Nenhuma
greve faz tão mal ao Brasil como a greve da oposição. Esta, sim,
compromete o nosso futuro e pode pôr em risco as instituições à medida
que o país se torna refém de uma única força política, que, sem freios e
sem limites, decide submeter as leis à sua vontade e não mais sua
vontade às leis. A greve da oposição foi decretada no dia em que o
publicitário Duda Mendonça declarou que o PT pagou parte da campanha
presidencial de 2002 em moeda estrangeira, no exterior, já no curso do
primeiro mandato de Lula, com dinheiro ilegal. Ali, naquele ponto,
deveria ter-se iniciado um movimento para denunciar o presidente por
crime de responsabilidade. Mais: segundo a lei eleitoral, um candidato é
o responsável último pelas finanças de sua campanha. Tomou-se, no
entanto, a decisão de deixar Lula encerrar seu mandato tranquilamente —
alguém teria recorrido à metáfora “sangrar no poder”… Deu no que deu. Os
leitores deste blog que migraram do extinto site “Primeira Leitura” (e
da revista) sabem o que escrevi à época: “A oposição está cometendo
suicídio”. O resto é história. E, como se nota com o julgamento do
mensalão, a greve continua.
O Supremo
Tribunal Federal está dizendo com todas as letras o que foi aquele
imbróglio a que se chamou “mensalão” — e o nome poderia ser qualquer
outro; isso é irrelevante. Ainda que todos os réus, doravante, fossem
considerados inocentes — o que é improvável —, o mensalão (ou
“roubalheira”, se alguns preferirem) já está comprovado de maneira
acachapante. ESSA É A REALIDADE JURÍDICA, do mundo das leis. MAS É
PRECISO QUE O EPISÓDIO SE TORNE TAMBÉM UMA REALIDADE POLÍTICA. Para
tanto, alguém precisa se apossar dessa narrativa. OU POR OUTRA: FORÇAS
POLÍTICAS TÊM DE FAZER DA VERDADE DOS AUTOS, DA VERDADE DOS FATOS, UMA
VERDADE ATIVA, COM FACE POLÍTICA. Mas quê… Ninguém se oferece!
Ora, se
inexistem forças políticas relevantes que deem o devido tratamento à
verdade que vai se tornando clara no tribunal, há o risco, por incrível
que pareça, de a farsa petista deitar sua sombra sobre os fatos. Luiz
Inácio Lula da Silva fez um comício na sexta em Belo Horizonte e, como é
de seu costume, exaltou a impoluta moral petista. Nas redes sociais, a
Al Qaeda eletrônica continua a repetir seus mantras. Os petistas
certamente se surpreendem com o fato de que os candidatos e líderes da
oposição simplesmente ignoram o julgamento. Surpreendem-se porque sabem o
que eles próprios fariam no lugar dos adversários — como, aliás,
fizeram. Lembrem-se do que custou às oposições o escândalo envolvendo o
nome do ex-governador José Roberto Arruda.
É
espantoso, observava dia desses o professor Marco Antonio Villa — um dos
debatedores dos programas que temos feito na VEJA.com (hoje é dia, logo
depois do fim da sessão do STF) —, que deputados e senadores da
oposição jamais tenham assistido a uma miserável sessão do STF, nada! O
seu lugar político, é evidente, seria o tribunal, acompanhando o
julgamento. Nada! As campanhas eleitorais simplesmente ignoram o tema.
Pior do que isso: anuncia-se mesmo a disposição de não tocar no assunto.
No
Congresso, os piores descalabros são aprovados sem qualquer sinal de
resistência. Tome-se o caso, por exemplo, da lei das cotas nas
universidades federais. O senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) lutou
praticamente sozinho. Sim, há vozes esparsas e valorosas entre os
oposicionistas. Aponto é a inexistência de uma força organizada, com
pensamento estruturado. O senador Aécio Neves (PSDB-MG) só se manifesta
quando considera que Minas está sendo agredida, incapaz, até agora, de
se fazer ouvir além das montanhas. Lula foi a Belo Horizonte, disse lá
suas grosserias de hábito, acusou o estado de estar quebrado, e o
senador tucano reagiu — muito lhano, como sempre. Onde estava durante a
aprovação da lei das cotas, por exemplo? Ou daquela PEC ridícula que
pretende meter na Constituição a obrigatoriedade do diploma de
jornalista? Atenção! Ainda que seja para defender os dois absurdos, que
se pronuncie. Não é ele agora o líder político máximo do PSDB? Não é o
futuro candidato do partido à Presidência? Onde está o deputado Sérgio
Guerra (PE), presidente da sigla?
A economia
brasileira cresce ao ritmo das economias europeias em crise, muito
abaixo dos chamados países emergentes. As sucessivas medidas adotadas
por Guido Mantega para estimular a economia têm-se mostrado, quando
menos, ineficazes. Imaginem onde poderíamos estar sem os pacotes de
renúncia e estímulo fiscais. Não há nada – NADICA MESMO! — a dizer a
respeito? Não há crítica possível, alternativas, nada? Nem mesmo se vai
dizer à população — agora, e não em 2014! — que o país está sofrendo as
consequências de decisões equivocadas em passado recente, que travaram
os investimentos? Não se jogarão nas costas do governo a sua óbvia
responsabilidade no atraso das privatizações, por exemplo, e sua
incapacidade de ordenar os investimentos públicos? Não!
Oposição na situação
Nas democracias, o lugar da oposição, afinal de contas, existe. Se os partidos a tanto destinados não o ocupam, alguém o fará. Quem passou a ser visto como uma alternativa de poder — embora pouco se conheça do seu pensamento, e o que se conhece não é necessariamente bom! — é Eduardo Campos (PSB), governador de Pernambuco. Tudo indica que seu candidato à Prefeitura do Recife, por exemplo, dará uma surra no de Lula. Ao marcar posição em seu próprio território — e no estado natal do Babalorixá —, o governador quer exibir musculatura, buscando o seu lugar num país pós-Lula.
Nas democracias, o lugar da oposição, afinal de contas, existe. Se os partidos a tanto destinados não o ocupam, alguém o fará. Quem passou a ser visto como uma alternativa de poder — embora pouco se conheça do seu pensamento, e o que se conhece não é necessariamente bom! — é Eduardo Campos (PSB), governador de Pernambuco. Tudo indica que seu candidato à Prefeitura do Recife, por exemplo, dará uma surra no de Lula. Ao marcar posição em seu próprio território — e no estado natal do Babalorixá —, o governador quer exibir musculatura, buscando o seu lugar num país pós-Lula.
Mas,
afinal, o que quer Campos? O que ele pensa? Que Brasil tem na cabeça?
Quais são seus valores? No que difere do PT, por exemplo? O que o seu
PSB faria de diferente no confronto com o petismo? Ninguém sabe. Como
não é um oposicionista nato, não tem de fazer confronto de valores. Tem
apenas de se dizer o melhor para gerir o modelo de gestão que, de fato,
integra. Lula é um líder em decadência. Dilma tem, hoje, uma reeleição
assegurada, mas não é uma organizadora de partido. Campos percebe um
vácuo óbvio de liderança na oposição e vislumbra a possibilidade de
declínio do próprio petismo. Daí ter encontrado este estranho lugar: o
da “oposição” na situação.
Não se
trata, como é óbvio, de “oposição” programática. Por enquanto, ele se
esmera em demonstrar que é um sujeito hábil, que sabe fazer as
articulações de bastidores, dotado de senso de estratégia, com trânsito
no establishment. Acho pouco provável que se apresente já em 2014 para
enfrentar Dilma Rousseff. É jovem e pode esperar por 2018, ganhando
musculatura até lá. Terá de tomar algum cuidado com o petismo, que já
está determinado a destruí-lo. Mas não há dúvida de que se prepara para
tentar ser o líder das ditas “forças progressistas”. A greve da oposição
lhe permite hoje ocupar, sem dúvida, um lugar privilegiado na política:
consegue ser poder e se apresentar como possível alternativa de poder.
Na
política, de fato, “quem não faz leva”. No futebol, afinal, a partida
pode terminar empatada em zero a zero. No jogo do poder, isso não
existe. Não fazer gol é o mesmo que tomar gol. Texto originalmente publicado às 4h43
REV VEJA
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