Felipe Recondo, Mariângela Gallucci, Eduardo Bresciani e Ricardo Brito, de O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA - No último ato do escândalo do mensalão, o
Supremo Tribunal Federal (STF) condenou nesta segunda-feira, por 6 a 4,
os operadores do esquema pela formação de uma quadrilha que atuou no
governo e foi comandada pelo ex-chefe da Casa Civil José Dirceu. Ele
sofreu condenação por chefiar o esquema, auxiliado na cadeia de comando
pelo ex-presidente do PT José Genoino, pelo ex-tesoureiro do partido
Delúbio Soares e pelo publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza.
Sete anos depois das primeiras denúncias, o STF desfechou o escândalo
com 25 réus condenados e julgou que a gestão do ex-presidente Luiz
Inácio da Silva comprou votos no Congresso para a aprovação de projetos
de interesse da administração federal. De acordo com o ministro Celso de
Mello, decano do tribunal, "um dos episódios mais vergonhosos da
história política do País", operado por "homens que desconhecem a
República, pessoas que ultrajaram as suas instituições e que, atraídos
por uma perversa atração do controle criminoso do poder, vilipendiaram
os signos do Estado Democrático de Direito e desonraram com seus gestos
ilícitos e ações marginais a ideia que consignam o republicanismo na
nossa Constituição".
Um grupo que reuniu 11 réus no total para a prática de crimes de
lavagem de dinheiro, contra a administração pública - peculato e
corrupção - e contra o sistema financeiro - gestão fraudulenta de banco.
"Tenho, para mim, que, neste perfil, reside a verdadeira natureza dos
membros dessa quadrilha, que, em certo momento histórico de nosso
processo político, ambicionou tomar o poder, a constituição e as leis do
País em suas próprias mãos. Isso não pode ser tolerado", afirmou Mello.
"Ninguém tem legitimidade para transgredir as leis e a Constituição de
nosso país. Ninguém está acima da autoridade do ordenamento jurídico do
estado", continuou.
No entendimento do STF, o desvio de recursos públicos, os empréstimos
bancários fraudados, a lavagem desse dinheiro e a distribuição para
deputados, tudo foi montado para angariar apoio ao governo Lula e
ampliar o poder do PT. Na sessão desta segunda-feira, o Supremo julgou a
última fatia do processo. Condenou Dirceu e outros dez réus por
integrar o que o decano do STF classificou como "uma sociedade de
delinquentes". "Formou-se na cúpula do poder, à margem da lei e ao
arrepio do direito, um estranho e pernicioso sodalício (sociedade de
pessoas que vivem em comum), constituído por dirigentes unidos por um
comum desígnio, um vínculo associativo estável que buscava eficácia ao
objetivo espúrio por eles estabelecidos: cometer crimes, qualquer tipo
de crime, agindo nos subterrâneos do poder como conspiradores, para,
assim, vulnerar, transgredir, lesionar a paz pública", afirmou Mello.
O grupo foi integrado por Dirceu, Delúbio, Genoino, Valério,
dirigentes do Banco Rural e das agências de publicidade que ajudaram a
capitalizar o mensalão. Votaram pela condenação dos réus pelo crime de
formação de quadrilha os ministros Joaquim Barbosa, Luiz Fux, Gilmar
Mendes, Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e Carlos Ayres Britto
(presidente). "No caso, houve a formação de uma quadrilha das mais
complexas, envolvendo, na situação concreta, o núcleo dito político, o
núcleo financeiro e o núcleo operacional", afirmou Marco Aurélio Mello.
"Mostraram-se os integrantes em número de 13. É sintomático o número",
acrescentou o ministro, lembrando o número do PT, mas ignorando que dois
dos 13 réus foram absolvidos. Conforme a maioria dos ministros, o
esquema envolvia divisão de tarefas entre cada um dos núcleos,
pressupunha a união estável entre os réus para a prática de crimes que
atentaram contra a paz pública. "Havia um projeto delinquencial de
natureza política", afirmou Fux. "Esse projeto delinquencial foi
assentado aqui pelo plenário como existente. Todos sabiam o que estavam
fazendo. Todos foram condenados por isso", disse.
Quatro integrantes da Corte não julgaram que o grupo constituiu uma
quadrilha. Para os ministros Ricardo Lewandowski, Rosa Weber, Cármen
Lúcia e Dias Toffoli, os réus não se juntaram com o fim de integrar um
grupo destinado à prática indeterminada de crimes. A partir de agora
relator do processo, ministro Joaquim Barbosa, começa a revelar as penas
que defende que sejam impostas a cada um dos réus. Deve começar pelo
ministro da Casa Civil. Barbosa já adiantou que aqueles que estavam no
topo da cadeia de comando do esquema terão tratamento mais severo.
Somente depois de todo o julgamento, os ministros discutirão se os
condenados começam imediatamente a cumprir as penas, como defendeu o
procurador-geral da República, Roberto Gurgel, ou se aguardam em
liberdade o trânsito em julgado do processo, o que deve ocorrer apenas
em 2013.