Enquanto o povo sambava
no carnaval, os sabotadores da Lava-Jato, sob o olhar complacente do
STF. Post de Augusto Nunes em Veja.com:
Em 7 de fevereiro, o
onipresente Gilmar Mendes sacou do coldre o trabuco retórico para
anunciar o recomeço do duelo com o juiz Sérgio Moro e a força-tarefa do
Ministério Público engajada na Operação Lava Jato: “Temos encontro
marcado com essas alongadas prisões que se determinam em Curitiba”,
avisou o ministro do Supremo Tribunal Federal que também preside o
Tribunal Superior Eleitoral. Em vez de ao menos lamentar a indolência
cúmplice de quem demora a julgar e só absolve, Gilmar se enfurece com
homens da lei que investigam, provam, condenam e prendem.
Em 20 de fevereiro, o
senador Romero Jucá, líder do governo no Congresso, sucumbiu ao medo
decorrente da aproximação do camburão e, disposto a tudo para continuar
sob as asas do foro privilegiado, pariu a Teoria da Suruba: “Se acabar o
foro, é para todo mundo”, comunicou. “Suruba é suruba. Aí é todo mundo
na suruba, não uma suruba selecionada”. Nessa linha de raciocínio, o STF
é uma espécie de casa de tolerância reservada a meliantes incomuns. Por
exemplo, gente como Jucá, um prontuário à espera de uma gaiola desde os
tempos do bercário.
Em 24 de fevereiro, o
ministro Marco Aurélio Mello resolveu infiltrar um recado à Lava Jato,
tão enviesado quanto impertinente, num trecho da justificativa para a
soltura do goleiro Bruno: “A esta altura, sem culpa formada, o paciente
está preso há 6 anos e 7 meses. Nada, absolutamente nada, justifica tal
fato. A complexidade do processo pode conduzir ao atraso na apreciação
da apelação, mas jamais à projeção, no tempo, de custódia que se tem com
a natureza de provisória”. (Horas depois, o advogado Wasley Vasconcelos
reivindicou ao Supremo Tribunal Federal que o indulgente parecer de
Marco Aurélio fosse estendido a seu cliente Luiz Henrique Ferreira
Romão, o Macarrão, amigo de Bruno e seu comparsa na execução e ocultação
do cadáver de Eliza Samudio, ex-namorada do então jogador do Flamengo).
Em 26 de fevereiro,
domingo de Carnaval, o onisciente Gilmar Mendes aproveitou uma
entrevista ao Estadão para endossar a tese do senador que preside o
PMDB. “Eles têm razão: se se quer acabar com o foro, é para todos”,
pontificou o artilheiro do time da toga. (“Eles” são os jucás). À caça
de explicações menos mambembes, o ministro acabou ampliando o acervo de
aberrações que recomendam a imediata interdição da suruba: “Falam de 22
mil autoridades com direito a foro privilegiado. Ora bolas, 17 mil são
juízes. E quanto serão os membros do Ministério Público?” Como engolir
um privilégio com tamanha multidão de beneficiários togados? “Quando se
fala que o grande problema do Brasil é o foro privilegiado, é
irresponsável”, delirou o entrevistado, sem esclarecer onde ouviu
tamanha bobagem. Quem luta pela revogação desse foro inconstitucional e
imoral nele enxerga não a origem de todos os males da nação, mas um dos
muitos tumores que infestam o sistema legal. “Só 8% dos homicídios são
desvendados no Brasil”, foi em frente o ministro. “Os processos não
andam em várias instâncias. As pessoas só são investigadas quando passam
a ter foro privilegiado”. Se os supremos sherloques do de fato
investigam, nunca encontram nada: o índice de condenações no STF é
inferior a 1%.
Em 27 de fevereiro,
dois dias depois do advogado de Macarrão, Rui Falcão descobriu que a
rota de fuga pavimentada por Marco Aurélio e inaugurada por Bruno
poderia ser percorrida por uma trinca de bandidos de estimação
engaiolados em Curitiba. “Diante do excesso de prisões preventivas, sem
motivo e prolongadas no tempo para forçar delações, o rigor jurídico do
ministro Mello para um homicida confesso deveria estender-se ao conjunto
das sentenças do STF”, caprichou no cinismo o presidente do PT num
artigo publicado pelo site do partido. “Afinal, por que manter presos
João Vaccari, José Dirceu e Antônio Palocci – e há outros em situação
semelhante — contra os quais só existem delações e nenhum prova
consistente? É hora de cessar a parcialidade nos julgamentos, dar um fim
à perseguição politica promovida por certos juízes e procuradores e
libertar Vaccari, Dirceu e Palocci”. Rui Falcão, quem diria, enfim
confessou que o PT é um viveiro de goleiros brunos que, em vez de
uniformes de times de futebol, trajam o modelito imposto à população
carcerária.
Conjugados, os cinco
episódios confirmam que, enquanto o País do Carnaval se distraía,
começou neste fevereiro o ensaio geral do bloco dos sabotadores da
Operação Lava Jato. O enredo carece de ajustes, a bateria vive
atravessando o samba, a ansiedade atrapalha a harmonia, os destaques
sofrem frequentes surtos de exibicionismo. Mas seus integrantes já não
escondem o rosto nem recorrem a fantasias para enganar a plateia. Para
manter confinado na área de concentração o bloco da infâmia, é preciso
que as multidões que representam o Brasil decente voltem às ruas e
renovem a advertência: ninguém vai deter a Lava Jato.
É essa a bandeira que
mobiliza, aglutina e une o país que presta. É essa a palavra de ordem
que afugenta e isola tanto extremistas de direita quanto devotos do
lulopetismo que espreitam as manifestações programadas para o fim deste
mês, decididos a deformá-las com reivindicações absurdas,
deliberadamente cretinas ou apenas equivocadas. Os idiotas estão por
toda parte. Assumirão o controle das ruas se a resistência democrática
embarcar na nau dos insensatos. DO O.TAMBOSI
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