quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Por que Lula tem de arrastar seu fotógrafo oficial para sessões de radioterapia? Ou: Que outro ex-presidente no mundo tem fotógrafo oficial? Ou ainda: O câncer fashion

É claro que eu poderia me abster deste comentário porque há sempre estúpidos incapazes de ler o que está escrito e dispostos a me acusar por aquilo que não escrevi. Ocorre que esses tontos não são meus juízes. Então escrevo. Vejam esta foto
lula-gianecchini
Foi feita por Ricardo Stuckert, do Instituto Lula. O Apedeuta faz tratamento de radioterapia no hospital Sírio-Libanês, onde Reynaldo Gianecchini também se trata. O ex-presidente decidiu visitar o ator. Até aí, bem! Mas o que faz junto o seu fotógrafo oficial? Aliás, desconheço outro político no mundo, já fora do poder, que tenha um “fotógrafo oficial”!!! Isso é coisa daqueles bilionários das arábias…
Já notaram que jamais se estranhou isso na imprensa? Os leitores muito jovens — e os tenho aos montes, felizmente — talvez não se lembrem, mas uma das críticas em que a imprensa se fartava era a tal “vaidade” de FHC… A acusação era sempre ressentida, meio bucéfala, tentando demonstrar que era uma ilusão ele se achar superior aos demais políticos só porque era intelectual. Ele jamais havia se declarado assim, mas e daí? Imaginem se o tucano carregasse um fotógrafo pra cima e pra baixo… Ao contrário: FHC já declarou que gosta é de privacidade.
Não Lula! Com ele, até o câncer tem de ser um espetáculo e de render flashes. VOCÊS JÁ SE DERAM CONTA DO ABSURDO QUE É CARREGAR FOTÓGRAFO EM SESSÃO DE QUIMIOTERAPIA E RADIOTERAPIA??? Pra quê? Por quê? A única resposta possível é esta: POLÍTICA! Luiz Inácio Apedeuta da Silva usa o câncer para reforçar a mitologia. Se puder aparecer ao lado de um ator querido por muitos, que também leva adiante uma batalha e tanto, melhor!
Alguns tolinhos da sociologia de fancaria vêm com aquela bobagem de que, assim, ele ajuda a desmistificar a doença etc e tal. Uma ova! Ajudaria caso se portasse como um homem comum — ainda que homem comum tratado no Sírio-Libanês. Levando junto um aparato, vivendo vida de artista, ele faz é o contrário. Não serve de exemplo, mas de exceção. Os demais pacientes não podem fazer essa glamorização da doença.
Eu detesto ter de escrever este texto, se querem saber. Acho que as enfermidades têm de ser tratadas com decoro. Jamais permiti, e não permitirei, neste blog, abordagens desrespeitosas com doentes — pode ser até o Chávez. É claro que as moléstias não tornam bons e decentes indivíduos maus e indecentes. Mas não é uma categoria de pensamento e uma categoria política. Ademais, queridos, não tem jeito — sou quem sou! —, acho que a compaixão é um bom sentimento.
Por isso mesmo eu me constranjo com a espetacularização a que Lula submete a própria doença. Stuckert deveria começar a divulgar as fotos dos encontros políticos do chefe, já que ele está articulando as eleições de 2012. Se é para acabar com o preconceito, que se mostre o petista cuidando das relações de poder, sem essa abordagem fashion.
Trata-se de uma cara politização barata da doença.
PS - Pior sorte teve Mário Covas. Doente de câncer, tomou bandeiradas na cabeça dos petistas, até sangrar.
Por Reinaldo Azevedo
REV VEJA

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