Josias de Souza
A honestidade de Dilma Rousseff tornou-se uma virtude negativa, meio fugitiva. À medida que a Lava Jato avança, a presidente deposta vai enumerando os dez mandamentos de sua honra. Todos começam com não.
“Não roubei, não deixei roubar, não fui complacente com o malfeito, não há dinheiro ilegal nas minhas campanhas, não autorizei João Santana a receber pagamentos no exterior, não troquei mensagens com Mônica Moura numa conta de e-mail clandestina, não avalizei o caixa dois, não deleguei a Guido Mantega a tarefa de coletor de verbas eleitorais, não conversei sobre transações escusas com Marcelo Odebrecht, não beneficiei a construtora em licitação de aeroporto…”
As confissões de João Santana e Monica Moura, o casal do marketing petista, já haviam injetado na ficção de Dilma alguns fatos desconcertantes. A deduragem de Antonio Palocci, rebatida por Dilma, mergulha a criatura de Lula em sua realidade 100% escorada no vocábulo de negação.
O problema de Dilma não é a incapacidade do brasileiro de reconhecer a honestidade de sua ex-governante, mas a incapacidade de madame de demonstrá-la. De resto, como já foi mencionado aqui certa vez, Dilma faz lembrar um personagem secundário do enredo de Júlio César, obra de Shakespeare.
Na peça, atiçados por Marco Antonio, os plebeus saem à caça dos assassinos do imperador. Encontram Cinna. “Matem-no, é um dos conspiradores!”, alguém grita. “Não, é apenas Cinna, o poeta”, retruca uma voz ao fundo. “Então, matem-no pelos maus versos.”
As perversões confessadas por Palocci já seriam suficientes para arrancar Dilma de sua ficção. No momento, porém nada conspira tanto contra fábula de madame quanto os R$ 51 milhões apreendidos no apartamento de Ali-Babá que Geddel Vieira Lima mantinha em Salvador.
Palocci foi ministro de Dilma. Geddel ocupou a vice-presidência de Pessoas Jurídicas da Caixa Econômica Federal no governo da doutora. Alguém pode perguntar: ''De que serve a honestidade presumida de Dilma?'' E uma voz vinda do Além sentenciará: “Que seja condenada pelos maus versos.”
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