Nos últimos trinta anos o Brasil mudou. Depois de reconquistar a democracia, a sociedade evoluiu, os critérios do maléfico e do benéfico se agravaram, novos valores se incorporaram ao cotidiano das pessoas. Devagar, o país trilha o caminho inexorável da modernidade. As maneiras da política, no entanto, permanecem referidas na antiguidade.
Nada mais velho no front do Parlamento que as recentes eleições para as presidências da Câmara e do Senado, evidência da distância abissal entre a oferta dos métodos vencidos dos representantes e a demanda dos representados por meios mais avançados.
À semelhança dos músicos que entoavam as melodias do melhor tempo enquanto o Titanic afundava, deputados e senadores conduziram os processos de sucessão como se mal algum os acometesse nem ameaçasse. Falamos de uma espécie humana que não pode andar na rua, caminhar na praia, frequentar um restaurante ou entrar num avião sem o risco de levar uma invertida nas ventas.
O senador Eunício Oliveira (PMDB-CE) e o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) elegeram-se com a tranquilidade dos cemitérios. Sem ocorrências relevantes, alheios à realidade de fora em que o carrinho sobe a montanha-russa vagarosamente, mas está prestes a desabar na toada da Operação Lava-Jato.
Eunício Oliveira é o 21º presidente do Senado desde a redemocratização, período no qual o posto foi ocupado dezesseis vezes por senadores filiados ao PMDB, considerados aqui os quatro mandatos de Renan Calheiros e José Sarney cada um, eleitos e reeleitos a despeito de escândalos, denúncias e processos.
Réu perante o Supremo Tribunal Federal, Calheiros foi aclamado líder do partido por seus pares que não encontraram em sua folha corrida impedimento algum. Além dele, nos últimos 32 anos dois presidentes do Senado (Antônio Carlos Magalhães e Jader Barbalho) viram-se na contingência de renunciar ao cargo para não perder o mandato por quebra do decoro parlamentar.
Assim como seu colega do Senado, Rodrigo Maia é citado em delações decorrentes da Lava-Jato. Foi eleito com a sustentação do governo federal, presidido por Michel Temer, que é apontado por delatores como beneficiário do duto de propinas construído entre partidos e empreiteiras, alvo do Tribunal Superior Eleitoral em acusação de uso indevido de recursos na campanha presidencial de 2014.
O que significa o relato acima? Que as trocas nos postos não correspondem à mudança dos fatos. E fato é que a vida passou na janela, mas só o Congresso não viu. Pagará em breve o preço da indiferença aos postulados éticos. Cidadãos podem até não corresponder a esses critérios no cotidiano, mas esperam que seus representantes observem as regras da melhor conduta.
Com razão. Racionalidade cuja expressão é a busca do voto. Eleitor indiferente corresponde a eleito frouxo. Tal indiferença abre espaço para o que der e vier. Notadamente a representantes permeáveis ao que vier e der. Portanto, amigos leitores e caras leitoras, vamos ao nosso trabalho de cobrar, examinar e julgar. DO A.NUNES
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