sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

Congresso prepara dança das cadeiras ignorando desdobramentos da Lava Jato


Dentro de poucos dias, no início de fevereiro, deputados e senadores terão de eleger novos presidentes para as duas Casas do Congresso. Na Câmara, o favorito é Rodrigo Maia (DEM-RJ). No Senado, há um único candidato: Eunício Oliveira (PMDB-CE). Eunício e Rodrigo têm algo em comum: ambos foram mencionados na delação da Odebrecht como beneficiários de repasses financeiros ilegais. Mas ninguém parece preocupado com esse detalhe no Congresso.
No vácuo moral em que o Legislativo se habituou a operar, não há revelação capaz de constranger os parlamentares. No prédio ao lado, o gabinete do ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal, trabalha nas férias do Judiciário para preparar a homologação dos acordos de colaboração dos 77 delatores da Odebrecht. Mas os congressistas fingem que a Lava Jato não existe.
Na lista da Odebrecht, Rodrigo Maia é o ‘Botafogo’. O codinome de Eunício Oliveira é ‘Índio’. Os dois negam ter prestado favores à empreiteira em troca de dinheiro. Mas a chance de se tornarem protagonistas de inquéritos judiciais é real. A despeito disso, contam com o apoio do Planalto. E já negociam com os partidos a distribuição de cargos nas comissões e nas mesas que dirigem o Legislativo.
Há dois anos, Eduardo Cunha e Renan Calheiros cumpriam esse mesmo tipo de ritual. O primeiro encontra-se na cadeia. O segundo deixará o comando do Senado como réu. Anestesiado, o Congresso transforma o velho espírito de corpo em espírito de porco. J.DESOZA
TJ-TO
Cármen Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal, reuniu-se em Brasília com os magistrados que comandam os tribunais de Justiça dos Estados. Conversaram sobre o flagelo do sistema prisional brasileiro. Foi um encontro arrastado. Durante cinco horas, a cúpula do Judiciário esbarrou, tropeçou no óbvio. E a maioria dos doutores se deu conta de que precisa parar de fingir que o óbvio é o óbvio. Ei-lo: há nos fundões das cadeias brasileiras um déficit de justiça. Para resolver o problema, Cármen Lúcia propôs um ''choque de jurisdição'' em matéria penal.
Além de chefiar o Supremo, Cármen Lúcia preside o Conselho Nacional de Justiça. Tanto poder e não consegue responder a uma pergunta trivial: quantos processos penais estão pendentes de julgamento no Brasil? Deu prazo de cinco dias, até terça-feira (17), para que os presidentes de tribunais de Justiça apresentem, “com precisão”, a quantidade de processos e de juízes necessários para fazê-los andar.
Cármen Lúcia também não faz ideia do número de brasileiros que estão atrás das grades. Trabalha-se com estimativas que ultrapassam os 620 mil, dos quais 40% são presos provisórios, trancafiados sem julgamento. O CNJ fará um censo penitenciário para contar os hóspedes do inferno, anunciou a ministra.
Simultaneamente, a doutora encomendou aos desembargadores providências para resfriar as cadeias. Deseja um “esforço concentrado” de três meses para retirar da prisão presos que só estão lá porque são muito pobres e não dispõem de advogados para lembrar aos juízes que seus processos foram esquecidos em algum escaninho empoeirado.
Relatórios disponíveis nos arquivos do CNJ informam que já foram detectados atrás das grades brasileiros que esperavam por sentenças há mais de uma década —11 anos num caso descoberto no Espírito Santo; 14 anos num processo paralisado no Ceará. No Piauí, os sem-sentença somam cerca de 70% da população carcerária.
Cármen Lúcia discursou na abertura da reunião. Defendeu, a alturas tantas, um “choque de jurisdição” em matéria penal. “É hora de agir com firmeza e rapidez”, declarou, antes de consumar sua rendição ao óbvio. Sem julgamentos rápidos, disse a ministra ao se entregar, a Justiça deixa de ser prestada aos réus, às vítimas e à sociedade.
De fato, o único segmento que ganha com a barbúrdia prisional é o crime organizado. Abandonados pelo Estado, os presos ficam à mercê das facções criminosas. Em troca de supostos favores e de proteção, são compelidos a cumprir ordens da criminalidade mesmo após deixar as cadeias. Potencializa-se a capacidade das facções de promover massacres dentro dos presídios e exportar a violência para as ruas.
O flagelo tem muitos culpados. E o Judiciário não é inocente. A reunião promovida por Cármen Lúcia não precisaria ter durado cinco horas. Bastariam 30 segundos para que a presidente do Supremo anunciasse o óbvio aos desembargadores. Ela diria algo assim: “Senhores, precisamos fazer cumprir nas cadeias do país a Lei de Execuções Penais.” E sentenciaria: “Está encerrada a reunião.”

Com lama pelo nariz, Lula fala em salvar o país

 JOSIAS DESOUZA
Alguma coisa subiu à cabeça de Lula ao discursar em Brasília num seminário sobre educação promovido por sindicalistas. Em meio a críticas ao governo de Michel Temer, o orador sapecou uma pergunta: “Quem é que vai tirar o país da lama?” E a plateia companheira: “Lula”. Entre os presentes, ironia suprema, estava o ex-tesoureiro petista Delúbio Soares.
Réu em cinco inquéritos —três dos quais relacionados ao petrolão—, Lula apresentou-se como a pessoa certa para livrar o país do pântano. Fez isso sob aplausos de Delúbio, um corrupto de mostruário, sentenciado no célebre julgamento do mensalão. Ou seja: Lula estava completamente fora de si.
Noutra passagem do seu discurso, a pretexto de alvejar Temer, Lula atirou contra o próprio pé: “Quem é o culpado de um jovem de 25 anos estar preso hoje? O que deram de oportunidade para ele quando ele tinha 8 anos? Se não dou educação, trabalho, essa criança vai fazer o quê da vida? A gente percebe que o dinheiro que se economizou na educação no passado está se gastando hoje para se fazer cadeia. E cada vez vai custar mais caro…”
Suponha que o personagem do enredo de Lula tenha acabado de chegar ao xilindró. Preso aos 25, fez aniversário de 8 anos em 2000. Quando Lula foi eleito para suceder FHC, em 2002, o garoto tinha dez anos. Quando Lula se reelegeu, o personagem era um adolescente de 14 anos. Na época em que Lula transformou Dilma de poste em sua sucessora, em 2010, já era um homem feito, com 18 anos na cara. Soprou as velinhas dos 22 anos em 2014, ocasião em que Lula atarrachou a luz do seu poste pela segunda vez. Somava 24 quando Dilma sofreu o impeachment.
Quer dizer: se o sujeito chegou à cadeia aos 25, guiando-se pelo raciocínio do morubixaba do PT, não poderá culpar senão os governos petistas de Lula e Dilma pela falta de “oportunidades” educacionais e funcionais capazes de retirá-lo do caminho do crime.
Lula sempre foi celebrado como um mágico da oratória. Entretanto, ao se apresentar como uma alternativa presidencial limpinha, comporta-se como um mágico tantã, que acredita na própria capacidade de tirar cartolas de dentro de um coelho. Alguma coisa subiu-lhe à cabeça. Não é sensatez. Parece alucinação.

País em que diaristas ganham mais que professores amarra a corda no pescoço

Josias de Souza

No Brasil, ensinou o escritor Otto Lara Resende, lei é feito vacina. Há as que pegam e as que não pegam. A lei que criou em 2008 o piso salarial dos professores do ensino básico, por exemplo, ainda não pegou. Reajustado em 7,64% nesta quinta-feira, o piso passou a valer R$ 2.298,80. É uma mixaria. Mas 55,1% das prefeituras brasileiras pagam aos professores em início de carreira vencimentos inferiores ao piso. Entre os Estados, suspeita-se que pelo menos nove ainda afrontam a lei.
Numa residência elegante de Brasília, uma boa diarista cobra em torno de R$ 150 por jornada. Dando duro de segunda a sexta, amealha R$ 3 mil por mês —fora o dinheiro da condução e as refeições feitas no trabalho. Se molhar a camisa aos sábados, eleva a remuneração para R$ 3,6 mil. A esse ponto chegou a República: uma diarista de primeiras letras pode ganhar no Brasil salários maiores que os contracheques dos professores que dão aula aos seus filhos nas escolas públicas.
Instada a comentar o fato de que apenas 2.533 municípios brasileiros (44,9% do total) declaram cumprir a lei do piso, a educadora Maria Helena Guimarães de Castro, secretária-executiva do Ministério da Educação, resignou-se: ''Precisamos melhorar o salário dos professores, valorizar os professores e, ao mesmo tempo, não há recursos suficientes para dar um reajuste acima da inflação. O reajuste agora é acima da inflação, cumprindo a lei, mas sabemos e entendemos as dificuldades dos Estados e municípios.''
Há um fundo do MEC destinado a socorrer prefeituras e Estados que condenam seus professores ao fim do mês perpétuo. Para 2017, o tônico será de R$ 1,29 bilhão. Em vez de liberar a grana no final do ano, como costumava suceder, o ministro Mendonça Filho (Educação) optou por fazer repasses mensais. Ainda assim, não há em Brasília quem alimente a ilusão de que a lei será 100% respeitada. Ao contrário. Há nos subterrâneos uma articulação para aprovar no Congresso um rebaixamento do pé-direito do teto.
Agora responda rápido: pode atingir o sucesso uma nação que paga a um professor iniciante remuneração inferior à de uma diarista? Não há o menor risco de dar certo! O Brasil parece condenado a ser um eterno país do futuro.

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