segunda-feira, 30 de maio de 2011

Sarney, o Stálin do Maranhão, agora virou juiz da história. “Cadê a estaca?”, perguntaria Paulo Francis

O afastamento de Collor da Presidência da República, que resultou na sua renúncia, não faz mais parte da galeria de imagens do Senado, conforme vocês lêem no post anterior. O bigodudo José Sarney — Paulo Francis sempre perguntava quem enfiaria uma estaca metafórica no coração dele… — se iguala, assim, a outro bigodudo, Josef Stalin. O tirano do Maranhão só é menos sutil. O da Geórgia mandava retocar fotos, eliminando seus inimigos da história. O homem que inventou um estado — o Amapá — só para ser senador e poder se alimentar com a seiva da política já manda eliminar a foto inteira mesmo. É um troço espantoso!
Indagado a respeito da decisão, o que ele respondeu?
“Não posso censurar os historiadores que foram encarregados de fazer a história. Agora, eu acho que talvez esse episódio seja apenas um acidente e não devia ter acontecido na história do Brasil. Não é tão marcante como foram os fatos que aqui estão contados, que construíram a história e não os que de certo modo não deviam ter acontecido.”
Hein??? Fosse uma consideração a ser levada a sério, seria só uma visão estúpida de história. No mundo dos fatos, inexiste a categoria das coisas “que deveriam e que não deveriam ter acontecido”. Imaginem se os judeus fossem eliminar as marcas deixadas pelo nazismo porque aquilo, afinal, “não deveria ter acontecido”.  Ou se decidíssemos jogar fora os arquivos da ditadura porque “não deveria ter acontecido”, como um Rui Barbosa mandando queimar os documentos sobre a escravidão.  Esse critério pode ser ético, pode ser moral, pode ser religioso, pode ser até estético — por exemplo, “Marimbondos de Fogo” não deveria ter acontecido… —, mas isso não é história. O que aconteceu… “acontecido” está, se me permitem a licença.
Sarney, vejam só, tornou-se juiz da história. Não estivesse apenas prestando um favorzinho a seu aliado de agora, Collor — que se elegeu satanizando-o —, estaria dizendo uma grossa bobagem. O “Caçador de marajás”, de fato, não “deveria ter acontecido” no que concerne à moral e aos bons costumes, mas foi um fato. Como foi fato o notável movimento para derrubá-lo, quando as muitas lambanças vieram à luz.
A deposição do primeiro presidente eleito diretamente depois do ciclo militar à esteira da revelação de um impressionante esquema de corrupção — que seria mais tarde superado com folga pelo petismo (não por acaso, estão juntos hoje Lula, Collor e Sarney) — e a posse tranqüila do vice evidenciaram que o país estava, sim, maduro para o jogo democrático. Collor talvez não “devesse ter acontecido”, mas a sociedade cumpriu um dever ao exigir a sua queda. E aquelas páginas da história são bastante meritórias.
Sarney, reitero, está apenas prestando favores — por isso não se deve debater com ele a sério. Como questão geral, cumpre lembrar que, por exemplo, na cadeia de eventos, o Plano Real não deixa de ser uma conseqüência da queda de Collor. Foi ela que permitiu o acordo que levou os tucanos para a base do governo Itamar e FHC para o Ministério da Fazenda. E, bem, o resto também é… história.
Sarney é o mais caro e dileto amigo do PT. É seu grande aliado no Congresso. Todos sabem que o partido de Lula foi um dos protagonistas da deposição de Collor — embora, com efeito, aquele tenha sido um movimento popular. O partido não vai esboçar nem um muxoxo contra a medida stalinista de Sarney. Não vai porque aquele PT, mesmo viciado em muitas porcarias ideológicas, ainda não era este incapaz de explicar que uma de suas estrelas fique milionária da noite para o dia. Que o partido jogue no lixo parte de sua história — afinal, o mensalão também não aconteceu…
O PT e Sarney, no entanto, não têm o direito de eliminar parte da história do povo brasileiro.
Por Reinaldo Azevedo
Rev. Veja

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