sábado, 20 de novembro de 2010

O espetáculo da canalhice não pode parar

20/11/2010
às 17:24 \ Direto ao Ponto
AUGUSTO NUNES

Foi aprovada por 80 votos a resolução da ONU que expressa “profunda preocupação” com as violações dos direitos humanos promovidas pelo governo do Irã, critica a pena de morte e rejeita a violência contra a mulher. Trata-se de mais uma tentativa de salvar Sakineh Ashtiani, condenada a morrer apedrejada — e de colocar o regime dos aiatolás no caminho que leva para longe da Idade da Pedra. Não tenho o que acrescentar ao texto sobre o assunto, republicado neste sábado na seção Vale Reprise.

Outros 44 países votaram contra a resolução. Tornaram-se cúmplices ativos da ignomínia assim justificada pelo embaixador iraniano, Mohammad-Javad Larijani:”O apedrejamento significa que você deve fazer alguns atos, jogando um certo número de pedras, de uma forma especial, nos olhos de uma pessoa. Apedrejamento é uma punição menor que a execução, porque existe a chance de sobreviver. Mais de 50% das pessoas podem não morrer”. Ao abster-se, o Brasil optou pela cumplicidade por omissão. É um dos avalistas do horror.

“A maneira pela qual algumas situações de direitos humanos são destacadas, enquanto outras não, serve apenas para reforçar que questões de direitos humanos são tratadas de forma seletiva e politizada”, miou em nome do Itamaraty o diplomata Alan Sellos. “Eu, pessoalmente, sou contra, mas não posso dizer a quem tem isso na sua cultura que seja contra”, emendou o ministro da Defesa e comerciante de aviões Nelson Jobim. No caso do Irã, o jurista de araque só autoriza discurseiras federais a favor da bomba atômica e de eleições fraudadas. Haja cinismo.

Jobim e o resto da turma sabem que a abstenção obscena só reafirmou que o presidente Lula não hesita em envergonhar a nação para curvar-se à vontade do companheiro Mahmoud Ahmadinejad. A política externa da cafajestagem ao menos é tão coerente quanto os líderes oposicionistas, que não traduziram em protestos veementes a indignação requerida por mais um tapa na cara do Brasil que presta. A oposição oficial está em férias.

“Acho o apedrejamento uma barbárie”, recitou Dilma Rousseff logo depois de eleita. Como não deu um pio sobre a abstenção pusilânime, ou não acha nada ou o que acha não tem importância. Dilma tem murmurado que gostaria de instalar uma mulher no Ministério das Relações Exteriores. Se a execução de Sakineh não ocorrer até o fim deste ano, a Era da Mediocridade vai produzir outro espanto: a cumplicidade do Brasil será confirmada por uma mulher na Presidência da República e outra na chefia do Itamaraty.

O espetáculo da canalhice não pode parar.

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