Tido como um político calculista, Renan Calheiros passou a viver
perigosamente. Enrolado em oito inquéritos da Lava Jato, o senador
forneceu a colegas que também enfrentam apuros penais um serviço de
desmonte de grampos e escutas ambientais. Fez isso deformando o papel da
Polícia do Senado. E espetou a conta no bolso do contribuinte. Apanhado
em suas exorbitâncias, Renan resolveu dar aula de democracia aos
estúpidos.
Ensinou que “a submissão ao modelo democrático não
implica em comportamentos passivos diante de excessos cometidos por
outros poderes.” Numa apoteose do ilógico político que caracteriza a
inconsequência reinante no Congresso, Renan explicou: “um juizeco
de primeira instância não pode, a qualquer momento, atentar contra um
poder.” Um “chefete de polícia” travestido de ministro da Justiça não
deve prestigiar uma Polícia Federal que cumpre ordem judicial que
desconsidera a invulnerabilidade do Senado.
Todos estranharam o
comportamento de Renan. Até os seus amigos mais próximos acham que ele
perdeu a bússola que o fazia antecipar racionalmente os resultados de
suas ações. Perdido, o mandarim do Congresso exercitou o seu direito de
escolher o próprio caminho para o inferno. Com atraso, Renan descobriu
que houve uma troca de guarda no Supremo Tribunal Federal.
A
presidência da Suprema Corte já não é exercida por Ricardo Lewandowski,
que manteve por três anos na gaveta uma denúncia em que Renan é acusado
de bancar as despesas de uma filha que teve fora do casamento com
dinheiro da Mendes Júnior. Quem preside o Supremo agora é Cármen Lúcia,
que definirá nos próximos dias a data de julgamento da denúncia longeva.
Como que decidida a informar a Renan que o Brasil pode estar mudando, a nova presidente do Supremo tratou Renan como um ‘senadorzeco’
qualquer. Sem mencionar-lhe o nome, ministrou ao senador uma aula de
bons modos. Esinou que a Constituição anota que os poderes da República
são independentes, mas também harmônicos.
“Numa democracia, o juiz
é essencial, como são essenciais os membros de todos os outros poderes,
que nós respeitamos. Queremos também, queremos não, exigimos o mesmo e
igual respeito para que a gente tenha democracia fundada nos princípios
constitucionais.''
Cármen Lúcia acrescentou: ''Somos todos
igualmente juízes brasileiros querendo cumprir nossas funções. Espero
que isso seja de compreensão geral (…) O mesmo respeito que nós, Poder
Judiciário, dedicamos a todos os órgãos da República, afinal somos, sim,
independentes e estamos buscando a harmonia em benefício do cidadão
brasileiro. Espero que isso não seja esquecido por ninguém, porque nós
juízes não temos nos esquecido disso.''
Sem querer, Cármen Lúcia
deu aula também a Michel Temer, cujo ministro foi chamado de “chefete de
polícia”. Em situações assim, não há meio-termo: ou o presidente coloca
seu ministro no olho da rua ou responde ao detrator à altura. Sob a
alegação de que precisa manter a governabilidade, Temer virou uma
espécie de sub-Cármen. DO JOSIASDESOUZA
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