quinta-feira, 1 de fevereiro de 2018

Cármen Lúcia pede respeito, mas Marun ignora

Deus poupou o ministro Carlos Marun do sentimento do medo. Mas o diabo parece ter tirado do coordenador político de Michel Temer a qualidade do comedimento. Disso resultou um personagem conflituoso. Nesta quinta-feira, enquanto Cármen Lúcia cobrava no Supremo Tribunal Federal respeito às decisões da Justiça, Marun trafegava na contramão: “Hoje, o governo Temer é retaliado pelo Judiciário porque quer fazer a Reforma da Previdência”, disse o trator do Planalto.
Marun referia-se ao caso da quase-ministra Cristiane Brasil. Nomeada para a pasta do Trabalho, a filha de Roberto Jefferson não pôde sentar-se na cadeira porque liminares judicias impediram sua posse. No momento, a escolhida de Michel Temer permanece no limbo graças a uma liminar da própria Cármen Lúcia. A mandachuva do Supremo cassou decisão do STJ, que autorizara Cristiane a assumir o ministério.
Na versão de Marun, os juízes barram a posse da nova ministra do Trabalho porque são contrários às mudanças nas regras da aposentadoria no serviço público, incluídas na reforma previdenciária de Temer. Tomado ao pé da letra, o auxiliar do presidente da República considera que Cármem Lúcia é uma magistrada precária, capaz de expedir sentenças motivadas pelo sentimento de vingança.
Ironicamente, o chefe de Marun, alvo de duas denúncias criminais, estava sentado ao lado da presidente do Supremo quando ela declarou: “Pode-se ser favorável ou desfavorável à decisão judicial pela qual se aplica o direito. Pode-se buscar reformá-la, pelos meios legais ou nos juízos competentes. O que é inadmissível é desacatar a Justiça, agravá-la ou agredi-la. Justiça individual, fora do direito, não é Justiça, senão vingança ou ato de força pessoal”.
Alheio ao discurso de Cármen Lúcia, proferido na solenidade de abertura do ano judiciário, Marun chegou mesmo questionar a moralidade dos juízes que consideram imoral a posse de uma ministra do Trabalho com duas condenações judiciais por desrespeito aos direitos trabalhistas de um par de motoristas. “O que é moralidade? Receber dois auxílios-moradia para dois [juízes] que moram na mesma casa própria?”, questionou.
As interrogações de Marun são dirigidas a Marcelo Brettas. Embora resida em casa própria, no Rio de Janeiro, o juiz da Lava Jato guerreia pelo “direito” de continuar recebendo do erário um auxilio-moradia cumulativo com o de sua mulher. Ficou boiando na atmosfera, porém, uma dúvida: o articulador de Temer considera Cármen Lúcia uma magistrada imoral? A despeito da coragem, o comedimento pede a Marun uma explicação.
Josias de Souza

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