Josias de Souza
Michel Temer fez pose de pretendente ao trono pela primeira vez em agosto de 2015. Acumulava o cargo de vice-presidente da República com a função de coordenador político do governo Dilma Rousseff. Com as crises moral e econômica a pino, declarou aos jornalistas: “É preciso alguém que tenha a capacidade de reunificar a todos.” Conseguiu. Presidente mais impopular da história, com apenas 5% de aprovação segundo o Datafolha, Temer reunificou o país contra si mesmo.
Em sua pesquisa mais recente, divulgada no início do mês, o Datafolha constatou que nove em cada dez brasleiros (89%) são favoráveis a que a Câmara autorize a abertura de processo contra Temer por formação de organização criminiosa e obstrução à Justiça. Entretanto, alheio à fome de limpeza que está no ar, Temer gastou recursos que o Tesouro Nacional não tem para impor sua Presidência aos brasileiros até 31 de dezembro de 2018.
Favorecido pela ausência de alternativas e pela anestesia das ruas, o presidente abusa da paciência dos brasileiros que gostariam que ele deixasse o Planalto, de preferência na semana que vem. Nesta quarta-feira, 25 de outubro de 2017, ao sepultar a segunda denúncia contra o primeiro presidente da história a ser alvejado por investigações criminais em pleno exercício do mandato, a Câmara inaugura uma contagem regressiva. Faltam 432 dias para a viagem de volta de Temer ao ostracismo, em São Paulo. Será um suplício acompanhar a decomposição diária de um presidente que fez da falta de recato o seu sacerdócio.
Ao presentear a bancada ruralista com a portaria que favoreceu o trabalho escravo, momentaneamente suspensa pelo STF, Temer mostrou até onde é capaz de chegar. Antes de ser gravado pelo delator Joesley Batista, prometia recolocar o Brasil nos trilhos. Agora, tende a virar maquinista de trem fantasma. Nas próximas semanas, o governo volatará a ameaçar a sociedade com o aumento de impostos. E levará às manchetes a alma penada do corte do abono salarial que assegura a quem recebe até dois salários mínimos por mês o pagamento de um salário extra por ano.
Depois de aprovar a emenda constitucional do teto de gastos, Temer não fez outra coisa além de gastar. Todas as medidas de austeridade anunciadas pelo governo —do adiamento de reajustes salariais de servidores ao cancelamento de benefícios tributários— encontram-se retidas no Planalto. A exemplo do que sucede com a reforma da Previdência, a chance de aprovação de medidas austeras diminui na proporção direta da aproximação do calendário eleitoral de 2018. Iniciativas que poderiam reforçar o caixa, como o programa de privatizações, vão subindo no telhado. Antes do Natal de 2018, o teto de gastos deve se revelar uma boa intenção subvertida pelos fatos num pesadelo a ser administrado pelo gestor de crises a ser eleito presidente na próxima sucessão.
Fraco e impopular, Temer assistirá a um estreitamento de sua margem de manobra. Voltará a fazer pose de reformador econômico. Mas terá de lidar com congressistas pouco afeitos à ideia de contrariar o eleitorado. O empresariado vai se revelando incapaz de acreditar na força política de Temer para impor suas reformas. E o presidente é incapaz de demonstrá-la.
Ainda que fosse o presidente que imagina ser, Temer teria de lidar com a aversão do brasileiro à roubalheira. Segundo o Datafolha, a maioria dos eleitores (62%) considera que a corrupção acarreta mais danos ao país do que a incompetência dos governos. Notáveis 80% concordam com a ideia de que ''a corrupção é inaceitável em qualquer circunstância''. Um contingente de 74% discorda da seguinte frase: “Se um governante administra bem o país, não importa se ele é corrupto ou não.'' Quer dizer: o brasileiro já não digere o lema do rouba, mas faz.
Imagem e semelhança!
Josias de Souza
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