sábado, 26 de agosto de 2017

'Seria muito triste' se Supremo alterasse regra sobre prisão em 2ª instância, diz Moro

Juiz afirma que medida 'não viola a presunção de inocência'. Para o magistrado, 'é essencial que essa regra geral permaneça'.

O juiz Sérgio Moro disse em evento em São Paulo neste sábado (26) que seria "muito triste" se o Supremo Tribunal Federal (STF) revisse a decisão de autorizar a prisão após condenação em 2ª instância.
"Seria, com todo respeito ao Supremo Tribunal Federal, seria muito triste que a meu ver a principal reforma geral da lei processual nos últimos anos fosse alterada por uma decisão do supremo", afirmou. "Essa foi a mudança fundamental nos nossos últimos anos no que se refere ao processo penal."
O Supremo Tribunal Federal decidiu autorizar a prisão após condenação em 2ª instância em fevereiro do ano passado. Na ocasião, o placar foi de 7 a 4. Essa interpretação levou para a cadeia criminosos que conseguiam adiar por anos a execução da pena através de recursos aos tribunais superiores, como o ex-senador Luiz Estevão.
Em outubro, a Corte voltou a analisar o tema e placar foi mais apertado: 6 a 5 a favor da prisão.
Nesta semana, o ministro Gilmar Mendes, um dos que votaram a favor nas duas ocasiões, concedeu habeas corpus para soltar um homem preso após condenação em segunda instância e enfatizou que deve mudar seu entendimento para garantir que os acusados possam aguardar resposta do Superior Tribunal de Justiça (STJ), chamada de terceira instância, antes da prisão.
A decisão de Gilmar nesta semana foi monocrática, o que significa que ele tomou a decisão sozinho. Para Moro, é prematuro dizer que o STF vai rever o posicionamento enquanto não houver uma decisão do colegiado da Corte. Na última quarta, o juiz mandou prender o empresário Márcio Bonilho e o aposentado Waldomiro de Oliveira, apontado pelo Ministério Público Federal (MPF) como "laranja" do doleiro Alberto Youssef.
"Vejo com grande preocupação algumas discussões atuais do Supremo rever esse precedente", afirmou Moro durante discurso no 1° Congresso Brasileiro da Escola de Altos Estudos Criminais, realizado na Zona Sul da capital paulista. "É essencial que essa regra geral permaneça", completa.

'Não existe propina grátis'

O juiz também disse que, em situações de "corrupção sistêmica", o pagamento de propina a um agente público não resulta, necessariamente, em uma "contrapartida específica", mas em uma compra de influência para ser aproveitada no futuro. Por isso, nem sempre é necessário encontrar um "ato de ofício" para provar a corrupção.
"Não é que não existe uma contrapartida. Como não existe almoço grátis, não existe propina grátis, sempre se espera alguma coisa em troca", afirmou o juiz responsável pela Operação Lava Jato em Curitiba.
Moro citou o caso de dois diretores da Petrobras que fizeram acordos de cooperação e, em seus depoimentos, disseram que o pagamento de propina na empresa era “regra do jogo”.
“Nesses casos, não necessariamente é uma contrapartida específica, muitas vezes é indeterminada, se compra a influência do agente público e se espera que seja usada em benefício do pagador de propina assim quando as oportunidades surgirem”, disse o juiz.
Moro relembrou ainda o caso do julgamento de Fernando Collor, e disse que houve “uma discussão profunda sobre a necessidade ou não de prova, da prática de um ato de ofício, para a configuração de um crime de corrupção”. Ao fim, o Supremo entendeu que Collor deveria ser absolvido do crime de corrupção.
O juiz argumentou que, nos casos de “corrupção sistêmica, o que se tem é uma compra de influência do agente público segundo oportunidades que podem surgir no futuro, ou seja, se paga para ter uma boa relação”, disse Moro. “Não é necessário que haja uma prova da individualização desse ato de oficio”, afirmou o juiz.
O juiz Sérgio Moro participa do 1° Congresso Brasileiro da Escola de Altos Estudos. O tema de sua palestra foi "Questões controvertidas sobre corrupção e lavagem de dinheiro". O evento também conta com a presença do procurador da República Deltan Dallagnol, que falará às 14h. Ele irá palestrar sobre " O combate à corrupção e à impunidade".
Juiz Sérgio Moro participa de evento em São Paulo neste sábado (26) (Foto: Reprodução/GloboNews)
Juiz Sérgio Moro participa de evento em São Paulo neste sábado (26) (Foto: Reprodução/GloboNews)
Por GloboNews, São Paulo

Juiz Bretas, o rabo, abanou Gilmar, o cachorro

Josias de Souza
A desforra veio mais cedo que se imaginava. Dias atrás, o ministro Gilmar Mendes abespinhou-se com o juiz Marcelo Bretas. Chamou de “atípico” o fato de o magistrado expedir nova ordem de prisão contra detentos que ele, com uma canetada suprema, mandara soltar horas antes. ''Em geral, é o cachorro que abana o rabo, não o rabo que abana o cachorro'', rosnou. Nesta sexta-feira, Bretas, o rabo, abanou acintosamente Gilmar, o cachorro.
Responsável pela Lava Jato no Rio de Janeiro, Bretas ordenou o reencarceramento de Rogério Onofre, outro libertado por Gilmar. O magistrado agiu com método. O encrencado presidira o departamento que deveria fiscalizar empresas de ônibus. É acusado de receber R$ 44 milhões em propinas. Sua libertação fez saltar dos autos um áudio tóxico. Nele, a voz do preso que Gilmar devolveu ao meio-fio ameaça dois clepto-empresários que lhe deviam propinas: “Vocês não estão acreditando, rapaz, na sorte. Vocês ainda não morreram porque eu quero receber, mermão.”
Acionado pela Procuradoria, Bretas enviou o áudio para Gilmar. Alertou para a gravidade da encrenca. E indagou quais são os limites da sua ação como juiz de primenta instância. Bingo! Gilmar miou. Em despacho endereçado a Bretas, o ministro rendeu homenagens ao obvio. Reconhecer que a bola estava com a Vara do Rio, não com o Supremo. Até a madrugada deste sábado, Onofre era tratado como foragido. Não foi encontrado no domicílio onde Gilmar ordenara que ficasse. Seus advogados asseguravam que ele se entregaria.
No atual estágio, Gilmar frequenta a controvérsia em posição análoga à dos cachorros de antigamente. Eles gostavam de correr atrás de carros. Perseguiam os veículos por algum tempo. Passavam a impressão de que iriam trucidá-los. Mas logo desistiam. Por mal dos pecados, Gilmar não é de desistir. Deve voltar à carga. O prolongamento dos latidos revigora-lhe a alma.

Temer confunde a vida pública com a privada

Josias de Souza

Alguma coisa subiu à cabeça de Michel Temer durante uma entrevista que concedeu ao SBT. Questionado sobre seu hábito de promover encontros noturnos no Palácio do Jaburu, o presidente declarou: ''Eu converso com quem eu quiser, na hora que eu achar mais oportuna e onde eu quiser.''
De duas, uma: ou Temer recebeu o espírito do ditador de alguma republiqueta africana ou decidiu transformar o palácio residencial numa gafieira, onde se dança até altas horas, em ambiene de penumbra. Seja qual for a hipótese, o tom adotado por Temer não é o que se espera de um presidente da República.
Temer é um funcionário público. Afora o salário, desfruta de todas as comodidades que o contribuinte pode pagar: cama, comida, roupa lavada, segurança, carro com motorista e avião no hangar. A lei obriga que seus encontros sejam registrados na agenda. E os bons costumes recomendam evitar conversas vadias como a que manteve com o delator Joesley Batista. Se quiser fazer da vida pública uma continuação da privada —com trocadilho— Temer dispõe de uma ótima saída. Pode renunciar. Fará muita gente feliz. E poderá falar com quem quiser, na hora que julgar conveniente, na gafieira de sua preferência.