domingo, 21 de outubro de 2018
Artigo de Leonardo Faccioni, via Blog do Puggina:
É inacreditável que uma cópia exata da narrativa utilizada nos
Estados Unidos para deslegitimar o resultado inconveniente das urnas e
impedir o eleito de governar conseguiu o domínio completo da pauta a uma
semana da eleição brasileira.
"Inacreditável", claro, é uma hipérbole. A serpente argumentativa há
muito vinha sendo chocada. A histeria sobre "notícias falsas", com mira
conveniente apenas nas imprecisões ou nas bobagens inócuas dos notórios
"tiozões do Zapzap", cumpria à perfeição a função de espantalho para que
os donos da opinião pública justificassem sua impotência.
É como se a realidade dos últimos anos -- a corrupção, a insegurança,
a anomia cabal -- fosse de uma insignificância atroz, e o populacho
vivesse em um mundo paralelo de notícias mirabolantes e credulidade
absoluta em linhas de texto tecladas no celular.
Os desapossados senhores da opinião pública imaginam o eleitorado à
sua imagem e semelhança, mas invertido como em um espelho: os que vivem
do consumo exclusivo das obsessões lúbricas da universidade e da
imprensa pensam que o seu Zé da Padaria, o Chicão da linha de produção e
a cabeleireira Wanda, todos com dinheiro contando até o fim do mês e
sobreviventes do quinto ou sexto assalto, pudessem se apartar da
realidade no mesmo grau dos doutores da lei que vivem de honorários
criminosos; dos parlamentares encastelados na Ilha da Fantasia; dos
jornalistas que recebem na Pessoa Jurídica e pagam por fora o
décimo-terceiro do segurança da babá.
Há mais de ano os editoriais autorizados vociferam: tudo o que
compromete o consenso social democrata do Projacquistão é "fake news", e
o fato mesmo de o Projacquistão, pela primeira vez, não conseguir
pautar uma eleição torna a deliberação eleitoral ilegítima.
Quem quer que tenha experiência de campo em disputas eleitorais
contra a extrema-esquerda (pode ser de eleição de DCE a corrida de
prefeitura de interior: a dinâmica não muda em essência, apenas em
proporção) conhece o talento petistóide para a desinformação e para a
calúnia. Foram sempre especialistas em incinerar reputações de
adversários na base da farsa, do "smearing", da boataria
sensacionalista. Mestres do ofício décadas antes das mídias sociais,
fizeram-se pioneiros na manipulação também destas: até hoje a campanha
de Dilma Rousseff responde pelo uso de robôs digitais e financiamento
ilícito para mídias subordinadas.
De repente, a dona Marocas da Quitanda compartilhando nota do site
RepúblicaDeValparaisoPontoCom que imputa a Haddad a "distribuição" do
KitGay (que existiu tal e qual noticiado, mas - oh!, que radical
injustiça! - acabou parcialmente abortado sob pressão congressual
posterior ás denúncias) é vicio insanável, que clama ao TSE por anulação
de eleições presidenciais.
O partido que está sob fortes suspeitas de receber aportes
milionários de ditadores estrangeiros (a quem o dinheiro público
brasileiro financiou durante seu governo) inverte magicamente a
acusação, sem uma prova sequer, para dizer que seu adversário abusa de
poder econômico ao promover correntes de WhatsApp não vistas, até hoje,
por ninguém.
Os critérios a que o petismo desesperado se agarrou de uma semana
para cá tornariam retroativamente ilegítimas todas as vitórias
eleitorais do partido, desde o primeiro grêmio estudantil na biografia
do Zé Dirceu.
Essa hipocrisia cínica é revoltante e odiosa, mas não prosperará. Vão
perder, e vão perder feio - como lhes é merecido. O chato será aguentar
durante anos o novo mimimi dos mesmos que enchem os ouvidos sobre o
"gópi" até aqui.