Em entrevista à GloboNews, procurador-geral da República afirmou que acordo com controladores da JBS era único caminho de interromper a prática de crimes graves e que sentiu náusea ao ouvir a gravação pela primeira vez.
Em entrevista ao programa Conexão Roberto d'Ávila, exibida na noite
desta quarta-feira (5) pela GloboNews, o procurador-geral da República,
Rodrigo Janot, afirmou que precisou fazer uma "escolha de Sofia", ao
ouvir a gravação da conversa entre o empresário Joesley Batista e o
presidente Michel Temer, feita durante um encontro dos dois no Palácio
do Jaburu, em Brasília. A divulgação da conversa levou Janot a abrir
investigação contra Temer e, posteriormente, a denunciar o presidente
por corrupção passiva.
Segundo o procurador, os irmãos Batista impuseram como condição para
delatar a imunidade total, ou seja, e a garantia de que não iriam
responder a nenhum dos crimes denunciados. "Essas pessoas chegaram para
mim e disseram assim: ‘Nós aceitamos negociar tudo, mas a 'não denúncia'
a gente não aceita negociar’. Eu me vi na seguinte escolha de Sofia",
disse o procurador, em referência à personagem do clássico da literatura
forçada a fazer uma decisão difícil.
"Eu tinha tomado conhecimento que altíssimas autoridades da república
estavam praticado crimes, os crimes estavam em curso e crimes graves. Se
eu não aceitasse esse acordo, não teria como apurar estes crimes. Eu
teria que fingir que nada tinha ouvido, que nada tinha acontecido, e
essas pessoas continuariam a cometer crimes".
Janot também descreveu o que sentiu ao ouvir a gravação: "Fiquei
chocado e senti náusea. Foi minha reação física: um choque, e fiquei
enjoado mesmo".
Janot também garantiu que os irmãos Joesley e Wesley Batista são réus
colaboradores e, como tal, precisam cumprir o que foi prometido."O
acordo cobre aqueles fatos relatados por eles e não cobre nenhum
eventual fato ilícito praticado depois, ou omitido naquele acordo. E
mais, tudo aquilo que eles se comprometeram a nos encaminhar, os
endereços de prova, o acesso às provas, eles têm que cumprir."
Reação de Temer
Na conversa com d'Ávila, Rodrigo Janot também comentou que a reação de Temer, ao chamar a denúncia de fraca e peça de 'ficção', é uma técnica conhecida, segundo a qual o denunciado tenta desacreditar a figura do acusador.
"Nós tínhamos um empresário investigado por atos ilícitos que gravou um
deputado [referindo-se a Rodrigo Rocha Loures] e acertou com este a ida
à residência do presidente da República, à noite, sem ser identificado.
Ele entra no palácio [do Jaburu] e grava uma conversa muito pouco
republicana com o presidente, que lhe diz que aquele mesmo deputado é o
interlocutor para qualquer assunto. Depois, esse deputado [Rocha Loures]
acerta uma propina com o empresário e é pilhado com uma mala de
dinheiro. Essa narrativa é fortíssima e está na denúncia; se isso é
fraco, não sei o que é forte", ironizou.
O procurador-geral rebateu as acusações de que teria tramado a gravação
da conversa com Joesley Batista: segundo ele, o registro foi feito
cerca de 30 dias antes de o empresário procurar o Ministério Público
Federal (MPF) e propor o acordo de colaboração premiada. Segundo Janot, o
STF já entendeu que o investigado pode gravar suas conversas e que
essas gravações podem ser usadas como provas em investigações.
"Ele gravou [as conversas com] Rocha Loures e Temer para nos convencer a
aceitar o acordo. Se não houvesse a gravação, ninguém acreditaria na
narrativa dele [Joesley], nem eu acreditaria", afirmou.
Substituição por Raquel Dodge
A pouco mais de dois meses de deixar o cargo, Rodrigo Janot falou sobre
sua substituta à frente da PGR, Raquel Dodge, escolhida por Temer.
Raquel toma posse à frente da PGR no dia 18 de setembro, mas até lá terá
que passar por uma sabatina no Senado, em data ainda a ser definida.
"Ela tem e continuará a ter, acredito, uma atitude de Ministéro
Público. A responsabilidade dela será enorme, ela vai ter muito trabalho
para seguir em várias áreas de investigação, e lhe desejo sucesso. Nós
interpretamos os procedimentos de maneira diversa e a forma de trabalho é
diferente, mas acima de tudo somos Ministéro Público", disse.
Candidatura descartada
O procurador-geral também rebateu as afirmações de que entrará para a
política ao deixar o cargo na PGR. "Eu tenho ouvido tanto isso, que
quero ser presidente, governador, senador, não sei se é tudo ao mesmo
tempo. Posso afirmar: respeito demais a política e as pessoas que se
lançam a exercer a atividade política, mas não é minha praia, minha
vocação. Não me candidadatei a nenhum cargo político: não quero ser
presidente, senador, deputado, vereador, absolutamente nada", assegurou.
Pior momento no cargo
Janot afirmou que o pior momento de seus quatro anos à frente da
Procuradoria Geral da República foi o dia da prisão do procurador Ângelo
Goulart Villela, que repassava informações a Joesley Batista sobre as
investigações acerca do grupo JBS, em especial da operação Greenfield -
que investigava fraudes bilionárias contra quatro dos maiores fundos de
pensão de funcionários de empresas estatais: Funcef (Caixa), Petros
(Petrobras), Previ (Banco do Brasil) e Postalis (Correios).
"Um dia especificamente ruim foi quando tive que pedir a prisão de um
colega. Eu pedi que fosse informado quando entrassem na casa dele para
efetuar a prisão. E quando fui informado, vomitei quatro vezes. E sou um
sujeito experiente, tenho 33 anos de Ministério Público, pouca coisa me
afetou de maneira tão contundente quanto essa", afirmou, emocionado.DO G1
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