Josias de Souza
Todos os governos, por piores que sejam, cultivam seus mitos de excepcionalidade. Mas é inédita na história a pretensão de Michel Temer de ser um estadista, que merece não só o reconhecimento coletivo como a reeleição à Presidência da República. Em entrevista, o chefe da Casa Civil Eliseu Padilha declarou que Temer não tem pretensões políticas senão a de “cumprir bem o seu mandato”. Acrescentou que a reeleição não está nos planos do presidente. E emendou: “Por enquanto…”
Não é o cinismo de Temer e seu sucesso entre os áulicos peemedebistas que assustam. O cinismo pelo menos é uma coisa consciente. Pode-se compreender que um grupo político recoberto de lama queira camuflar sua imoralidade atrás de hipotéticos projetos reformistas. O que assusta mesmo é a percepção de que nem Temer nem os seus apologistas estão sendo cínicos. Eles acreditam mesmo que fazem ao país o favor de realizar um governo salvacionista, que lhes dá o direito de reivindicar a continuidade.
Se Temer não for candidato, informou Padilha, o PMDB apoiará outro nome. Com uma condição: tem que “defender o legado do governo Temer”, uma gestão que executa a missão especial de “colocar o Brasil nos trilhos.” Os comentários do ministro desconsideram o fato de que Temer não impulsiona as reformas. Ele as enterra, como sucede agora com a não-reforma da Previdência. Ele não conserta a economia, mas torna mais lenta uma retomada do crescimento que poderia ser exuberante.
É certo que o humor compreende também o mau humor. Mas o mau humor que assegura a Temer o título de campeão de impopularidade não compreende que uma piada possa sonhar com a reeleição à Presidência da República. O projeto político que se esconde atrás do “por enquanto” de Padilha é real. Temer passou a acalentar a fantasia de comparecer às urnas de 2018 como recandidato.
Considerando-se o rastro pegajoso deixado pelas duas denúncias criminais congeladas pela Câmara, Temer sonha não com uma nova Presidência, mas com a preservação do escudo da imunidade presidencial. O sucesso do empreendimento depende do reconhecimento de que o Brasil virou uma nação de idiotas.
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