O
relator do mensalão, ministro Joaquim Barbosa, começa a julgar hoje a
parte do Capítulo VI da denúncia que trata da corrupção ativa. Entre os
réus, estão José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares. Toda a
procrastinação, toda a chicana, todas as vigarices intelectuais tornadas
influentes, todas as agressões ao Supremo, todos os ataques à imprensa
independente, todo o achincalhe à ordem legal, todas as teses sem
embasamento jurídico, toda essa maquinaria estúpida, em suma, posta em
ação buscava evitar que se chegasse ao dia de hoje. Estamos lidando com
pessoas especializadas em fraudar a história, em retocar os fatos, em
maquiar a realidade. Por isso mesmo, é preciso que jamais nos
esqueçamos: eles se mobilizaram para que o julgamento jamais
acontecesse.
Depois de
montar um esquema comprovadamente criminoso para comprar a representação
parlamentar, como já está comprovado pelos próprios ministros do STF,
os mesmos criminosos atuaram de forma pertinaz, determinada, sôfrega
até, para que o julgamento fosse para as calendas. E mostraram uma
ousadia espantosa! Como revela Marcos Valério — já a caminho da cadeia —
a seus interlocutores, ele recebeu a garantia do Palácio do Planalto,
então sob o comando de Lula, de que não haveria julgamento nenhum! A
Valério foi dito, mais ou menos como fazem os traficantes ou as milícias
quando tomam conta de uma área: “Está tudo dominado!” E, como se vê,
felizmente, ainda não! Ainda há, perdoem-me repetir isto de novo!,
juízes em Brasília.
O que se
tem claro a esta altura do julgamento? O esquema criminoso a que se
chamou mensalão existiu. Nunca é demais lembrar que esse neologismo é
apenas uma espécie de marca-fantasia. Faz sentido! Os “ãos” e “ões” da
língua portuguesa se associam, com frequência, a posturas desastradas,
meio destrambelhadas; a práticas às quais faltam graça e elegância; a
comportamentos reprováveis porque grosseiros, agressivos ou mesmo
abestalhados; a pensamentos que se deixam marcar pela incultura, pela
vulgaridade, pela falta de decoro. Assim, ainda que o “mensalão” não
resuma, com efeito, o que foi expressão de um projeto de assalto ao
estado — e ao estado de direito —, o nome parece bom! Esse “ão” lhe
desenha a devida face abrutalhada, que viola os fundamentos da
democracia e do estado de direito.
Agora vem a hora perigosa
Qualquer que seja o destino dos réus ainda não-julgados, já está devidamente comprovado: a compra de apoio político no Congresso existiu. E isso quer dizer que se fraudou e se violou um dos Poderes da República. E assim se procedeu recorrendo ao dinheiro público, razão por que réus foram condenados por peculato. Não só isso: foi preciso fraudar a gestão de um banco — e o sistema financeiro é um bem tutelado pela Constituição brasileira — para que a engrenagem criminosa funcionasse. Políticos se deixaram corromper e lavaram dinheiro para dar corpo ao projeto petista de dominar o Congresso e governar o país fora dos limites da Constituição e das balizas institucionais.
Qualquer que seja o destino dos réus ainda não-julgados, já está devidamente comprovado: a compra de apoio político no Congresso existiu. E isso quer dizer que se fraudou e se violou um dos Poderes da República. E assim se procedeu recorrendo ao dinheiro público, razão por que réus foram condenados por peculato. Não só isso: foi preciso fraudar a gestão de um banco — e o sistema financeiro é um bem tutelado pela Constituição brasileira — para que a engrenagem criminosa funcionasse. Políticos se deixaram corromper e lavaram dinheiro para dar corpo ao projeto petista de dominar o Congresso e governar o país fora dos limites da Constituição e das balizas institucionais.
Muito bem!
Tudo isso se fez em proveito, então, desse projeto de poder. Se houve o
polo passivo da corrupção; se houve aquele que mercadejou sua função
pública, cumpre perguntar: quem era o polo ativo? Quem os corrompeu?
Haverá de se contentar a nação com uma história da carochinha? Com que
então os parlamentares que se deixaram corromper estariam a serviço do
“corruptor” Marcos Valério, como se fosse ele o dono do tal projeto de
poder? Ora… Na semana passada, numa indevida manifestação de
partidarização do debate, o ministro Ricardo Lewandowski resolveu
lembrar o mensalão mineiro, destacando (e já o fizera antes) que Valério
atuou também naquele caso.
Muito bem!
Eu não sou especialista em leis, é claro!, como não cansam de lembrar
os petralhas — embora, vejam os arquivos e os vídeos da VEJA.com, eu
tenha madado bem no mensalão, hehe. Mas sei ler, levo em conta o sentido
das palavras e sou um apaixonado pela lógica. Não poderia haver melhor
argumento do que o do próprio Lewandowski — eu sei que ele não quis
prejudicar os petistas, claro! — para demonstrar que, por óbvio, o
“ativo” de todos aqueles “passivos” não era Valério; não sozinho ao
menos. O projeto de poder deste senhor, provavelmente, era ficar ainda
mais rico. Quantos são os da sua espécie que se ligam a governos, a
quaisquer governos, para prestar serviços? Os horizontes de alguém como
ele não são dados pela ideologia, pelas convicções, pelas crenças… Ele é
um caçador de oportunidades. Se, amanhã, o, digamos, PCO chegar ao
poder, aparecerá alguém de sua estirpe para criar facilidades…
Quem
detinha os arcanos do projeto petista? Quem se especializava — e gosta
ainda hoje de brincar disso… — em interpretar os oráculos? Quem é que
lia as entranhas do poder para tomar as decisões? Sim, dirão vocês, e
estão certos nisto, o chefe era Lula. Ocorre que ele não é um dos
denunciados — não ainda ao menos. Seu braço-direito no controle da
“máquina”, seu “primeiro-ministro”, era — e ele próprio fazia questão de
alardear — José Dirceu.
Responsabilidade objetiva?
Não se cuida aqui, por óbvio, de afirmar que se está diante da chamada “responsabilidade objetiva”, com a qual se podem cometer grandes injustiças. Não! Ao contrário até! Dirceu nem era, formalmente, o chefe do partido. Comandava a máquina que produziu aqueles horrores, em parceria com Lula, porque tinha, ATENÇÃO!, mais do que o poder objetivo de fazê-lo: ELE TINHA O PODER POLÍTICO. Por isso a banqueira Kátia Rabello mantinha encontros com o então chefe da Casa Civil. Porque, afinal de contas, era ele a tomar as decisões.
Não se cuida aqui, por óbvio, de afirmar que se está diante da chamada “responsabilidade objetiva”, com a qual se podem cometer grandes injustiças. Não! Ao contrário até! Dirceu nem era, formalmente, o chefe do partido. Comandava a máquina que produziu aqueles horrores, em parceria com Lula, porque tinha, ATENÇÃO!, mais do que o poder objetivo de fazê-lo: ELE TINHA O PODER POLÍTICO. Por isso a banqueira Kátia Rabello mantinha encontros com o então chefe da Casa Civil. Porque, afinal de contas, era ele a tomar as decisões.
No tempo
em que os petistas ainda apostavam que o processo do mensalão não daria
em anda porque, afinal de contas, tudo estaria dominado, o próprio
Dirceu fazia praça de seu poder. Atenção! Mesmo cassado pela Câmara por
corrupção, mesmo formalmente fora do poder, mesmo atuando como lobista
de empresas privadas, ela concedeu uma entrevista à revista Playboy em que se orgulhava da influência que mantinha no Palácio do Planalto. Leiam trecho:
PLAYBOY – O senhor não parece muito à vontade ao falar da sua atividade de consultor.
José Dirceu – A lei me obriga ao sigilo e à confidencialidade, tanto no escritório de advocacia como aqui. Fazem campanha para me prejudicar. A minha vida é pública, eu continuo fazendo política, então é natural que escrevam e falem de mim. A minha atividade como consultor está totalmente legal, faz dois anos que saí do governo. Eu esperei um ano e meio. Posso fazer qualquer atividade.
José Dirceu – A lei me obriga ao sigilo e à confidencialidade, tanto no escritório de advocacia como aqui. Fazem campanha para me prejudicar. A minha vida é pública, eu continuo fazendo política, então é natural que escrevam e falem de mim. A minha atividade como consultor está totalmente legal, faz dois anos que saí do governo. Eu esperei um ano e meio. Posso fazer qualquer atividade.
PLAYBOY – Ter passado pelo governo que continua no poder não ajuda?
José Dirceu - O Fernando Henrique pode cobrar 85 mil reais por palestra, e eu não posso fazer consultoria? No fundo, o que eu faço é isso: analiso a situação, aconselho. Se eu fizesse lobby, o presidente saberia no outro dia. Porque no governo, quando eu dou um telefonema, modéstia à parte, é um telefonema! As empresas que trabalham comigo estão satisfeitas. E eu procuro trabalhar mais com empresas privadas que com empresas que têm relação com o governo.
José Dirceu - O Fernando Henrique pode cobrar 85 mil reais por palestra, e eu não posso fazer consultoria? No fundo, o que eu faço é isso: analiso a situação, aconselho. Se eu fizesse lobby, o presidente saberia no outro dia. Porque no governo, quando eu dou um telefonema, modéstia à parte, é um telefonema! As empresas que trabalham comigo estão satisfeitas. E eu procuro trabalhar mais com empresas privadas que com empresas que têm relação com o governo.
Voltei
O que mais eu poderia acrescentar contra José Dirceu que ele já não o tenha feito melhor do que eu? Essa entrevista é de 2007, ano em que a denúncia foi aceita pelo Supremo. Então o consultor, o lobista, o deputado cassado por corrupção podia, segundo ele próprio, mobilizar a República com um simples telefonema? Do que não era capaz o superpoderoso chefe da Casa Civil, que não fazia questão nenhuma de esconder que se considerava o sucessor natural de Lula? Dirceu tem tanto orgulho dessa entrevista que a mantém em seu site pessoal.
O que mais eu poderia acrescentar contra José Dirceu que ele já não o tenha feito melhor do que eu? Essa entrevista é de 2007, ano em que a denúncia foi aceita pelo Supremo. Então o consultor, o lobista, o deputado cassado por corrupção podia, segundo ele próprio, mobilizar a República com um simples telefonema? Do que não era capaz o superpoderoso chefe da Casa Civil, que não fazia questão nenhuma de esconder que se considerava o sucessor natural de Lula? Dirceu tem tanto orgulho dessa entrevista que a mantém em seu site pessoal.
No governo
Dilma, seu telefonemas passaram a ter um pouco menos de importância, é
fato. Para compensar, ele decidiu montar uma espécie de governo paralelo
num quarto de hotel, em que recebia, à socapa, os líderes do governo no
Congresso, ministros de Estado, presidentes de estatais, parlamentares…
E o Zé poderia dizer: “Os meus clientes estão satisfeitos”.
Chegou a
sua hora, Dirceu! Faço aqui essa reconstituição porque as minudências do
processo são apenas a expressão, digamos, penal do fato histórico. Sem
contar que, até hoje, fico aqui a me perguntar por que um certo Bob Marques,
carregador de malas de Dirceu, tinha uma autorização — embora não
consta que a tenha utilizado — para sacar R$ 50 mil do Banco Rural. Ou
por que uma ex-mulher de Dirceu, quando foi arrumar um segundo emprego,
foi parar justamente no BMG, um dos bancos que “emprestaram” dinheiro ao
PT (segundo um dos diretores da empresa, foi a pedido de Valério). Ou
por que essa mesma ex-mulher, ao vender um apartamento (e receber R$ 20
mil adiantados, em espécie), encontrou como comprador justamente Rogério
Tolentino, um dos braços-direitos de… Valério!
Às vezes, um mundo que parece pequeno demais é apenas promíscuo demais.
Chegou a sua hora, Dirceu! Que a Justiça lhe seja… JUSTA!
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