quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

ZUENIR VENTURA: Num dia você diz “não é possível”; no outro, fica ainda pior. Esse é o Brasil em que vivemos

(Imagem: Reprodução/Fabiocampana.com.br)
Depois de mensalão e petrolão, está certo o ministro Jorge Hage: “não me assusto com mais nada”, disse (Imagem: Reprodução/Fabiocampana.com.br)
EM CASA COM O INIMIGO
Artigo publicado no jornal O Globo
carinha_colunista_zuenir_venturaDepois de 12 anos como ministro-chefe da Controladoria-Geral da União, órgão de fiscalização do governo, Jorge Hage, saturado, desabafou: “Não me assusto com mais nada.” Mesmo sem ter investigado cartéis, quadrilhas, esquemas e escândalos, como ele, posso dizer que no meu caso o que acabou foi a surpresa. Temo não me espantar com mais nada.
Muitos leitores já estão assim: blasés, cínicos. É tamanha a overdose de mais do mesmo todo dia que pode estar ocorrendo uma certa anestesia após as reações iniciais.
Primeiro, os escândalos produziram choque; em seguida, indignação; depois, apatia; e agora, impotência, como se nada pudesse ser feito. A política tornou-se um espetáculo tristemente enfadonho, alternando personagens e proezas que se superam diariamente: os de hoje são mais incríveis do que os de ontem, e certamente menos do que os de amanhã.
Num dia você diz “não é possível”, ao ler que o desvio no petrolão é seis vezes maior do que o do mensalão. No dia seguinte, são os e-mails de uma ex-funcionária mostrando que a cúpula da empresa, incluindo a presidente, fora alertada sobre uma série de graves irregularidades antes do início da Operação Lava-Jato. E assim por diante.
Um gerente se compromete a devolver US$ 100 milhões desviados, e ninguém explica como um gerente — não um diretor — conseguia acumular essa fortuna sem que um superior percebesse, numa empresa com hierarquia e níveis de comando e de controle?
A geração que nos anos 50 saiu às ruas gritando “O petróleo é nosso” jamais podia imaginar que o inimigo não estaria fora, mas dentro da estatal, e que o orgulho nacional um dia viraria caso de polícia ou, como disse um procurador da República, “uma aula de crime”. De fato, o vocabulário a ela associado passou a ser o da crônica policial: propina, suborno, corrupção, lavagem de dinheiro, organização criminosa, desvio, roubo.
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DO RICARDOSETTI

Um comentário:

  1. Parabéns. Disse tudo em poucas palavras. "Primeiro, os escândalos produziram choque; em seguida, indignação; depois, apatia; e agora, impotência, como se nada pudesse ser feito. A política tornou-se um espetáculo tristemente enfadonho, alternando personagens e proezas que se superam diariamente: os de hoje são mais incríveis do que os de ontem, e certamente menos do que os de amanhã." É de fato uma triste realidade. Isso é coisa de Republiqueta de Banana.

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