EUMANO SILVA
ÉPOCA
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Circulam incógnitos pelas ruas sem ser reconhecidos.
Desde a semana passada, eles se transformaram em estrelas do mais peculiar, complicado e simbólico julgamento da história do Supremo. Pelo número e relevância dos réus, pelo volume das investigações e pela complexidade das denúncias, o julgamento do mensalão supera todas as decisões anteriores do STF.
Os brasileiros acompanham pela televisão o destino dos envolvidos com o maior escândalo político da história recente do país.
Nascido com as denúncias feitas pelo então deputado Roberto Jefferson (PTB), o processo do mensalão recebeu o registro formal de Ação Penal 470. Dependendo do resultado, a vida política do país poderá se dividir em antes e depois deste julgamento.
Ele servirá como referência para os limites de tolerância com a mistura entre o público e o privado. Balizará a questão da independência dos Poderes, posta em xeque com a promiscuidade entre Executivo e Legislativo evidenciada no caso. Estará em jogo, ainda, a imagem dos oito anos do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Os 11 escolhidos para decidir o destino dos 38 réus do mensalão percorreram caminhos distintos e sinuosos antes de chegar ao momento máximo da carreira. A começar por quem os indicou – cinco presidentes da era democrática do país.
Dos atuais integrantes do STF, dois foram indicados por Dilma Rousseff, seis por Luiz Inácio Lula da Silva, um por Fernando Henrique Cardoso, um por Fernando Collor de Mello e um por José Sarney.
No cargo, alguns se comportam em sintonia com seu padrinho. Outros repelem o estabelecimento de sintonia com os presidentes.
Uma observação atenta da biografia dos ministros do Supremo permite concluir que eles formam um colegiado eclético também na origem e na formação profissional. Dos 11, três nasceram no Rio de Janeiro, uma em Porto Alegre e os outros sete em cidades do interior.
Pelo critério de naturalidade, representam as cinco regiões brasileiras. Entre eles, estão juízes de carreira, advogados e integrantes do Ministério Público.
Há um ex-petista, um ex-assessor do governo Collor e um amigo da família do ex-presidente Lula.
Na composição atual do STF, há ministros indicados por cinco presidentes diferentes
Nas questões doutrinárias, com variantes, nota-se a presença vocal de uma corrente que valoriza a presunção de inocência e o direito de defesa – fato que os leva a ser menos rigorosos na aplicação de penas e, por isso, apoiar decisões que tendem a facilitar a vida dos réus.
No jargão jurídico, são chamados de “garantistas”. Costumam seguir essa linha os ministros Gilmar Mendes, Celso de Mello e Marco Aurélio Mello.
Na direção oposta, seguem ministros que levam em consideração a repercussão social de suas decisões, suas implicações práticas e aquilo que elas trazem de pedagógico na história do país.
É aquilo que os juristas americanos costumam, por oposição ao “garantismo”, chamar de “ativismo”.
Encaixa-se nesse perfil o ministro Joaquim Barbosa, cuja origem é o Ministério Público. O próprio presidente do Supremo, Ayres Britto, pode ser chamado de ativista, na medida em que gosta de julgar causas de alta repercussão para a sociedade, como a união civil homossexual.
O choque de doutrinas no plenário se confundirá com o embate de 11 personalidades fortes e vaidade justificada por suas carreiras bem-sucedidas.
No maior exemplo da singularidade da Ação Penal 470, o caso do mensalão, quase todos os ministros que participam do julgamento, em algum momento, tiveram alguma relação com o processo ou com envolvidos nas investigações.
Dois tiveram de responder o que pensavam do mensalão quando foram sabatinados pelo Senado. Alguns se envolveram em bate-bocas públicos sobre o processo, que desgastaram a imagem do STF.
A capacidade de tomar decisões de alta complexidade, sob intensa pressão, exige preparo emocional (que tem faltado) e jurídico (que sempre demanda aprendizado). Um fato, no entanto, sobressai.
Oito dos 11 ministros foram nomeados por presidentes petistas. O escândalo do mensalão afeta diretamente a imagem do PT – e, mesmo assim, o resultado do julgamento é imprevisível. Prova da maturidade democrática do país, em que os poderes prezam, acima de tudo, sua independência.
Este é um trecho da reportagem de capa de ÉPOCA.
DO R.DEMOCRATICA
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