Pouco antes de deixar a prisão, no dia 19
de fevereiro, o senador Delcídio do Amaral (PT-MS) fez um acordo de
delação premiada com a força-tarefa da Lava Jato. ISTOÉ teve acesso às
revelações feitas pelo senador. Ocupam cerca de 400 páginas e formam o
mais explosivo relato até agora revelado sobre o maior esquema de
corrupção no Brasil – e outros escândalos que abalaram a República, como
o mensalão.
Com extraordinária riqueza de detalhes, o senador descreveu a ação
decisiva da presidente Dilma Rousseff para manter na estatal os
diretores comprometidos com o esquema do Petrolão e demonstrou que, do
Palácio do Planalto, a presidente usou seu poder para evitar a punição
de corruptos e corruptores, nomeando para o Superior Tribunal de Justiça
(STJ) um ministro que se comprometeu a votar pela soltura de
empreiteiros já denunciados pela Lava Jato.
O senador Delcídio também afirmou que o ex-presidente Luiz Inácio
Lula da Silva tinha pleno conhecimento do propinoduto instalado na
Petrobras e agiu direta e pessoalmente para barrar as investigações -
inclusive sendo o mandante do pagamento de dinheiro para tentar comprar o
silêncio de testemunhas. O relato de Delcídio é devastador e complica
de vez Dilma e Lula, pois trata-se de uma narrativa de quem não só
testemunhou e esteve presente nas reuniões em que decisões nada
republicanas foram tomadas, como participou ativamente de ilegalidades
ali combinadas –a mando de Dilma e Lula, segundo ele.
Nos próximos dias, o ministro Teori Zavascki decidirá se homologa
ou não a delação. O acordo só não foi sacramentado até agora por conta
de uma cláusula de confidencialidade de seis meses exigida por Delcídio.
Apesar de avalizada por procuradores da Lava Jato, a condição imposta
pelo petista não foi aceita por Zavascki, que devolveu o processo à
Procuradoria-Geral da República e concedeu um prazo até a próxima semana
para exclusão da exigência. Para o senador, os seis meses eram o tempo
necessário para ele conseguir escapar de um processo de cassação no
Conselho de Ética do Senado. Agora, seus planos parecem comprometidos.
As preocupações de Delcídio fazem sentido. Sobretudo porque suas
revelações implicaram colegas de Senado, deputados, até da oposição, e
têm potencial para apressar o processo de impeachment de Dilma no
Congresso. O que ele revelou sobre a presidente é gravíssimo. Segundo
Delcídio, Dilma tentou por três ocasiões interferir na Lava Jato, com a
ajuda do ex-ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. “É indiscutível e
inegável a movimentação sistemática do ministro da Justiça, José
Eduardo Cardozo e da própria presidente Dilma Rousseff no sentido de
promover a soltura de réus presos na operação”, afirmou Delcídio na
delação.
A terceira investida da presidente contou com o envolvimento
pessoal do senador petista. No primeiro anexo da delação, Delcídio disse
que, diante do fracasso das duas manobras anteriores, uma das quais a
famosa reunião em Portugal com o presidente do STF, Ricardo Lewandowski,
“a solução” passava pela nomeação do desembargador Marcelo Navarro para
o STJ. “Tal nomeação seria relevante para o governo”, pois o nomeado
cuidaria dos “habeas corpus e recursos da Lava Jato no STJ”. Na semana
da definição da estratégia, Delcídio contou que esteve com Dilma no
Palácio da Alvorada para uma conversa privada.
Os dois conversavam enquanto caminhavam pelos jardins do Alvorada,
quando Dilma solicitou que Delcídio, na condição de líder do governo,
“conversasse como o desembargador Marcelo Navarro, a fim de que ele
confirmasse o compromisso de soltura de Marcelo Odebrecht e Otávio
Marques de Azevedo”, da Andrade Gutierrez. Conforme acertado com a
presidente, Delcídio se encontrou com Navarro “no próprio Palácio do
Planalto, no andar térreo, em uma pequena sala de espera”, o que,
segundo o senador, pode ser atestado pelas câmeras de segurança. Na
reunião, de acordo com Delcídio, Navarro “ratificou seu compromisso,
alegando inclusive que o dr. Falcão (presidente do STJ, Francisco
Falcão) já o havia alertado sobre o assunto”.
O acerto foi cumprido à risca. Em recente julgamento dos habeas
corpus impetrados no STJ, Navarro, na condição de relator, votou pela
soltura dos dois executivos. O problema, para o governo, é que o relator
foi voto vencido. No placar: 4x1 pela manutenção da prisão.
A ação de uma presidente da República no sentido de nomear de um
ministro para um tribunal superior em troca do seu compromisso de votar
pela soltura de presos envolvidos num esquema de corrupção é
inacreditável pela ousadia e presunção da impunidade. E joga por terra
todo seu discurso de “liberdade de atuação da Lava Jato”, repetido como
um mantra na campanha eleitoral. Só essa atitude tem potencial para
ensejar um novo processo de impeachment contra ela por crime de
responsabilidade.
Segundo juristas ouvidos por ISTOÉ, a lei 1.079 que define os
crimes de responsabilidade diz no artigo nono, itens 6 e 7, que atenta
contra a probidade administrativa – e é passível de perda de mandato –
usar de suborno ou qualquer outra forma de corrupção para levar um
funcionário público a proceder ilegalmente ou agir de forma incompatível
com a dignidade, a honra e o decoro. O que também poderá trazer
problemas para Dilma é o trecho da delação de Delcídio a respeito da
compra da refinaria de Pasadena, no Texas, considerada um dos negócios
mais desastrosos da Petrobras e que foi firmado em 2006 com um
superfaturamento de US$ 792 milhões, quando Dilma presidia o Conselho de
Administração da estatal.
A versão da presidente era de que ela e os conselheiros do
colegiado não tinham conhecimento de cláusulas desfavoráveis a
Petrobras, mas Delcídio no anexo 17 da delação é taxativo: “Dilma tinha
pleno conhecimento de todo o processo de aquisição da refinaria”. “A
aquisição foi feita com conhecimento de todos. Sem exceção”, reforçou o
senador. Não seria a primeira vez que Delcídio desmentiria Dilma na
delação. No anexo 03, o senador garante que ela teve participação
efetiva na nomeação de Nestor Cerveró para a diretoria da BR
Distribuidora, contrariando o que ela havia afirmado anteriormente.
No relato aos procuradores, Delcídio disse que “tem conhecimento
desta ingerência (de Dilma), tendo em vista que, no dia da aprovação
pelo Conselho, estava na Bahia e recebeu ligações de Dilma”. Ex-diretor
internacional da Petrobras, Cerveró foi preso em janeiro de 2015,
acusado de receber propina em contratos da estatal com empreiteiras. Até
então, a indicação de Cerveró era atribuída a Lula e José Eduardo
Dutra, ex-presidente da BR Distribuidora, falecido no ano passado. Mas
segundo Delcídio, a atuação de Dilma foi “decisiva”. A presidente ligou
para ele duas vezes.
Teor explosivo: Depoimento prestado no STF por Delcídio do Amaral (PT-MS) aguarda a homologação.
Na parte inferior, o termo de acordo e os principais tópicos da delação
Na primeira, a presidente telefonou “perguntando se o Nestor já
havia sido convidado para ocupar a diretoria financeira da BR
Distribuidora”. “Depois, ligou novamente, confirmando a nomeação de
Nestor para o referido cargo”, o que se concretizou no dia 3 de março de
2008. Cerveró foi o pivô da prisão de Delcídio. Em 25 de novembro do
ano passado, pela primeira vez desde 1985, o Supremo mandava prender um
senador no exercício do mandato. Um dos motivos apontados pelo ministro
Teori Zavascki foi a oferta de uma mesada de R$ 50 mil para que Cerveró
não celebrasse um acordo de delação premiada.
Na delação, Delcídio não só forneceu detalhes do pagamento como fez
uma revelação bombástica: disse que o mandante dos pagamentos à família
Cerveró foi o ex-presidente Lula. O senador petista trata do tema no
anexo 02 da delação. Segundo Delcídio, Lula pediu “expressamente” para
que ele ajudasse o amigo e pecuarista José Carlos Bumlai, porque ele
estaria implicado nas delações de Fernando Baiano e Nestor Cerveró.
Bumlai, segundo o senador, gozava de “total intimidade” e exercia o
papel de “consigliere” da família Lula – expressão usada pela máfia
italiana e consagrada no filme “O Poderoso Chefão” para designar o
conselheiro que detinha uma posição de liderança e representava o chefe
em reuniões importantes.
A transcrição da delação pelos procuradores diz no que consistia a
ajuda exigida por Lula a Bumlai: “No caso, Delcídio intermediaria o
pagamento de valores à família de Cerveró”. Na conversa com o
ex-presidente, de acordo com outro trecho da delação, Delcídio diz que
“aceitou intermediar a operação”, mas lhe explicou que “com José Carlos
Bumlai seria difícil falar, mas que conversaria com o filho, Maurício
Bumlai, com quem mantinha boa relação”. O acerto foi sacramentado.
Depois de receber a quantia de Maurício Bumlai, a primeira remessa de R$
50 mil foi entregue em mãos pelo próprio Delcídio ao advogado de
Cerveró, Edson Ribeiro, também preso pela Lava Jato.
Os repasses de dinheiro se repetiram em outras oportunidades, de
acordo com Delcídio, por meio do assessor Diogo Ferreira. O total
recebido foi de R$ 250 mil. Para os procuradores que tomaram o
depoimento de Delcídio, a revelação é de extrema gravidade e pode
justificar a prisão do ex-presidente Lula. Integrantes da Lava Jato
elaboram o seguinte raciocínio: se o que embasou a detenção de Delcídio,
preventivamente, foi a tentativa do senador de obstruir as
investigações, atestada pela descoberta do pagamento a Cerveró, o mesmo
se aplicaria a Lula, o mandante de toda a artimanha.
Não seria a primeira vez que, durante a delação aos integrantes da
Lava Jato, Delcídio envolveria Lula na compra do silêncio de
testemunhas. De acordo com o senador, Lula e o ex-ministro da Fazenda e
da Casa Civil, Antonio Palocci, em meados de 2006, articularam o
pagamento a Marcos Valério para que ele se calasse sobre o mensalão. O
dinheiro, um total de R$ 220 milhões destinados a sanar uma dívida,
segundo Delcídio, foi prometido por Paulo Okamotto. Aos procuradores, o
senador relatou uma conversa com Lula em que ele o alerta: “Acabei de
sair do gabinete daquele que o senhor enviou a Belo Horizonte
(Okamotto). Corra, Presidente, senão as coisas ficarão piores do que já
estão”.
Na sequência, Palocci ligou para Delcídio dizendo que o Lula estava
“injuriado” em razão do teor da conversa, mas que ele (Palocci), a
partir daquele momento, “estaria assumindo a responsabilidade pelo
pagamento da dívida”. Valério, de acordo com o senador petista, não
recebeu a quantia integral pretendida. De todo o modo, diz o trecho da
delação, “a história mostrou a contrapartida: Marcos Valério silenciou”.
Ainda sobre o mensalão, Delcídio – ex-presidente da CPI dos Correios –
disse ter testemunhado na madrugada do dia 5 de abril de 2006 as
“tratativas ilícitas para retirada do relatório (final da CPI) dos nomes
de Lula e do filho Fábio Luís Lula da Silva em um acordão com a
oposição”. Assim, segundo o anexo 21 da delação, Lula se salvou do
impeachment.
Implicações: Juiz Sérgio Moro ganha novos elementos contra Lula
O senador ainda lembrou aos procuradores uma frase do ex-ministro
José Dirceu: “Pode checar quem ia à Granja do Torto aos domingos. Te
garanto que não era eu”. Sem dúvida, afirmou Delcídio, tratava-se de uma
referência a Delúbio Soares e Marcos Valério. Hoje, de acordo com
Delcídio, um dos temas que “mais aflige” o ex-presidente Lula é a CPI do
Carf. O colegiado apura a compra de MPs durante o governo do petista
para favorecer montadoras e o envolvimento do seu filho, Luis Claudio,
no esquema. Segundo o senador petista, “por várias vezes Lula solicitou a
ele que agisse para evitar a convocação do casal Mauro Marcondes e
Cristina Mautoni para depor”.
O consultor Mauro Marcondes, amigo de Lula desde os tempos do ABC, e
sua mulher foram presos na Operação Zelotes, da PF, acusado de
intermediar a compra de MPs. Documentos integrantes da Operação mostram
que a LFT, uma empresa de marketing esportivo pertencente a Luis Claudio
Lula da Silva, recebeu R$ 1,5 milhão na mesma época em que lobistas
foram remunerados por empresas interessadas na renovação da medida
provisória. Afirmou Delcídio aos procuradores da Lava Jato: “Lula estava
preocupado com as implicações à sua própria família, especialmente os
filhos Fábio Luís e Luis Cláudio”, fato confirmado a ele por Maurício
Bumlai.
Outra CPI, desta vez a dos Bingos (encerrada em 2006), segundo
Delcídio, teria agido para proteger a presidente Dilma. A declaração vem
no bojo de uma revelação que compromete a campanha da presidente em
2010. No anexo 29 da delação, o senador petista afirmou que “uma das
maiores operações de caixa 2 para a campanha de Dilma em 2010 foi feita
através do empresário Adir Assad”, condenado no fim de 2015 por ser um
dos operadores do esquema do Petrolão.
“Orientados pelo tesoureiro de campanha de Dilma, José Di Filippi,
os empresários faziam contratos de serviços com as empresas de Assad,
que repassava recursos para as campanhas eleitorais”. De acordo com
Delcídio, o encerramento prematuro e sem relatório final da CPI dos
Bingos deveu-se exclusivamente a esse fato. “Quando o governo percebeu
que as várias quebras de sigilo levariam à campanha Dilma 2010,
determinaram o encerramento dos trabalhos”, afirmou. Parte dos
depoimentos de Delcídio foi tomado dentro do próprio Supremo Tribunal
Federal.
Segundo informou à ISTOÉ um dos procuradores responsáveis pelo
acordo de delação, para que Delcídio conseguisse deixar a carceragem, em
Brasília, sem ser notado, foi montada uma verdadeira operação de guerra
envolvendo dezenas de policiais. Desde o início das tratativas a
preocupação maior de Delcídio foi justamente com o vazamento prematuro
do acordo. Por isso, as insistentes negativas de seus advogados. Até
livrar sua pele no Senado, ele preferia o sigilo. Com o novo cenário, de
altíssima octanagem, Brasília estremece. Pior para Delcídio. Melhor
para os fatos.
Dilma interferiu na lava jato
No anexo 01 da delação, o senador Delcídio do Amaral revela que em
três ocasiões a presidente Dilma Rousseff, no exercício do mandato, e o
ex-ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, tentaram interferir na
Lava Jato. Nomeação do ministro Marcelo Navarro para o STJ fez parte de
acordo para soltura de executivos presos.
“1 – A Primeira Investida do Planalto
A despeito dos discursos do governo com relação à sua isenção nos
rumos da operação Lava jato, é indiscutível e inegável a movimentação
sistemática do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e da própria
presidente Dilma Rousseff no sentido de tentar promover a soltura de
réus presos no curso da referida operação. Faz parte dessa articulação o
advogado Sigmaringa Seixas, figura influente quando se trata, no
governo, de indicações para os tribunais superiores. Nas conversas com
José Eduardo Cardozo, Dilma se refere a Sigmaringa como ‘the old man’.
A primeira investida do Planalto para tentar alterar os rumos da
Lava Jato salta aos olhos pela ousadia: o encontro realizado em
07/07/2015 (18 dias após a prisão de Marcelo Odebrecht e Otávio Azevedo)
entre Dilma, José Eduardo e o presidente do STF, Ricardo Levandowski,
numa escala em Porto (Portugal) para supostamente falar sobre o reajuste
de verbas do Poder Judiciário. A razão apontada pela Presidência é
absolutamente injustificável... ...A razão principal do encontro, em
verdade, foi a mudança nos rumos da Lava Jato. Contudo, a reunião foi
uma fracasso, em função do posicionamento retilíneo do ministro
Lavandowski, ao afirmar que não se envolveria.
2- A Segunda Investida do Planalto
Em virtude da falta de êxito na primeira investida, mudou-se a
estratégia, que se voltou, então, para o STJ, José Eduardo esteve em
Florianópolis em agenda institucional... ... A ideia era indicar para
uma das vagas no STJ o presidente do TJ de Santa Catarina, Nelson
Schaefer. Em contrapartida, o ministro convocado, Dr. Trisotto, votaria
pela libertação dos acusados Marcelo Odebrecht e Otavio Azevedo. A
investida foi em vão porque Trisotto se negou a assumir tal
responsabilidade espúria. Mais um fracasso de José Eduardo em conseguir
uma nomeação”.
3- Terceira Investida do Planalto
Após os dois fracassos anteriores, rapidamente desenhou-se uma nova
solução que passava pela nomeação de Marcelo Navarro, desembargador do
TRF da 5ª Região, muito ligado ao ministro e presidente do STJ, Dr.
Francisco Falcão. Tal nomeação seria relevante para o governo, pois o
nomeado entraria na vaga detentora de prevenção para o julgamento de
todos os Habeas Corpus e recursos da Lava Jato no STJ. Na semana da
definição da nova estratégia, Delcídio do Amaral esteve com a presidente
Dilma no Palácio da Alvorada para uma conversa privada. Conversaram
enquanto caminhavam pelos jardins do Palácio e Dilma solicitou que
Delcídio conversasse com o desembargador Marcelo Navarro a fim de que
ele confirmasse o compromisso de soltura de Marcelo e de Otavio...
... Conforme o combinado, Delcídio do Amaral se encontrou com o
desembargador Marcelo Navarrro no próprio Palácio do Planalto, no andar
térreo, em uma pequena sala de espera, o que poderá ser atestado pelas
câmeras do Palácio. Nessa reunião, muito rápida pela gravidade do tema, o
Dr. Marcelo ratificou seu compromisso, alegando inclusive que o Dr.
Falcão já o havia alertado sobre o assunto. Dito e feito. A sabatina do
Dr. Marcelo pelo senado e correspondente aprovação ocorreram em tempo
recorde. Em recente julgamento dos habeas Corpus impetrados no STJ,
confirmando o compromisso assumido, o Dr. Marcelo Navarro, na condição
de relator, votou favoravelmente pela soltura dos dois executivos
(Marcelo e Otavio). Entretanto, obteve um revés de 4X1 contra seu
posicionamento, vez que as prisões foram mantidas pelos outros ministros
da 5ª turma do STJ.”
Dilma sabia de tudo do acerto de Pasadena
O senador conta que como presidente do Conselho de Administração da
Petrobras, Dilma Rousseff, sabia que por trás da compra da Refinaria de
Pasadena havia um esquema de superfaturamento para desviar recursos da
estatal. Ela poderia ter barrado as negociações, mas os contratos foram
aprovados pelo Conselho de Administração em tempo recorde e a Petrobras
teve um prejuízo de US$ 792 milhões, como foi comprovado pela Lava Jato e
pelo TCU.
“Dilma Rousseff, como então presidente do Conselho de Administração
da Petrobras, tinha pleno conhecimento de todo o processo de aquisição
da Refinaria de Pasadena e de tudo o que esse encerrava. A alegação de
Dilma de que ignorava o expediente habitualmente utilizado em contratos
desse tipo, alegando desconhecimento de cláusula como put option,
absolutamente convencional, é, no mínimo, questionável. Da mesma forma,
discutir um revamp de refinaria que nunca ocorreu, é inadmissível. A
tramitação do processo de aquisição de Pasadena durou um dia entre a
reunião da Diretoria Executiva e o Conselho de Administração. Delcídio
esclarece que a aquisição de Pasadena foi feita com o conhecimento de
todos. Sem exceção”.
Dilma queria Cerveró na Petrobrás
O senador revela como, em 2008, Dilma Rousseff atuou de forma
decisiva para que Nestor Cerveró fosse mantido na direção da Petrobras.
Na ocasião, Cerveró perdeu o cargo de diretor Internacional por pressão
do PMDB, mas Dilma conseguiu coloca-lo na Diretoria Financeira da BR
Distribuidora.
“Diferentemente do que afirmou Dilma Rousseff em outras
oportunidades, a indicação de Nestor Cerveró para a Diretoria Financeira
da BR Distribuidora contou efetivamente com a sua participação.
Delcídio do Amaral tem conhecimento dessa ingerência tendo em vista que,
no dia da aprovação pelo Conselho, estava na Bahia e recebeu ligações
de Dilma...
...Não é correta a informação de que a Diretoria Financeira da BR
Distribuidora tenha sido produto de entendimento exclusivo de Lula e
Dutra (José Eduardo). Dilma Rousseff teve atuação decisiva, comprovada
através das ligações mencionadas, quando da sua chegada ao Rio de
Janeiro para a reunião do Conselho de Administração da Petrobras. Dilma
Rousseff ligou para Delcídio perguntando se o Nestor já havia sido
convidado para ocupar a Diretoria Financeira da BR Distribuidora.
Depois, ligou novamente confirmando a nomeação de Nestor para o referido
cargo, o que restou concretizado na segunda-feira, 03/03/2008, quando
da posse de Nestor na BR Distribuidora e de Jorge Zelada na área
internacional da Petrobras”.
CPI dos bingos protegeu Dilma
No anexo 29 da delação premiada, o senador Delcídio do Amaral
descreve aos membros da Lava Jato uma operação de caixa dois na campanha
de Dilma em 2010 feita pelo doleiro Adir Assad. Segundo Delcidio, o
esquema seria descoberto pela CPI dos Bingos, mas o governo usou a base
de apoio no Congresso para barrar a investigação dos parlamentares.
“Uma das maiores operações de caixa dois da campanha de Dilma em
2010 foi feita através de Adir Assad. Orientados pelo tesoureiro da
campanha, José Filippi, os empresários faziam contratos de serviços com
as empresas de Assad, que repassava os recursos para as campanhas
eleitorais. Esse expediente foi largamente utilizado e o encerramento
prematuro e sem relatório final da CPI dos Bingos deveu-se
exclusivamente a esse fato. Quando o governo percebeu que as várias
quebras de sigilo levariam à campanha de Dilma, determinou o
encerramento imediato dos trabalhos”.
Lula mandou pagar Cerveró
Um dos relatos mais explosivos feitos pelo senador Delcídio do
Amaral à operação Lava Jato está no anexo 2. O senador revela aos
procuradores que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva comandou o
esquema do pagamento de uma mesada a Cerveró para tentar evitar sua
delação premiada. Foi por intermediar esses pagamentos que Delcídio
acabou na cadeia. Lula não queria que o ex-diretor da Petrobras
mencionasse o esquema do pecuarista José Carlos Bumlai na compra de
sondas superfaturadas feitas pela estatal.
“Lula pediu expressamente a Delcídio do Amaral para ajudar o Bumlai
porque supostamente ele estaria implicado nas delações de Fernando
Soares e Nestor Cerveró. No caso, Delcídio intermediaria o pagamento de
valores à família de Cerveró com recursos fornecidos por Bumlai.
Delcídio explicou a Lula que com José Carlos Bumlai seria difícil falar,
mas que conversaria com o filho, Maurício Bumlai, com quem mantinha uma
boa relação. Delcidio, vendo a oportunidade de ajudar a família de
Nestor, aceitou intermediar a operação.
A primeira remessa de R$ 50.000,00 foi entregue pelo próprio
Delcidio do Amaral em mãos do advogado Edson Ribeiro, após receber a
quantia de Mauricio Bumlai, em um almoço na churrascaria Rodeio do
Iguatemi, em 22/05/2015 (em anexo existe base documental para isso). As
entregas de valores à família de Nestor Cerveró se repetiram em outras
oportunidades. Nessas outras oportunidades quem fez a entrega foi o
assessor Diogo Ferreira (em anexo existe base documental disso). O total
recebido pela família de Nestor foi de R$ 250.000,00. O próprio
Bernardo (filho de Nestor Cerveró) recebeu em espécie do Diogo.
Lula comprou o silêncio de Marcos Valério
O ex-presidente cedeu às chantagens do publicitário Marcos Valério
que exigiu R$ 220 milhões para se calar na CPI dos Correios sobre os
meandros do Mensalão. Em seu depoimento, Delcídio afirma que ele e Paulo
Okamotto (presidente do Instituto Lula) tentaram negociar o pagamento,
mas que foi o ex-ministro Antônio Palocci quem assumiu essa tarefa.
“Em 14/02/2006 foi conversado sobre o pagamento de uma dívida
prometida por Paulo Okamotto em Belo Horizonte, a fim de que Marcos
Valério silenciasse em relação às questões do mensalão. Nos dois dias
seguintes, Delcidio do Amaral se reuniu sucessivamente: primeiro com
Paulo Okamoto, a fim de que ele cumprisse com o prometido em Belo
Horizonte (de acordo com Marcos Valério o valor seria de R$ 220
milhões); segundo com o ex-presidente Lula, sendo que na conversa
Delcidio disse expressamente ao presidente: ‘acabei de sair do gabinete
daquele que o senhor enviou à Belo Horizonte. Corra presidente, senão as
coisas ficarão piores do que já estão’.
No dia seguinte, Delcidio recebeu uma ligação do então ministro da
Justiça, Marcio Thomaz Bastos, na qual este disse: ‘parece que sua
reunião com o Lula foi muito boa, né?’. A resposta de Delcidio foi a
seguinte: ‘não sei se foi boa para ele’. Na sequência, o ministro da
Fazenda, Palocci, ligou para Delcidio dizendo que Lula estava
‘injuriado’ com ele em razão do teor da conversa. Contudo, Palocci disse
que estaria, a partir daquele momento, assumindo a responsabilidade
pelo pagamento da dívida. Marcos Valério recebeu, mas não a quantia
integral pretendida. De todo modo, a história mostrou a contrapartida:
Marcos Valério silenciou.”
“Exclusão de Lula e Lulinha da CPI dos correios evitou o impeachment”
No anexo 21 da delação, Delcídio relata a forte atuação de Lula e
aliados sobre os parlamentares da CPI dos Correios. O senador, que
presidiu a CPI, afirma que a votação do relatório que poupou o
ex-presidente foi duvidosa.
“Lula se salvou de um impeachment com a exclusão de seu nome e de
seu filho Fábio Lula da Silva (o Lulinha) na madrugada do dia 05/04/2006
do relatório final da CPI dos Correios, que foi aprovado em votação
polêmica e duvidosa naquele mesmo dia”.
Lula pressiona CPI do CARF para proteger a família
Delcidio afirmou aos procuradores da Lava Jato que, como líder do
governo, foi pressionado por Lula para que Mauro Marcondes e Cristina
Mautoni não fossem depor na CPI que apura a venda de Medidas
Provisórias. Ele revelou que o ex-presidente temia que o casal pudesse
implicar seus filhos no escândalo.
“Delcidio do Amaral tem conhecimento de que um dos temas que mais
aflige o presidente Lula é a CPI do Carf (Conselho Administrativo de
Recursos Fiscais). A preocupação do ex- presidente foi elevada
especialmente quando da convocação de Mauro Marcondes e sua esposa
Cristina Mautoni. Por várias vezes o próprio Lula solicitou a Delcidio
que agisse para evitar a convocação do casal para depor perante a CPI.
Lula alegava que estava muito preocupado com eles.
Mas, em verdade, Lula estava preocupado com implicações à sua
própria família, especialmente com os filhos Fábio Luiz Lula da Silva e
Luiz Claudio Lula da Silva. Esse fato foi confirmado a Delcídio por
Maurício Bumlai, que conhece muito bem a relação dos familiares de Lula
com a casal. Em resposta a insistência de Lula, Delcídio, como líder do
governo no Senado, mobilizou a base do governo para derrubar os
requerimentos de convocação do casal na reunião ocorrida em 05/11/2015,
onde logrou êxito”.
Bumlai é o consigliere da família Lula
No anexo 6 de sua delação premiada, Delcidio descreve as relações
de Bumlai com o ex-presidente e sua família. Fala sobre os negócios
escusos envolvendo o pecuarista e a Petrobras e cita as obras no sítio
de Atibaia.
“Ao contrário do que afirma o ex-presidente Lula, José Carlos
Bumlai goza de total intimidade com ele, representando de certa maneira o
papel de ‘consigliere’ da família Lula....
De todas as ações ilícitas de Bumlai, uma das mais relevantes é a
aquisição/operação, pela Petrobras, da sonda Vitória 10.000, cujos
desdobramentos políticos e financeiros são muito maiores do que os
divulgados. O negócio foi feito com a finalidade de quitar uma dívida de
Bumlai com o Banco Schahim, divida essa de R$ 12 milhões. O contrato
girou em torno de US$ 16 milhões... A realidade é que o contrato não só
quitou a dívida de Bumlai como pagou dívidas da campanha presidencial de
Lula em 2006...
Bumlai foi o principal responsável pela implementação do Instituto
Lula, disponibilizando de todo o aparato logístico e financeiro. Foi
também a pessoa que ficou responsável, em um primeiro momento, pelas
obras do sítio de Atibaia, do ex-presidente Lula. Delcidio tem
conhecimento de que Bumlai já tinha contratado arquiteto e engenheiro
para a realização das obras, o que foi abortadopor Léo Pinheiro, outro
grande amigo do presidente, que pessoalmente se dispôs a fazer o serviço
através da OAS em um curto espaço de tempo”.
Pedágio na CPI da Petrobras
Delcído diz que os senadores Gim Argello (PTB-DF) e Vital do Rego
(PMDB-PB) e os deputados Marco Maia (PT-RS) e Fernando Francischini
(SD-PR) cobravam de empreiteiros para não serem convocados na CPI da
Petrobras.
“Delcidio do Amaral sabe de ilicitudes envolvendo o desfecho da CPI
que apurava os crimes no âmbito da Petrobras. A CPI obrigava Léo
Pinheiro, Júlio Camargo e Ricardo Pessoa a jantarem todas as
segundas-feiras em Brasília. O objetivo desses jantares era evitar que
os empresários fossem convocados para depor na CPI. Os senadores Gim
Argello, Vital do Rego e os deputados Marco Maia e Francischini cobravam
pedágio para não convocar e evitar maiores investigações contra Léo
Pinheiro, Júlio Camargo e Ricardo Pessoa.”
Créditos das fotos nesta matéria: Gilberto Tadday; Antônio
Cruz/Agência Brasil; Ichiro Guerra; Marcos Oliveira/Agência Senado;
Rodrigues Pozzebom/Agência Brasilfotos: Ernesto Rodrigues/Estadão
Conteúdo; Juca Varella/Estadão Conteúdo; Márcio- DA ISTOÉ