Ao
grudar na imagem de Lula, por um placar de 3 a 0, a qualificação de
corrupto, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região carbonizou o projeto
presidencial do réu. Horas depois, em comício na Praça da República, em
São Paulo, o condenado reafirmou sua candidatura ao Planalto. A
insistência de Lula é algo a ser festejado. Com seu atrevimento, o
personagem mostra que a prioridade da disputa presidencial de 2018 deve
ser assegurar aos brasileiros o direito a um governo decente, comandado
por biografias limpas.
Ao contrário do que sustenta o slogan do PT, eleição sem Lula não será uma fraude, mas um bom começo. A democracia não cai do céu, precisa ser conquistada. E a exclusão de um ficha-suja graúdo da corrida sucessória emitirá um sinal de vitalidade que as instituições brasileiras estão devendo ao país. Urnas servem para contar votos, não para expedir habeas corpus. Um sentenciado a 12 anos de reclusão deve ser tratado como candidato favorito a passar uma temporada atrás das grades, não na poltrona de presidente.
Por falta de uso, a legislação penal brasileira sofre de atrofia muscular. Não consegue atingir larápios acima de um certo nível de renda. Deve-se à impunidade dos criminosos do poder a conversão da nossa democracia em ratocracia. Antes do mensalão e da Lava Jato, a taxa de risco da corrupção era baixa. O normal era não ser apanhado. Ou ser apanhado e fazer piada da má sorte. O drama de Lula consolida uma terceira hipótese: a de ser pilhado e pagar pelos crimes. Parece pouco. Mas faz uma enorme diferença.
Nem todo mundo notou, mas o Brasil está mudando. O que desanima é a lentidão do processo. A candidatura de Lula é útil porque ajuda a trazer a mercadoria podre do fundo da loja para a vitrine. O PT se pergunta: por que prender Lula e deixar solto Aécio Neves? Logo alguém gritará: “Numa disputa em que até Fernando Collor concorre ao Planalto, a exclusão de Lula é um despropósito.”
Não demora e o ministro Dias Toffoli, do Supremo, será constrangido a retirar da gaveta o pedido de vista que mantém a salvo, dentro da bolha do foro privilegiado, Aécio, Collor e outros 271 políticos processados por corrupção. O mau exemplo de Lula será redentor se for capaz de arrancar órgãos como a Suprema Corte e o Tribunal Superior Eleitoral de sua tradicional letargia.
A desfaçatez de Lula será útil também pelo contraste. Encrencado por corrupção e lavagem de dinheiro, o pajé do PT voltou a comparar-se no comício noturno desta quarta-feira a Nelson Mandela, encarcerado por combater a discriminação racial. Microfone em punho, Lula declarou: “Mandela ficou preso 27 anos. E nem por isso a luta que ele fazia diminuiu. Ele voltou e virou presidente da África do Sul.” Quem ouve fica tentado a perguntar: por que Lula quer voltar?
A resposta está no parágrafo 4º do artigo 86 da Constituição Federal. Anota o seguinte: “O Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções.” Traduzindo para o português do asfalto: eleito, Lula não poderia responder por crimes praticados antes do início do mandato. E a ação sobre o tríplex iria para o freezer. Seria congelada junto com os outros oito processos criminais que perseguem o autoproclamado Mandela brasileiro como um rastro pegajoso.
Diz-se que o brasileiro não tem memória. Engano. O que falta à plateia é curiosidade. Ao manter viva sua candidatura ficcional, Lula presta um último serviço ao país. Seu descaramento é útil porque estimula as pessoas a buscarem as causas da ruína ética. Muita gente talvez encontre no espelho a melhor explicação.
Noutras nações, a condenação de um ex-presidente por ladroagem seria vista como um desses acontecimentos que ferem a rotina e fazem a vida escapar da normalidade. No Brasil, não. Deve-se rezar para que Lula leve sua candidatura às últimas (in)consequências. Com sorte, o brasileiro talvez perceba que algo de extremamente anormal precisa acontecer para alterar a insuportável normalidade reinante no cenário político.
A aplicação indiscriminada de leis como a da Ficha Limpa, por exemplo, saciaria a fome de limpeza que paira no ar. O cumprimento automático de regras como a que abre a porta da cadeia para os condenados na segunda instância provocaria uma revolução nos costumes. Torça-se para que o PT mantenha um militante de plantão junto à orelha de Lula por 24 horas. Ao menor sinal de renúncia à candidatura, o plantonista deve dizer: “Tem que manter isso, viu?”
Ao contrário do que sustenta o slogan do PT, eleição sem Lula não será uma fraude, mas um bom começo. A democracia não cai do céu, precisa ser conquistada. E a exclusão de um ficha-suja graúdo da corrida sucessória emitirá um sinal de vitalidade que as instituições brasileiras estão devendo ao país. Urnas servem para contar votos, não para expedir habeas corpus. Um sentenciado a 12 anos de reclusão deve ser tratado como candidato favorito a passar uma temporada atrás das grades, não na poltrona de presidente.
Por falta de uso, a legislação penal brasileira sofre de atrofia muscular. Não consegue atingir larápios acima de um certo nível de renda. Deve-se à impunidade dos criminosos do poder a conversão da nossa democracia em ratocracia. Antes do mensalão e da Lava Jato, a taxa de risco da corrupção era baixa. O normal era não ser apanhado. Ou ser apanhado e fazer piada da má sorte. O drama de Lula consolida uma terceira hipótese: a de ser pilhado e pagar pelos crimes. Parece pouco. Mas faz uma enorme diferença.
Nem todo mundo notou, mas o Brasil está mudando. O que desanima é a lentidão do processo. A candidatura de Lula é útil porque ajuda a trazer a mercadoria podre do fundo da loja para a vitrine. O PT se pergunta: por que prender Lula e deixar solto Aécio Neves? Logo alguém gritará: “Numa disputa em que até Fernando Collor concorre ao Planalto, a exclusão de Lula é um despropósito.”
Não demora e o ministro Dias Toffoli, do Supremo, será constrangido a retirar da gaveta o pedido de vista que mantém a salvo, dentro da bolha do foro privilegiado, Aécio, Collor e outros 271 políticos processados por corrupção. O mau exemplo de Lula será redentor se for capaz de arrancar órgãos como a Suprema Corte e o Tribunal Superior Eleitoral de sua tradicional letargia.
A desfaçatez de Lula será útil também pelo contraste. Encrencado por corrupção e lavagem de dinheiro, o pajé do PT voltou a comparar-se no comício noturno desta quarta-feira a Nelson Mandela, encarcerado por combater a discriminação racial. Microfone em punho, Lula declarou: “Mandela ficou preso 27 anos. E nem por isso a luta que ele fazia diminuiu. Ele voltou e virou presidente da África do Sul.” Quem ouve fica tentado a perguntar: por que Lula quer voltar?
A resposta está no parágrafo 4º do artigo 86 da Constituição Federal. Anota o seguinte: “O Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções.” Traduzindo para o português do asfalto: eleito, Lula não poderia responder por crimes praticados antes do início do mandato. E a ação sobre o tríplex iria para o freezer. Seria congelada junto com os outros oito processos criminais que perseguem o autoproclamado Mandela brasileiro como um rastro pegajoso.
Diz-se que o brasileiro não tem memória. Engano. O que falta à plateia é curiosidade. Ao manter viva sua candidatura ficcional, Lula presta um último serviço ao país. Seu descaramento é útil porque estimula as pessoas a buscarem as causas da ruína ética. Muita gente talvez encontre no espelho a melhor explicação.
Noutras nações, a condenação de um ex-presidente por ladroagem seria vista como um desses acontecimentos que ferem a rotina e fazem a vida escapar da normalidade. No Brasil, não. Deve-se rezar para que Lula leve sua candidatura às últimas (in)consequências. Com sorte, o brasileiro talvez perceba que algo de extremamente anormal precisa acontecer para alterar a insuportável normalidade reinante no cenário político.
A aplicação indiscriminada de leis como a da Ficha Limpa, por exemplo, saciaria a fome de limpeza que paira no ar. O cumprimento automático de regras como a que abre a porta da cadeia para os condenados na segunda instância provocaria uma revolução nos costumes. Torça-se para que o PT mantenha um militante de plantão junto à orelha de Lula por 24 horas. Ao menor sinal de renúncia à candidatura, o plantonista deve dizer: “Tem que manter isso, viu?”
Josias de Souza
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