Mais um listão: em delação, ex-presidente da Andrade envolve ex-governadores, senadores, ministros e ex-ministros de Lula e Dilma
Otávio
Azevedo, ex-presidente da Andrade Gutierrez, acusou Ricardo Berzoini,
ministro da coordenação política, de negociar propina em obras federais.
E disse que Edinho Silva, da Comunicação Social, pediu dinheiro para a
campanha de 2014 e foi informado sobre “doações” oriundas do petrolão
O DELATOR - O ex-presidente da empreiteira contou que o esquema de cobrança de “comissões” começou no governo Lula
(Vagner Rosario/VEJA)
Das
grandes empreiteiras envolvidas no escândalo de corrupção na Petrobras,
a Andrade Gutierrez foi a primeira a decidir contar seus segredos.
Durante quase uma década, Otávio Azevedo presidiu o que é hoje um vasto
conglomerado, expandiu seus negócios para a área de energia, saneamento,
transportes e tecnologia, e passou a atuar em quatro continentes -
crescimento combinado com as boas relações que sempre manteve com o
poder, especialmente a partir de 2003, quando Lula chegou ao governo.
Preso e acusado de pagar propina a políticos envolvidos no escândalo do
petrolão, Otávio Azevedo assinou um acordo de delação premiada com a
Justiça. Em troca da liberdade, comprometeu-se a contar detalhes da
relação simbiótica que, por mais de uma década, transformou políticos em
corruptos e empresários em corruptores. As revelações do executivo
fornecem evidências que não deixam dúvidas sobre a natureza dos governos
de Lula e Dilma Rousseff. Ambos tinham na corrupção um pilar de
sustentação.
Em
sua confissão, Otávio Azevedo contou que pagar propina por obras no
governo petista era regra em qualquer setor - e não uma anomalia apenas
da Petrobras. Nos depoimentos prestados pelo empreiteiro aos
investigadores da Procuradoria-Geral da República são descritas
transações associadas ao nome de alguns dos políticos mais influentes do
país. Combinados a um calhamaço de demonstrativos bancários, minutas de
contratos e registros de reuniões secretas, os relatos produzem um
acervo sobre o grau de contaminação dos governos petistas. Estão
envolvidos ministros, ex-ministros, ex-governadores e parlamentares de
múltiplos quilates. Eles negociaram pagamentos milionários de propina
com a empreiteira e, com isso, vilipendiaram o mais sagrado dos rituais
em uma democracia: o processo eleitoral. A lista de Otávio Azevedo deixa
em péssima luz tanto o ex-presidente Lula quanto a presidente Dilma
Rousseff. Todos os comprometidos nas maquinações narradas pelo
empreiteiro são figuras presentes na intimidade do ex e da atual
mandatária do Planalto.
No
governo Lula, segundo ele, cobrava-se propina de 1% a 5% das
empreiteiras interessadas em participar dos consórcios que executavam as
obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O negociador do
pacote de corrupção, de acordo com o empreiteiro, era Ricardo Berzoini,
atual ministro da coordenação política. O executivo contou que, certa
vez, a cúpula da Andrade Gutierrez foi procurada por Berzoini, que se
apresentou como representante do PT para resolver pendengas financeiras.
Em outras palavras, o petista era o encarregado de acertar o
recebimento de "comissões" por contratos no governo. O ministro, durante
bom tempo, foi responsável pela administração da "conta corrente" das
obras de Angra 3 e da hidrelétrica de Belo Monte.
O
setor elétrico, como a Lava-Jato já descobriu, era um dos grandes
vertedores de dinheiro sujo para os cofres do PT. As empreiteiras eram
achacadas em todas as fases, e por personagens distintos. Berzoini
cobrava depois de assinados os contratos. Antes disso, ainda na fase de
estudos, apareciam outros figurões do partido para "ajudar" nas
negociações. Segundo o empreiteiro, Erenice Guerra, ex-chefe da Casa
Civil de Lula e braço-direito de Dilma, e Antonio Palocci, ex-chefe da
Casa Civil de Dilma e braço-direito de Lula, auxiliavam as empreiteiras
na formação dos consórcios que mais tarde executariam as obras. Cobravam
1% de propina pelo serviço. Só depois disso os projetos destravavam, os
preços ficavam dentro do que as empreiteiras queriam e todos, exceto os
contribuintes, saíam ganhando.
Em
janeiro passado, VEJA revelou que Otávio Azevedo havia sido alvo de uma
abordagem nada republicana durante a campanha presidencial de 2014. O
executivo contou que foi procurado pelo tesoureiro Edinho Silva, hoje
ministro da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da
República, e por Giles Azevedo, ex-chefe de gabinete e atual assessor
especial de Dilma. Os dois queriam dinheiro, mais dinheiro, 100 milhões a
mais do que a quantia que a empreiteira havia combinado "doar" à
campanha. Da negociação, sabe-se agora, surge uma evidência mais grave.
Para explicar que não podia atender ao pedido, Azevedo explicou que os
"acertos" da Petrobras já haviam sido repassados. O tesoureiro e o
assessor disseram que isso era outra coisa. Ou seja, Edinho e Giles, ao
menos naquele instante, foram informados sobre a existência de repasses
oriundos do petrolão. Não se surpreenderam ou não se interessaram. Como a
pressão continuou, a Andrade "doou" mais 10 milhões à campanha petista.
A
roubalheira não poupou as obras dos estádios para a Copa de 2014. Em
sua lista, Azevedo incluiu como beneficiários de propinas cinco
ex-governadores de estados que sediaram o Mundial. Todos embolsaram
"comissões" para favorecer a empreiteira na construção das arenas e na
realização de outras obras relacionadas à Copa. Otávio Azevedo admite o
pagamento de propina aos ex-governadores do Distrito Federal José
Roberto Arruda (então no DEM) e Agnelo Queiroz (PT), responsáveis pelas
obras do Estádio Nacional Mané Garrincha, um monumento ao
superfaturamento que custou quase 2 bilhões de reais. Ele também disse
ter pago propina a Sérgio Cabral, ex-governador do Rio de Janeiro, a
Eduardo Braga (PMDB), ex-governador do Amazonas e atual ministro de
Minas e Energia, e a Omar Aziz (PSD), hoje senador. Otávio Azevedo foi
transferido para prisão domiciliar após entregar a lista de seus
"clientes" famosos. A empreiteira também aceitou pagar uma multa de 1
bilhão de reais.
Criticados
no início da Lava-Jato, os acordos de delação foram, sem dúvida,
fundamentais para o sucesso das investigações. Através deles,
quebraram-se pactos de silêncio, localizaram-se contas secretas no
exterior, figurões e figurinhas foram parar na cadeia. Em busca da
liberdade ou da redução da pena, outros envolvidos entraram na fila para
contar o que sabem. Na semana passada, advogados da Odebrecht e da OAS
estiveram em Curitiba conversando com o Ministério Público sobre a
possibilidade de seus clientes serem admitidos no programa. Marcelo
Odebrecht está condenado a dezenove anos e quatro meses de prisão. Léo
Pinheiro, ex-presidente da OAS, a dezesseis anos e quatro meses. Além
deles, buscam o acordo o marqueteiro João Santana, que recebeu dinheiro
sujo como pagamento de serviços eleitorais a campanhas do PT, o
pecuarista José Carlos Bumlai, amigo de Lula e envolvido até o pescoço
no petrolão, e o senador petista Delcídio do Amaral.
Não
será uma negociação fácil: o esquema de corrupção na Petrobras está
praticamente todo desvendado. Falta apenas confirmar quem era o chefe, o
mandante. Ou seja, os benefícios serão concedidos a quem ajudar os
procuradores a chegar lá. Todos os investigados têm informações que
podem levar ao topo da cadeia de comando. A dúvida é saber quem vai
tomar a iniciativa de falar primeiro. O senador Delcídio está na frente.
Preso em novembro do ano passado por atrapalhar as investigações, ele
revelou que tanto Dilma quanto Lula sabiam e se beneficiaram do
petrolão. O petista narrou detalhes de negócios fraudulentos realizados
pelo PT na China e em Angola, também citando os ex-ministros Antonio
Palocci e Erenice Guerra. Elencou, ainda, dezenas de políticos que
receberam dinheiro de corrupção - incluindo, de novo, o presidente do
Congresso, Renan Calheiros, e os peemedebistas Romero Jucá, Jader
Barbalho e Eunício Oliveira - e até um representante da oposição, no
caso, o senador tucano Aécio Neves. Por fim, acrescentou uma nova
história de extorsão ao currículo do ministro Edinho Silva. O então
tesoureiro de Dilma, de acordo com o senador petista, repetiu os métodos
denunciados pela Andrade para arrancar dinheiro do laboratório EMS na
campanha presidencial. Se tudo for verdade, faltará mesmo muito pouco
para ser contado.
14/03/2016 - DO R.DEMOCRATICA
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