O desembargador federal João Pedro Gebran Neto destacou que a lei de
colaboração premiada, de 2013, foi uma ferramenta positiva para a
operação
LISBOA - O desembargador Federal e Relator da Lava Jato no Tribunal
Regional Federal (TRF) da 4ª Região, João Pedro Gebran Neto, disse nesta
quarta-feira, 19, que o Brasil vive uma crise ética. "A crise
brasileira hoje não é econômica, é ética. Se não chegamos no fundo do
poço, chegamos em momento de autorreflexão", afirmou. Para ele, entre as
surpresas felizes dos últimos anos está a Operação Lava Jato. "Se diz
que se puxou uma pena e veio uma galinha inteira. Para mim, veio um
galinheiro inteiro", disse durante o V Seminário Luso-Brasileiro de
Direito, que ocorre desde terça-feira em Lisboa.
Foto: Daniel Teixeira/Estadão
Gebran Neto comentou que a Lava Jato começou de forma
pequena e que hoje a sociedade brasileira não é mais indiferente a esses
escândalos. "As pessoas têm ido às ruas, reagido. Essa mudança de
comportamento permite que a Lava Jato tenha algum êxito", disse,
acrescentando que a lei de colaboração premiada, de 2013, é uma
ferramenta positiva neste caso. O desembargador também destacou que
havia um "véu de ingenuidade" do setor judiciário em alguns pontos e
lembrou que agora a situação está mais realista. "Ninguém passa recibo
de recebimento de valores ilícitos", considerou.
O desembargador fez um alerta sobre a aprovação de novas
leis que possam interferir no rumo das investigações Lava Jato e de
outras operações, sem citar nenhum caso específico. O Judiciário teme
que o Legislativo aprove regras que impeçam ou dificultem o trabalho de
investigações.
"Em três anos, fizemos no TRF julgamento de 650 recursos
decorrentes da Operação Lava Jato. Sua dimensão é amazônica e é
absolutamente natural que, dentro de um megaprocesso, haja processados,
condenados, investigados com as mais diferentes reações. Reações desde
defesa técnica até mudanças legislativas", disse.
Por isso, de acordo com ele, é preciso ter "muita
serenidade" sobre o que está sendo discutido e aprovado. O desembargador
enfatizou que qualquer nova lei tem que ter foco no Brasil e no futuro,
e não pode ser casuística. "A Operação Mãos Limpas (da Itália) tem de
ser referência. Espero que o desfecho daquela operação não aconteça no
nosso País", enfatizou.
Para Gebran Neto, é importante
realizar mudanças estruturais. "Se não no atual cenário político, no
próximo cenário político", observou. Isso porque ele avaliou que algumas
oportunidades já foram perdidas até este momento.
Avanços. O desembargador disse, ainda,
que o País passa por um momento de "desencantamento", mas que desde a
Constituição, mostrou avanços. "De 1988 para cá, o Brasil melhorou, e
melhorou em muitos setores", afirmou.
Gebran Neto salientou que nos últimos 30 anos houve o
maior período da democracia brasileira. "Temos estabilidade
institucional, apesar das crises, de dois impeachments, de mensalão, de
Lava Jato. As instituições estão todas de pé, o Brasil funciona", citou.
Ele continuou dizendo que o sistema de saúde está longe dos desejos dos
brasileiros, mas é muito melhor do que de era no passado, houve maior
grau de inclusão social nesse período, menor nível de pobreza, a
longevidade aumentou, o salário mínimo ficou acima de US$ 300.
Para Gebran Neto, a educação no ensino público também
está melhor e o alfabetismo diminuiu bastante. "Um fator que piorou é o
da criminalidade. O Brasil vive estado de guerra civil, com números
semelhantes aos da Síria. E a sociedade parece que tem letargia, parece
que nada mais choca o brasileiro. A sensação de insegurança no Brasil é
uma realidade. Sensação de insegurança que temos no Brasil é terrível",
disparou.
O desembargador fez sua apresentação durante o segundo
dia do V Seminário Luso-Brasileiro de Direito, promovido na capital
portuguesa pela Escola de Direito de Brasília do Instituto Brasiliense
de Direito Público (EDB/IDP) e pela Faculdade de Direito da Universidade
de Lisboa (Fdul). DO ESTADÃO
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