O quadro atual do funcionalismo, contaminado pelo corporativismo dos sindicalistas da categoria, revela a urgência de se iniciar uma discussão séria sobre os privilégios dos servidores e a melhoria da gestão pública no País – e isso vale para o Executivo e também para o Legislativo e o Judiciário, onde a autonomia administrativa funciona como uma espécie de salvo-conduto para a distribuição de benesses para si próprios e os funcionários dos dois poderes.
Da regulamentação da Lei de Greve no setor público, prevista na Constituição e até agora não realizada, à redução dos cargos em comissão, para diminuir a interferência política na administração e a nomeação de funcionários sem conhecimento das áreas em que vão atuar; da limitação da estabilidade no emprego, para enfrentar a acomodação, à revisão das aposentadorias dos servidores, não faltam propostas para enfrentar o problema. O que falta é vontade política de levar adiante a missão. “A nossa administração ainda se baseia em princípios atrasados”, afirma o advogado Almir Pazzianotto, ex-ministro do Trabalho e ex-presidente do TST. “Essa falta de agilidade, decorrente da estabilidade indiscriminada, não dá ao Estado condições de exercer uma gestão eficiente, porque o serviço público, envelhece, fica embolorado, as pessoas adquirem vícios.”
Segundo ele, uma das prioridades deve ser a regulamentação da Lei de Greve. Pazzianotto afirma que é contrário às greves do funcionalismo, por não ser “compatível” com a natureza do serviço público, de servir à população. Para ele, a Polícia Federal, o setor de saúde e o Judiciário, por exemplo, não poderiam ter o direito de fazer greve. “A greve no serviço público afeta quase exclusivamente as classes pobres. O rico não vai ao Sistema Único de Saúde (SUS). Na área escolar, também, há greves de dois, três meses. Eu não lembro de uma greve em colégios particulares como o Dante Alighieri, o Vértice, o Porto Seguro, o Bandeirantes (todas escolas de São Paulo). Não acontece. Não há registro histórico.”
Apesar de ser favorável à regulamentação da Lei de Greve, para evitar os abusos, ele parece cético em relação ao encaminhamento da medida. “Uma das dificuldades para regulamentar a Lei de Greve é que a iniciativa tem de ser do presidente da República, como tudo o que diz respeito ao servidor público – e ele não quer ter o desgaste de uma regulamentação dessa natureza”, afirma Pazzianotto. “Ele acha que perde mas do que ganha. Eu acho que ganha mais do que perde, porque o grevismo não é uma característica dos servidores públicos, mas de uma minoria aboletada em entidades sindicais e que, na condição de dirigente sindical, não precisa trabalhar.”
Outra questão essencial, de acordo com o professor Nelson Marconi, coordenador executivo do Fórum de Economia na FGV de São Paulo, é a Previdência do funcionalismo, que causa um forte desequilíbrio fiscal. Com pouco mais de um milhão de aposentados, contra 25 milhões de aposentados da iniciativa privada, a Previdência dos servidores federais responde por mais de 50% do déficit na área. Para enfrentar o “buraco”, ele defende um aumento na alíquota das contribuições, “no espaço que houver”, e o fim da paridade salarial entre os ativos e os inativos, que se beneficiam de todos os aumentos salariais que quem ainda está trabalhando recebe. Marconi propõe também ao governo a realização de um plano de recursos humanos, antes da contratação de novos funcionários, para fazer um diagnóstico completo da administração federal e avaliar onde sobra gente, onde falta, onde tem gente com perfil inadequado, onde as coisas estão funcionando bem. Ele afirma que muita gente já disse que iria levar a ideia adiante, mas não levou. Com certeza, numa época em que a adoção de ferramentas empresariais de gestão está mais em pauta do que nunca, seria uma boa medida para o governo Temer implementar. Depois, ao menos, ele saberia melhor onde está pisando. DO ESTADÃO
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