sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Ué… Agora os petistas vão ficar bravos porque os chamo de… petistas? Por quê? Ou: Há mais sobre a “relatora petista da ONU”

É, fui mexer no vespeiro, e adivinhem só: as vespas vieram pra cima de mim, como se eu já não estivesse imunizado contra esse tipo de ataque. Lia-se ontem no jornalismo online que a ONU iria denunciar violação de direitos humanos no Pinheirinho, em São Paulo, e lançar um “apelo urgente” cobrando explicações. Sei, sei… O que, ou quem, estava sendo chamado de ONU era Raquel Rolnik, uma “relatora especial para o Direito à Moradia Adequada”. O que se omitia —  e é possível que os jornais omitam ainda hoje — é que Raquel é do PT e trabalhou na Prefeitura de São Paulo quando Luiza Erundina era prefeita (e não Marta Suplicy; já corrigi o primeiro post) e no Ministério das Cidades no primeiro governo Lula. O que eu fiz? Ora, escrevi um post contando quem é ela. Fiz mal? Menti? Não!
Acho que fiz bem em contar as verdades que os outros omitiram, não é? A área de comentários foi invadida pelos petralhas. Xingam-me de tudo quanto é nome! Só não conseguem me contestar — e os que tentam fazem humor involuntário, como vocês verão. Eles acham que os leitores não tinham o direito de saber que a tal “relatora” é, de fato, uma fiel servidora do petismo. Mas eles sempre me estimulam, e isso quer dizer que eu tenho mais algumas coisinhas a falar sobre dona Rolnik — que concede uma entrevista à Folha desta sexta que é um assombro, vejam lá; não vou me ocupar dela no detalhe, ou isto não tem fim.
Raquel não é “a ONU”
Comecemos com uma questão elementar. Raquel não pode ser chamada de “a ONU” nem por metonímia porque relatores especiais, que atuam em contato com o Conselho de Direitos Humanos não representam as Nações Unidas. São conselheiros independentes — ela é uma das 36, como vocês podem
ler na página da ONU. Esses relatores independentes podem, então, agir como lhes der na telha? Não! Nesta outra página, há o conjunto de procedimentos. E uma deles consiste justamente em VISITAR OS PAÍSES e eventuais áreas em que os direitos humanos estejam sendo desrespeitados. Mais: há a recomendação explícita para manter “reuniões com autoridades nacionais e locais, incluindo membros do Judiciário, parlamentares, ONGs… Só ao fim da visita é que se faz um relatório ao Conselho de Direitos Humanos, com as devidas recomendações.
Muito bem! Raquel foi ao Pinheirinho, conversou com o governo de São Paulo, com a Polícia, com o Judiciário? Nada!!! Antes mesmo de qualquer apuração, ela já expediu uma sentença condenatória, como se fosse esse o seu papel. E não só nesse caso. Em seu blog, ataca três ações do governo do Estado, todas elas DESTINADAS, VEJAM SÓ, A FAZER CUMPRIR A LEI. Qual é a independência de uma relatora da ONU que já tem prontas as conclusões antes de qualquer apuração? Eu provo o que digo. Acima estão os links para textos que deveriam orientar a sua atuação.
ATENÇÃO! Entre os papéis de Raquel Rolnik está, sim, fazer um “apelo urgente”, como o que ela diz ter feito, cobrando informações. MAS NÃO LHE CABE EXPEDIR OU EXPELIR UMA SENTENÇA CONDENATÓRIA, como ela já fez em seu blog. Na sua entrevista a Eleonora de Lucena, na Folha,  diz este troço espantoso: “O Judiciário [brasileiro] não obedeceu à legislação internacional”. Como, minha senhora? Então existe uma “legislação internacional”??? Acreditem: ela não estava tentando ser engraçada, coitada!; é provável que só quisesse ser justa. Quando muito, existem alguns valores que compõem um arcabouço de civilidade, mas não existe uma “legislação internacional” que impeça uma reintegração de posse, por exemplo. Ainda não se estabeleceu o governo mundial…
Indagada se apurou alguma coisa sobre a atuação do PSTU na área — que é quem “administrava” o Pinheirinho (ver post abaixo), Rolnik respondeu:
“Não tenho detalhes de como cada liderança agiu. A comunidade procurou resistir porque acreditou que a liminar que suspendia a reintegração ainda estava válida.”
Ah, bom! Ela não teve tempo de acompanhar o trabalho do PSTU… Prefere demonizar a polícia, que cumpria uma determinação judicial.
Há uma porção de tratados e declarações internacionais que dizem respeito à moradia de que o Brasil é signatário. São objetivos a perseguir. Mas atenção! À diferença do que sugere Raquel Rolnik, INEXISTE uma legislação internacional que oriente o Poder Executivo a descumprir uma decisão judicial. A atuação política pregressa de Raquel e a linguagem a que recorre em seu blog contra sucessivas ações — corretas e legais — do governo de São Paulo tiram dela a credibilidade e a isenção para emitir o tal apelo. Aliás, a ONU estabelece precondições para a própria emissão do tal apelo, a saber:
- identificação das supostas vítimas;
- identificação dos supostos autores da infração;
- identificação da pessoa ou organização que comunica a infração (informação mantida em sigilo);
- data e local do incidente;
- uma descrição detalhada das circunstâncias do incidente em que a alegada violação ocorreu.
E outras exigências podem ainda ser feitas.  A ONU é explícita ao recomendar que se evite o viés político nas comunicações de violação. E é literal: “As comunicações [de violações] não devem ser baseadas exclusivamente em relatos da mídia.” Acho que Raquel Rolnik não teve tempo de fazer nada disso. A entrevista que dá e o blog que escreve são sentenças condenatórias que a desautorizam porque contrariam as próprias exigências da ONU para um relator independente..
Reação
Ela tem, no entanto, alguns valentes admiradores. Um deles ficou muito bravo porque cometi uma falha: afirmei que seu blog não trazia a informação de sua participação na gestão petista de São Paulo e no Ministério das Cidades de Lula. De fato, não está na home, mas há botão que remete para essas informações. Feito o reparo.
O resto é chororô e  violência verbal. Petistas adoram falar como se fossem apenas pessoas preocupadas com o bem da humanidade. Quando se revelam suas vinculações, ficam furiosos. O Marcel Branco, que parece ser ligado à USP (dado o e-mail), manda uma defesa de Raquel e escreve este brinco:
“É verdade que ela condenou antes de qualquer apuração por parte da ONU. Ocorre que ela, além de relatora das Nações Unidas, é também urbanista, professora e cidadã. O blog não pertence à ONU e nem se restringe a falar sobre assuntos relacionados à essa organização.”
Entendi, Marcel! Quando alguém é “urbanista, professora e cidadã”, isso lhe confere o direito de condenar antes de apurar. Tenha dó!
Uma tal Daniele me envia um comentário quase tão analfabeto como aquelas cartas que o MEC envia para os estudantes do Enem… No seu melhor trecho, tentando me ofender, ela dispara:
“Não sou petista, petralha, ou o que quer que vc ache dos partidos de esquerda. Apenas estou absurdada com tamanha falta de despreparo jornalístico.”
Você tem razão, ô absurdada! Falta-me muito despreparo!!! Caramba! Abriram a casinha!!!
Caminhando para o encerramento
Eu gosto dos fatos ou desgosto deles. Mas lido com fatos. Dona Rolnik resolveu botar a boca no trombone com base no barulho e nas mentiras contadas por grupos de pressão que atuam nas redes sociais. É uma prática antiga dos petistas. A gente viu como prosperou a mentira de que houve mortos no Pinheirinho…
Há mais coisas sobre a atuação de Rolnik que eventualmente ficam para o futuro. Ela foi, por exemplo, diretora de uma ONG chamada Instituto Pólis, que lida com questões urbanas, entre 1997 e 2002. Entre 2003 e 2007, foi secretária nacional de Programas Urbanos do Ministério das Cidades, e o Pólis passou a ser a um dos mais pressurosos prestadores de serviço — como ONG, claro! — do Ministério das Cidades, trabalhando justamente com Rolnik. Tudo deve ter sido de uma honestidade franciscana, eu sei. Mas eram trabalhos remunerados, e o procedimento é — como ficaria claro depois, quando a prática se generalizou, e o governo foi fatiado em ONGs —, como direi?, heterodoxo.
Como acho a clareza uma virtude, então deixo tudo muito claro.
Por Reinaldo Azevedo
REV VEJA

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