A surpreendente vitória de Donald Trump na corrida presidencial americana, creditada por analistas à sua figura de
outsider
e à desilusão de grande parte da população com a classe política
tradicional, marcou uma guinada à direita no país e tem seus paralelos
com eventos recentes no Brasil.
A partir de 2015, em um intervalo de um ano e três meses, grupos
comandados por brasileiros que nunca tiveram cargos públicos organizaram
sete manifestações que levaram multidões às ruas e culminaram na queda
do Partido dos Trabalhadores - que ocupava a presidência do país havia
13 anos.
Tanto cá como lá, os insatisfeitos defenderam a guinada à direita após
perderem dinheiro e empregos e não se viam representados por políticas
sociais de seus governos - como as cotas, no Brasil, ou o direito ao
aborto, nos EUA.
Mas, o que diriam os movimentos "debutantes" do novo cenário politico
brasileiro sobre a renovação política que se inicia nos EUA? Que recados
os americanos dão ao mundo com a derrota de Hillary Clinton? A
radicalização de parte do eleitorado pode se refletir aqui, numa
candidatura do simpatizante de Trump Jair Bolsonaro, em 2018?
Kim Kataguiri, do Movimento Brasil Livre, Rogerio Chequer, do Vem pra
Rua, e Marcello Reis, do Revoltados Online responderam a essas
perguntas, em entrevistas por telefone à BBC Brasil nesta quarta-feira.
O que esperar de Trump
Marcello Reis:
"Estou superfeliz que Trump ganhou. Hillary ridicularizou os homens
brancos protestantes americanos e Trump vai governar para eles, que
provaram que são maioria. Ele se elegeu para defender os nossos valores,
que não são comunistas."
Kim Kataguiri:
"Com Hillary seria pior. Ele tem defeitos, mas em termos de política
econômica, pelo menos, não propõe coisas como taxar grandes fortunas. Há
duas indicações a serem feitas para a Suprema Corte dos EUA. Trump deve
indicar juízes que respeitam o que está na lei. A tendência dos
democratas é indicar juízes com interpretação mais flexível da
Constituição e que não se atêm ao que está escrito."
Rogério Chequer:
"Os conceitos de Trump sobre um Estado menor e menos impostos são
positivos. Mas os valores extremistas impedem que a gente sequer analise
suas outras propostas. Pela forma autoritária e egóica que age, não sei
como será o diálogo dele com o Congresso, outros líderes, potências,
organizações sociais e militares."
O recado dos eleitores
Rogério Chequer:
"Da mesma forma que alguns brasileiros passaram a conhecer o Congresso
que têm no impeachment, muitos passaram agora a conhecer os EUA para
além das grandes capitais. Foi um voto de protesto. As democracias estão
encurtando a sua paciência. Numa era onde a informação anda mais
rápido, a população espera que os problemas sejam endereçados mais
rapidamente."
Kim Kataguiri:
"A maior qualidade do Trump é não ser a Hillary."
Marcello Reis:
"A Hillary é comunista, vista como alguém extremamente ambicioso e
corrupto. Trump é uma cara nova e o politicamente correto não desce
mais, ninguém mais engole. As pessoas de bem querem respeito aos valores
tradicionais e por isso ele ganhou."
Radicalismo
Kim Kataguiri:
"A tendência é que ele tenha uma postura mais sensata, como já mostrou
no discurso de posse. E governar com um Congresso majoritariamente
republicano deve ajudar a regular isso. Mesmo que ele propusesse (muro
na fronteira com o México, deportações de ilegais e barreiras à
muçulmanos), não passaria pelo Congresso. Principalmente pelos
senadores."
Rogério Chequer:
"Tenho certeza que o muro ele não vai construir. Mas não sei com que
afinco ele vai perseguir uma expulsão ou limitação da presença de
muçulmanos nos Estados Unidos. Com aquele temperamento, não dá para
prever."
Marcello Reis:
"Trump representa o novo, então devem vir novidades boas para o mundo
inteiro, como o muro e a blindagem dos Estados Unidos contra
terroristas. Isso mostra que ele realmente está lutando contra o mal,
contra os comunistas, e por isso está sitiando o país."
Bolsonaro 2018?
Rogério Chequer:
"A eleição de Trump indica que a população brasileira pode, como a
americana, fechar os olhos para determinados valores e seguir uma linha
parecida com a de Bolsonaro. Isso aumenta a possibilidade de um bom
desempenho."
Kim Kataguiri:
"Acho que o Bolsonaro não tem chances para ser presidente da República.
Ele deve estar atirando para este lado para conseguir outro cargo, uma
cadeira no Senado, por exemplo. Isso é possível."
Marcello Reis:
"Com certeza isso vai se refletir nas eleições de 2018, porque a
tentativa da esquerda de ridicularizar a direita com rótulo de
'discriminadora' não cola mais. Bolsonaro vai ganhar. Estamos tentando
viabilizar um encontro dele com o Trump, mas assessoria de Trump diz que
ele está sem agenda agora."DO TERRABRASIL
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