Em vídeo, testemunha-chave conta bastidores da teia de corrupção montada no Ministério do Esporte pelo ex-ministro Agnelo Queiroz. Aparecem nomes e funções dos envolvidos na rede que desviou recursos públicos para ONGs de fachada e empresas fantasmas
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Claudio Dantas Sequeira, IstoÉ Online
Na semana passada, ISTOÉ obteve com exclusividade o inteiro teor de um explosivo depoimento gravado em vídeo por Geraldo Nascimento de Andrade, testemunha-chave das denúncias sobre o esquema de desvio de verbas com ONGS do programa Segundo Tempo, do Ministério do Esporte. Como motorista, arrecadador e até como laranja para empresas fantasmas, Andrade serviu por mais de quatro anos a essa rede de corrupção. Ele é um homem simples, de 25 anos, que na maior parte do tempo esteve preocupado em garantir uma subsistência modesta. Numa gravação de quase duas horas, Andrade conta tudo o que testemunhou e executou para o grupo. Seu relato, nunca revelado na íntegra, impressiona pela riqueza de detalhes e foi repetido por ele à Polícia Civil e ao Ministério Público. As declarações de Andrade foram checadas pelas autoridades, cruzadas com documentos e ofícios internos do Ministério, aos quais ISTOÉ também teve acesso exclusivo. O material embasou duas denúncias já acolhidas pela Justiça Federal e que correm sob segredo de Justiça. Com esse conjunto é possível traçar pela primeira vez um organograma de quando foi instalado, como atuavam, como era feita a distribuição da propina e o papel de cada operador no complexo esquema de dreno de recursos públicos montado no Esporte. A gravação deixa evidente que a teia de falcatruas que irrigou o caixa do PCdoB foi iniciada e bem azeitada pelo ex-ministro do Esporte e antecessor de Orlando Silva, Agnelo Queiroz, hoje governador do Distrito Federal. O depoimento de Andrade ajuda a demonstrar, com minúcias, como Agnelo organizou esse propinoduto para sugar dinheiro no Ministério do Esporte – operação que se manteve sob administração do PCdoB com Orlando Silva.
"O cabeça dessa quadrilha era o Agnelo, porque ele
liberava o dinheiro para o esquema. Ele liberava o
dinheiro, o João Dias pegava e fazia os contatos. O Miguel
abria as empresas e arranjava pessoas. O esquema
foi até 2009 (…) A gente fazia 20 saques por semana" Geraldo Nascimento de Andrade, funcionário das ONGs beneficiadas,
laranja em empresas fornecedoras e encarregado de repassar as propinas
"Estou gravando isso aqui porque, se alguma coisa acontecer comigo,
foi Agnelo, o Miguel (Santos de Souza, empresário que operacionalizou
o esquema) e o João Dias (Ferreira, o PM que denunciou as fraudes).
A atual esposa do Miguel já me falou que tinham dois ou três carros
me procurando…Vou gravar isso aqui, deixar para todo mundo ver.
Vou falar a verdade de tudo o que aconteceu"
Diante da pressão interna, a secretária-adjunta de Barbosa, Luciana Homrich, determinou a vistoria e recomendou o nome de Santos, o coordenador técnico, “por ter sido ele mesmo a proceder a análise técnica”. Mas, misteriosamente, isso não aconteceu. A vistoria acabou nas mãos de dois companheiros partidários, o técnico Denizar Dourado e a assessora internacional do Ministério, Flaurizia Rodrigues. A dupla assinou a declaração, datada de 3 de maio, obtida por ISTOÉ, atestando “as boas condições” para a execução do projeto Segundo Tempo nas instalações da Febrak. Um ano depois, no entanto, uma auditoria do próprio ministério constataria o oposto. Registre-se que Dourado é membro da diretoria estadual do PCdoB e Flaurizia, além de integrar as fileiras do partido, ganhou cargo comissionado no governo de Agnelo no DF. Além de não ter estrutura física para prestar o serviço encomendado, a Febrak, conforme um relatório com balanço patrimonial de dezembro de 2004, consultado por ISTOÉ, detinha patrimônio de apenas R$ 90 mil. Ou seja, não possuía recursos para arcar com a contrapartida de R$ 462 mil exigida pelo governo.
“Vi o rosto do Agnelo (quando entregou o dinheiro), vi o rosto do rapaz
que trabalha com ele, um homem forte e calvo. Eles me conhecem, não têm
como mentir. Bota esses caras no detector de mentiras! Eu provo que
saquei o dinheiro. Tem filmagem minha e do Eduardo (Tomaz, o tesoureiro
do esquema), tem filmagem minha e do João Dias, tem filmagem minha
e do Miguel entrando no banco, sacando dinheiro”
As acusações de Andrade são fortes, e ele pagou por elas com limites à sua liberdade. Há um ano, quando gravou o vídeo, ele foi ameaçado de morte por João Dias e acabou entrando para o Programa de Proteção a Testemunhas. Hoje vive escondido. Em vários trechos do DVD, explica que gravou o depoimento como garantia de vida. Temia ser morto pelo PM, a quem acusa de chefiar uma milícia na cidade-satélite de Sobradinho, sede da maior parte das ONGs. “Havia um esquema para me matar. O João Dias tem uma miliciazinha. Eles queriam me apagar por queima de arquivo, só para proteger o Agnelo e toda essa corja aí”, diz. Durante a campanha eleitoral de 2010, assessores do candidato Joaquim Roriz (PSC) tentaram usar pequena parte do depoimento de Geraldo Nascimento Andrade contra Agnelo Queiroz. No trecho, ele confessava ter entregue pessoalmente a Agnelo, quando ministro, a quantia de R$ 256 mil, fruto do esquema de corrupção. A campanha petista recorreu à Justiça Eleitoral e conseguiu proibir a veiculação da denúncia na campanha de Welian Roriz, candidata ao governo do DF. Partes do relato, no entanto, foram parar no Youtube [ver vídeo no final da postagem]. Somente a íntegra do depoimento agora revelado por ISTOÉ, no entanto, permite que, com o cruzamento dos dados disponíveis em processos judiciais, se chegue aos nomes e papel de cada membro do esquema.
"Os saques eram feitos em dinheiro vivo. Sempre. A distribuição era
quase na hora. Às vezes, eles ficavam na porta do banco esperando a gente
em carros diferentes. Todas as empresas tinham a mesma conta. Todas as
empresas tinham o mesmo endereço: na 711 Norte e na 303. O Miguel colocou
algumas das empresas que tinha num apartamento lá, que usava para outros fins”
"Está no meu nome a JG (empresa que fornecia alimentos para
as ONGs). Mas não tenho os 100 mil que estão no contrato.
Dos 5 milhões que passaram na JG, não tenho nenhum real na
minha conta. O que eu fazia? Minha função era sacar dinheiro
e entregar para o pessoal, os donos das ONGs"
SÓ FACHADA
A fornecedora de alimentos para as ONGs estava registrada
em nome do motorista Geraldo Nascimento de Andrade
ISTOÉ
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