quinta-feira, 11 de maio de 2017

Lula: ‘Eu não tenho nenhuma influência no PT’

Em depoimento a Sergio Moro, Lula disse que ninguém mais do que ele está interessado em “esclarecer a verdade”. O réu soou vago e contraditório em vários momentos. Noutras passagens, a conselho dos advogados, silenciou. Mas em nenhum trecho do interrogatório o compromisso de Lula com a verdade revelou-se tão maleável quanto no instante em que ele disse ao juiz da Lava Jato: “Eu não tenho nenhuma influência no PT.” Ficou entendido que Lula depondo também é uma pose.
A frase escorregou dos lábios de Lula num instante em que Moro o espremia sobre a inusitada versão de que ele jamais soube da bandalheira que ocorria sob suas barbas presidenciais na Petrobras. Seguiu-se o seguinte diálogo:
— O senhor, tendo indicado ou, pelo menos, dado a palavra final para a indicação ao Conselho de Administração da Petrobras de Paulo Roberto Costa, Renato Duque, Nestor Cerveró e Jorge Zelada, não tinha conhecimento de nenhum dos crimes por ele praticados?
Lula respondeu atacando:
— Não. Nem eu, nem o senhor, nem o Ministério Público, nem a Petrobras, nem a imprensa, nem a Polícia Federal. Todos nós só ficamos sabendo quando foi pego no grampo a conversa do Yousseff com o Paulo Roberto.
Moro insistiu:
— Eu indago ao senhor porque foi o senhor que indicou o nome deles ao Conselho de Adminitração da Petrobras. É uma situação diferente da minha, eu não tenho nada a ver com isso. Nunca participei dessas negociações.
— O senhor soltou o Yousseff. E mandou grampear. O senhor podia saber mais do que eu.
— Não, eu decretei a prisão do Alberto Yousseff, é um pouco diferente. Mas, enfim, o senhor, tendo indicado essas pessoas, não teve conhecimento de nada disso?
Lula, como de hábito, esquivou-se:
— Nada. Eu indiquei tanta gente!
— O senhor, tendo nomeado toda essa gente, entende que não tem nenhuma responsabilidade pelos fatos que eles praticaram na Petrobras?
— Nenhuma responsabilidade.
Moro ampliou o quadro, tornando o interrogatório ainda mais constrangedor:
— Alguns dirigentes de algumas empreiteiras do Brasil —Ricardo Pessoa, da UTC; Marcelo Odebrecht, da Odebrecht; Léo Pinheiro, da OAS; Rogério de sá, Andrade Gutierrez— admitiram que havia um esquema criminoso na Petrobras de pagamento de percentual de propina nos grandes contratos. Parte dela sendo destinada a executivos da Petrobras, outra parte destinada a agentes políticos e partidos polítcos, inclusive ao PT. O senhor não tinha qualquer conhecimento disso?
— Não, porque quem monta cartel para roubar não conta para ninguém. O presidente da República não participa do processo de licitação da Petrobras, de tomada de preços da Petrobras. É um problema interno da Petrobras.
[…]
— Alguns desses dirigentes citaram como responsável no partido dos trabalhadores pela arrecadação desses valores o senhor João Vaccari Neto. O senhor não tinha conhecimento disso?
— Não. Veja que o Vaccari é tesoureiro do PT há pouco tempo. Nós tivemos vários tesoureiros na história do PT.
— Alguns afirmam que ele fazia isso desde 2007. O senhor não tem conhecimento?
— Ele não era tesoureiro do PT em 2007.
— Depois que vieram à tona as informações acerca desse esquema criminoso na Petrobras, inclusive de valores sendo direcionados a agentes políticos e a partidos políticos, inclusive ao Partido dos Trabalhadores, o senhor, ex-presidente, tomou alguma providência a esse respeito?
Lula pede ao juiz para repetir a pergunta. Moro, pacientemente, repete cada palavras. E o pajé do PT:
— Eu já estava fora da Presidência há quatro anos. E o senhor sabe que um ex-presidente vale tanto quanto um vaso chinês. Um vaso chinês é um vaso bonito que você ganha quando é presidente. Quando você deixa a Presidência, você não tem onde colocar ele. Você não sabe como cuidar de um ex-presidente. Você não sabe como cuidar do tal vaso chinês. Eu era ex-presidente em 2014, quando saíram as denúncias da Lava Jato.
Moro foi ao ponto
— Senhor ex-presidente, com sua influência no Partido dos Trabalhadores, solicitou eventualmente para que fosse realizada uma apuração interna para verificar se os fatos afirmados pelos executivos ou pelos agentes da Petrobras eram verdadeiros?
Lula saiu-se, então, com uma verdade vista com os olhos da pose:
— Sabe que essa influência dentro do Partido dos Trabalhadores é porque o Ministério Público não conhece o PT.
Moro espantou-se:
— O senhor não tem influênciua dentro do partido?
— Não. Se eles conhecessem o PT não falariam isso. Eu não participo de nenhuma reunião do PT desde que fui eleito Presidente da República, em 2002. Em 2014, quando eu deixei a Presidência (Lula deixou o Planalto em 2010) é que eu voltei a participar. Então, eu não tenho nenhuma influência no PT. Eu tenho influência na sociedade. Quando eu falo, as pesosas me ouvem. Alguns ouvem, nem todos.
Moro insistiu:
— O senhor não solicitou nenhuma providência para que o PT fizesse algum exame…
— Não, porque eu não era dirigente do PT.
O ex-tesoureiro Vaccari está preso. Já sondou a força-tarefa da Lava Jato sobre a hipótese de tornar-se um delator. Mas ainda não abriu o bico. Nos encontros partidários, ainda é aclamado como “herói do povo brasileiro.” Outro petista preso, Renato Duque, já moveu os lábios mesmo sem ter assinado um acordo de colaboração. Contou a Moro que Lula o chamou para conversar, em 2014. Foi levado à presença do “nine”, como o “chefe” era chamado, por Vaccari. Falaram sobre corrupção e contas secretas na Suíça. Lula orientou-o a apagar os rastros.
Indagado por Moro, Lula viu-se compelido a admitir o encontro. ''Tive uma vez no aeroporto de Congonhas, se não me falha a memória, porque tinha vários boatos no jornal de corrupção e de contas no exterior. Eu pedi para o Vaccari, que eu não tinha amizade com o Duque, trazer o Duque para converconversar.''
O mesmo Lula que dissera ter lavado as mãos diante da Lava Jato por estar fora da Presidência revelou-se um zeloso ex-presidente: ''A pergunta que eu fiz para o Duque foi simples: tem matéria nos jornais, tem denúncias de que você tem dinheiro no exterior, está pegando da Petrobras. Eu falei: 'você tem conta no exterior?' Ele falou: 'Não tenho'. Eu falei: 'Acabou'. Se não tem, não mentiu para mim. Mentiu para ele mesmo.''
Moro emendou uma pergunta óbvia: por que não chamou para conversar os outros ex-diretores da Petrobras que frequentavam o noticiário como salteadores dos cofres da estatal? E Lula, agora um petista bastante preocupado com a imagem do PT: ''O Duque tinha sido indicado pela bancada do PT. O PT indicou o Duque com outros partidos… Eu fiquei muito puto. E ele disse que não [tinha contas no exterior].''
Considerando-se que os réus têm o direito de mentir para não se auto-incriminar, a versão de Lula para a lama que engolfa sua biografia não deveria despertar tanto interesse. Mas o líder máximo do PT soou tão surreal diante de Moro que seu depoimento bale quase como uma autodelação. Para dar crédito a tudo o que disse Lula, é preciso acreditar em tantas coisas improváveis que o desafio passa a ser ao bom senso. DO J.DESOUZA

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