Revista Raça: O que o racismo do Paulo Henrique Amorim representou para você?
Heraldo Pereira: No mundo de hoje, ninguém pode ser ofendido, como fui, pelo fato de ser negro. O agressor não faz uma análise profissional, política ou comportamental da minha pessoa. Ele faz uma leitura intolerante a partir da racialidade. Destaca sempre como fato a ser distinguido a cor da minha pele e desmerece a minha pessoa num gesto de crueldade. Nós negros sabemos bem qual foi a intenção do réu ao dizer que eu, com mais de 30 anos de carreira jornalística e um título de mestre em direito constitucional, não tenho "nenhum atributo para fazer tanto sucesso, além de ser negro e de origem humilde". São expressões racistas que foram seguidas de um jargão máximo da intolerância: "é um negro de alma branca". É algo abjeto, que não posso admitir, sobretudo, partindo de quem deve fazer da comunicação um ofício ético e democrático e não uma ferramenta da intolerância. Fora as outras agressões raciais que ele fez diretamente e admitiu em forma de comentários em seu blog no papel de moderador.
Sou negro, sempre me empenhei em todas as lutas contra os preconceitos e as intolerâncias desde garoto. Sou de uma família de operárias, empregadas domésticas, pessoas residentes em conjunto habitacional de Cohab e que sempre sofreram o racismo na carne. Não vou permitir que um indivíduo que faz propaganda do que é ser negro em suas rodinhas de convertidos tardios ao esquerdismo, todos criados em berço de ouro, venha me dizer o que é ser negro. Nas minhas veias correm, com muito orgulho, sangue de quem foi escravo e ajudou a fazer deste o nosso país. Exigimos respeito com a história de quem construiu o Brasil. Por isso, não poderia deixar essa campanha imunda, com contornos de inveja, passar como se nada tivesse acontecido. Não honraria o meu passado e nem a luta de negros e brancos que combatem o racismo.
O meu agressor chegou a dizer, em sua defesa judicial, que se considera um expoente da luta pela igualdade racial, num gesto de arrogância desmedida. E recebeu uma firme reprimenda do juiz criminal do TJDFT, Márcio Evangelista Ferreira da Silva, para quem, só adere à Luta pela igualdade racial, os que veem diferença entre raças, fato já rechaçado pela genética. Numa das peças de sua defesa, o réu chegou a dizer que ao usar a expressão "negro de alma branca", o fez para me elogiar. Pode isso? Só eu e a minha família sabemos a dor que sofri ao ler todo aquele lixo em formato de texto. É algo indescritível e que, no fundo, jamais será reparado, eu bem sei. O próprio juiz Daniel Felipe no julgamento da ação civil disse isso. Entretanto, eu sempre acreditei na Justiça e continuo acreditando.
Leia aqui a entrevista de Heraldo Pereira, jornalista da Rede Globo, na Revista Raça.
DO CELELAKS
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