Operação Lava Jato entrou na 24ª fase esta semana.
Tudo começou em 2014 com uma investigação contra doleiros do Paraná.
Uma sala reservada, na sede da Polícia Federal em Curitiba, guarda uma pista de que novos capítulos ainda estão por vir. Vamos voltar a março de 2014, para entender como tudo isso começou.
Quando a primeira peça cai, é difícil prever onde o último reflexo vai ser sentido. Tudo começou com uma investigação contra doleiros do Paraná. O esquema funcionava num posto de gasolina, em Brasília. Lá, se lavava tudo.
Lavanderia de roupas. Um lava a jato de carros, e uma casa de câmbio, especializada em lavar dinheiro sujo.
O doleiro por trás do esquema era conhecido da polícia desde a adolescência quando trazia contrabando do Paraguai. E já havia sido preso antes por lavagem de dinheiro. Na época, contou o que sabia. Mas foi solto e voltou, com uma operação ainda mais sofisticada. Criou empresas de fachada para intermediar propinas entre empresários.
O que transformou a Lava Jato foi um detalhe: o carro usado pelo ex-diretor de abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa, e registrado em nome dele, tinha como endereço um apartamento de Alberto Youssef. Estava feita a conexão da lavagem de dinheiro com a maior empresa do país, a Petrobras.
“Graças a fatos ocorridos na fase final da investigação em que detectaram o relacionamento do Alberto Youssef com o Paulo Roberto Costa e, por sua vez, está trazendo contratos com a Petrobras pra dentro da investigação. Aí as coisas ganharam uma dimensão que ninguém imaginava”, conta Igor Romário de Paula, delegado da Polícia Federal.
Nesse momento, vários fatores ajudaram a investigação a avançar. Um deles foi consequência das manifestações de rua em 2013. Pressionada, a presidente Dilma sancionou novas leis de combate à corrupção. Entre elas, a da colaboração premiada, que ficou conhecida, como delação premiada.
O diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa foi o primeiro a aceitar ter as penas diminuídas em troca de contar tudo o que sabia e fornecer provas.
Thiago Bottino, professor de Direito da FGV-Rio: Você usar mecanismos que estimulem membros de uma organização criminosa a delatarem os seus comparsas é uma forma diferente de investigar. Isso se dá porque um membro da organização criminosa indicou aonde estão as contas, quais são as contas, quem transferiu, qual o contrato referente a essa propina da corrupção. Enfim, a partir do momento que você entende aquele funcionamento e consegue buscar a prova porque você já sabe onde ela está, aí você vai ter condição de condenar pessoas que tradicionalmente não eram condenadas.
Repórter: É achar agulha no palheiro, sabendo onde está a agulha. Com alguém dizendo onde está a agulha.
Thiago Bottino: É exatamente. É saber em qual palheiro procurar e em que ponto daquele palheiro está a agulha.
A Operação Lava Jato virou uma força-tarefa. Em Curitiba, junta os 70 membros do Ministério Público, Receita Federal e Polícia Federal.Depois de Costa, o Brasil passou a ver a sequência de fases da Lava Jato. Prendendo diretores da Petrobras, empresários, políticos. Já foram 49 acordos de colaboração premiada.
Elas levaram a 117 conduções coercitivas, quando a pessoa é obrigada a prestar depoimento, como a do ex-presidente Lula, na última sexta-feira, a mais recente. E a 141 mandados de prisão. Já houve 84 condenações. As
penas somadas já chegam a 825 anos e 10 meses. A maior delas, de 20 anos e 8 meses, para o ex-diretor de serviços da Petrobras, Renato Duque.
Nos próximos dias, deve sair a sentença de um dos principais presos da Operação Lava Jato. Até agora ele se recusou a fazer acordo de colaboração premiada. É o presidente da construtora Odebrecht, Marcelo Odebrecht, que está preso na custódia da Polícia Federal, em Curitiba. Nesse processo, Marcelo Odebrecht, executivos da empresa e operadores do esquema são acusados de corrupção e de lavagem de dinheiro. Se forem condenados, as penas podem passar de décadas. Isso porque eles são acusados de terem cometido esses crimes repetidas vezes. E nesses casos, as penas são somadas.
Outra lei nova, de 2013, é a que permite acordo de leniência com as empresas envolvidas. Elas admitem os crimes e devolvem dinheiro ao país, em troca de poder continuar participando de contratos públicos.
Até agora, já foram pedidos ressarcimentos no valor de R$ 14,5 bilhões. O esquema que teria repassado R$ 6,4 bilhões da Petrobras para pagar propinas foi mapeado.
A organização tinha três núcleos: os operadores, os empresários e os políticos.
Três diretorias da Petrobras foram loteadas para três partidos políticos. E os diretores da empresa repassavam parte do valor dos contratos para os partidos.
Operadores como os doleiros Youssef e lobistas como Fernando Baiano movimentavam o dinheiro. O núcleo empresarial era formado pelos executivos das nove principais empreiteiras do Brasil. Entre eles, Marcelo Odebrecht, presidente da Odebrecht. Ricardo Pessoa, da UTC. Dalton Avancini, presidente da Camargo Corrêa. Léo Pinheiro, da OAS. E Otávio Azevedo, da Andrade Gutierrez.
Os políticos implicados até agora na Lava Jato são ministros e ex-ministros, senadores e deputados, inclusive os presidentes da Câmara e do Senado, governadores e ex-governadores. E, na última semana, como investigado, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A Lava Jato trabalha como força-tarefa, formada por 70 pessoas do Ministério Público, receita e polícia federais.
Na Polícia Federal de Curitiba, a equipe da Lava Jato trabalha numa área de segurança separada do dia a dia da delegacia. Lá ainda estão, guardados em malotes, todos os documentos e arquivos eletrônicos apreendidos na mais recente fase da operação, a 24ª.
Na sexta-feira foram feitas buscas em endereços ligados ao ex-presidente Lula e a seus familiares. O material começa a ser periciado e analisado nesta segunda (07). Assim como tudo o que foi encontrado num galpão em São Bernardo do Campo, em São Paulo. Lá estão bens do ex-presidente Lula, trazidos de Brasília ao final do mandato. Segundo a polícia, a despesa de armazenagem era paga, até poucas semanas atrás, pela construtora OAS.
“Como não se conseguiu identificar especificamente o que são esses itens, o depósito foi lacrado. Ele permanece lacrado e a partir já da segunda-feira, uma equipe vai ao depósito, vai abri-lo e vai catalogar um por um desses itens”, aponta o delegado.
Em uma sala ficam as cópias de todas as provas recolhidas até agora, e que estão sendo consultadas pelos investigadores. Ficam na prateleira, numeradas de acordo com a fase em que foram recolhidas.
Repórter: Mas aqui já tem numeração até 31. Quer dizer que vai longe.
Igor Romário de Paula: Tem mais estante se for necessário. DO G1
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