se saía para ingressar no partido (nazista), na Frente Alemã do
Trabalho, nas tropas de assalto ou na SS (principal organização militar,
policial e de segurança do Reich), ou no serviço da Waffen-SS (corpo de
combate de elite da SS) e na Wehrmacht (Exército).
No início de 1939, 98,1% dos jovens alemães pertenciam à JH. Entre os
que escaparam de suas garras, com grande risco, porque havia pesadas
sanções (recorria-se a Heinrich Himmler e sua polícia e à SS para fazer
cumprir o serviço), figurava aquele que depois seria escritor e prêmio Nobel de Literatura,
Heinrich Böll, com 16 anos em 1933. No entanto, outro autor e também
prêmio Nobel, Günter Grass, fez um percurso clássico completo: pimpfe aos 10 anos, auxiliar antiaéreo aos 15 e artilheiro de carro de combate da Waffen-SS aos 17.
Nosso olhar se dirige a esses jovens frequentemente com uma
perturbadora ambivalência. Ficamos espantados e indignados com imagens
de jovens multidões ruidosas e entusiasmadas diante do líder, alinhadas
em ordem militar, desfilando com arrebatamento marcial, cantando com
endemoniada pureza diabólica (como na icônica e impressionante cena de Tomorrow Belongs To Me, do filme Cabaret);
os mais fanáticos, incorporados ao combate nas divisões mecanizadas de
elite ou na luta política e racial: a juventude que queima livros,
persegue e maltratada –e até assassina –os opositores e os judeus nas
ruas (ou nos campos de concentração), denuncia seus próprios vizinhos e
até mesmo seus pais para a Gestapo. Tudo isso indica que este foi um
conflito intergeracional. A outra face é a da foto (que foi capa da Life)
do soldado de 15 anos, enfiado num casaco muito grande, chorando como o
que é, um menino, depois de sua captura em 1945 pelos norte-americanos.
Ou a dos 20 soldadinhos condecorados com a Cruz de Ferro, um deles um
“pequeno herói” (como foi batizado pela propaganda) de 12 anos,
recebidos no bunker da chancelaria do Reich no dia 19 de março de 1945
por um Hitler já espectral, mas ainda capaz de enviá-los para a morte
mais absurda e inútil diante dos tanques russos depois de lhes dar um
beliscão na bochecha. “Não voltarão a ser livres pelo resto de suas
vidas”, profetizara em 1938 o grande flautista de Hamelin da Alemanha.
O historiador nascido na Alemanha, mas naturalizado canadense Michael H. Kater (Zittau, 1937), um especialista na cultura do Terceiro Reich, doutor em História e Sociologia pela Universidade de Heidelberg e professor da Universidade de York (Toronto, Canadá) acaba de publicar um livro imprescindível sobre a JH, organização sobre a qual girou especialmente o esforço dos nazistas para se aproveitar dessa geração alemã. Hitler Youth (Juventude hitleriana) é uma obra tão exaustiva quanto apaixonante e comovente que combina a investigação científica com o relato humano – explica que os acampamentos da JH, onde proliferava o sadismo, eram um mau lugar para molhar a cama. E instala em seu centro uma profunda reflexão moral.
“As organizações juvenis, como as Wandervögel, existiam na
Alemanha desde a era guilhermina e o início do século”, diz Kater, “elas
se voltaram mais para a direita, de acordo com o espectro político
geral; na última metade da República de Weimar (1925-1932), quando
Hitler estava em alta, membros de grupos de juventude nacionalista
simpatizavam secreta ou abertamente com o NSDAP, o partido nazista,
embora menos do que com a JH, que teve um início fraco e tardio. À
medida que os padrões democráticos foram derrubados, uma estrutura com
um Führer passou a ser aceitável entre a juventude alemã, e isso
facilitou para que todos os grupos juvenis fossem incorporados à JH.
Isso aconteceu em etapas. Aqueles que resistiram foram forçados a
fazê-lo em 1935”. Uma das chaves do sucesso da Juventude Hitlerista é
que ela se apresentava como excitante, moderna e progressista.
Que conceito Hitler tinha da juventude? “No começo, realmente nenhum”, responde o historiador. “Não estava interessado nos jovens porque não podiam votar. Eventualmente Hitler se convenceu de que criar jovens seguidores não era uma má ideia: um movimento milenar deveria ter uma retaguarda”.
Ante a imagem do jovem soldado da Life e a de dois
meninos do bunker de Hitler, Michael H. Kater deixa claro seus
sentimentos: “Pessoalmente sinto uma imensa compaixão por eles. Para
mim, nesse tempo, eram obviamente meninos inocentes que tinham sido
explorados por políticos fascistas criminosos”.
Com a guerra, recorreu-se aos membros da JH para ajudarem
após os bombardeios das cidades alemãs, o que obrigou meninos de 12, 13 e
14 anos a terem experiências espantosas, desenterrando famílias
inteiras carbonizadas. Pior ainda foi o recrutamento para as defesas
antiaéreas, em que 200.000 meninos e meninas da JH prestaram serviço
como pessoal auxiliar de artilharia (Flakhelfer). Saiam das escolas diretamente aos canhões, e muitos sofriam crises nervosas devido ao medo.
Junto a isso, afirma Kater, está o fato de que o doutrinamento da Juventude Hitleriana desempenhou um importante papel nos crimes de guerra da Wehrmacht e das SS, quando esses jovens ingressaram em suas fileiras convertidos em soldados políticos. "É possível identificar dois importantes ingredientes da formação ideológica da JH que os jovens transferiram para a Wehrmacht e as SS: um é a crença de que a Alemanha deveria dominar outras partes do mundo, e o outro, a hierarquia racial, que colocava os alemães arianos no cume e os judeus na parte mais baixa". Um hábito sinistro dos jovens recrutas provenientes da JH era o "turismo de execução": assistir aos assassinatos coletivos de judeus sobre o terreno.
A JH foi realmente útil militarmente? Kater responde que foi fundamental para que os nazistas pudessem colocar tantas forças no campo de batalha. "Tinham recebido treinamento paramilitar, inclusive antes de março de 1935, quando se introduziu o recrutamento geral, e de setembro de 1939 (início da II Guerra Mundial). É preciso lembrar que o selo distintivo da socialização da JH foi a militarização, com os acampamentos, as marchas e os jogos de guerra". A JH, inclusive, tinha áreas especializadas como a naval, a equestre e a de pilotos de planadores, cujos integrantes eram cobiçados por Hermann Göering. "Ao passar a fazer parte das forças regulares da Wehrmacht ou das SS, os jovens da JH se misturavam facilmente em suas fileiras e reforçavam sua agressividade". Houve inclusive uma divisão de elite vinculada à JH, a 12ª Divisão Panzer Hitlerjugend, formada em 1943 com 16.000 membros da JH nascidos em 1926. "Eram combatentes nazistas particularmente fanáticos, tendo sido socializados sem problemas desde os campos da JH até as casernas das SS". A JH cometeu crimes de guerra. Também houve membros da organização no supervalorizado Werwolf, a guerrilha nazista que enfrentou a ocupação aliada.
O historiador concorda que os meninos da JH com bazucas
Panzerfaust tão habituais ao final da guerra como membros do Volkssturm,
a milícia popular de último recurso, eram claros precedentes dos
modernos meninos soldados. “Desde cedo. No grande conflito prévio, a I
Guerra Mundial, o Exército alemão foi muito cuidadoso em não admitir
recrutas com menos de 18 anos --por exemplo, o próprio Heinrich
Himmler--, inclusive apesar de alguns menores terem entrado furtivamente
no exército imperial (como Ernst Jünger). Mas o fenômeno dos meninos
soldados é uma marca das últimas fases desesperadas da II Guerra
Mundial". Kater aponta que com os recrutas da JH enviados para os Panzer
em 1943 e 1944 não se compartilhava cigarros como com os soldados
adultos, mas sim... doces.
Responsabilidade e culpa estão no núcleo do livro de Kater,
que, além de ser sobre história, é um livro sobre moral, e inclusive
sobre juízo moral. "Qualquer um que escreva sobre a JH tem de se ocupar
desses temas. É um assunto muito delicado, e responder de maneira
satisfatória a todas às perguntas que surgem, impossível". Ser de origem
alemã deve complicar as coisas. "O fato de ter nascido na Alemanha e de
ter estado, em 1945, a apenas dois anos de ser incorporado à JH
provavelmente me faz ser especialmente sensível ao tema. Me considero um
democrata liberal de esquerda, e hoje tremo ante o que teria me
aguardado como membro da JH se a guerra tivesse durado o suficiente.
Nascido em 1937, me mudei para o Canadá em 1953 e me converti em cidadão
canadense, deixando para trás de propósito minha nacionalidade alemã.
Graças a Deus o Canadá é uma terra de tolerância e integração. Não
existe Marine Le Pen aqui, nem Trump, nem NSDAP”.
Percebe-se no livro uma tensão entre a visão do historiador
--e seu impecável exame dos pecados das Juventudes Hitlerianas-- e a
compaixão ante determinados casos dessa juventude abreviada. Qual é a
avaliação final de Kater? Vítimas e perpetradores? "Sim, ambas as
coisas. É preciso diferenciar entre adolescentes suficientemente mais
velhos para aceitar responsabilidade (e inclusive culpa) por certas
atitudes e ações, e meninos que em um tribunal de justiça, inclusive em
um nazista, deveriam ter sido considerados inocentes. Obviamente, essas
duas categorias sempre se sobrepõem, e quem pode dizer onde estão os
limites claros?”.
A JH não teve muita sorte --se é possível se dizer assim-- com seus dois líderes: Von Schirach (julgado en Nuremberg) e Artur Axmann. “Ambos foram personagens impessoais na maquina nazista e intercambiáveis no que diz respeito à JH. Nenhum tinha carisma, eram meros funcionários. Schirach, não muito brilhante, era particularmente vazio, mas com enormes pretensões, mais culturais do que políticas. Axmann ao menos havia lutado na guerra, na frente do Leste, onde foi gravemente ferido e teve o braço direito amputado". O líder das Juventudes Hitlerianas pediu a seus rapazes e moças que defendessem Berlim até o fim: mantiveram abertas as pontes sobre o rio Havel para que escapassem os faisões dourados nazistas, os hierarcas, entre eles o próprios Axmann.
Nem toda juventude alemã seguiu Hitler. Houve dissidentes.
Individuais e em grupo. Como os Jovens do Swing, atraídos pelo jazz
norte-americano, as gangues (era difícil ser rebelde sem causa na
Alemanha nazista) e os integrantes do grupo de resistência da Rosa
Branca.
O historiador aborda em profundidade um tema característico da JH: o gênero. “Sempre houve no partido nazista duas tendências, uma que queria que as meninas e mulheres fossem colocadas em massa para trabalhar, especialmente em tempo de guerra, e a outra que esperava que se dedicassem a ser amas do lar e paridoras de nazistas. Hitler pertencia ao segundo grupo. Albert Speer e Joseph Goebbels, ao primeiro. Em última instância, Hitler ganhou. Inclusive as mulheres nazistas que se revoltaram contra isso foram rapidamente silenciadas. Assim como as feministas na JH. A ala feminina, a BDM --cuja saída militar poderia ser a de ajudantes nos distintos ramos das Forças Armadas--, tinha que obedecer sempre aos membros masculinos, inclusive as líderes”.
O assunto do sexo é bastante sinistro. “Apesar da ideologia oficial que afirmava que as mulheres deveriam ser honradas e que o sexo era só um catalizador necessário para a reprodução eugênica, os nazistas (homens) se aproveitavam de suas posições hierárquicas para explorar sexualmente meninas e mulheres. Na JH havia jovens (com energia e libido alta) muitas vezes bonitos (uma boa isca para a luxuria) misturados com uma estrutura autoritária, onde sempre havia alguém que podia mandar e outro que não estava autorizado a dizer que não, a promiscuidade era muito alta". De fato, o acrônimo da Liga das Meninas Alemãs, BDM, passou a ser lido como Bund Deutscher Matrazen (liga de colchões alemães) ou Bubi Drück Mich (vamos rapaz, me aperte forte).
Qual é o legado da JH? “Depois da guerra, praticamente todo
mundo havia feito parte delas e podiam se sentir envergonhados ou
culpados, então não se falava do tema. Os de ultradireita são uma
exceção, claro".
DO EL PAIS
O historiador nascido na Alemanha, mas naturalizado canadense Michael H. Kater (Zittau, 1937), um especialista na cultura do Terceiro Reich, doutor em História e Sociologia pela Universidade de Heidelberg e professor da Universidade de York (Toronto, Canadá) acaba de publicar um livro imprescindível sobre a JH, organização sobre a qual girou especialmente o esforço dos nazistas para se aproveitar dessa geração alemã. Hitler Youth (Juventude hitleriana) é uma obra tão exaustiva quanto apaixonante e comovente que combina a investigação científica com o relato humano – explica que os acampamentos da JH, onde proliferava o sadismo, eram um mau lugar para molhar a cama. E instala em seu centro uma profunda reflexão moral.
Que conceito Hitler tinha da juventude? “No começo, realmente nenhum”, responde o historiador. “Não estava interessado nos jovens porque não podiam votar. Eventualmente Hitler se convenceu de que criar jovens seguidores não era uma má ideia: um movimento milenar deveria ter uma retaguarda”.
Junto a isso, afirma Kater, está o fato de que o doutrinamento da Juventude Hitleriana desempenhou um importante papel nos crimes de guerra da Wehrmacht e das SS, quando esses jovens ingressaram em suas fileiras convertidos em soldados políticos. "É possível identificar dois importantes ingredientes da formação ideológica da JH que os jovens transferiram para a Wehrmacht e as SS: um é a crença de que a Alemanha deveria dominar outras partes do mundo, e o outro, a hierarquia racial, que colocava os alemães arianos no cume e os judeus na parte mais baixa". Um hábito sinistro dos jovens recrutas provenientes da JH era o "turismo de execução": assistir aos assassinatos coletivos de judeus sobre o terreno.
A JH foi realmente útil militarmente? Kater responde que foi fundamental para que os nazistas pudessem colocar tantas forças no campo de batalha. "Tinham recebido treinamento paramilitar, inclusive antes de março de 1935, quando se introduziu o recrutamento geral, e de setembro de 1939 (início da II Guerra Mundial). É preciso lembrar que o selo distintivo da socialização da JH foi a militarização, com os acampamentos, as marchas e os jogos de guerra". A JH, inclusive, tinha áreas especializadas como a naval, a equestre e a de pilotos de planadores, cujos integrantes eram cobiçados por Hermann Göering. "Ao passar a fazer parte das forças regulares da Wehrmacht ou das SS, os jovens da JH se misturavam facilmente em suas fileiras e reforçavam sua agressividade". Houve inclusive uma divisão de elite vinculada à JH, a 12ª Divisão Panzer Hitlerjugend, formada em 1943 com 16.000 membros da JH nascidos em 1926. "Eram combatentes nazistas particularmente fanáticos, tendo sido socializados sem problemas desde os campos da JH até as casernas das SS". A JH cometeu crimes de guerra. Também houve membros da organização no supervalorizado Werwolf, a guerrilha nazista que enfrentou a ocupação aliada.
A JH não teve muita sorte --se é possível se dizer assim-- com seus dois líderes: Von Schirach (julgado en Nuremberg) e Artur Axmann. “Ambos foram personagens impessoais na maquina nazista e intercambiáveis no que diz respeito à JH. Nenhum tinha carisma, eram meros funcionários. Schirach, não muito brilhante, era particularmente vazio, mas com enormes pretensões, mais culturais do que políticas. Axmann ao menos havia lutado na guerra, na frente do Leste, onde foi gravemente ferido e teve o braço direito amputado". O líder das Juventudes Hitlerianas pediu a seus rapazes e moças que defendessem Berlim até o fim: mantiveram abertas as pontes sobre o rio Havel para que escapassem os faisões dourados nazistas, os hierarcas, entre eles o próprios Axmann.
O historiador aborda em profundidade um tema característico da JH: o gênero. “Sempre houve no partido nazista duas tendências, uma que queria que as meninas e mulheres fossem colocadas em massa para trabalhar, especialmente em tempo de guerra, e a outra que esperava que se dedicassem a ser amas do lar e paridoras de nazistas. Hitler pertencia ao segundo grupo. Albert Speer e Joseph Goebbels, ao primeiro. Em última instância, Hitler ganhou. Inclusive as mulheres nazistas que se revoltaram contra isso foram rapidamente silenciadas. Assim como as feministas na JH. A ala feminina, a BDM --cuja saída militar poderia ser a de ajudantes nos distintos ramos das Forças Armadas--, tinha que obedecer sempre aos membros masculinos, inclusive as líderes”.
O assunto do sexo é bastante sinistro. “Apesar da ideologia oficial que afirmava que as mulheres deveriam ser honradas e que o sexo era só um catalizador necessário para a reprodução eugênica, os nazistas (homens) se aproveitavam de suas posições hierárquicas para explorar sexualmente meninas e mulheres. Na JH havia jovens (com energia e libido alta) muitas vezes bonitos (uma boa isca para a luxuria) misturados com uma estrutura autoritária, onde sempre havia alguém que podia mandar e outro que não estava autorizado a dizer que não, a promiscuidade era muito alta". De fato, o acrônimo da Liga das Meninas Alemãs, BDM, passou a ser lido como Bund Deutscher Matrazen (liga de colchões alemães) ou Bubi Drück Mich (vamos rapaz, me aperte forte).
DO EL PAIS