Ainda há muito por fazer e o preço da aventura é mistério total
Domingo, 16 de Outubro de 2011, 03h06
Filipe Araujo/AE
Itaquerão corre para recuperar o tempo perdido
No último balanço divulgado pelo governo federal, em setembro, o custo da Copa, considerando-se o dinheiro a ser investido em estádios, portos e aeroportos e em mobilidade urbana, foi estimado em R$ 27,1 bilhões. Aumento de cerca de 14% em relação aos R$ 23,1 bilhões do balanço de janeiro e de 26% sobre os R$ 21,5 bilhões de previsão feita em 13 de janeiro de 2010, quando o ex-presidente Lula assinou a Matriz de Responsabilidade.
Esses R$ 27,1 bilhões estão a anos-luz de uma estimativa feita pela Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), que calculou em R$ 112 bilhões o custo com a Copa. O estudo da associação, que tem parceria técnica com a CBF e o Ministério do Esporte, inclui também gastos com hotelaria, segurança, tecnologia e saúde, entre outros. Mesmo assim, a diferença é grande, pois o balanço do governo acrescenta apenas R$ 10,3 bilhões para esses itens.
Os números são mesmo conflitantes. Na sexta-feira, o governo divulgou atualização na Matriz de Responsabilidade e a conta baixou para R$ 26,1 milhões. "A Matriz é um documento que precisa ser atualizado com os ajustes que são feitos enquanto a obra está em andamento. Isso é essencial para a transparência do processo", esclareceu Alcino Reis, secretário Nacional de Futebol e Defesa dos Direitos do Torcedor do Ministério do Esporte.
Mas não evita, ou diminui, a confusão. No mesmo dia, a Controladoria Geral da União (CGU)inaugurou ferramenta no portaldatransparência.gov.br que permite acompanhar os custos estimados por área de investimento. Valor da soma dos gastos com estádios, aeroportos e portos e mobilidade urbana: R$ 24,024 bilhões.
O fato é que em todas as áreas ligadas à Copa existem pontos nebulosos quando se trata de orçamentos. Estádios, por exemplo. O Maracanã, virtual palco de encerramento do Mundial, já viu o orçamento flutuar entre R$ 705 milhões e R$ 1,1 bilhão. Atualmente, a conta está em R$ 859,9 milhões, depois que o TCU (Tribunal de Contas da União) estrilou com o orçamento que lhe foi apresentado. Mas esse valor parece longe de ser definitivo.
A arena do Corinthians também pode sair por bem mais que os R$ 820 milhões anunciados. Já é certo que haverá o custo extra da estrutura provisória necessária para aumentar a capacidade do estádio de 48 para 65 mil - fala-se em até R$ 70 milhões, dinheiro que vai ser retirado dos cofres do governo estadual.
Pouco mais de um ano atrás, o diretor de marketing do Corinthians, Luiz Paulo Rosenberg, dizia que o Itaquerão, para 65 mil pessoas, ficaria em R$ 600 milhões. A Fifa começou a fazer exigências e o custo cresceu. Não será surpresa se, no frigir do ovos, passar de R$ 1 bilhão. Justiça seja feita, Rosenberg também falou em setembro do ano passado que erguiria uma arena para 48 mil pessoas por R$ 335 milhões. Mas aí, nada de Mundial.
Menos mal que, de maneira geral, as obras nas arenas estão ganhando ritmo. Há dores de cabeça, como a das Dunas, em Natal, ainda em estágio inicial, e do Beira-Rio, em Porto Alegre, com obras paralisadas desde que o Inter resolveu achar um parceiro para ajudar a bancar os custos de R$ 290 milhões. O acordo com uma construtora foi feito, mas o contrato ainda não está assinado.
Claro que cada pescador puxa a sardinha para seu lado no momento de defender suas intervenções. Isso leva a situações curiosas, como a da Arena da Baixada, em Curitiba. A rigor, as obras começaram há alguns dias e, do que é necessário, quase nada foi feito. Por isso, tem analista que considera que apenas 6,7% dos trabalhos estão concluídos. A conta do governador do Paraná, Beto Richa, é outra. Como muita coisa já está pronta no estádio do Atlético, ele entende que 60% do caminho para receber partidas da Copa já foi percorrido. Pode-se dizer que os dois lados têm razão.
Aflição. O ritmo das intervenções de mobilidade urbana nem de longe podem ser comparadas ainda ao dos estádios. Dos 49 projetos, apenas 9, em 4 cidades, estão em desenvolvimento. O restante ainda está na fase de projeto ou licitação. E alguns podem ficar apenas no papel.
A situação causa aflição até mesmo na presidente Dilma Rousseff. "Temos de ser capazes de correr contra o tempo'', disse ela esta semana em Curitiba, onde anunciou investimentos em mobilidade.
O governo tenta colaborar. Reconsiderou a ameaça de retirar do PAC da Copa obras que não começassem até dezembro, mas pediu agilidade. Porém, há casos emblemáticos: Cuiabá, por exemplo, conseguiu trocar na Matriz de Responsabilidade o projeto de BRT (Bus Rapit Transit) pelo VLT (Veículo Leve sobre Trilhos). Salvador propõe fazer o mesmo: pôr o metrô de superfície no lugar no VLT. Por causa disso, a obra de mobilidade da capital baiana foi temporariamente retirada da Matriz.
São Paulo ainda não começou suas obras. As 5 intervenções viárias na região de Itaquera que consumirão R$ 478,2 milhões (R$ 345,9 milhões do Estado e R$ 132,3 milhões da Prefeitura) têm projetos básicos prontos e licitação em fase de preparação. O valor dessas obras não consta da Matriz de Responsabilidade. O projeto que consta é o do Monotrilho que ligará o aeroporto de Congonhas à estação Morumbi, da CPTM. O monotrilho que passará pelo estádio do Morumbi (excluído da Copa), teve o valor reajustado de R$ 2,860 bilhões para R$ 3,108 bilhões. Ficou na matriz sobre a alegação de que transportará as pessoas até o metrô e, portanto, servirá de acesso até Itaquera.
O governo paulista também se comprometeu a investir R$ 2,5 bilhões na melhoria das linhas de trem e metrô que levam a Itaquera. Tal valor também não consta da Matriz de Responsabilidade. Dúvidas no ar. A questão dos aeroportos também causa desconforto. Vários deles já tiveram as obras - de reforma e ampliação de terminais, pistas e pátio, em sua maioria - iniciadas. Em outros, as melhorias continuam apenas nos projetos. Dinheiro parece não faltar, pois o governo se comprometeu a investir exatos R$ 6.5 bilhões na área. O desencontro, porém, permanece.
Há um grupo, composto por institutos, entidades de classe e políticos, que mantém a aposta de que não dará tempo para que tudo fique pronto. O governo insiste que os prazos serão cumpridos.
No início desta semana, no Rio, parlamentares integrantes da Subcomissão Temporária da Copa de 2014 voltaram a dizer que é preciso acelerar o ritmo das obras, do contrário os aeroportos brasileiros não comportarão a demanda esperada para o Mundial. "Nenhuma cidade está dentro do prazo. Obras que ainda nem começaram já deveriam estar na metade'', criticou, por exemplo, Romário, deputado pelo PSB-RJ.A "grita'' dos parlamentares obrigou o governo a reagir. E a repetir o discurso otimista adotado quando se toca no tema. "No nosso controle, nos dados que temos do governo e da Infraero é que todos (os aeroportos) ficarão prontos a tempo e hora'', rebateu o ministro-chefe da Secretaria de Aviação Civil, Wagner Bittencourt. Ele foi mais longe. "Algumas (obras) podem ser entregue até antes, em outubro.''No último balanço dos preparativos para a Copa, divulgado em setembro, oito das 13 intervenções têm previsão de conclusão para dezembro de 2013. O que pode ajudar é a disposição do governo de entregar à iniciativa privada a gestão dos aeroportos. Nesta semana, foi definido o modelo dos editais de concessão para os aeroportos de Cumbica, Viracopos e Brasília. Pelo documento, os concessionários terão metas a cumprir, tanto de investimentos (R$ 4,47 bilhões até a Copa), como de entrega das reformas necessárias para atender à demanda do Mundial, sob pena de multas pesadas pelo não cumprimento. O governo estima realizar o leilão ainda em dezembro e considera haver tempo suficiente para que o Brasil chegue à Copa navegando em céu de brigadeiro. Mas sabe que muita coisa terá de ser feita até lá.
FONTE: ESTADÃO
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